O batismo cristão
ordenado por Cristo na Grande Comissão (Mt 28.19) deve ser efetuado “em nome do
Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”. Observe que o texto diz “nome” e não
“nomes”. A ideia é que o nome de Deus é Pai-Filho-Espírito Santo. É verdade que
o termo Trindade não se encontra no texto hebraico nem no grego, na Bíblia; e
tampouco aparecem termos como “soteríologia” — no entanto, existe na teologia
sistemática a doutrina da salvação, também se encontra a da “hamartologia”, a
da “transcendência” e “imanência”, ou a da “preexistência” de Cristo, ou a
“cristologia”. Poucas pessoas que discutem os ensinos bíblicos levantam uma
bandeira vermelha e objetam contra o uso de tais termos, quando estudam a
natureza das graciosas obras de Deus. Tais designações servem como rótulos
convenientes, didáticos, para conceitos ou ensinos complexos a respeito de
assuntos intimamente relacionados.
É impossível discutir
teologia como disciplina sistemática, filosófica, sem se usar esses termos
técnicos. Nenhum deles se encontra na Bíblia, disso temos certeza. No entanto,
todos eles formam um complexo grandioso de conceitos coerentes, organizados,
que são ensinados nas Escrituras. Portanto, devemos rejeitar como irrelevante a
objeção de que a palavra precisa, “Trindade”, não se encontra na Bíblia.
No entanto,
aventuramo-nos a insistir em que alguns dos ensinos básicos e fundamentais a
respeito de Deus tornam-se praticamente incompreensíveis, sem que tenhamos uma
boa compreensão da doutrina da Trindade.
Em primeiro lugar, vamos
definir com clareza o que significa “Trindade”. Esse termo implica que o Senhor
é uma unidade que subsiste em três pessoas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo —
sendo os três um só Deus. Que Deus é uno tanto o Antigo como o Novo Testamento
o asseveram:
Deuteronômio 6.4:
“Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor”; Marcos 12.29:
“Respondeu Jesus: o principal é: Ouve, ó Israel, o Senhor nosso Deus é o único
Senhor!”;
Efésios 4:6: “[Há] um
só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, age por meio de todos e está em
todos”. Vemos aqui afirmações claras, inequívocas de monoteísmo:
Deus é um só. Não há
outros deuses além dele. Isaías 45.22 menciona Deus dizendo:
“Olhai para mim e sede
salvos, vós, todos os termos da terra; porque eu sou Deus, e não há outro”.
Ou ainda Salmos
96.4,5:“Porque grande é o Senhor e mui digno de ser louvado, temível mais que
todos os deuses. Porque todos os deuses dos povos não passam de ídolos [hebr.
‘elilim tem conotação de ‘fraco, sem valor’]; o Senhor, porém, fez os céus”.
Isso se torna muito explícito em l Coríntios 8.5,6: “Porque, ainda que há
também alguns que se chamem deuses, quer no céu ou sobre a terra, como há
muitos deuses e muitos senhores, todavia, para nós há um só Deus, o Pai, de
quem são todas as cousas e para quem existimos; e um só Senhor, Jesus Cristo,
pelo qual são todas as cousas, e nós também, por ele”.
Mas, a Bíblia também
ensina que Deus não é uma mônada estéril, mas existe eternamente em três
pessoas. Isso fica implícito no registro da criação, em Gênesis 1.1-3: “No
princípio, criou [bãrã; verbo no singular, não no plural bãre’û] Deus [’elohim,
plural na forma, tendo o final im; esse plural para ‘Deus’ provavelmente é um
‘plural majestático’; entretanto, compare-se Gênesis 1.26,27, que discutimos
abaixo] os céus e a terra. A terra, porém, estava sem forma e vazia... e o
Espírito de Deus pairava por sobre as águas [mostrando o envolvimento da
terceira Pessoa na obra da criação]. Disse Deus [’elóhîm]: Haja luz; e houve
luz”. Temos aqui Deus falando como a Palavra Criativa, o Verbo (Jo 1.3), que é
a segunda Pessoa da Trindade.
Diz a Bíblia que cada
pessoa da Trindade tem uma função especial, tanto na obra da criação como na da
redenção. O Pai é a Fonte de todas as coisas (1 Coríntios 8.6) “... pelo qual
são todas as coisas”). Ele é aquele que planejou e ordenou a redenção. “Porque
Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo
o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (João 3.16). A encarnação
foi o cumprimento de seu decreto previamente anunciado em Salmos 2.7:
“Proclamarei o decreto do Senhor: Ele me disse: Tu és meu Filho, eu, hoje, te
gerei”. Ele também deu-nos o Messias como expiação pelos nossos pecados (Is
53.6, 10). De maneira semelhante, ele concedeu o Espírito Santo a seu povo (At
2.18; Ef 1.17). Ele derramou a salvação sobre os redimidos (Ef 2.8,9), pela fé,
que também é dom de Deus. E a seu Filho entregou a Igreja (Jo 6.37).
Quanto a Deus, o Filho,
foi por meio dele que toda a obra da criação se realizou (Jo 1.3; lCo 8.6);
significa que ele era também o Senhor Deus, ao qual se refere o salmo 90, o
Criador que fez as montanhas, as colinas e toda a Terra. Ele é também o
Sustentador e Preservador do universo material que ele criou (Hb 1.2,3). No entanto,
ele também é o Deus que se tornou “carne” (Jo 1.18), isto é, um verdadeiro ser
humano —sem deixar de ser divino, a fim de explicar (“exegete”) Deus à
humanidade. Ele era a Luz que veio ao mundo para salvar os homens do poder das
trevas (Jo 1.9; 8.12) por meio de sua perfeita obediência à lei e sua morte
expiatória na cruz (Hb 1.3). Ele é também aquele que venceu o poder da morte,
e, como o Salvador ressurreto, estabeleceu sua Igreja e comissionou-a como seu
templo vivo, seu corpo e sua noiva.
O Espírito Santo é
aquela pessoa da Trindade que inspirou a redação das Escrituras (lCo 2.13; 2Pe
1.21), e manifesta o Evangelho aos redimidos de Deus (Jo 16.14). Ele comunica
os benefícios do Calvário a todos quantos verdadeiramente crêem e receberam
Cristo como Senhor e Salvador (Jo 1. 12,13); e Ele penetra em suas almas a fim
de santificar seus corpos como templos vivos de Deus (lCo 3.16; 6.19), depois
de terem nascido de novo pela sua graça transformadora (Jo 3.5,6). A seguir,
ele ensina aos crentes as palavras de Cristo, de modo que possam entendê-las e
crer nelas (Jo 14.26; lCo 2.10), e dá testemunho de Jesus tanto por sinais
externos como por convicção interna (Jo 15.26; At 2.33,38,43). Ele santifica e
congrega os membros de Cristo num organismo vivo, que é o verdadeiro templo do
Espírito Santo (Ef 2.18-22) e concede a cada membro dons especiais da graça e
do poder mediante os quais possam enriquecer e fortalecer a Igreja como um todo
(l Co 12.7-11).
O Novo Testamento
afirma reiterada e claramente que Jesus Cristo é Deus encarnado. Ele veio como
o Verbo criador, que também é Deus (Jo 1.1-3). De fato Ele é “o Deus unigênito”
(Jo 1.18; segundo os manuscritos mais antigos, os melhores, essa era a redação
original) em vez de “único Filho gerado”. Em João 20.28, a afirmação de Tomé,
que deixara de ser incrédulo, “Senhor meu e Deus meu foi aceita por Cristo como
sua verdadeira identidade; assim comentou o Senhor: “Porque me viste, creste?
Bem-aventurados os que não viram e creram”. Creram em quê? Acreditaram naquilo que
Tomé acabara de reconhecer, que Cristo é Senhor e Deus!
Nas cartas de Paulo e
nas epístolas gerais, encontramos outras afirmações claras sobre a deidade de
Cristo:
1. Falando dos
israelitas, assim diz Paulo: “... deles são os patriarcas, e também deles [ón,
o particípio realmente exige essa tradução; ho ón (‘ele é’) tem de ser uma
construção modificadora de ho Christos, como seu antecedente] descende o
Cristo, segundo a carne [i.e., do ponto de vista físico], o qual é sobre todos,
Deus bendito para todo o sempre. Amém” (Rm 9.5).
2. Em Tito 2.13, Paulo
diz: “aguardando a bendita esperança e a manifestação [epiphaneia noutras
passagens só se refere ao surgimento de Cristo, nunca de Deus Pai] da glória do
nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus.
3. Hebreus 1.8 cita
Salmos 45.6,7 como prova da divindade de Cristo, ensinada no AT: “mas acerca do
Filho: O teu trono, ó Deus, é para todo o sempre” [o hebraico usa ‘elóhim aqui].
4. Hebreus 1.10,11 cita
Salmos 102.25,26, declarando: “Em tempos remotos, Senhor [o salmo todo
dirige-se a Iavé, pelo que o autor insere o vocativo Senhor aqui, partindo de
um contexto anterior], lançaste os fundamentos da terra; e os céus são obras
das tuas mãos. Eles perecerão, mas tu permaneces”. Aqui Cristo é mencionado
como o Deus que sempre existiu, até mesmo antes da criação, que viverá para
sempre, até mesmo depois de os céus terem cessado de existir.
5. Em l João 5.20, esse
apóstolo diz: “... estamos no verdadeiro, em seu Filho, Jesus Cristo. Este
[lit., esta pessoa] é o verdadeiro Deus e a vida eterna”.
No que concerne às
passagens do AT, os seguintes fatos relacionam-se à Trindade:
1. Gênesis 1.26 cita
Deus (‘elóhim) que diz: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa
semelhança...”. Essa primeira pessoa dificilmente pode ser um plural editorial
ou real, referente a uma única pessoa, a que fala, visto que tal uso não se
verifica em parte alguma do hebraico bíblico. Portanto, precisamos enfrentar a
pergunta: Quem são as pessoas incluídas em “façamos nos” e em “nossa”.
Dificilmente incluiríamos os anjos, que estariam sendo consultados, pois em
parte alguma se diz que o homem foi criado à imagem deles; só de Deus. O v. 27
afirma: “Criou Deus [’elóhim], pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o
criou; o homem e a mulher os criou”, O Senhor — o mesmo Deus que falou de si
mesmo no plural— declara agora que criou o homem à sua imagem. Em outras
palavras, o plural equivale ao singular. Só podemos entender isto em termos da
natureza trinitária de Deus. O verdadeiro Deus subsiste em três pessoas, as
quais são capazes de discutir entre si e executar seus planos, pondo-os em
ação, juntos — sem deixarem de ser um único Deus.
Para nós, que fomos
criados à imagem de Deus, essa doutrina não deveria ser difícil de entender.
Existe um sentido muito bem definido em que temos uma natureza tríplice, ou
trinitária. I Tessalonicenses 5.23 indica-o com clareza: “O mesmo Deus de paz
vos santifique em tudo; e o vosso espírito, alma e corpo sejam conservados
íntegros e irrepreensíveis na vinda de nosso Senhor Jesus Cristo” (grifo do
autor). Com freqüência, encontramo-nos engajados em debate entre nosso
espírito, alma e corpo, quando enfrentamos uma decisão moral, uma escolha entre
a vontade de Deus e o desejo de nossa natureza carnal, que busca o prazer
egoísta.
2. Salmos 33.6 diz: “Os
céus por sua palavra se fizeram, e, pelo sopro [rûah, Espírito] de sua boca, o
exército deles”. Aqui de novo temos o mesmo envolvimento das três pessoas da
Trindade na obra da criação: o Pai decreta, o Filho, sendo o Verbo, executa o
decreto do Pai, e o Espírito concede a dinâmica vital ao processo.
3. Salmos 45.6 já foi
citado em conexão com Hebreus 1.8: “O teu trono, ó Deus, é para todo o sempre;
cetro de eqüidade é o cetro do teu reino”. Mas 45.7 traz uma referência a um
Deus que abençoara ao Verbo que é o perfeito Rei: “Amas a justiça e odeias a
iniqüidade; por isso Deus, o teu Deus, te ungiu com o óleo de alegria, como a nenhum
dos teus companheiros”. O conceito de Deus abençoando Deus só pode ser
entendido em um sentido trinitário. Um conceito de Deus unitário torna essa
passagem ininteligível.
4. Isaías 48.16 mostra
as três pessoas em ação, na obra da revelação redentora: “Chegai-vos a mim e
ouvi isto: não falei em segredo desde o princípio; desde o tempo em que isso
vem acontecendo [i.e., o livramento do povo de Deus dos grilhões e da
escravidão], tenho estado lá. Agora, o Senhor Deus me enviou a mim e o seu
Espírito”. Temos aqui o Deus-homem Redentor falando (o que se descreveu a si
mesmo no v. 12 dizendo: “sou o primeiro e também o último”, e no v. 13, assim:
“... a minha mão fundou a terra, e a minha destra estendeu os céus...” Agora
ele diz, no v. 16: “... o Senhor Deus me enviou a mim e o seu Espírito (que
nesse caso se refere a Deus, o Filho, e a Deus, o Espírito, a terceira Pessoa
da Trindade). E possível que “e o seu Espírito” possa ligar-se a “me”, como
objeto direto de “enviou”, mas no contexto do original hebraico, a impressão é
que “seu Espírito” (rüah, Espírito) está ligado a ‘adonay YHWH (“Senhor Iavé),
como mais um sujeito, em vez de um objeto. Seja como for, a terceira Pessoa
torna-se distinta da primeira e da segunda, nesses versículos.
Além dos exemplos mencionados
acima, de versículos do AT que não fazem sentido a não ser que se admita a
natureza trinitária de Deus, do Senhor triúno, existem múltiplos exemplos da
atividade do “Anjo de Iavé” que se iguala ao próprio Deus. Consideremos as
seguintes passagens:
1. Gênesis 22.11
descreve o momento dramático da experiência de Abraão no monte Moriá, quando
estava prestes a sacrificar seu filho Isaque: “Mas do céu lhe bradou o Anjo do
Senhor:Abraão! Abraão! Ele respondeu: .Eis-me aqui”. O versículo seguinte prossegue,
igualando esse ser celestial ao próprio Deus: “...agora sei que temes a Deus,
porquanto não me negaste o filho, o teu único filho”. Depois, nos v. 16 e 17,0
anjo declara: “Jurei, por mim mesmo, diz o Senhor, porquanto fizeste isso e não
me negaste o teu único filho, que deveras te abençoarei e certamente
multiplicarei a tua descendência...”. Fica bem claro que o anjo de Iavé aqui é
o próprio Deus. “Iavé” é o nome de aliança do Deus Triuno, e o seu anjo também
é o próprio Deus. Em outras palavras, podemos identificar o anjo de Iavé em
passagens como essa, como sendo a pré-encarnação do Redentor, Deus o Filho, já
engajado na obra redentora e mediadora, antes ainda de tornar-se um homem,
filho da virgem Maria.
2. Em Gênesis 31.11,13
observamos o mesmo fenômeno; o anjo de Deus na verdade é o próprio Deus: “E o
Anjo de Deus me disse em sonho: Jacó! Eu respondi: .Eis-me aqui [...] Eu sou o
Deus de Betel, onde ungiste uma coluna...”.
3. Êxodo 3:2 declara:
“Apareceu-lhe o Anjo do Senhor numa chama de fogo, no meio duma sarça...”.
Depois, no v. 4, lemos: “Vendo o Senhor que ele se voltava para ver, Deus, do
meio da sarça...”. A identificação completa nós a temos no v. 6: “Eu sou o Deus
de teu pai, o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó. Moisés escondeu
o rosto, porque temeu olhar para Deus”. Outra vez verificamos que o Anjo do
Senhor não é outro senão Iavé em pessoa.
4. Juízes 13.20
declara: “Sucedeu, que, subindo para o céu a chama que saiu do altar, o Anjo do
Senhor subiu nela; o que vendo Manoá e sua mulher, caíram com o rosto em
terra”. Os v. 22 e 23 completam a identificação do anjo como sendo o próprio
Senhor: “Disse Manoá a sua mulher: Certamente, morreremos, porque vimos a
Deus”. Mas sua esposa lhe disse: “Se o Senhor nos quisera matar, não aceitaria
de nossas mãos o holocausto e a oferta de manjares, nem nos teria mostrado tudo
isto”.
À face dessa pesquisa
das evidências bíblicas, concluímos que as Escrituras verdadeiramente ensinam a
doutrina da Trindade, ainda que não empregue esse termo. Além disso, devemos
observar que o conceito de Deus como sendo um, em essência, mas três nos
centros de consciência —a que a Igreja grega se referia como três hypostases e
a latina como três personagens — e concepção singular, exclusiva, na história
do pensamento humano. Nenhuma outra cultura ou movimento filosófico jamais
apareceu com uma idéia semelhante a essa a respeito de Deus —pensamento que
continua difícil à nossa mente finita, para que o entendamos. No entanto, a
inabilidade nossa para compreender completamente a riqueza e a plenitude da
natureza de Deus, como Trindade Santa, não deve constituir motivo para o ceticismo.
Se só tivermos de aceitar aquilo que podemos entender totalmente, e nisso
acreditar, estaremos, nesse caso, desesperançosamente além da redenção. Por
quê? Pois jamais entenderemos plenamente como poderia Deus amar-nos de tal
maneira que enviasse seu Filho Unigênito à terra para morrer por nós, pelos
nossos pecados, e tornar-se nosso Salvador. Se não aceitarmos uma idéia que não
podemos entender, como creríamos em João 3:16? Como receberíamos a certeza do
evangelho e salvar-nos?
FONTE: www.altoclamor.com
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