Ricardo
André
A bebida alcoólica faz
parte de quase todos os eventos sociais. Festas, despedidas, comemorações,
dores de um coração partido — a bebida é a companheira de todas as horas. Na
televisão, a qualquer hora do dia, somos bombardeados com a publicidade de
etílicos, sempre associados à festa e descontração. Todas as propagandas estimulam
os usuários a beber moderadamente. E, muitos jovens cristãos ao participarem de
muitos desses eventos sociais, movidos pela propaganda da mídia, ou pela
pressão social ou mesmo pelo desejo de ser igual aos amigos, acabam bebendo
vinho, cerveja ou outras bebidas alcoólicas.
Em muitas passagens as Sagradas
Escrituras condenam nitidamente o consumo de vinho por causa de seus efeitos
prejudiciais (Levítico 10:9; Números 6:3; Deuteronômio 14:26; 29:6; Juízes
13:4,7,14; I Samuel 1:15; Provérbios 20:1; 31:4,6; Isaías 5:11,22; 24:9; 28:7;
29:9; 56:12; Miquéias 2:11; Lucas 1:15). Todavia, o apóstolo Paulo aconselhou
Timóteo a usar “um pouco de vinho, por causa do teu estômago e das tuas frequentes
enfermidades” (I Timóteo 5:23). Muitos cristãos hoje, com base nessa
declaração paulina, entendem que a Bíblia autoriza os cristãos a consumir
moderadamente bebidas alcoólicas. Aprova Deus que os cristãos bebam cerveja,
vinho ou qualquer outra bebida alcoólica de forma moderada? Como deveríamos
entender esse texto?
O
consumo de bebida alcoólica é condenado na Bíblia
É um fato bem
documentado que o álcool prejudica os processos físicos e mentais. O ébrio tem
a impressão de que o álcool o eleva acima dos cuidados e ansiedades da vida
real, e o conduz a um mundo de felicidade, vigor e inteligência. Na verdade,
ocorre exatamente o contrário! Por conta disso, o uso de bebidas alcoólicas é
condenado nas Escrituras. O profeta Habacuque chama o vinho de
"enganoso". “Assim
como o vinho é enganoso, tampouco permanece o arrogante, cuja gananciosa boca
se escancara como o sepulcro e é como a morte, que não se farta; ele ajunta
para si todas as nações e congrega todos os povos” (Habacuque 2:5),
enquanto Salomão diz que, "o vinho é escarnecedor, e a bebida
forte alvoroçadora; todo aquele que por eles é vencido, não é sábio"
(Provérbios 20:1).
Os dirigentes são
especialmente advertidos de que o álcool destruirá a capacidade deles para
tomar decisões acertadas e administrar com sabedoria. “Não convém aos reis, ó Lemuel;
não convém aos reis beber vinho, não convém aos governantes desejar bebida
fermentada, para não suceder que bebam e se esqueçam do que a lei determina, e
deixem de fazer justiça aos oprimidos” (Provérbios 31:4,5, NVI).
Tais advertências,
entretanto, com o tempo foram sendo ignoradas. Nos tempos do profeta Isaías, o
uso de vinho fermentado tinha se tornado um problema tão universal, que até
mesmo os sacerdotes se embriagavam (Isaías 28:7).
O
que significa o conselho de Paulo a Timóteo?
Bom, mas se a Bíblia
Sagrada desaprova o uso do álcool por que Paulo aconselhou seu filho na fé a
beber “um pouco de vinho”? O que, de fato, queria Paulo dizer?
Este conselho, dado por
Paulo a Timóteo, tem sido seguido com prazer durante os últimos 20 séculos, por
inúmeras pessoas amantes das bebidas alcoólicas. Assim, é importante verificar
a natureza do conselho de Paulo e sua aplicação para nós hoje.
Em primeiro lugar, o
conselho de Paulo a Timóteo deve ser considerado como uma expressão de cuidado
paterno, e não como uma ordem. O apóstolo não está mandando que seu amado filho
na fé beba vinho à vontade. O seu conselho é para que ele use um pouco de
vinho, pela razão mencionada: “por causa do teu estômago e das tuas frequentes
enfermidades”.
Comentando este
versículo, o Dr. Samuele Bacchiocchi, em seu livro Wine in lhe Bible, diz:
"Paulo não está aqui estabelecendo uma regra a ser seguida por toda a
cristandade, nem está “prescrevendo vinho como uma panaceia para todo tipo de
doenças. Ele estava apenas fazendo uma recomendação que julgava útil para
aliviar os problemas de Timóteo. A única conclusão legítima que se pode tirar
deste texto é que é apropriado usar uma pequena quantidade de vinho por razões
médicas."1
Segundo alguns
comentaristas, o que o texto original em grego quer dizer é: "Não bebas
mais água pura: use-a misturada com um pouco de vinho".
Como medicamento, o
vinho deve ser misturado com água, como a calda feita de uvas e outras frutas
era antigamente preparada e usada como tônico para o estômago em casos de
dispepsia. Quando se conhece este fato, torna-se absurdo imaginar que este
texto seja uma "santa" recomendação para beber vinho em lugar de
água.
"A prática de
misturar uma parte de vinho em duas, três, cinco ou mais partes de água, era
comum no mundo antigo. Alguns vinhos, especialmente a calda grossa do suco de
uva, era misturada em até 20 partes de água."2
De acordo com o Dr. Aecio
Cairus, professor de Teologia no Instituto Internacional de Estudos Avançados
das Filipinas, nos tempos de Paulo usava-se o vinho misturado na água como
antisséptico. Ele afirma: “A água potável no passado era muito insegura. Poucos
tinham acesso aos mananciais. A maioria das pessoas bebia água pluvial
estagnada, coletada de seus próprios telhados em cisternas (Provérbios 5:15),
onde as bactérias se multiplicavam facilmente. Isso produzia “doenças frequentes”
do “estômago” ou disenteria. Porém, a adição de um “pouco de vinho” – como o
clássico vinho doce e espesso – na água era suficiente para eliminar as
bactérias. A passagem pressupõe que Timóteo havia sido instruído a evitar o
vinho e estaria disposto a sofrer frequentes episódios diarréicos a fim de ser
fiel a tal instrução, não fosse a recomendação oportuna de Paulo. Mas da mesma
maneira que a consciência moderna não toleraria a posse de escravos ou a
poligamia, o fato de que no passado o álcool era usado como antisséptico a fim
de tornar a água da mesa própria para se beber, não pode ser usado para
desculpar seu consumo hoje. A recusa ao álcool implícita nessa passagem mostra
que, se o vinho for consumido pelos cristãos, ele tem de ser o “suco de uva
não-fermentado” (Ellen G. White, Signs of the Times, 6 de setembro de 1899).3
Tipos de vinho
Geralmente se pensa que
o vinho que Paulo recomendou a Timóteo contivesse álcool. Mas não há qualquer
certeza nesse sentido, por duas razões: o termo vinho era usado de maneira
genérica para denotar tanto o vinho fermentado como o não fermentado. Em
segundo lugar, há testemunhos históricos que atestam o uso de vinho não
fermentado por razões médicas no mundo antigo.
Aristóteles, no quarto século
A.C., recomenda o uso de um suco de uva doce, chamado glukus em grego, porque,
diz ele, "embora chamado vinho, ele não tem o efeito do vinho".
Ateneus, o Gramático
(280 A.D.) aconselha especificamente o uso de um tipo de suco de uva, que
alguns chamam de "vinho doce", para as desordens do estômago.
Já Plínio,
contemporâneo de Paulo, fala também do uso médico de vinho fermentado,
demonstrando assim que os dois tipos de vinho eram utilizados como remédio. No
entanto, Plínio reconhece que o vinho fermentado é absorvido mais rapidamente e
"sobe para a cabeça". Para evitar os efeitos colaterais do vinho com
álcool, Plínio recomenda o uso de suco de uva filtrado.
"Os testemunhos de
Aristóteles, Ateneus e Plínio indicam que o vinho não fermentado era conhecido
e preferido em relação ao vinho fermentado, porque não possuía os efeitos
colaterais deste último. A luz de tais testemunhos, é razoável supor que o
vinho recomendado por Paulo a Timóteo fosse, na verdade, não fermentado."4
O texto que analisamos
indica claramente que Timóteo tinha o hábito de beber apenas água. Ele era abstêmio,
portanto. Se tivesse o hábito de beber vinho, este conselho de Paulo teria sido
desnecessário. Temos razão para crer que o próprio Paulo havia instruído Timóteo
a ser abstinente, porque anteriormente, nessa mesma epístola, o apóstolo diz
que um bispo cristão, entre outras coisas, não deve ser dado ao vinho. (I
Timóteo 3:2 e 3).
Os
riscos potenciais do beber moderado
A verdade é que as
Sagradas Escrituras ensinam a temperança. Que é temperança? Ela é para a saúde
o que a argamassa é para um edifício de tijolos. Sem a temperança não é
possível preservar a saúde. Segundo a escritora cristã Ellen G. White
(mensageira especial sobre o assunto de temperança), “a verdadeira temperança nos
ensina a dispensar inteiramente todas as coisas nocivas, e usar judiciosamente
aquilo que é saudável” (Patriarcas e Profetas, p. 562). Em outras
palavras, a Bíblia ensina a moderação naquilo que é bom, e a abstinência
daquilo que é mau. Como ilustração do princípio de moderação naquilo que é bom,
temos o conselho de Salomão para comer mel "porque é saudável"
(Provérbios 24:13). Mas em seguida ele adverte que "comer muito mel, não é
bom" (Provérbios 25:27). O excesso, mesmo nas coisas boas, é sempre
prejudicial.
Agora, no que concerne
a bebida alcoólica, por ser prejudicial a nosso corpo, ela deve ser dispensada
inteiramente. O cristão, como fiel mordomo do Senhor, deve abster-se
completamente dela. Até porque um pouco de álcool destrói a eficiência;
quantidades maiores destroem a vida.
Paul Harvey afirmou que “trinta gramas de álcool retardam a reação
muscular em 17, 4 por cento; aumentam 9,7% do tempo requerido para tomar uma
decisão; ocasionam um aumento de 35,3% no número de erros causados pela
coordenação muscular” (Citado em Lição da Escola Sabatina, 4º Trimestre de
1991, p. 48).
Segundo o médico e apresentador
da BBC, Michael Mosley, “qualquer
quantidade de álcool que você ingerir irá provocar um aumento nos riscos de
desenvolver algumas formas de câncer – particularmente câncer de mama –,
incluindo algumas ocorrências mais raras da doença, em partes do corpo como
cabeça, pescoço e garganta”.6 Já o professor Tim Stockwell, diretor do Centro
de Pesquisas sobre Dependência Química da Universidade de Victoria, no Canadá,
afirmou: “o consumo de bebidas alcoólicas, em qualquer quantidade, aumenta o
risco de mulheres desenvolverem câncer de mama”. E afirmou ainda enfaticamente:
“Teríamos 10% a menos de mortes no mundo por causa dessa doença se ninguém
bebesse".7
Vale dizer que o álcool
é um dos co-responsáveis por grande parte dos crimes, pois em maior ou menor
grau, está presente como coadjuvante nas tomadas de decisões criminosas.
Nos crimes passionais
está quase sempre atuante como fator desencadeador da ação violenta. Nas
vinganças e brigas de bar/balada fazem parte do gatilho impulsivo que
transforma um simples desentendimento numa guerra.
Além disso, temos os
crimes domésticos contra mulheres e crianças em que vemos o álcool como motivo
de discussões e desinibidor de agressividades latentes entre casais, pais e
filhos. Os acidentes de trânsito com ou sem vítimas fatais quase sempre estão
associados ao uso do álcool.
Ora, se os malefícios
desse hábito são tão grandes como descritos aqui, por que insistir em continuar
com ele? O melhor é que os cristãos sejam abstêmios. À primeira vista radical,
a decisão é perfeitamente sensata para os servos de Deus. Vale ressaltar que a
Bíblia ensina que nosso corpo é templo do Espírito Santo (I Co 6:19, 20). Essa
é uma razão suficiente para cuidarmos dele. Sobre isso Ellen G. White afirma: “Nosso
corpo não é nosso, para que o tratemos como desejamos, para que o danifiquemos
com hábitos que levam à decadência, tornando impossível render a deus perfeito
serviço. Nossa vida e todas as nossas faculdades Lhe pertencem” (Conselho Sobre
o Regime Alimentar, p.56).
Ademais, o beber
moderado constitui-se numa verdadeira arapuca. É sabido que todos os
alcoólatras (hoje o termo é “alcoolista”) de hoje, começaram a beber
moderadamente, o famoso “beber socialmente”. Nunca tiveram a intenção de
tornarem-se ébrios. Mas, acabaram caindo no vício, pego pela armadilha do “beber
socialmente”. Transpuseram o uso moderado e adentraram a zona do alcoolismo sem
perceber. Verdade é que, não nos é tão nítido ou perceptível quando alguém
passou da dose "moderada" e incidiu numa doença silenciosa,
socialmente estimulada, que rende bons papos entre amigos e mata muitas pessoas
direta e indiretamente – ainda que os dados estatísticos não consigam revelar a
extensão e gravidade do assunto.
Todo mundo já ouviu uma
história envolvendo álcool que não terminou bem. O problema é que ignoramos o
fato de que a história não precisa culminar em morte ou paraplegia para ser uma
tragédia. Portanto, para não correr o risco de tornar-se um alcoólista é
importantíssimo não “flertar com o inimigo”, é mais prudente dispensar
inteiramente a bebida. Mas, o que é preciso para praticar a temperança? “Em
todos os tempos e em todas as ocasiões requer coragem moral aderir aos
princípios de estrita temperança” (Ellen G. White, Temperança, p. 190).
Caro amigo leitor, que
Deus lhe dê forças para fazer as modificações necessárias em sua vida no tocante
a essa questão.
Referências:
1. Samuele Bacchiocchi, Wine in lhe Bible, pág.
243.
2. Ibidem, pág. 243.
4. Ibidem, pág. 245.
5. Ibidem, pág. 251.
7. Ibidem