Teologia

domingo, 27 de junho de 2021

AS PORTAS QUE PRECISAMOS GUARDAR

Ellen G. White*

Todos devem vigiar os sentidos, do contrário Satanás alcançará vitória sobre eles; pois essas são as avenidas da alma. Deves tornar-te fiel sentinela de teus olhos, ouvidos e todos os sentidos, se quiseres dominar a mente e impedir que vãos e corruptos pensamentos te manchem a alma. Só o poder da graça pode realizar esta tão desejável obra.

Satanás e seus anjos estão ativos, criando uma espécie de paralisia dos sentidos, de modo a não serem ouvidas as admoestações, advertências e repreensões, ou, se ouvidas, não terem efeito sobre o coração, transformando a vida (LA, 401).

Satanás não pode entrar na mente sem nosso consentimento — Deus tomou providências para que não fôssemos tentados acima de nossa capacidade de resistir, mas que com cada tentação dará também um meio de escape. Se vivemos inteiramente para Deus, não permitiremos que a mente se demore em imaginações egoístas.

Se houver um meio qualquer pelo qual Satanás possa alcançar acesso à mente, ele semeará o seu joio e o fará crescer até que redunde em farta colheita. Em caso algum pode Satanás obter domínio sobre os pensamentos, palavras e ações, a menos que voluntariamente lhe abramos a porta e o convidemos a entrar. Ele entrará então, lançando fora a boa semente semeada no coração e tornando de nenhum efeito a verdade. […]

É perigoso deter-nos a considerar as vantagens que poderemos colher em ceder às sugestões de Satanás. O pecado resulta em desonra e ruína para toda pessoa que com ele condescende; sua natureza, porém, é de molde a cegar e iludir, e nos enganará com lisonjeiras perspectivas. Caso nos aventuremos no terreno do inimigo, não temos nenhuma garantia de proteção contra o seu poder. Cumpre-nos, no que de nós depender, cerrar toda entrada pela qual ele possa encontrar acesso à alma. […]

Todo cristão deve manter-se em guarda continuamente, vigiando cada entrada da alma por onde Satanás possa ganhar acesso. Ele precisa orar pedindo auxílio divino e ao mesmo tempo resistir resolutamente a cada inclinação ao pecado. Mediante coragem, fé, perseverante esforço, pode tornar-se um vitorioso. Mas lembre-se de que para alcançar a vitória Cristo precisa habitar nele e ele em Cristo. […]

Devemos fazer todo o possível para pormos a nós mesmos e a nossos filhos em posição onde não vejamos a iniquidade que é praticada no mundo. Devemos guardar cuidadosamente nossa capacidade de ver e de ouvir, para que essas coisas más não entrem em nossa mente. […] Não procureis saber quão perto podeis andar à beira do precipício e todavia estar seguros. Evitai a primeira aproximação ao perigo. Não se pode brincar com os interesses da alma. Vosso capital é vosso caráter. Acariciai-o, como faríeis a um áureo tesouro. A pureza moral, o respeito próprio, o forte poder de resistência, têm de ser acariciados firme e constantemente. Não deve haver um único afastamento da discrição; um ato de familiaridade, um deslize, podem pôr em perigo a alma, abrindo a porta da tentação, e tornar-se enfraquecido o poder de resistência. (LA, 402-404).

 

*Ellen G. White (1827–1915) foi uma das pioneiras da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Os adventistas acreditam que ela exerceu o dom de profecia bíblico durante mais de 70 anos de ministério ativo.

 

FONTE: Conselhos Para a Igreja, Cap. 30, p. 169, 170.

 

 

 

sexta-feira, 25 de junho de 2021

NÃO TENHA MEDO


Bill Knott*

Não temos o controle sobre as tempestades da vida, mas podemos aprender a confiar que estamos a salvo com Deus em nosso barco

Quando éramos crianças, às vezes tínhamos a impressão de que controlávamos o mundo. Mantínhamos os dedos eretos diante dos nossos olhos e os membros queridos da nossa família desapareciam – mas só por um momento.

Nós ríamos, e a sala cheia de adultos parava de conversar para rir freneticamente conosco. Quando chorávamos, normalmente o mundo deixava de girar, pois os adultos se apressavam a nos abraçar, enxugar nossas lágrimas, nos confortar ou nos alimentar. Orávamos pelos gatinhos e cachorrinhos perdidos, e (quase sempre) eles voltavam para casa. Orávamos por proteção para os missionários que levavam o evangelho ao mundo, e eles voltavam com histórias que validavam nossas orações.

Pensávamos que havia uma conexão direta entre nossas ações e os acontecimentos à nossa volta. Quando éramos bons, o sol surgia por entre as nuvens. Quando estávamos aborrecidos, irados ou éramos indelicados e egoístas, as coisas só iam de mal a pior.

As bicicletas ou carros quebravam nas tardes de sexta-feira porque não tínhamos nos preparado adequadamente para o sábado. Amizades eram rompidas porque, de algum modo, tínhamos um pecado nunca confessado. No universo que conhecíamos, as boas coisas só aconteciam às pessoas que faziam escolhas corretas e sábias. As coisas ruins – terríveis, indescritíveis – esperavam por aqueles que viviam sem a lei. E porque, finalmente, aprendemos que “não existe um só justo, nem um sequer” – nem nós, nem eu –, questionávamos se o fogo que havia queimado o celeiro ou o acidente que quebrou um braço não seria um sinal enviado do Céu para nós, mostrando a perda de nossa inocência ou as nossas más escolhas.

Então somos afetados por acontecimentos tão cósmicos e amplamente escalonados que parece não haver nada em nós que possa provocá-los. Economias nacionais se endividam e as moedas são desvalorizadas. A corrupção domina onde a justiça deveria reinar e nossa bússola moral parece ficar invertida. Um terrorista ataca uma indústria petrolífera a milhares de quilômetros de onde moramos e, de repente, temos dificuldade para encher o tanque de combustível.

Os incêndios destroem matas e derretem os icebergs. Furacões e tufões rodopiam pelos vastos oceanos, visando, ao que parece, apenas aos lugares em que a miséria será ainda maior. Os corais morrem; espécies desaparecem; e as cidades costeiras veem suas torres cintilantes sucumbirem à elevação dos mares.

Uma grande pandemia varre o globo, levando com ela os corretos e os descuidados, os fiéis e os ateus. Nem a idade, nem a saúde, nem a raça, nem a riqueza nos protegem de um inimigo minúsculo que não podemos ver. E a cada morte pela Covid-19 de alguém que conhecemos, de quem amamos, levantamos nossos olhos chorosos para o céu e murmuramos em nossa dor: “Não Te importas que morramos?”

As catástrofes da vida cotidiana no século 21 são tão reais que chegamos à conclusão de que são causadas por forças maiores e mais escuras do que qualquer coisa que fizemos, ou escolhas que tenhamos feito. “Porque a nossa luta não é contra o sangue e a carne, mas contra os principados e as potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestiais” (Ef 6:12). Como os discípulos exaustos, agarrados a um barco que naufragava, esperamos impacientemente o resgate: “Até quando, Senhor, Te esquecerás de mim? Será para sempre? Até quando esconderás de mim Teu rosto” (Sl 13:1).

E ali, deitado no convés do nosso barco, está Aquele no qual fomos ensinados a confiar, dormindo o sono imperturbável da inocência e da fé.

É o suficiente para fazer homens e mulheres adultos rangerem os dentes, pois temos como regra o que chamamos de “fé”: a compreensão de que todos são necessários em uma crise. “Todas as mãos no convés” é o lema da marinha quando as calamidades requerem todos os recursos e todos os marinheiros possíveis. Murmuramos: Jesus poderia estar, no mínimo, nos ajudando a retirar a água do barco. Poderia estar manejando os remos, ou arrastando o mastro quebrado. Pelo fato de estarmos enfrentando uma emergência em nossa vida, concluímos que Ele também deve enfrentar na Dele.

Mas Ele ainda está dormindo – na verdade, está descansando – como que num vácuo, não do barco, mas nas mãos do Seu Pai. E enquanto Ele sonha com os milhares que alimentará, os corpos que irá curar e os olhos aos quais devolverá a visão, sentimos que nosso desespero e pânico se transformam em uma indignação cáustica. Então expressamos em alto e bom som o que antes só ousávamos pensar: “Não Te importas que morramos?”

“Jesus, é o meu emprego que estou perdendo... Como vou alimentar minha família?” “Foi o meu bairro que o tufão destruiu. Como vamos reconstruí-lo?” “É minha esposa, meu marido – que o Senhor me deu – que agora está no hospital e mal consegue respirar, nem consegue comunicar-se!”

Essas são questões nascidas do medo, mas parecem terrivelmente urgentes. Nesse momento, a fé parece semelhante a “Deus ajuda quem ajuda a si mesmo” (e outras ideias não bíblicas). Insistimos que as respostas às nossas crises dependem dos recursos que temos à mão – estabilizando um barco prestes a virar, em águas revoltas, mantendo os remos presos.

Não conseguimos imaginar Alguém que interrompe Seu descanso, levanta-Se em um barco que naufraga e ordena ao vento e às ondas que se aquietem. Não conseguimos enxergar que Aquele que dorme inocentemente tem em Suas mãos a vasta onipotência. Sua resposta está além da nossa náufraga imaginação, pois Ele controla inclusive as forças que consideramos as mais mortais. “As ondas e os ventos ainda reconhecem Sua voz que os governa mesmo Ele vivendo entre nós” (Katharina von Schlegel, “Be Still, My Soul” (Review and Herald, 1985, p. 461). Ele sabe que, terrível como possa ser, essa tempestade não é a maior que cairá sobre nossa jornada.

A calma criada por Ele e a suave ondulação das ondas sobre o barco subitamente estável são tão surpreendentes quanto a tempestade que veio dos desfiladeiros. A dor e a tensão dos músculos e mentes retesados diminuem gradualmente, na medida em que somos invadidos por um novo e justo medo – ou melhor, temor – que outro discípulo entorpecido uma vez confessou no fundo de outro barco: “Senhor, afaste-Se de mim, porque sou pecador” (Lc 5:8).

Sentimos, novamente, nossa impotência – não como a causa de tudo que aconteceu, nem daqueles cujo comportamento gerou a grande tempestade, mas do quanto a graça nos sustenta, mesmo nas emergências, especialmente nelas. Aquele que esteve no fundo encharcado de um barco com 12 homens desesperados e fragilizados agora divide o fundo do seu barco enquanto você olha por cima dos barris de pólvora para um mundo que ameaça com mais doenças e tempestades.

Ainda se perderão empregos e os animais de estimação irão desaparecer. A reconstrução de casas e comunidades será difícil e lenta, e os relacionamentos desfeitos só serão restaurados no compasso da humildade e do amor. Ainda vamos sofrer quando nossos queridos se forem, ou afundarem nos lugares em que o diálogo não consegue chegar. Mas tivemos a visão vital de um Senhor que nunca abandona um barco naufragando, nem vira Seu rosto quando enfrentamos as calamidades. Contra as ondas revoltas ou nuvens cinzentas vemos a silhueta Daquele que Se comprometeu a levar-nos até Seu porto eterno. Agora temos a certeza de que nada “poderá nos separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8:39) – nem as altas tempestades, nem os mares profundos, nem as crises de hoje, nem as que virão; nem vida encurtada, nem morte atrasada; nem qualquer outra coisa em toda a criação.

“Por isso não desanimamos. Pelo contrário, mesmo que o nosso exterior se desgaste, o nosso ser interior se renova dia a dia. Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós um eterno peso de glória, acima de toda comparação na medida em que não olhamos para as coisas que se veem, mas para as que não se veem. Porque as coisas que se veem são temporais, mas as que não se veem são eternas” (2Co 4:16-18).

 

*Bill Knott é editor-chefe da revista Adventist World

 FONTE: Revista Adventista, fevereiro 2021, p. 16-18.


quinta-feira, 24 de junho de 2021

VISÕES DE OUTRO MUNDO


 Rubem M. Scheffel*

O mundo do futuro será um ambiente perfeito para uma existência idealizada

Qualquer pessoa, religiosa ou não, pode perceber que este mundo está errado. Os deso­nestos prosperam enquanto os hones­tos são considerados tolos. Pessoas ino­centes morrem, vítimas de todo tipo de violência. Há seca em alguns lugares e enchentes em outros, sem falar nos fura­cões, terremotos, incêndios, acidentes e doenças incuráveis. Qualquer observador consciente concorda em que o mundo caminha para a sua autodestruição.

Em meio a todas essas calamidades, chega até nós a visão do profeta João, registrada no livro do Apocalipse (21:1): "Vi novo céu e nova Terra, pois o pri­meiro céu e a primeira Terra passaram, e o mar já não existe."

O apóstolo Pedro confirma a vi­são de João com palavras semelhantes: "Nós, porém, segundo a sua promessa, esperamos novos céus e nova Terra, nos quais habita justiça" (II Pedro 3:13).

Esta é a grande esperança do cristão: o estabelecimento do reino de Deus na Terra. Um reino de paz e felicidade perenes.

PLANETA RENOVADO

Como será a vida nessa nova Terra? A Palavra de Deus diz que "nem olhos vi­ram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para aqueles que O amam" (I Coríntios 2:9).

A linguagem humana não é adequada para descrever a recompensa dos justos. Nós podemos ter apenas uma pálida ideia das maravilhas que aguardam aqueles que amam a Deus. Mas de uma coisa podemos ter certeza: o Céu não será lugar de ociosidade.

A nova Terra é, antes de mais nada, este mundo, e não outro lugar. Ela será nova no sentido de que Deus removerá dela todo e qualquer vestígio do pe­cado. É, portanto, um lugar real, em que pessoas reais, com corpo e cérebro, vi­verão em felicidade completa e perene. O paraíso, portanto, será aqui.

A nova Terra tem uma capital, que é a Nova Jerusalém, "a cidade que tem fun­damentos, da qual Deus é o Arquiteto e Edificador", e pela qual Abraão esperava (Hebreus 11:10). É nessa cidade que Cristo está nos preparando moradas.

A água que abastece a cidade é puríssima. Vem do rio da água da vida, que flui do trono de Deus, localizado no centro da cidade. Um dos alimentos será o fruto da árvore da vida. Esse fruto contém os elementos vitais que impe­dem o envelhecimento, desgaste ou simples fadiga (Apocalipse 22:2).

Entretanto, os redimidos não ficarão presos dentro dos muros da Nova Jerusalém. Eles poderão deixar seus la­res na cidade e dirigir-se às suas "cháca­ras" ou sítios - um sonho que muitos têm para esta vida, mas nem todos con­seguem realizar.

Lá, os leões e outros animais carní­voros serão vegetarianos, pois o reinado das garras e dos dentes terá chegado ao fim, e não haverá mais morte.

No Éden, Deus concedeu a Adão e Eva um jardim para cultivar. Se na nova Terra haveremos de plantar vinhas, por que não jardins e campos de cereais?

Se os remidos tocarão harpas, como diz o Apocalipse, por que não flautas, violinos e outros instrumentos? Deus dotou o ser humano de capacidade criadora e está poderá ser desenvolvida de modo ilimitado na eternidade.

VIDA INTELECTUAL E SOCIAL

Na Terra renovada, poderemos desen­volver amizade com os santos de todas as épocas e aprender de sua experiência. Todos conservarão sua identidade, em­bora com nova aparência e novo vigor. Reconheceremos os amigos e familiares e manteremos relacionamento com aque­les que hoje conhecemos e amamos.

Além desses relacionamentos huma­nos, porém, será nosso privilégio man­ter contato com Deus, os anjos e os demais seres celestiais. Seremos uma fa­mília universal, unida e perfeita, e nossa felicidade será total.

E o casamento? Certa vez, os saduceus se aproximaram de Jesus e Lhe rela­taram o caso de uma mulher que havia se casado sete vezes. Então pergunta­ram qual deles seria seu marido na res­surreição. Imaginem a confusão que ha­veria se cada um dos maridos quisesse retomar o seu relacionamento com a ex-esposa, no Céu. Por isso, Jesus cor­rigiu essa ideia errônea ao responder: "Errais, não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus. Porque, na ressurreição, nem casam, nem se dão em casamento; são, porém, como os anjos no Céu" (Mateus 22:29 e 30).

Aqueles que são bem casados e feli­zes não precisam se angustiar com essa resposta de Cristo, pois a base do ca­samento, que é o amor, continuará no Céu, numa nova relação muito mais satisfatória e superior.

Todos amarão com intensidade su­prema e serão correspondidos. Por isso, é importante desenvolvermos aqui e agora o amor a Deus e ao próximo, já que esse princípio se constitui a essência do próprio Deus e o fundamento de Seu governo.

À medida que comermos da árvore da vida, nos libertaremos das limitações físicas e mentais que séculos de pecado nos ocasionaram. Teremos então uma capacidade mental poderosa, com um potencial ilimitado.

Neste mundo, um estudioso conse­gue, com muito esforço e dificuldade, se tornar especialista num único ramo do conhecimento. E quanto mais especiali­zado se torna, mais ele reconhece quão pouco sabe! Na eternidade, porém, poderemos nos tornar especializados em todos os ramos do conhecimento, pois teremos tempo, capacidade e condições para isso. Também nos dedicaremos a estudar pelos séculos infindos da eter­nidade o mistério da salvação.

A EXTINÇÃO DO MAL

O profeta João menciona algumas das consequências do pecado que não mais existirão no Céu: "A morte já não exis­tirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas passaram" (Apocalipse 21:4).

Lá não farão parte de nosso vocabu­lário palavras como doença, acidente, fome, medo, falência, terrorismo, incên­dio e terremoto, pois essas coisas já te­rão passado. Os assassinos e outras pes­soas maldosas serão deixados de fora desse reino, para que não coloquem em risco a felicidade dos remidos.

Assim, todo vestígio do mal desa­parecerá. Mas para sempre nos lem­braremos do preço de nossa redenção ao contemplarmos nas mãos e pés de nosso Salvador os cruéis resultados do pecado. Essa lembrança deixará os remi­dos vacinados contra qualquer tentação de repetir tal experiência.

 

*Rubem M. Scheffel é jornalista e mestre em Teologia

 

FONTE: Sinais dos Tempos, Edição Especial.

sexta-feira, 18 de junho de 2021

A GRANDE QUESTÃO DA VIDA: PARA ONDE NÓS IREMOS?


 Ricardo André

“Jesus perguntou aos Doze: "Vocês também não querem ir?" Simão Pedro lhe respondeu: "Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras de vida eterna” (João 6:67-68, NVI).

O contexto precedente desses versos revela que uma multidão acompanhava o Mestre, mas alguns dentre ela não o seguiam, não estavam dispostos a ouvi-Lo, pois o objetivo maior era apenas se beneficiar. Cristo ensinava a inabilidade do homem chegar a Deus pelas suas próprias forças. Por exemplo, em versículo 44, Cristo diz, “Ninguém pode vir a Mim, se o Pai que Me enviou o não trouxer...”. E é verdade nos dias de hoje: nós jamais alcançaremos o perdão e aceitação de Deus pelas nossas próprias forças. É Deus que precisa trazer-nos, ajudar-nos, levar-nos até Si mesmo.

A narrativa revela que a multidão ao redor de Cristo começa a murmurar. O versículo 60 afirma: “Muitos, pois, dos seus discípulos, ouvindo isto, disseram: Duro é este discurso; quem o pode ouvir?” Estes homens que diziam ser seguidores e discípulos de Cristo, estão ofendidos com a pregação de Cristo. Eles reclamam que as verdades que Cristo ensinava são duras, e difíceis de ouvir. Eles desejavam verdades mais suaves. Queriam que Cristo falasse sobre coisas mais confortáveis, mais bem aceitos entre os homens. Em seguida, muitos abandonam a Jesus Cristo, alegando os absurdos que estavam descobrindo na chamada vida cristã.

Ellen G. White, comentando esse momento de crise no ministério de Cristo, acrescentou: “Condoído, viu Jesus os que haviam sido Seus discípulos afastarem-se dEle, a vida e a Luz dos homens. A consciência de que Sua compaixão não era apreciada, nem Seu amor reconhecido, de que Sua misericórdia era desprezada e rejeitada Sua salvação, enchia-O de inexprimível dor. Foram acontecimentos como esses que O tornaram um Varão de dores, experimentado nos trabalhos” (O Desejado de Todas as Nações, p. 393).

Aqui temos a primeira lição que o texto bíblico nos ensina: As verdades do evangelho nunca foi popular ou bem aceito. Quando a Bíblia fala a respeito de benções, é fácil prestar atenção. Quando um pregador fala a respeito de promessas, e milagres, e curas, as pessoas mostram muito interesse e escutam. Porém, quando a Bíblia mostra qual é a condição natural do homem, as pessoas fazem como fizeram nos dias de Cristo: eles reclamam que o discurso é difícil de ouvir.

Ao ver Jesus que uma parte da multidão o deixara, imediatamente se volta para os discípulos e faz uma interessante pergunta: “quereis vós também retirar-vos?”. Os multidões estão indo embora, quereis vós também retirar-vos? E realmente, se nós estamos seguindo a Cristo somente para observar as suas promessas ou a suas benções, nós também, um dia ou outro, deixaremos de segui-lo. Se nós nos chamamos de “cristãos” simplesmente porque temos experimentado uma emoção forte ou frequentado uma igreja, não temos base para afirmar que é Cristo que nos guia. Certa vez, Cristo disse a um grupo de judeus, em João 8:31, “Jesus dizia, pois, aos judeus que criam nele: Se vós permanecerdes na minha palavra, verdadeiramente sereis meus discípulos”. Neste versículo, Cristo ensina que os verdadeiros seguidores são os seguidores obedientes a Sua palavra. Como já temos visto, apenas as palavras de Cristo são espírito e vida. Se usamos experiências ou emoções, para tentar ser aceito por Deus, as nossas tentativas são sem aproveito, pois a nossa carne para nada aproveita.

Naquele momento todos pararam, e em meio ao silêncio surge uma voz que interpela veementemente: era Pedro o mais corajoso do grupo. A resposta dramática dele foi: “Para onde nós iremos, se somente tu, tens a Palavra da Vida Eterna. E nós temos crido e conhecido que Tu és o Cristo, o Filho de Deus” Certamente Pedro ao proferir estas sábias palavras, sabia que não havia outro mestre em quem devia crer.

Isso implicava sua firme convicção de que Jesus era o Messias e que somente ele era capaz de salvá-los. É uma das nobres confissões de Pedro – os sussurros instintivos de um coração piedoso e de amor ardente. Não havia mais ninguém que pudesse ensiná-los. Os fariseus, os saduceus e os escribas eram corruptos e incapazes de guiá-los corretamente; e, embora as doutrinas de Jesus fossem misteriosas, elas eram as únicas doutrinas que poderiam instruí-las e salvá-las. Pedro sabia que o Caminho era, e é Cristo. “O próprio pensamento de perder esta âncora de sua alma, enchia-os de temor e pesar. Ser privado de um Salvador, era andar flutuando em negro e tormentoso mar” (Idem).

Para onde iremos?

A pergunta é relevante. Cedo ou tarde todas as pessoas se defrontarão com essa questão. Por isso se faz mister considerarmos essa pergunta. As Sagradas Escrituras afirmam claramente que somos pecadores e verdadeiramente destituídos da gloria de Deus (Rm 6:23). Logo, necessitamos do perdão divino. Como alcançamos esse perdão? Ou para quem iremos nós em busca de paz, felicidade e salvação?

Hoje em dia, o mundo oferece inúmeras respostas a esta pergunta. Algumas religiões orientais, a exemplo do Hinduismo, sugerem o caminho da prática da Yoga (forma de alcançar o equilíbrio entre o corpo e a mente, assim como de unir a alma individual, a alma universal (Brahma), a meditação (forma de elevação espiritual), a oração e o ascetismo (a libertação dos aspectos materiais do mundo), como meios para quebrar o ciclo de existências sucessivas (reencarnações), alcançando o nirvana, que é o estado de plenitude e de conhecimento de si mesmo e do universo. Enquanto não alcança o nirvana, ele se vê obrigado a retornar para uma nova existência, que pode ser na forma humana ou de animal.

Antigos gregos desenvolveram a filosofia denominada “hedonismo”, cuja principal ideia é que o prazer é o único caminho para a felicidade. Influenciados por essa filosofia milhões de pessoas no mundo buscam encontrar felicidade no prazer, nas orgias, bebidas, drogas, sexo livre, no consumismo, tornando-se escravos deles. Os hedonistas dizem: “Pare de se cobrar tanto: qual é o problema em ir a baladas, shows de rock, usar drogas e praticar o sexo livre? Deus ama a todas as pessoas de qualquer jeito. No fim das contas, Ele vai salvar todo mundo”, argumentando que todos os caminhos levam a Deus.

Para os niilistas, que não acreditam na existência de um Deus supremo absoluto, o sentido da vida está no “ser”, na capacidade humana e no potencial que o mundo material pode oferecer como antídoto de satisfação pessoal e finalidade da própria existência. A tese niilista traz consigo a “filosofia do martelo”, como dizia Nietzsche, isto é, a qual destrói ídolos, argumentando que as crenças religiosas são inúteis e que, portanto, a vida real não tem sentido algum, senão a busca idealizada pelo mundo material. Portanto, de acordo com a cosmovisão niilista, o real sentido de tudo é a satisfação pessoal aqui e agora.

Muitos procuram a salvação nas religiões, nas imagens, nas rezas, nas cantigas repetidas, nos mantras, nos sacrifícios e na peregrinação.

Notamos também uma outra sugestão que o mundo faz, ao tentar responder a pergunta, “Para quem iremos nós?”. O mundo sugere que possamos ser salvos através das obras, são os que dizem: "Fora da caridade não há salvação".  É ensinado que possamos alcançar a salvação se: praticamos boas obras, ou seguimos uma lista de regras, ou se fizermos boas obras na nossa cidade. Será que é através das nossas próprias mãos que alcançarmos o favor de Deus? Isaias 64 versículo 6 nos mostra que não. Isaias 64:6: “Mas, todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças como trapo da imundícia; e todos nós murchamos como a folha, e as nossas iniquidades como um vento nos arrebatam”. Perceba a maneira que a Bíblia refere às nossas obras de justiça como sendo trapos da imundícia aos olhos de Deus. Não será através destes “trapos” que chegaremos ao céu.

Nenhum desses atalhos atrativos e fáceis do mundo podem satisfazer os supremos anseios do nosso coração e conduzir-nos a vida eterna. Então, a pergunta continua: para quem iremos nós?

Nós também sabemos disto, mas quando observamos nossa realidade atual como cristãos ficamos verdadeiramente perplexos. Indiferença tem sido uma de nossas posturas nos dias atuais.

Nossas fraquezas e limites, nosso temor, nosso desejo de agradar a Deus profundamente parecem estar amortecidos, muitas vezes, tem pessoas que ficam sem direção que até chegam a duvidar e perguntam: Que caminho eu estou indo?

Porque eu estou passando por isso? E muitos se perdem no caminho, pois deixaram de olhar para Jesus, e começaram a seguir seus problemas, suas preocupações, tentando resolver da sua forma a qualquer custo, e isso até os tem levado a frustrações.

Não desviar jamais o nosso olhar Dele (Jesus) é fundamental para sabermos para onde ir. O homem pobre, perdido e pecador não tem outro lugar a não ser Jesus. Ele é o caminho, a verdade e a vida. Ele é a única porta e o único meio de salvação, somente Ele tem a Palavra para Vida Eterna, foi Ele mesmo que declarou em João 14:6: “Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por Mim” E se o pecador se comprometer com outra maneira, ele vagará e morrerá.

A resposta para onde iremos é: Estamos indo para Deus por meio de Jesus Cristo, não tem outra forma de ir, Jesus a única Porta “Eu sou a porta; se alguém entrar por Mim salvar-se-á” João 10:9.

Cristo é a resposta

É o próprio Jesus quem afirma em João 14:6 que ninguém vem ao Pai senão por Ele. Mas, mesmo Ele fazendo esta afirmação, muitos ainda procuram outros caminhos, outras formas.

Certa vez, Agostinho escreveu que cada um de nós tem dentro de si um espaço vazio deixado por Deus. Você pode tentar preencher esse vazio com qualquer coisa que existe no mundo, mas nunca vai conseguir, pois é imenso, infinito como Deus, e só Ele pode preencher. Ele afirmou: “Criaste-nos, Senhor, para Ti e nosso coração estará inquieto enquanto não descansar em Ti”.

Os seres humanos têm tentado de tudo, na ânsia de preencher esse vazio cavado por Deus. Diz C. S. Lewis: “O que Satanás pôs na cabeça de nossos primeiros pais foi a ideia de que eles poderiam ser como Deus, como se fossem independentes e tivessem vida em si próprios; que eles poderiam inventar algum tipo de felicidade sem Deus. E dessa tentativa infrutífera surgiu quase tudo na história humana – riqueza, pobreza, ambição, guerras, prostituição, classes, impérios, escravidão – a longa e terrível história do homem tentando achar outra coisa, menos Deus, para fazê-lo feliz. E por que isso nunca deu certo? É porque Deus nos criou, nos inventou, um como um fabricante inventa uma máquina. Se um veículo é fabricado para ser movido a óleo diesel, ele não vai funcionar direito com outro combustível. E Deus criou a máquina humana para se mover nEle. Ele é o combustível que nos faz agir, o alimento do qual precisamos para nos nutrir. Não há outro”. Portanto, a única solução é nEle viver, se mover e existir (At 17:28). Jesus é o tudo da existência. É o Salvador, mantenedor da vida, fonte de alegria e realização pessoal. Sem Ele, não podemos ter esperança de nada. Só Ele tem palavras de vida eterna

A Bíblia descreve em Provérbios 16:25 “Há um caminho que parece direito ao homem, mas o seu fim são os caminhos da morte”.

Na história da Igreja Adventista do Sétimo Dia encontramos registrados o nome de talentosos líderes que serviram a Jesus e a Sua igreja, alcançaram postos elevados na administração da igreja, obtendo influência e prestígio. Todavia, para a surpresa de muitos esses seguidores de Jesus resolveram palmilhar um caminho descendente, caindo nos abismos tenebrosos da apostasia. Abandonaram a Jesus. Entre eles encontra-se Alonzo T. Jones (1850-1923). Após ter participado de uma série de conferências adventistas, Jones aceitou a mensagem adventista e foi batizado em 8 de agosto de 1874, “enquanto servia como sargento do exército no Fort Walla Walla, no estado de Washington, logo começou a estabelecer igrejas no Noroeste” (Enciclopédia Ellen G. White, p. 469). Em 1878, foi ordenado ao ministério e se tornou um líder influente do adventismo. Com Ellet J. Waggoner, desempenhou um papel fundamental na pregação da justificação pela fé na assembleia da Associação Geral de 1888, em Mineápolis. Carismático, enérgico, dramático e com tendência aos extremos, Jones tornou-se uma figura de liderança e um dos mais brilhantes teólogos no meio adventista durante a década de 1890.

“Suas mensagens, embora repudiadas por um influente segmento da Igreja, foram recebidas com entusiasmo e fervor por outros que, em seus temas, discerniram o poder espiritual capaz de produzir um grande reavivamento e precipitar o derramamento da prometida chuva serôdia” (Enoch de Oliveira, A Mão de Deus ao Leme, p. 201). Com Ellet J. Waggoner, desempenhou um papel fundamental na pregação da justificação pela fé na assembleia da Associação Geral de 1888, em Mineápolis.

Contudo, depois de 1901, a amizade com o Dr. John H. Kellogg fortaleceu sua autossuficiência e o sentimento de amargura antiorganizacional. Jones acreditava que a igreja não deveria ser dirigida por um presidente, mas por uma comissão executiva. Tinha ojeriza a centralização da autoridade na figura de um presidente. Ele tentava incessantemente minar a liderança de Arthur G. Daniells como presidente da Associação Geral. Não obstante, tornou-se presidente de uma associação na Califórnia por dois mandatos, mas não obteve sucesso como administrador.

Em 19 de setembro de 1892, Ellen White afirmou: “É bem possível que os pastores Jones ou Waggoner sejam derrubados pelas tentações do inimigo. Mas se isso acontecer, não significa que não transmitiram uma mensagem de Deus nem que toda a obra realizada por eles foi um erro” (Carta 24, 1892). Infelizmente, faltou-lhes humildade e, como consequência, eles falharam em viver a mensagem que haviam pregado com tamanha eficácia para milhares de pessoas. Com o tempo, Kellogg, Waggoner e Jones acabaram saindo da igreja.

Por conta de suas críticas ácidas contra a Igreja e seus dirigentes, em 1907, Jones recebeu a orientação de entregar sua credencial ministerial e, no ano seguinte, foi removido do rol de membros da igreja. Mesmo assim, ele solicitou uma audiência na assembleia da Associação Geral de 1909, realizada em Washington, DC. Na ocasião, apresentou um longo discurso em tom acusatório e se reuniu por três vezes com os principais líderes da igreja. Na última, após um longo apelo por reconciliação, o presidente, Arthur G. Daniells, estendeu as mãos do outro lado da mesa e disse: “Venha, irmão Jones, venha.” Jones se levantou e, “aparentando vacilar, deteve-se em silêncio. Todos esperaram contemplar uma comovente cena de aproximação, reconciliação e perdão. Desafortunadamente, porém, decorridos alguns momentos, Jones abruptamente se assentou, repetindo em angústia: “Não! Nunca!” (Idem, p. 206), e se assentou, para nunca mais voltar à igreja.

Em 1923, faleceu repentinamente, vítima de um AVC fulminante. “Alonzo T. Jones desceu à sepultura guerreando contra o adventismo, contra Arthur G. Daniells e contra toda e qualquer forma de organização. Para ele, a essência da liberdade religiosa consistia em se manter livre de organização” (Enciclopédia Ellen G. White, p. 471).  Jones é um exemplo de alguém que seguiu a Jesus. Mas que em algum momento de sua caminhada com Ele defrontou-se com a grande questão: "Senhor, para quem iremos?” Diante das dificuldades, do orgulho e da tentação abandonou a Jesus.

Caro amigo leitor, se você quer saber para onde está indo, faça como Pedro: não procure fazer seu próprio caminho, não se afaste de Jesus, continue firme, ainda que sofra críticas, perseguição, piadinhas, ou descrédito, mas permaneça sempre firme, e tenha a certeza que Jesus é que tem a Palavra para vida Eterna. Não deixe sua fé esfriar! Decida ir com o seu Deus até o último dia da sua vida!

Decisões difíceis foram tomadas naquele dia, na Galiléia, decisões que afetariam as vidas e a eternidade de todos os envolvidos. Podemos aprender com as escolhas de cada um dos que lá estavam. Com Jesus, aprendemos a importância de manter em ordem as prioridades e vemos que a missão do evangelho vai muito além das preocupações físicas e sociais dos homens. Com Judas e com as multidões, podemos ver a loucura de tentar Jesus a se encaixar em nossas expectativas. Com a fé corajosa de Pedro, podemos tirar a força para seguir Jesus pelos motivos certos. Precisamos dizer ao Mestre, como o fez Pedro: "Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras da vida eterna" (João 6:68).

Para onde você se voltará? Para quem você irá? A decisão é sua! Seguir pelo caminho de Jesus é sempre a melhor opção.