Teologia

sexta-feira, 30 de julho de 2021

DA CRUZ AO TRONO


 Wilson Paroschi*

A ENTRONIZAÇÃO DE CRISTO OCORREU NO LUGAR MAIS SAGRADO DO UNIVERSO E DESENCADEOU UMA SÉRIE DE EVENTOS IMPORTANTES COMO PARTE DO PLANO DA REDENÇÃO

Em Sua mais longa e sublime oração registrada nos evangelhos, Jesus orou pedindo que o Pai Lhe restabelecesse a glória que tivera no Céu desde antes da formação do mundo (Jo 17:5). Na oração, feita na noite anterior à Sua morte, Jesus assumiu que Sua missão na Terra estava concluída (v. 4) e que o propósito pelo qual viera ao mundo já havia sido alcançado, embora a cruz ainda estivesse por vir. Mas o que exatamente significava reaver a glória que Ele tivera no passado e quais são as implicações disso?

O SIGNIFICADO DA CRUZ

Visto que “o salário do pecado é a morte” (Rm 6:23), a cruz foi necessária para que o ser humano pudesse ser salvo (Hb 9:22). Porém, a vinda de Jesus ao mundo teve um propósito maior, que foi a vindicação do caráter de Deus. É sobre isso que Jesus falou na oração de João 17 antes de pedir que o Pai O glorificasse: “Eu Te glorifiquei na Terra, realizando a obra que Me deste para fazer. E agora, ó Pai, glorifica-Me Contigo mesmo com a glória que Eu tive junto de Ti, antes que houvesse mundo” (Jo 17:4, 5).

A ideia de que, com Sua morte, Jesus estava glorificando o Pai deve ser vista no contexto do grande conflito entre o bem e o mal. O originador do mal levantou dúvidas sobre o caráter de Deus. Alguma coisa tinha dado errado com a criação do ser humano (Rm 3:9-12) e era natural que a responsabilidade recaísse sobre o Criador. O pecado, porém, foi um risco calculado antevisto por um Deus de amor ao dotar Suas criaturas do direito de escolha. Entretanto, o pecado nunca O intimidou. Deus nunca perdeu o controle das coisas e, desde o início, já havia estabelecido um plano para salvar a humanidade, caso esta usasse o livre-arbítrio para desobedecer-Lhe (Rm 16:25, 26; 2Tm 1:8-10; 1Pe 1:19, 20; Ap 13:8). E foi na cruz que o amor e o poder de Deus foram vindicados, ao mesmo tempo em que a natureza do mal foi plenamente revelada (Jo 12:31; 16:11; Cl 2:14, 15).

O custo de tudo isso foi enorme. A abnegação de Cristo ao deixar a glória do Céu, tornar-Se humano e morrer como se fosse um vil pecador (Fp 2:5-8; 2Co 5:21; Gl 3:13) jamais poderá ser totalmente compreendida por mentes finitas (Rm 11:33). E agora, uma vez concluída Sua missão, era hora de retornar para junto do Pai (Jo 16:5, 28) e reassumir Sua glória anterior. Mais que isso, a ascensão de Jesus desencadearia uma série de eventos importantes como parte do plano da redenção.

A ENTRONIZAÇÃO DE CRISTO

O retorno de Jesus para junto do Pai e Sua entronização no Céu foram preditos no Antigo Testamento (Sl 110:1, 2) e descritos em tons dramáticos no capítulo 5 de Apocalipse. O desespero de João (Ap 5:4) revela o temor de que o caráter de Deus tivesse sido para sempre comprometido pela história do pecado e Ele houvesse perdido as condições morais de governar. Mas alguém lhe disse: “Não chore! Eis que o Leão da tribo de Judá, a Raiz de Davi, venceu para quebrar os sete selos e abrir o livro” (v. 5). Quando João olhou, porém, o que ele viu não foi um Leão, e sim “um Cordeiro que parecia que tinha sido morto” (v. 6). E o que se segue é a cena, descrita em termos apoteóticos, da entronização de Cristo no Céu.

A tônica da narrativa é clara: “Digno é o Cordeiro que foi morto de receber o poder, a riqueza, a sabedoria, a força, a honra, a glória e o louvor” (v. 12), um reconhecimento que começa aparentemente com seres humanos redimidos (v. 8), passa para os milhões de anjos celestiais (v. 11) e termina com toda a criatura no vasto Universo de Deus (v. 13). Um momento de glória e louvor indescritíveis. Jesus venceu! Deus venceu! Seu caráter foi passado a limpo e Seu direito de reinar, bem como o de Cristo, plenamente vindicado, e por isso Jesus pôde dizer pouco antes de ascender ao Céu: “Toda a autoridade Me foi dada no Céu e na Terra” (Mt 28:18). Embora esse não tenha sido ainda o momento em que as forças do mal foram definitivamente aniquiladas, a destruição delas e o triunfo do plano divino já estavam assegurados (Sl 110:1; Ef 1:19-22; Fp 2:10, 11).

A entronização de Cristo à destra do Pai, mencionada inúmeras vezes pelos escritores do Novo Testamento (At 2:32-36; 5:31; 7:55, 56; Rm 8:34; Ef 1:20; Cl 3:1; Hb 1:3, 13; 8:1; 10:12;12:2; 1Pe 3:22; Ap 3:21) e antecipada pelo próprio Jesus diante do Sinédrio (Lc 22:69), ocorreu na sala do trono celestial, simbolizado pelo Santo dos Santos do santuário terrestre (Êx 25:17 22; Nm 7:89; 1Sm 4:4; 2Sm 6:2; 2Rs 19:15; 1Cr 13:6; Sl 99:1; Is 37:16) e o lugar mais sagrado do Universo. A sacralidade do local é determinada pela presença de Deus. Detalhe interessante é que no evangelho de João Jesus é explicitamente apresentado como o “Eu Sou” do Antigo Testamento (Jo 8:28, 58; 13:19), inclusive como Aquele que Isaías viu “assentado sobre um alto e sublime trono,” rodeado por serafins que clamavam uns para os outros: “Santo, santo, santo é o Senhor dos Exércitos” (Is 6:1, 3; cf. Jo 12:41). Ou seja, de acordo com João, o Ser divino, glorioso e majestoso que Isaías viu na sala do trono do santuário celestial era o próprio Jesus, o que ajuda a entender o que Jesus quis dizer quando Ele orou para reaver a mesma glória que Ele tivera desde a eternidade passada.

A VINDA DO ESPÍRITO

A ascensão e a entronização de Jesus inauguraram uma nova fase na história da redenção. Ao revelar o verdadeiro caráter de Deus e desmascarar Satanás, a cruz conferiu a Deus o direito definitivo de resgatar a humanidade de volta para Si (Rm 3:24-26; Hb 7:25; 9:12). Isso significa que, nos tempos do Antigo Testamento, as ações salvíficas de Deus ainda eram de certo modo limitadas e provisórias, porque dependiam da morte de Jesus na cruz (Hb 9:15, 22). Talvez isso explique por que o Espírito Santo não poderia vir em Sua plenitude senão após o sacrifício de Jesus ter sido confirmado no Céu e Ele ter ocupado novamente Seu lugar à destra do Pai (Jo 7:39). O Espírito Santo sempre estivera presente. Ele é mencionado quase 400 vezes no Antigo Testamento, mas ao mesmo tempo há ali várias profecias que se referem a Ele como o dom da era messiânica (Is 11:1, 2; 32:15; 44:3; Ez 11:19; 36:26, 27; 37:1-14; Jl 2:28, 29), indicando uma vinda futura muito mais abundante que até então.

Isso se cumpriu no Pentecostes (At 2:1-4), como Pedro deixou bem claro em seu sermão (v. 16-21, 32-36), o que resultou, já no primeiro momento, no batismo de quase 3 mil pessoas (v. 41; cf. 2:47; 4:4; 5:14). Após a cruz e o fim do reino teocrático de Israel (Jo 19:14, 15), não era mais Jerusalém que deveria atrair as nações (1Rs 8:41-43; Sl 22:27; 66:5; Is 2:2-4; 42:6, 7; 56:6-8; Mq 4:1-3; Sf 3:9, 10), mas o povo de Deus que, cheio do Espírito, deveria sair e testemunhar de Jesus a todas as nações, tribos, línguas e povos (Mt 24:14; 28:19, 20; Mc 13:10; Lc 24:47; At 1:8). O Espírito não só atuaria de forma ainda mais intensa para convencer “o mundo do pecado, da justiça e do juízo” (Jo 16:8) como também capacitaria os seguidores de Jesus para que alcançassem até os confins da Terra com a mensagem do evangelho.

Numa pequena parábola, Jesus declarou que, se alguém quiser entrar na casa de um homem forte para lhe roubar os bens, terá primeiro que neutralizar o homem forte. Então estará à vontade para lhe saquear a casa (Mt 12:29). Na cruz, o príncipe deste mundo foi para sempre neutralizado (Jo 12:31; 16:11). Sua derrota foi fragorosa (Ap 12:7-9). Havia chegado a hora de invadir seu reino e levar de volta para Deus as pessoas que ele mantinha sob seu domínio. O Espírito veio com essa finalidade.

A INAUGURAÇÃO DO SANTUÁRIO

Assim que o sacrifício de Jesus foi aceito pelo Pai, conferindo-Lhe o direito de salvar o pecador sem anular Sua justiça e santidade (Rm 3:24-26), e Jesus foi entronizado, o santuário celestial entrou em cena como a sede das ações salvíficas divinas. É ali, na parte mais interior do santuário, que está o trono de Deus.

O santuário celestial sempre existiu. Foi ele que Deus usou como modelo para que Moisés contruísse o tabernáculo no deserto (Êx 25:40; At 7:44; Hb 8:5; 9:23, 24), mas ele somente entrou oficialmente em operação no que diz respeito à salvação da humanidade quando Jesus ascendeu ao Céu, levando por assim dizer o próprio sangue para ministrar na presença de Deus. O livro de Hebreus é claro a esse respeito (Hb 9:11-14, 23-28), como também ao afirmar que o antigo tabernáculo era uma “figura e sombra das coisas celestiais” (8:5) ou “uma parábola para a época presente” (9:9). Assim como o antigo tabernáculo foi inaugurado ou consagrado por Moisés para que entrasse em operação (Êx 40:1-9; Lv 8:10-12; Nm 7:1; Hb 9:18), o mesmo aconteceu com o santuário celestial (Hb 6:19, 20; 10:19, 20).

A mesma ideia está presente na profecia de Daniel 9, uma das mais impressionantes profecias messiânicas do Antigo Testamento por antecipar não apenas a obra do Messias, mas também o tempo exato de Sua vinda (v. 24-27). Entre as coisas que aconteceriam ao final do período profético das 70 semanas, uma delas seria exatamente a unção ou consagração do Santo dos Santos do santuário celestial (v. 24). Desde os primórdios do adventismo a expressão “ungir o Santo dos Santos” nesse versículo tem sido interpretada como uma referência à inauguração do santuário celestial por Jesus em Sua ascensão.

O INÍCIO DA OBRA INTERCESSÓRIA

Os sacrifícios do Antigo Testamento eram simbólicos e, portanto, imperfeitos. Não consistiam numa solução real e definitiva para o problema do pecado (Hb 9:9; 10:1-4, 11). Eles apenas apontavam para o sacrifício de Jesus, “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo 1:29). Por ser perfeito e eficaz, o sacrifício de Jesus não precisa ser repetido (Hb 9:26, 28; 10:10, 12-14; 1Pe 1:19). Ele morreu uma vez para sempre, cumprindo assim a tipologia de todos os sacrifícios do passado. Em Sua asensão, Jesus Se tornou Sumo Sacerdote (Hb 6:20), passando a aplicar diante de Deus os benefícios de Seu sacrifício em favor do pecador arrependido (Hb 9:12-14, 23-28).

Assim como no santuário terrestre, o ministério de Cristo no santuário celestial se desenvolve em duas fases: no Lugar Santo e no Lugar Santíssimo. A primeira é de intercessão; a segunda, de julgamento. A profecia de Daniel 8:14 nos ajuda a entender a cronologia das duas fases. Dizer que, em Sua ascensão, Jesus foi ao Santo dos Santos (entronização e inauguração do santuário celestial) não anula Seu ministério em duas fases, as quais são tão essenciais à salvação como Sua morte na cruz.

Mesmo que a morte de Jesus tenha sido perfeita e tenha provido ampla e suficiente expiação pelos pecados (Rm 3:24, 25; Hb 2:17; 1Jo 2:2; 4:10), a justiça divina requer cuidado na aplicação do perdão. Embora Deus possa perdoar a todos indistintamente (1Tm 2:4, 6; 4:10; Tt 2:11; 1Jo 2:2), o perdão só é realmente outorgado àquele que responde com fé (Jo 3:16; At 10:43; 13:39; 16:31; Rm 1:16; 3:22, 25-28). Nem todos, portanto, serão salvos (Jo 3:16-19). É aqui que entra a intercessão de Cristo, ministrando diante de Deus em favor daqueles que se arrependem e creem (Rm 8:34; Hb 7:25; 1Tm 2:5; 1Jo 2:1, 2). No dia antitípico da expiação (ou seja, a segunda fase do ministério sumo-sacerdotal de Cristo), o próprio registro de pecado é removido, o santuário é purificado e o perdão ratificado para sempre.

NOVO E VIVO CAMINHO

O pecado nos baniu da presença de Deus (Gn 3:23, 24; Is 59:2). Como pecadores, não mais podíamos ter acesso direto a Ele. A mediação era feita pelos sacerdotes, que, sendo igualmente pecadores, precisavam primeiro fazer rigorosa expiação pelos próprios pecados para que pudessem interceder pelo povo (Hb 5:1-3). A presença de Deus entre o povo de Israel era real, mas velada e circunscrita ao Santo dos Santos do antigo tarbernáculo (Êx 40:34-38) e depois do templo (2Cr 7:1-3).

Quando Jesus morreu, provendo completa expiação pelo pecado, o véu interior do templo de Jerusalém se rasgou de alto a baixo (Mt 27:51), deixando a descoberto o Santo dos Santos. Era o fim da alienação. E, ao ascender ao Céu como um de nós (1Tm 2:5), Cristo, como nosso Precursor, entrou “no santuário que fica atrás do véu” (Hb 6:19), readmitindo-nos à presença de Deus. No Antigo Testamento, a expressão “atrás do véu” ou “dentro do véu” sempre se refere ao véu mais interior, que dava acesso ao Santo dos Santos (Êx 26:33; Lv 16:2, 12, 15). Paulo falou que, justificados pela fé, “temos paz com Deus” (Rm 5:1). Não somos mais inimigos, estranhos nem alienados. Fomos reconciliados com Ele (2Co 5:19, 20; Cl 1:20-22). Recuperamos a condição de filhos e podemos novamente chamá-Lo de “Pai” (Rm 8:15; 2Co 6:18; Gl 4:4-7; Ef 2:17, 18).

É por isso que somos instados a nos achegarmos ao “trono da graça com confiança, a fim de recebermos misericórdia e encontrarmos graça para ajuda em momento oportuno” (Hb 4:16). Pela fé, podemos hoje entrar à presença de Deus “pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que Ele nos abriu por meio do véu, isto é, pela Sua carne” (Hb 10:19, 20). Isso significa entrada irrestrita à sala do trono celestial, confiados na obra intercessória de Cristo (v. 21) e “em plena certeza de fé” (v. 22). Guardemos firmemente, portanto, “a confissão da esperança, sem vacilar, pois quem fez a promessa é fiel” (v. 23).

TRIUNFO COMPLETO

A glorificação de Jesus no Céu foi o reconhecimento de Seu triunfo na cruz, que vindicou o caráter e o governo moral de Deus no Universo e assegurou a Ele o direito de salvar o pecador. Após a glorificação, seguiu-se uma série de eventos destinados a tornar real a salvação do ser humano: o envio do Espírito Santo, que capacitaria a igreja para o cumprimento da missão; a inauguração do santuário celestial, onde seriam aplicados os benefícios do sangue expiatório de Cristo; a unção de Cristo como Sumo Sacerdote, habilitando-O a interceder por nós; o início de Sua obra intercessória em favor daqueles que se arrependessem e cressem; e nossa restauração à presença de Deus, de modo que novamente podemos nos dirigir a Ele como “Pai”.

Embora a obra de Cristo no santuário celestial ainda não esteja concluída, já temos a certeza de que “não existe nenhuma condenação para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8:1). “Se Deus é por nós,” pergunta Paulo, “quem será contra nós?” Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará? É Cristo Jesus quem morreu, ou melhor, quem ressuscitou, o qual está à direita de Deus e também intercede por nós. Quem nos separará do amor de Cristo?” (v. 31-35). Na sequência (v. 37-39), o apóstolo responde: Nada! Ninguém! Jamais!

 

*WILSON PAROSCHI, doutor em Teologia, é professor de Novo Testamento na Universidade Adventista do Sul, em Collegedale (EUA)

 

FONTE: Revista Adventista, Dezembro 2020, p. 48-51.

sexta-feira, 23 de julho de 2021

SALVAÇÃO PELA GRAÇA NO ANTIGO TESTAMENTO


 

É possível provar que, inclusive no Velho Testamento, as pessoas eram salvas pela graça e não pela lei?

Não é difícil entendermos este assunto. Através de alguns textos bíblicos – e também pela lógica bíblica, é possível comprovar este fato. Primeiramente, deve-se ressaltar que não existem dois planos de salvação e sim um. Isto já é prova suficiente para crermos que todas as pessoas – inclusive aquelas que viveram na época do Antigo Testamento – eram salvas única e exclusivamente pela graça de Deus. Mesmo que Jesus ainda não tivesse vindo morrer na cruz, a salvação deles foi garantida (uma espécie de ‘cheque pré-datado’), pois expressavam sua crença no Salvador que viria no futuro, através da imolação dos cordeiros; estes animais simbolizavam a Jesus, “o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (João 1:29).  Além do mais, o plano de salvação pela graça já existia desde o princípio, o que demonstra novamente que a graça sempre fez parte do plano de Deus para nos redimir do pecado e da morte:

… sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo, conhecido, com efeito, antes da fundação do mundo, porém manifestado no fim dos tempos, por amor de vós (1 Pedro 1:18-20).

… adorá-la-ão todos os que habitam sobre a terra, aqueles cujos nomes não foram escritos no Livro da Vida do Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo (Apocalipse 13:8).

A salvação pela graça, através do sacrifico de Jesus, nasceu no coração de Deus, antes de existir o mundo. Veja outro verso: “Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar” (Gênesis 3:15). Neste texto, Deus expôs a Adão, Eva e à serpente (Satanás) que o ser humano seria salvo pelo sacrifício de Jesus, gratuitamente. Deus disse que o “descendente da mulher” (igreja – 2 Coríntios 11:2), que é Jesus, feriria a cabeça (derrotou a Satanás na cruz e através de Sua ressurreição) da serpente e que este lhe “feriria o calcanhar” (na cruz, quando o diabo conseguiu com que matassem a Jesus), ou seja, Deus expôs o plano da salvação na época em que havia apenas Adão e Eva.

Se existissem dois planos de salvação (um pelas obras e outro pela graça), certamente haveria uma grande confusão no céu entre os justos. Alguns iriam reclamar a Deus de ter sido mais difícil para eles a salvação do que para outros. Já pensou, ao chegarmos ao Céu, vermos Abraão dizer: “Eu fui salvo pela lei…”; já o apóstolo Paulo: “eu fui salvo pela graça…”. Seria uma incoerência total. Portanto, assim como as pessoas no passado, apesar de serem salvas pela graça, tinham de obedecer, hoje ocorre o mesmo (o plano de Deus para o ser humano é um só). A obediência não salva, mas está ligada à nossa conversão: demonstra o tipo de fé que nós temos e nosso amor a Deus (João 14:15).

Outros textos que nos mostram que a salvação sempre foi pela graça, inclusive na época do Antigo Testamento:

“A tua salvação espero, ó SENHOR!” (Gênesis 49:18).

“No tocante a mim, confio na tua graça; regozije-se o meu coração na tua salvação” (Salmo 13:5).

Davi confiava na lei? Não, na graça; e mesmo confiando na graça de Deus, era obediente à lei (Salmo 40:8; cf. Salmo 119:152).

“O SENHOR é a minha rocha, a minha cidadela, o meu libertador; o meu Deus, o meu rochedo em que me refúgio; o meu escudo, a força da minha salvação, o meu baluarte” (Salmo 18:2).

“Vive o SENHOR, e bendita seja a minha rocha! Exaltado seja o Deus da minha salvação” (Salmo 18:46).

“E minha alma se regozijará no SENHOR e se deleitará na sua salvação” (Salmo 35:9).

“Vem do SENHOR a salvação dos justos; ele é a sua fortaleza no dia da tribulação” (Salmo 37:39).

O versículo diz que ‘vem do Senhor a salvação dos justos’. Prova inequívoca acerca da salvação pela graça no período do Antigo Testamento.

“Somente em Deus, ó minha alma, espera silenciosa; dele vem a minha salvação. Só ele é a minha rocha, e a minha salvação, e o meu alto refúgio; não serei muito abalado” (Salmo 62:1-2).

“De Deus dependem a minha salvação e a minha glória; estão em Deus a minha forte rocha e o meu refúgio” (Salmo 62:7).

Neste dois versos (Salmo 62:1-2 e 7), Davi fala que ‘Somente em Deus deveria esperar sua alma’, que “Só Ele era a sua Rocha e Salvação” e que “de Deus dependiam sua salvação e glória”.

“Vinde, cantemos ao SENHOR, com júbilo, celebremos o Rochedo da nossa salvação” (Salmo 95:1).

“Venham também sobre mim as tuas misericórdias, SENHOR, e a tua salvação, segundo a tua promessa” (Salmo 119:41).

“Eis que Deus é a minha salvação; confiarei e não temerei, porque o SENHOR Deus é a minha força e o meu cântico; ele se tornou a minha salvação” (Isaías 12:2).

“Mas, com a voz do agradecimento, eu te oferecerei sacrifício; o que votei pagarei. Ao SENHOR pertence a salvação!” (Jonas 2:9).

“O SENHOR é a minha luz e a minha salvação; de quem terei medo? O SENHOR é a fortaleza da minha vida; a quem temerei?” (Salmo 27:1).

Aqui é dito que “o Senhor é a salvação” e não: “a lei é a salvação”. Reafirmo dois fatos importantes:

– Que a salvação sempre foi pela graça;

– Apesar de muitos dos personagens do Antigo Testamento acreditarem que a salvação é pela graça (um dos exemplos é Davi), faziam questão de guardar a lei. Isto quer dizer que não há contradição entre a graça e a Lei de Deus.

Versos adicionais para estudo acerca da salvação pela graça no Antigo Testamento:

– Êxodo 15:2;                            – Isaías 52: 7 e 10;

– 1 Samuel 2:1;                          – Jeremias 3:23;

– 2 Samuel 22:3;                       – Miquéias 7:7;

– 2 Samuel 22:47;                     – Habacuque 3:18;

– 1 Cr ônicas16:23;                    – Malaquias 4:2.

– 1 Crônicas 13:35                     – Salmo 3:8;

– Salmo 9:14                               – Salmo 21:5;

– Salmo 27:9                               – Salmo 35:3;

– Salmo 38:22                             – Salmo 40:10;

– Salmo 40:16                             -Salmo 51:12;

– Salmo 67:2                               – Salmo 85:4;

– Salmo 89:26                            – Isaías 45:17;

Há salvação apenas em Jesus. Para usufruí-la, basta crer em Seu sacrifício realizado na cruz do calvário e aceitá-Lo como seu Salvador pessoal: “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (João 3:16). Por que não entregar seu coração a Ele hoje mesmo e convidá-lo para que seja o seu Deus e Redentor?

 

FONTE: Biblia.com.br

sexta-feira, 9 de julho de 2021

A LUTA CONTINUA


 Ellen G. White*

A integridade cristã deve ser buscada com irresistível energia, e mantida com resoluta definição de propósito.

O que foi causado pelo pecado

Necessitamos entender mais claramente o que está em jogo no grande conflito em que nos achamos empenhados. Precisamos compreender com mais plenitude o valor das verdades da Palavra de Deus, e o perigo de permitir que nosso espírito seja delas desviado pelo grande enganador.

O infinito valor do sacrifício requerido para nossa redenção revela que o pecado é um tremendo mal. Pelo pecado, perturba-se todo o organismo humano, a mente é pervertida, corrompida a imaginação. O pecado tem degradado as faculdades do ser humano. As tentações exteriores encontram eco no coração, e os pés se volvem imperceptivelmente para o mal.

Como foi completo o sacrifício feito em nosso favor, assim deve ser a nossa restauração do aviltamento do pecado. Nenhum ato de impiedade será desculpado pela lei de Deus; injustiça alguma lhe pode escapar à condenação. A ética do evangelho não reconhece nenhuma norma senão a perfeição do caráter divino. [...]

Perseverança

Não se podem endireitar os erros, nem operar reformas na conduta mediante alguns fracos e intermitentes esforços. A formação do caráter não é obra de um dia, nem de um ano, mas de uma existência. A luta pela conquista do eu, pela santidade e o Céu, é uma luta que se prolonga por toda a vida. Sem contínuo esforço e atividade constante, não pode haver progresso nem ganho da coroa da vitória.

A mais vigorosa prova da queda do homem de uma mais elevada condição é o quanto lhe custa retroceder. O caminho de volta só pode ser conquistado por meio de renhida luta, palmo a palmo, hora a hora. Num momento, por uma ação precipitada, impensada, podemos lançar-nos sob o poder do mal; requer, porém, mais que um momento o quebrar as cadeias e atingir a uma vida mais santa. Pode-se formar o desígnio, começar a obra; sua realização, porém, requererá fadiga, tempo, perseverança, paciência e sacrifício.

Não nos podemos permitir agir por impulso. Não podemos estar despercebidos nem por um momento. Assaltados por inúmeras tentações, devemos resistir firmes, ou seremos vencidos. Se chegássemos ao fim da vida com nossa obra por fazer, isso importaria em perda eterna.

A vida do apóstolo Paulo foi um constante conflito com o próprio eu. Ele disse: “Dia após dia, morro” (1 Coríntios 15:31). Sua vontade e seus desejos lutavam cada dia com o dever e a vontade de Deus. Em vez de seguir a inclinação, ele fazia a vontade de Deus, embora crucificando a própria natureza.

Ao fim de sua vida de conflito, olhando para trás, às lutas e triunfos da mesma, pôde dizer: “Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé. Já agora a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, reto Juiz, me dará naquele dia” (2 Timóteo 4:7, 8).

A vida cristã é uma batalha e uma marcha. Nessa guerra não há trégua; o esforço deve ser contínuo e perseverante. É assim fazendo que mantemos a vitória sobre as tentações de Satanás. A integridade cristã deve ser buscada com irresistível energia, e mantida com resoluta definição de propósito.

Ninguém será levado para o alto sem árduo e perseverante esforço. Todos têm de se empenhar nessa luta; nenhuma outra pessoa pode combater os nossos combates. [...]

A ciência a ser dominada

Há uma ciência do cristianismo a ser dominada – ciência tão mais profunda, vasta e alta que qualquer ciência humana, como os céus são mais elevados do que a Terra. A mente deve ser disciplinada, educada, exercitada; pois nos cumpre fazer serviço para Deus por maneiras que não se acham em harmonia com nossa inclinação inata. As tendências hereditárias e cultivadas para o mal devem ser vencidas. Muitas vezes, a educação e as práticas de toda uma existência devem ser rejeitadas para que a pessoa se possa tornar um aprendiz na escola de Cristo. Nosso coração deve ser educado em se firmar em Deus. Cumpre-nos formar hábitos de pensamento que nos habilitem a resistir à tentação. Devemos aprender a olhar para cima. Os princípios da Palavra de Deus – princípios tão elevados como o céu e que abrangem a eternidade – cumpre-nos compreendê-los em sua relação para com a nossa vida diária. Cada ato, cada palavra, cada pensamento deve estar de acordo com esses princípios. Tudo deve ser posto em harmonia com Cristo, e a Ele sujeito.

As preciosas graças do Espírito Santo não se desenvolvem num momento. Ânimo, fortaleza, mansidão, fé e inabalável confiança no poder de Deus para salvar são adquiridos mediante a experiência de anos. Por uma vida de santo esforço e firme apego ao direito, devem os filhos de Deus selar seu destino.

Não há tempo a perder

Não temos tempo a perder. Não sabemos quão rapidamente nosso tempo de graça pode se encerrar. Quando muito, não teremos senão o curto intervalo de uma existência aqui, e não sabemos quão breve a seta da morte pode nos ferir o coração. Não sabemos quão pronto seremos chamados a abandonar o mundo e todos os seus interesses. Estende-se diante de nós a eternidade. A cortina está a ponto de se erguer. Uns poucos anos apenas, e para todos os que ora são contados entre os vivos, sairá o decreto: “Quem é injusto faça injustiça ainda; [...] e quem é justo faça justiça ainda; e quem é santo seja santificado ainda” (Apocalipse 22:11).

Estamos nós preparados? Conhecemos a Deus, o Governador do Céu, o Legislador, e a Jesus Cristo a quem Ele enviou ao mundo como Seu representante? Quando a obra de nossa vida terminar, estaremos aptos a dizer, como Cristo, nosso exemplo: “Eu Te glorifiquei na Terra, consumando a obra que Me confiaste para fazer; manifestei o Teu nome”? (João 17:4, 6).

Os anjos de Deus nos estão procurando atrair de nós mesmos e das coisas terrenas. Não os façamos trabalhar em vão.

As mentes que têm liberado as rédeas do pensamento precisam mudar. “Cingindo o vosso entendimento, sede sóbrios e esperai inteiramente na graça que vos está sendo trazida na revelação de Jesus Cristo. Como filhos da obediência, não vos amoldeis às paixões que tínheis anteriormente na vossa ignorância; pelo contrário, segundo é santo Aquele que vos chamou, tornai-vos santos também vós mesmos em todo o vosso procedimento, porque escrito está: “Sede santos, porque Eu sou santo” (1 Pedro 1:13-16).

Os pensamentos devem se concentrar em Deus. Devemos exercer diligente esforço para vencer as más tendências do coração natural. Nossos esforços, nossa abnegação e perseverança devem ser proporcionais ao infinito valor do objetivo que perseguimos. Unicamente vencendo como Cristo venceu, havemos de alcançar a coroa da vida.

Constante dependência

O maior perigo do ser humano está em enganar a si mesmo, em condescender com a presunção, separando-se assim de Deus, a fonte de sua força. A menos que sejam corrigidas pelo Santo Espírito de Deus, nossas tendências naturais encerram em si mesmas os germes da morte. A menos que nos ponhamos em uma ligação vital com Deus, não podemos resistir aos profanos efeitos da satisfação própria, do amor a nós mesmos e da tentação para pecar.

Para que possamos receber auxílio de Cristo, devemos compreender nossa necessidade. Temos que conhecer-nos verdadeiramente. Unicamente ao que se reconhece pecador, pode Cristo salvar. Só quando vemos nosso inteiro desamparo e renunciamos a toda confiança própria, lançaremos mão do poder divino.

Não é apenas no início da vida cristã que se deve fazer essa renúncia. A cada passo de avanço em direção ao Céu, ela deve ser renovada. Todas as nossas boas obras são dependentes de um poder fora de nós; deve haver portanto um constante anelo do coração para Deus, uma contínua e fervorosa confissão de pecado e humilhação perante Ele. Cercam-nos perigos; e só estamos a salvo quando sentimos nossa fraqueza, e nos apegamos com a segurança da fé ao nosso poderoso Libertador.

Verdade ou trivialidade

Devemos desviar-nos de mil assuntos que nos convidam a atenção. Há assuntos que nos consomem tempo e suscitam indagações, mas acabam em nada. Os mais elevados interesses exigem a acurada atenção e a energia que são tantas vezes dispensadas a coisas relativamente insignificantes.

O aceitar teorias novas não traz em si nova vida. Mesmo o relacionar-se com fatos e teorias importantes é de pouco valor a não ser que sejam postos em uso prático. Precisamos sentir nossa responsabilidade de proporcionar alimento que nutra e incentive a vida espiritual. [...]

A questão que devemos estudar é: “Qual é a verdade – a verdade que deve ser acariciada, amada, honrada e obedecida?” Os adeptos da ciência têm ficado derrotados e abatidos quanto a seus esforços para encontrar a Deus. O que eles devem inquirir nestes dias é: “Qual é a verdade que nos habilitará a obter a salvação?”

Como responderemos?

“Que pensais vós de Cristo?” – eis a questão fundamental. Temos recebido a Cristo como um Salvador pessoal? A todos quantos O recebem, Ele dá poder de se tornarem filhos de Deus.

Cristo revelou Deus a Seus discípulos de modo que lhes operou no coração uma obra especial, tal qual Ele deseja realizar em nosso coração. Muitos há que, detendo-se demasiadamente na teoria, têm perdido de vista o poder vivo do exemplo do Salvador. Deixaram de vê-Lo como o humilde e abnegado obreiro. O que eles necessitam é contemplar a Jesus. Necessitamos diariamente uma nova revelação de Sua presença. Cumpre-nos seguir-Lhe mais de perto o exemplo de renúncia e sacrifício.

Carecemos da experiência possuída por Paulo ao escrever: “Estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou e Se entregou a Si mesmo por mim” (Gálatas 2:20).

O conhecimento de Deus e de Jesus Cristo expresso no caráter é uma exaltação superior a tudo mais que se estime na Terra e no Céu. É a suprema educação. É a chave que abre as portas da cidade celestial. Deus designa que todos quantos se revestem de Cristo possuam esse conhecimento (CBV, p. 451-457).

*Ellen G. White (1827-1915) é considerada a autora norte-americana mais amplamente traduzida. Suas obras foram publicadas em aproximadamente 150 línguas. Guiada pelo Espírito Santo, ela exaltou a Jesus e apontou para as Escrituras como a base de sua fé.

 

FONTE:

Ellen G. White. A luta continua. In: Reavivamento verdadeiro: a maior necessidade da igreja. Trad. Márcio Dias Guarda. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2011. p.51-54.

 

sexta-feira, 2 de julho de 2021

A LEI DOMINICAL NA PROFECIA


 Instituto de Pesquisa Bíblica adventista responde perguntas sobre a “marca da besta” e os eventos finais

A atual pandemia parece ter despertado a atenção de muitas pessoas para as profecias bíblicas. Algumas têm manifestado um interesse sincero em conhecer mais a respeito dos sinais que precederão a segunda vinda de Cristo. Ao mesmo tempo, percebe-se que outras têm feito releituras da escatologia bíblica a partir de perspectivas que tendem a suprimir/relativizar os elementos preditivos das profecias e a condicioná-las historicamente.

No contexto adventista, por exemplo, alguns têm enxergado a promulgação de um futuro “decreto dominical” em âmbito global como uma possibilidade remota ou algo impossível de acontecer. Assim, a tradicional interpretação adventista da imposição da observância do domingo não se encaixa nessa visão.

Foi para esclarecer essa e outras questões relacionadas ao cenário profético apresentado na Bíblia e nos escritos de Ellen White que o Instituto de Pesquisa Bíblica (BRI, na sigla em inglês), órgão ligado à sede mundial da denominação, preparou o documento intitulado “Answers to Questions on the Mark of the Beast and End Time Events”, publicado em 25 de junho. A seguir, disponibilizamos uma versão traduzida para o português.     

RESPOSTAS A PERGUNTAS SOBRE A MARCA DA BESTA E OS EVENTOS FINAIS

Têm chegado perguntas ao Instituto de Pesquisa Bíblica acerca da posição da Igreja Adventista do Sétimo Dia quanto à relação entre a marca da besta e a guarda do domingo, bem como a respeito da condicionalidade da profecia e dos escritos de Ellen G. White sobre o tempo do fim. As seguintes perguntas resumem as principais preocupações que foram trazidas à nossa atenção e respondidas aqui de maneira resumida.

1. Visto que nem o sábado nem o domingo são especificamente mencionados no livro do Apocalipse, como pode a marca da besta envolver um dia de adoração ou uma lei exigindo a guarda do domingo?

A marca da besta é mencionada sete vezes no Apocalipse (13:16, 17; 14:9, 11; 16:2; 19:20; 20:4). Quatro dessas menções aparecem no centro do livro (Ap 12-14), que é introduzida por uma visão da arca da aliança contendo os Dez Mandamentos (Ap 11:19). O povo remanescente de Deus é identificado como os que “guardam os mandamentos de Deus e têm o testemunho de Jesus” (Ap 12:17). Imediatamente depois isso, João descreve duas bestas que perseguem a igreja de Deus: (1) uma que “emerge do mar” (Ap 13:1) e (2) outra que “emerge da terra” (Ap 13:11). A primeira besta ordena uma falsa adoração e sua atividade de perseguição se assemelha à do “chifre pequeno” de Daniel 7, que cuidaria “em mudar os tempos e a lei” (v. 25) e perseguiria o povo de Deus por 1.260 dias/anos (Ap 13:4, 8).

A conexão com a profecia de Daniel mostra que a falsa adoração envolve uma tentativa de mudar os “tempos” de Deus e Sua lei dos Dez Mandamentos. O único mandamento dos dez que lida com tempo é o quarto — o mandamento para santificar o sábado do sétimo dia. Historicamente, a tentativa de mudar o dia de adoração foi perpetrada pela igreja romana, que reverencia o domingo como dia de descanso, em vez do sábado, o dia de descanso bíblico.

O fato de a segunda besta em Apocalipse 13, representando o protestantismo apostatado, exercer a mesma autoridade da primeira besta (Ap 13:12) e cooperar com ela para impor a falsa adoração mostra que o domingo será uma marca distintiva importante dos que adoram a besta e sua imagem, em contraste com o povo remanescente de Deus que guarda “os mandamentos de Deus e a fé de Jesus” (Ap 14:12). Sua obediência inclui a santificação do sétimo dia porque eles dão ouvidos ao chamado para “adorar aquele que fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas” (Ap 14:7; ver Êx 20:11). Eles recebem o selo de Deus (Ap 7:4; 14:1), enquanto os que rejeitam esse chamado e reverenciam o domingo, a marca da autoridade da besta, são descritos como parte de Babilônia e recebem a marca da besta (Ap 14:8-11). A prova final, portanto, tem a ver com a verdadeira ou a falsa adoração embasada na obediência à lei de Deus, o que inclui o sábado e o dia de adoração inventado pelo homem, o domingo.

2. Qual é o número da besta e como isso se relaciona à marca da besta?

Na Bíblia, o número da besta é mencionado em Apocalipse 13:17, 18: “Para que ninguém possa comprar nem vender, senão aquele que tem a marca, o nome da besta ou o número do seu nome. Aqui está a sabedoria. Aquele que tem entendimento calcule o número da besta, pois é número de homem [anthropou = de um ser humano]: Ora, esse número é seiscentos e sessenta e seis”.

A Igreja Adventista do Sétimo Dia não tem uma posição oficial sobre essa questão, mas há dois pontos de vista principais em nosso meio acerca do número da besta (666), em Apocalipse 13:17, 18. Alguns o interpretam como uma referência crítica ao título papal Vicarius Filii Dei, embora não nos seja dito que “666” seja o somatório do valor numérico das letras em tal designação.

Outros veem o “6” triplo como indicativo de uma trindade satânica. Eles ressaltam que a expressão “é número de homem” (Ap 13:18) pode ser traduzida como “é número da humanidade”, ou seja, de seres humanos separados de Deus. Esse número (seis usado três vezes) simbolizaria, portanto, uma rebelião intensa e independência total de Deus. No entanto, o texto grego é literalmente 600 + 60 + 6, e não três 6 ou um 6 triplo. Ao reconhecer isso, muitos adventistas do sétimo dia continuam a associar o número da besta com o título papal Vicarius Filii Dei, tendo pesquisas recentes proporcionado boas evidências históricas para vincular o “666” com esse título. Seja como for, há muitas evidências do texto e da história para identificar a primeira besta de Apocalipse 13 com o papado, independentemente de como o “666” seja compreendido.

3. Na Bíblia, há profecias condicionais e incondicionais. Como os escritos de Ellen G. White poderiam ser compreendidos à luz desse fato? A interpretação pode ser condicional se a profecia apocalíptica é incondicional?

As profecias clássicas do Antigo Testamento se concentram primariamente no próprio tempo e contexto histórico do profeta, embora também possam incluir uma perspectiva cósmica, mais ampla, que atinge até o “dia do Senhor” no tempo do fim (ver, por exemplo, Is 2:12; 13:9; Jo 2:21). As profecias clássicas dadas no contexto da aliança de Deus com Israel continham elementos condicionais, cujo cumprimento dependia da resposta de Israel (ver Dt 28). Semelhantemente aos profetas canônicos, os testemunhos de Ellen G. White acerca de pessoas e instituições podem ter apenas uma aplicação local, condicional, visto que seu cumprimento geralmente dependia da resposta ou decisão dos envolvidos. No entanto, como nas Escrituras, os princípios subjacentes são de aplicação contínua.

Por outro lado, as descrições feitas por Ellen White sobre o tempo do fim devem ser compreendidas no contexto escatológico da profecia apocalíptica bíblica, bem como em visões que ela mesma recebeu de Deus. Essas mensagens proféticas interpretam a profecia apocalíptica, que é, por sua própria natureza, incondicional e se concentra na resolução do grande conflito. Considerando que as mensagens proféticas de Ellen G. White refletem o contexto do tempo do fim, e não o contexto local da época em que foram escritas, elas devem ser compreendidas como profecias incondicionais, ou seja, como as profecias apocalípticas de Daniel e Apocalipse que dão sustentação ao seu panorama profético.

4. Os pontos de vista de Ellen G. White sobre o papado e o protestantismo, em conexão com a marca da besta, mudaram com o passar dos anos?

Não há mudança real nos pontos de vista de Ellen G. White sobre o papado e o protestantismo, nem a respeito da imposição da marca da besta. A fim de compreender suas últimas declarações, é útil considerar seus primeiros escritos sobre o tema. A primeira declaração de Ellen G. White a respeito do catolicismo e do protestantismo como poderes perseguidores data de 1850 e se baseia em Apocalipse 13 e 17, capítulos nos quais o papado é descrito como “a mãe das meretrizes” e os protestantes, como “suas filhas”, assim como “a besta de dois chifres”.

Várias fases da perseguição são descritas: (1) o “dia” do papado refere-se aos 1.260 anos de supremacia papal e perseguição ao povo de Deus; (2) os protestantes, em harmonia com o que diz a segunda mensagem angélica (Ap 14:8), também começariam a persegui-los. O fato de Ellen G. White não considerar encerrada a obra de perseguição do papado está claro nos parágrafos subsequentes, que indicam fases adicionais de perseguição; (3) igrejas protestantes, juntamente com a Igreja Católica, viriam contra os que “guardam o sábado e desconsideram o domingo”; e (4) a Igreja Católica emprestaria sua influência aos protestantes nos Estados Unidos para destruir o povo de Deus (Ellen G. White, Ms 15, 1850, parágrafos 5-7). Assim, de acordo com Ellen White, católicos e protestantes farão uma aliança durante um período considerável de tempo para perseguir o povo de Deus.

A próxima declaração importante, publicada em 1884, discorre sobre essa fala inicial de 1850 e mostra que a mensagem do segundo anjo sobre a queda de Babilônia se refere especificamente ao protestantismo apóstata: “A palavra de Deus ensina que essas cenas [de perseguição durante o período de supremacia papal] devem se repetir à medida que católicos e protestantes se unirem para a exaltação do domingo” (Ellen G. White, The Spirit of Prophecy, v. 4, p. 233, 396).

Em suma, a posição de Ellen G. White sobre o papado e a promoção da santidade do domingo permanece consistente. Declarações posteriores, incluindo as que foram publicadas nas diversas edições de O Grande Conflito, são um aprimoramento de sua declaração inicial, não uma mudança de posicionamento. Por exemplo, em 1900, ela escreveu: “Quando vier a prova, será mostrado claramente o que é a marca da besta. Ela é a observância do domingo” (Ellen G. White, Eventos Finais, p. 224).

5. Os adventistas do Sétimo Dia continuam sustentando o cenário do tempo do fim encontrado nos escritos de Ellen G. White?

Em harmonia com a referência ao testemunho de Jesus em operação no final da história mundial (Ap 12:17), os adventistas reconhecem Ellen G. White como mensageira do Senhor e continuam sustentando que seus escritos foram dados à igreja remanescente como um guia inspirado para estes últimos dias, sendo especialmente úteis na compreensão das profecias da Bíblia acerca dos eventos finais. Conforme demonstram as respostas a essas perguntas, cremos que suas interpretações proféticas são sólidas e permanecem relevantes e instrutivas para a igreja.

6. A interpretação adventista de Apocalipse 13 é anticatólica?

Ellen G. White reconhece que os filhos de Deus estão presentes em todas as denominações, incluindo a Igreja Católica Romana. Ela declara: “Não devemos criar desnecessariamente um preconceito em seu espírito [isto é, na mente dos católicos] com o fazer-lhes um ataque. […] Pelo que Deus me tem mostrado, grande número será salvo dentre os católicos” (Manuscrito 14, 1887, parágrafo 4). Em outra de suas obras, a pioneira acrescenta: “Entre eles [os católicos] existem muitos que são cristãos conscienciosos, que vivem segundo a luz que lhes é proporcionada, e Deus atuará em seu favor” (Testemunhos Para a Igreja, v. 9, p. 243). Essas declarações deixam claro que Ellen G. White não era, de forma alguma, anticatólica. Dito isso, vale salientar que ela permanecia alinhada com a Reforma. A pioneira via o sistema doutrinário católico, incluindo a missa e os outros sacramentos, como inconsistentes com a fé em Cristo e com o princípio da Sola Scriptura. Além disso, ela entendia que a estrutura de autoridade da Igreja Católica Romana está em oposição direta à Bíblia e sua autoridade. Sua compreensão de Apocalipse 13 é consistente com a teologia adventista e com a interpretação historicista de outras profecias apocalípticas em Daniel e Apocalipse.

7. Alguns têm conjecturado que a Bíblia e Ellen G. White não proporcionam sustentação à compreensão de que a adoração no sábado versus domingo será uma questão importante no tempo do fim. Há evidências recentes que sustentem a interpretação tradicional adventista?

Em primeiro lugar, devemos ser muito cuidadosos ao lidar com profecias bíblicas não cumpridas e resistir à tentação de interpretar as Escrituras pelas lentes das últimas manchetes dos jornais. Devemos seguir princípios sólidos de interpretação bíblica e dar a devida atenção ao texto bíblico (ver Frank M. Hasel, ed., Biblical Hermeneutics: An Adventist Approach [Silver Spring, MD: Biblical Research Institute e Review and Herald Academic, 2020]). A ideia de que declarações de Ellen G. White sobre a Igreja Católica Romana não refletem a realidade pós-Concílio Vaticano II, que foram condicionadas pelas circunstâncias de seu tempo e não se aplicam à nossa situação presente demanda uma análise mais detalhada.

Embora o Concílio Vaticano II tenha levado a uma maior abertura por parte da Igreja Romana para com outros grupos religiosos, não houve mudança doutrinária substancial, inclusive acerca de sua posição sobre o domingo como dia de adoração. De fato, a interpretação adventista das profecias de Daniel e Apocalipse e as declarações de Ellen G. White a esse respeito parecem cada vez mais plausíveis. Por exemplo, na seção 67 de sua Carta ApostólicaDies Domini, o papa João Paulo II declarou que “é natural que os cristãos se esforcem para que, também nas circunstâncias específicas do nosso tempo, a legislação civil tenha em conta o seu dever de santificar o domingo” e enfatizou que eles “têm a obrigação de consciência de organizar o descanso dominical de forma que lhes seja possível participar na Eucaristia, abstendo-se dos trabalhos e negócios incompatíveis com a santificação do dia do Senhor”.

Mais recentemente, o papa Francisco fez o seguinte apelo em sua Encíclica Laudato Si (seção 13): “O urgente desafio de proteger a nossa casa comum inclui a preocupação de unir toda a família humana na busca de um desenvolvimento sustentável e integral, pois sabemos que as coisas podem mudar”. Esse desenvolvimento, de acordo com o papa Francisco, inclui a restauração da vida espiritual, tendo em seu cerne a Eucaristia e o domingo como dia universal para o descanso, bem como para experimentar essa restauração.

A importância da adoração no domingo e a obrigação de participar da missa aos domingos também são enfatizadas no catecismo católico mais recente: “Todo cristão deve evitar impor a outrem, sem necessidade, o que possa impedi-lo de guardar o Dia do Senhor. […] Não obstante as pressões de ordem econômica, os poderes públicos se preocuparão em assegurar aos cidadãos um tempo destinado ao repouso e ao culto divino. Os patrões têm obrigação análoga para com os seus empregados” (Catechism of the Catholic Church, 1994, seção 2187; ver também as seções 2176, 2177, 2182 e 2184; disponível em português aqui).

O papel unificador do domingo também é reconhecido por líderes ortodoxos. Numa edição de 2015 da Sunday Magazine, o teólogo e líder ortodoxo Demetrios Tonias considerou o “domingo como marca da unidade cristã”. Portanto, não é surpresa que alguns políticos impulsionem essas ideias e até mesmo preconizem uma frequência obrigatória na igreja aos domingos e leis dominicais mais estritas, não apenas dos Estados Unidos. A forte Aliança Europeia pelo Domingo (European Sunday Alliance) está exigindo leis dominicais mais rígidas nos países da União Europeia. Embora esses desdobramentos sejam sinais dos tempos e mereçam nossa devida atenção, podem não ser o cumprimento final do cenário do tempo do fim que é apresentado nas Escrituras e nos escritos de Ellen White. Contudo, certamente proporcionam uma estrutura na qual essas coisas podem plausivelmente ocorrer em um período de tempo relativamente curto.

Conclusão

Como adventistas do sétimo dia, nossa missão é pregar o evangelho eterno ao mundo, que está centrado no sacrifício de uma vez por todas de Cristo na cruz, o dom gratuito de Sua justiça e Seu ministério de intercessão e juízo no santuário celestial. Nossa tarefa especial no tempo do fim se concentra na proclamação das três mensagens angélicas, a fim de preparar um povo para Seu breve retorno. Nossa compreensão profética dos eventos finais é essencial a essas mensagens.

Embora não devamos nos envolver em especulações que nos distraiam dessa missão, os eventos finais realmente tendem a confirmar nossa compreensão. Estamos convencidos de que as mensagens proféticas de Deus, conforme reveladas na Bíblia e nos escritos de Ellen G. White, são corretas e proporcionam um cenário cada vez mais plausível à medida que nos aproximamos dos eventos finais que foram divinamente revelados, mesmo se não pudermos determinar precisamente quão breve esses eventos se darão.

Nosso foco deve permanecer na missão da igreja, fortalecendo a família, envolvendo-nos em evangelismo e refletindo Jesus em nossa vida. À medida que as condições do mundo avançam e continuamos a estudar as profecias da Bíblia em busca de orientação, especialmente os livros de Daniel e Apocalipse, nossa compreensão dos eventos finais se tornará mais clara. Os escritos de Ellen G. White também são um recurso importante que lançam luz sobre essas profecias.

 

INSTITUTO DE PESQUISA BÍBLICA, órgão vinculado à sede mundial da Igreja Adventista, nos Estados Unidos (com tradução de Hander Heim)

FONTE: Site Revista Adventista