Teologia

sábado, 25 de fevereiro de 2023

MEU MUNDO DESABOU


 Ricardo André

Você já viveu uma decepção ou frustração em sua vida? Creio que sim! Quem nunca sofreu uma decepção ou frustração na vida, que atire a primeira pedra! Esta é uma experiência assaz comum da existência humana, a qual causa muito sofrimento. Raramente encontramos pessoas que não tenham passado por esses momentos dolorosos. Até porque a vida nem sempre toma o curso que queremos. E muitas vezes nos sentimos frustrados com o resultado das situações. Esse sentimento vem à tona quando, por exemplo, não passamos no ENEM ou num concurso, quando o casamento está aparentemente condenado ao colapso, quando ocorre o término de uma relação amorosa, quando ocorre um fracasso profissional e financeiro, quando se é acometido por uma doença debilitante, quando não se alcança um objetivo, enfim.

Sempre existe um “dia da decepção ou da frustração” para cada um. Enquanto vivermos neste mundo de dor e tristeza, mais cedo ou mais tarde haverá um momento em que, literalmente, você não saberá o que fazer nem aonde ir.

Em maio de 2022, sofri minha maior frustração. Passei minha adolescência sonhando conquistar “algo”, e consegui, pela graça de Deus, realizar esse sonho na minha fase adulta. A conquista trouxe-me uma alegria e felicidade indescritível durante mais de uma década. De repente, fui atravessado pela descoberta de que havia perdido aquilo que por anos sonhara e lutara para conquistar. Fiquei sem abrigo, o meu mundo desabou. Tudo ficou obscuro à minha volta. Parecia que estava vivendo um pesadelo de uma noite escura que nunca vai despertar. À semelhança do salmista Davi, “a minha alma [ficou] profundamente perturbada” (Sl 6:3). O coração doía terrivelmente.

Naquele ano eu sorri muitas vezes e chorei outras tantas. Nas palavras da poetisa cearense Leônia Teixeira, “assim como o palhaço chorei muitas vezes, ninguém viu, porque no rosto pintei o sorriso”. Mesmo não sentido vontade de sorrir, sorria para as pessoas a fim de impedir de parecer triste e oprimido para elas. Na realidade, algumas vezes, ao estar com outras pessoas, queria chorar, porém como sabia que o ato de sorrir podia elevar o meu humor e o humor das pessoas ao meu redor, pus-me a sorrir. Mas, somente eu e Deus sabíamos a tristeza e dor que eu estava sentindo. Sozinho, chorei muitas vezes.

Nessa circunstância adversa sentia que precisava de um lugar para me refugiar. Precisava dos poderosos braços de Deus para me abrigar em Seus cuidados. Então, foi no momento de tristeza e pesar que abri meu coração a Ele e disse: “Querido Deus e bom Pai que estás no Céu, meu mundo desabou, preciso de um lugar para me esconder”. Depois daquela oração, senti profundamente que Ele tornou-se meu lugar de refúgio desse mundo mal, permeado de pecado, sofrimento e de pessoas maldosas, ímpias e perversas. Cantei como o salmista: “Como é precioso o teu amor, ó Deus! Toda a humanidade encontra abrigo [refúgio] à sombra de tuas asas” (Sl 36:7).

A comunhão diária com Deus e as músicas sacras que ouvia me deram a certeza de que tinha encontrado refúgio à sombra das asas do compassivo Salvador. Durante o ano de 2020, escutei inúmeras vezes as lindas e inspiradoras músicas do saudoso casal Elias e Zilda Azevedo, especialmente os quatro volumes “A Família Canta”. Essas músicas foram bálsamo suave e refrigério para minha alma abatida.

Um poderoso pensamento da escritora cristã Ellen G. White, deu-me plena certeza da guia do Senhor. Ela escreveu: “[...] Nada temos que recear quanto ao futuro, a menos que esqueçamos a maneira em que o Senhor nos tem guiado, e os ensinos que nos ministrou no passado” (Testemunhos Seletos, v. 3, p. 443). Senti que Deus falava diretamente comigo. Comecei então a rememorar as muitas bênçãos que o Senhor Jesus tinha me concedido no transcurso dos anos da minha vida. Como o salmista Davi louvei ao Senhor: “Mas eu cantarei louvores à tua força, de manhã louvarei a tua fidelidade; pois tu és o meu alto refúgio, abrigo seguro nos tempos difíceis” (Sl 59:16, NVI). Isso trouxe-me calma e paz.

Foi no momento em que tudo parecia estar desmoronando-se ao meu redor que apeguei-me, pela fé, a poderosa mão de Jesus. Fé que não foi ofuscada pela dúvida, pelo desânimo e pelo desespero; fé que não se deixou corroer pela tendência de encarar as coisas meramente da perspectiva humana; fé que confia no poder de Deus para fazer o que parece ser impossível.

Todo aquele que conhece a Palavra de Deus, confia nEle. A fé não cresce de forma mística, romântica ou filosófica. É um crescimento concreto e prático. “Vem [...] pela palavra de Cristo” (Rm 10:17). O resultado final de confiar em Deus e na Sua Palavra é dizer como Davi: “Que poderá fazer-me o simples mortal?” (Sl 56:4, NVI).

O apóstolo Paulo em Filipenses 4:13, fala da maior força possível ao cristão! Ele diz: “Tudo posso naquele que me fortalece” (Filipenses 4:13, NVI). A força que sustinha Paulo, a força locomotora de sua vida era Cristo! Ele nos ensina que como cristãos somos fortes em Cristo Jesus. Em sua fraqueza diante da decepção, frustração, sofrimento e dor o cristão confia na força de Jesus. Apesar das vicissitudes, das enormes dificuldades, não somente o cristão recebe o alento, o bálsamo que necessita, o perdão e a paz, mas a força e o ânimo para enfrentar novas lutas.

Ellen White fala-nos de uma visão. Viu a igreja como um navio velho e cansado de viajar, indo ao encontro de um poderoso iceberg. A noite é fria, o iceberg é enorme, as águas são tenebrosas, os passageiros estão assustados. Então uma voz do céu diz: “Enfrentai-o!” (Ellen G. White, Mensagens Escolhidas, vol. 2, p. 205).

Caro amigo leitor, esta é a palavra de Deus para você e para mim. Enfrente seus males no ponto de interseção de coragem, competência e entrega a Deus. Enfrente-os com segurança e confiança plena em Deus. Enfrente-os depois de ter a certeza de que Deus está com você. Quão bom é saber que na batalha contra os problemas desta vida, não estamos sós. Do outro lado da montanha, está Jesus, nosso Salvador e Consolador. Morreu no Calvário, mas ao terceiro dia ressuscitou vitorioso. Emergiu da morte e proclamou vitória definitiva sobre o pecado. E voltará em glória e majestade para nos levar para o Lar eterno, onde não haverá mais dor, morte e nem sofrimento (Jo 14:1-3; Ap 21:1-5). Esse Lar é o Céu. Parece utopia falar dessas coisas em pleno século 21. O pragmatismo que permeia a cultura de nossos dias se recusa a aceitar o paraíso como uma realidade. Mas as Sagradas Escrituras afirmam enfaticamente que o Céu existe.

Confesso que não superei plenamente a frustração. Vez por outra, sou visitado por memórias da perda sofrida em maio de 2020. Isso incomoda e me entristece. Todavia, encontro refúgio em Jesus e prossigo firme pela fé na graça de Deus até receber a herança imortal! A cada dia tenho colocado minhas tristezas, feridas abertas, meu sonho frustrado nas mão de Deus. Ele está reconstruindo paulatinamente meu “mundo” que desabou.

Deus abençoe a todos e todas!

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023

A IGREJA E OS SINAIS DOS TEMPOS


Por que os sinais são importantes na vida da igreja

O surgimento de nossa igreja está relacionado a uma poderosa proclamação do breve retorno do Senhor em glória. O pequeno grupo de crentes estava convicto de que a vinda de Cristo estava às portas. Essa convicção se baseava no cumprimento de profecias bíblicas e de sinais que deviam preceder o evento. As profecias de Daniel e Apocalipse, juntamente com Mateus 24, ocuparam lugar importante nas pesquisas realizadas pelos pioneiros para entender tal assunto. À semelhança deles, cremos que “os sinais dos tempos, a cumprirem-se rapidamente, declaram que a vinda de Cristo está próxima, às portas. Os dias em que vivemos são solenes e importantes” (Ellen G. White, Exultai-O, [MM 1992], p. 357).

O remanescente como sinal

A Bíblia apresenta grande número de sinais que funcionam como arautos do retorno de nosso Senhor. Quero analisar profundamente a importância desses sinais. Em primeiro lugar, menciono um sinal sobre o qual não temos o costume de falar. Trata-se de um sinal que mostra o fato de que o propósito de Deus para com Seu povo está se cumprindo na história. A presença do povo remanescente de Deus no fim do tempo é um sinal.

Em primeiro lugar, o remanescente é um sinal pelo fato de ter aparecido no tempo indicado na Bíblia. A profecia descreve o ataque dos inimigos de Deus contra Cristo (Ap 12:5,4) e prevê um permanente ataque contra a igreja (Ap 12:13-16). Bem no início de sua história, a igreja enfrentou oposição de vários setores. As pressões sociais, religiosas e legais que a igreja sofreu durante tempos difíceis causaram perdas lamentáveis na área da verdade bíblica (Dn 7:25; 8:11, 12; 2Ts 2:3, 4). Contudo, Deus nunca abandonou Sua igreja. Ele sempre convidou Seu povo a fazer uma reforma. As profecias mostram que, ao se aproximar o fim do conflito cósmico, um remanescente seria suscitado. Isso se cumpriu no tempo exato (Ap 12:17). O cumprimento dessa profecia demonstra que o plano de Deus estava se cumprindo de acordo com Sua vontade.

A existência do remanescente não quer dizer que Deus não Se interessa no restante do mundo cristão. Ao contrário, a presença do remanescente mostra que Deus não rejeita o mundo cristão, mas procura meios para usá-lo para Sua glória, se seus integrantes o quiserem. O remanescente do tempo do fim é um sinal de esperança para o cristianismo e para o mundo não-cristão.

Em segundo lugar, o remanescente é um sinal que pode ser identificado. Para que um sinal seja útil e cumpra seu propósito, precisa ser visível (fome, terremotos, guerras). As características do remanescente facilitam sua identificação como um segmento em que Deus opera uma grande obra em benefício do restante de Seu povo em toda a Terra. Eles guardam os mandamentos de Deus e têm o testemunho de Jesus (Ap 14:12). Não podem se esconder, nem podem ser ignorados. São facilmente identificados e, desse modo, constituem um sinal vivo da obra de Deus no mundo.

Em terceiro lugar, o remanescente do tempo do fim é um sinal que focaliza uma realidade maior. Ao cumprir sua missão, ele aponta para a consumação da obra da salvação por Cristo na ocasião da Segunda Vinda. Existe propósito para a existência do remanescente, que tem uma missão específica em relação ao mundo (Ap 14:6-12). Portanto, é um sinal presente e acessível ao redor do mundo. Em certo sentido, sua presença global facilita sua função como sinal. À medida que nos aproximamos do retorno de Jesus, é necessário que o mundo conheça esse sinal. Pessoas de todas as nações e raças precisam conhecer esse sinal e se preparar para o evento. Por meio do exemplo, o remanescente é um sinal do amorável serviço de Deus em favor dos outros.

Significado dos sinais

Os muitos sinais da segunda vinda de Jesus são importantes para a vida da igreja. Sem dúvida, eles encorajam os membros a observarem os acontecimentos que ocorrem ao seu redor e a ver neles a presença de Deus relembrando a bendita esperança. Os sinais são relevantes em muitos aspectos.

Primeiro, servem para manter nossos olhos fixos em nossa esperança. Esperanças podem morrer; podem tornar-se irrelevantes e perder seu significado. O livro de Provérbios nos diz: “A esperança que se adia faz adoecer o coração” (Pv 13:12). Jesus não quer que esqueçamos a promessa que Ele instilou em nosso coração. Os sinais não somente mantêm viva em nós a esperança, mas também nos dizem que a promessa de Jesus é imutável e que Ele não Se esqueceu de nós.

Os sinais deviam aparecer entre a ascensão de Jesus e Seu retorno (Mt 24:6-14). Quando alguns desses sinais se cumprissem, os crentes seriam lembrados da promessa de seu Senhor crucificado e ressurreto: “Virei outra vez” e isso os ajudaria a manter a chama da esperança no coração. O Senhor sabia quão importante seria a esperança para Seus servos em um mundo de pecado, sofrimento e morte. Ele associou os sinais à promessa de Sua vinda para que mantenhamos sempre viva nossa esperança.

Segundo, os sinais preservam, na comunidade de crentes, um importante elemento: a expectativa de algo melhor. Os sinais nos alertam de que o Senhor pode retornar antes do tempo que imaginamos, mesmo em nossos dias. Cada geração é potencialmente a última geração. Por isso, vivemos em expectativa. Nossa vida é marcada pela convicção de que Jesus está às portas. Ele falou sobre a figueira: ‘Aprendei, pois, a parábola da figueira: quando já os seus ramos se renovam e as folhas brotam, sabeis que está próximo o verão. Assim também vós: quando virdes todas estas coisas, sabei que está próximo, às portas” (Mt 24:32,33). Toda vida marcada pela expectativa é orientada para o futuro. É livre de temor, porque espera somente o que é bom, ou seja, o cumprimento da esperança cristã.

Terceiro, os sinais nos encorajam a cumprir a missão. São uma força motivadora em nosso serviço para o Senhor, cuja vinda aguardamos. Partilhamos nossa esperança porque cremos que ela é relevante para as pessoas do século vinte e um. Mostramos Jesus como a fonte de nossa esperança e, ao mesmo tempo, mostramos os sinais de Sua vinda para encorajar pessoas a aguardar esse evento. Talvez, isso explique a presença de um elemento de incerteza nos sinais. Eles não podem ser usados para indicar o momento exato da vinda de Cristo. Não é esse o propósito dos sinais. Eles têm que ver especialmente com a missão da igreja. A presença dos sinais através da história da igreja cristã é percebida paralelamente com o cumprimento da missão da igreja, desde a ascensão de Jesus até Sua segunda vinda. Existe relação íntima entre ambas: “Quem é, pois, o servo fiel e prudente, a quem o senhor confiou os seus conservos para dar-lhes o sustento a seu tempo? Bem-aventurado aquele servo a quem seu senhor, quando vier, achar fazendo assim” (Mt 24:45,46). A correta compreensão dos sinais contribui para manter a igreja direcionada para a missão. Estar preparado consiste em estar cumprindo a tarefa da pregação quando Ele vier (verso 46).

Palavras de advertência

Nosso interesse nos sinais da Segunda Vinda deve estar fundamentado numa clara informação bíblica. O estudo da profecia bíblica deve fortalecer nossa esperança e nosso compromisso com o Senhor, que morreu para nos salvar. Mas se tal estudo nos causa temor, incerteza e preconceito, algo está errado em nossa maneira de ler os sinais da vinda de Jesus. Cumpre-nos ser melhores cristãos ao estudarmos o plano de Deus para Seu povo no fim do conflito cósmico. Não devemos especular sobre o que não sabemos. É uma atitude saudável reconhecer que não sebemos todos os detalhes do que vai acontecer. Do contrário, seremos tentados a ler sinais que não se acham nos eventos sociais ou religiosos contemporâneos. Isso cria um excitamento prejudicial ao equilíbrio da vida cristã. Devemos falar convictamente sobre o que está revelado nas Escrituras e nos abster de partilhar nossas próprias especulações como se fossem revelações divinas. Interpretações bizarras causam descrédito ao significado de nossa esperança, tornando-a alvo de zombaria. Protejamos nossa esperança contra isso, permanecendo leais ao que conhecemos e proclamamos como igreja.

Há outro perigo: ignorar os sinais, considerando-os irrelevantes. Tal atitude revela desilusão com a esperança cristã. Isso é um dos primeiros sinais de que a esperança está morrendo no coração de um crente. Quando isso acontece, morre também o interesse na missão da igreja. Ignorar os sinais do breve retorno de Cristo seria uma tragédia para igreja, como um todo, e para o crente individualmente. Sem esperança, a igreja não seria lembrada, por meio dos sinais, de que seus sonhos logo serão concretizados. “Insto com os membros de nossas igrejas para que não ignorem os sinais dos tempos, os quais anunciam claramente que o fim está próximo” (Ellen G. White, Pacific Union Recorder, 1º de dezembro de 1904).

Devemos fazer tudo o que é possível para evitar esses perigos. Preocupação exagerada com os sinais pode ser tão ruim quanto ignorá-los. A melhor maneira de evitar esses perigos é estar bem alicerçado nas Escrituras em relação à esperança que Deus confiou a Seu povo remanescente e permitir que ela molde toda a nossa vida em amor e serviço para outros. Portanto, sejamos prudentes enquanto esperamos a vinda do Senhor. Os sinais nos dizem que Ele logo voltará!

 

*Jan Paulsen [foi] presidente mundial da Igreja Adventista do Sétimo Dia.

 

FONTE: Revista Adventista Outubro de 2008, p. 4 e 5.