Teologia

sábado, 29 de fevereiro de 2020

A HORA DO JULGAMENTO


ROY GANE*

Evidências do juízo pré-advento em Daniel 8

Em seu livro A Visão Apocalíptica e a Neutralização do Adventismo (CPB, 2010), George Knight chama atenção para a progressiva perda de visão do adventismo e o consequente enfraquecimento no cumprimento da missão. Ele também faz um apelo para que o adventismo se concentre na urgência de priorizar a comissão evangélica centrada no amor de Cristo nesses últimos dias, especialmente as três mensagens angélicas (Ap 14:6-12), e eu acrescentaria a mensagem de Elias (Ml 4:5, 6) [Roy Gane, Who’s Afraid of the Judgment? The Good News About Christ’s Work in the Heavenly Sanctuary (Nampa, ID: Pacific Press, 2006), p. 126-128].

No entanto, quero analisar um pouco mais detidamente algo que ele abordou sobre Daniel 8:14 que, a meu ver, poderia fortalecer sua mensagem geral (Clinton Wahlen, “The Pathway Into the Holy Places (Hb 9:8): Does it End at the Cross?”, Journal of Asia Adventist Seminary, n° 11 (2008), p. 47-51). Depois de afirmar sua crença de que a profecia foi cumprida em 1844, Knight continuou dizendo que não consegue ver um juízo pré-advento dos santos em Daniel 8:14, mas somente um julgamento sobre o chifre pequeno e a “purificação do santuário em relação com esse poder no fim dos 2300 dias” (George R. Knight, A Visão Apocalíptica e a Neutralização do Adventismo, p. 68). Ele encontra um juízo pré-advento contra o “chifre pequeno” a favor dos santos em Daniel 7 (p. 68, 69), mas somente é possível vê-lo começando em 1844 se tomar como base o paralelismo entre Daniel 7 e 8 (p. 69).

O CONTEXTO DE DANIEL 8:14

Penso que Knight esteja certo em sua análise sobre o julgamento em Daniel 7, ou seja, a existência de um forte paralelo entre os capítulos 7 e 8, e a necessidade de se chegar a conclusões por meio de uma interpretação sólida, e não apenas pela leitura de um texto com outro. É verdade que o paralelo entre os capítulos é suficiente para associar o juízo pré-advento (Dn 7) com a purificação do santuário (Dn 8), de modo que o momento do segundo se aplique ao primeiro. Mas o que há em Daniel 8:14? Será que o texto se refere apenas a um julgamento pré-advento do “chifre pequeno” no fim dos tempos, e não contém um juízo investigativo dos santos?

De fato, Daniel 8:14 também não menciona explicitamente o “chifre pequeno”. Diz apenas: “E ele me disse: ‘até 2.300 tardes e manhãs; e o santuário será [justificado]’” (grifo do autor). Isso não soa como pensamento completo porque está respondendo à pergunta do verso 13: “Até quando durará a visão do sacrifício diário [que inclui a] transgressão assoladora, visão na qual é entregue o santuário e o exército, a fim de serem pisados? (grifo do autor). Assim, justificar o “santuário” no fim dos 2.300 “dias” (v. 14) resolve o problema levantado no verso 13. Não podemos entender o significado de justificar o santuário sem compreender a natureza do problema que isso pretende resolver.

A questão apresentada no verso 13 tem quatro partes: (1) a regularidade (diário), (2) a transgressão assoladora, (3) um santuário, e (4) ser pisado (Roy Gane, “The Syntax of Tet Va. in Daniel 8:13”, em J. Moskala (ed.), Creation, Life, and Hope: Essays in Honor of Jacques B. Doukhan [Berrien Springs, MI: Andrews University, 2000], 367-382). Mas essa lista enigmática não não nos diz muito por si só. O que aconteceu com “a regularidade” e “o santuário”? Quem é responsável pela “transgressão assoladora” e por “pisotear o exército”?

O verso 13 é um resumo dos pontos-chave da visão descrita em Daniel 8:1 a 12 (a palavra “visão” em Dn 8:13 é hazon, que aparece várias vezes em conexão com essa interpretação; ver Dn 8:15, 17, 26; 9:21, 24). À luz da interpretação posterior, nesse mesmo capítulo (v. 15-26), a visão cobre os períodos da Medo-Pérsia (v. 3-4, 20) e da Grécia, com seus quatro reinos helenísticos (v. 5-8, 21-22), os quais são substituídos por outro império maior, simbolizado por um “chifre” que começa pequeno, mas se expande horizontalmente na Terra, como poder político, e depois verticalmente em direção ao céu, como força religiosa (v. 9-12, 23-26).

A expressão “até quando durará a visão?”, significa: Qual será o ponto final da visão como um todo (a partir do tempo da Medo-Pérsia), quando os males perpetrados pelo “chifre pequeno” serão corrigidos? Os ataques principais incluem (na ordem do v. 13): (1) remover a regularidade (na adoração e no ministério) do Príncipe do exército do Céu, ou seja, Cristo (v. 11; cf. Js 5:13-15); (2) atribuir/nomear, de maneira hostil, outro contra essa “regularidade” (Dn 8:12); (3) derrubar o local do santuário que pertence ao Príncipe do exército (v. 11); e (4) derrubar e pisotear alguns do exército celestial (v. 10).

O chifre pequeno obviamente se destaca, mas onde está o povo fiel a Deus (os santos) em tudo isso? O “povo santo” aparece descrito no verso 24 (cf. v. 25), retratado como objeto de destruição pelo poder simbolizado pelo chifre pequeno. Visto que o povo santo pertence ao Deus do Céu e, portanto, ao Príncipe da hoste celestial, parece que destruí-lo literalmente expressa a mesma coisa que pisotear alguns do exército celestial (v. 10; cf. v. 13). Seja como for, Daniel 8 identifica explicitamente duas partes opostas: (1) o poder rebelde do chifre pequeno; e (2) o povo fiel de Deus, a quem o chifre persegue.

Descobrimos que Daniel 8:14 responde à pergunta referente a um determinado cenário (v. 13) que tem seu desdobramento no restante do capítulo, tanto em uma visão anterior quanto em sua interpretação. Assim, o todo de Daniel 8 se concentra no versículo 14: “Até 2.300 tardes e manhãs e o santuário será purificado [justificado]” (grifo do autor). Agora sabemos o que isso significa: No fim de um longo período de 2.300 “dias” (obviamente muito mais que dias literais), que vão do período medo-persa até o fim do período de dominação do chifre pequeno, um santuário seria justificado. Esse evento do fim dos tempos (v. 19, 26) repararia os problemas causados pelo chifre pequeno, o qual interrompeu a adoração ao Deus verdadeiro, levantou oposição, contrafez o sistema da adoração, atacou o local do santuário de Cristo e atentou contra alguns de Seus súditos.

NATUREZA DO JULGAMENTO

De que maneira o fato de justificar o santuário resolveu essas questões? É verdade que o ataque do chifre pequeno contra o santuário de Deus foi apenas um de seus crimes, mas os outros crimes também interferem no santuário, porque ali é o local em que os fiéis súditos de Deus regularmente realizam sua verdadeira adoração. O “santuário” celestial (literalmente, [lugar de] santidade, em Dn 8:14) se refere ao Templo no Céu, a sede do governo divino, a representação de Sua administração, assim como a Casa Branca representa o governo dos Estados Unidos ou o Kremlin a administração da Federação Russa. Portanto, justificar o santuário de Deus, o local real em que Ele reside no Céu (Sl 11:4;
Ap 4), compreende nada menos que vindicar Sua santa forma de governo, em oposição ao sistema do chifre pequeno.

“Será purificado”, ou justificado (niphal de tsdq), em Daniel 8:14, é uma linguagem forense que indica um processo judicial, que demonstra que a administração de Deus, representada por Seu santuário, está correta (Jó 9:15, 20; Sl 19:10; 51:6; 143:2; Is 43:9, 26, etc. Em Jó 4:17, aquele que é “justo” (tsdq) diante de Deus está “puro/limpo” (verbo thr), isto é, “vindicado”). O mesmo verbo hebraico (com suas variantes) é usado em outros contextos legais (inclusive tendo Deus como Juiz) e, nesse sentido, referindo-se ao julgamento em favor de alguém (por exemplo, Gn 38:26; 44:16; Dt 25:1; 2Sm 15:4; 1Rs 8:32; Sl 51:4 [heb. v. 6]; Is 5:23; 43:9, 26). Obviamente, o resultado de ter justificado o governo divino foi benéfico para o “povo santo” (v. 24), Seus súditos leais. Mas o resultado do poder do “chifre pequeno” foi decididamente negativo. Ele foi condenado pela vindicação do santuário de Deus e, finalmente, será “quebrado”/destruído, não pela ação de nenhum poder humano, mas pelo próprio Deus (v. 25) [2Ts 2:8, destruição dos ímpios na segunda vinda de Cristo.]. Essa execução do julgamento implica um processo de investigação pré-advento, que Daniel 8:14 descreve em termos de demonstração de que a administração divina está correta.

Observando Daniel 8 e seu contexto, verificamos que a vindicação do santuário de Deus no tempo do fim (v. 14) envolve um processo de justiça que resulta em benefício para Seu povo fiel e na condenação dos rebeldes. Portanto, após tudo isso, existe um julgamento envolvendo os “santos”, embora o texto não mencione isso com essas palavras.

O pano de fundo do Dia da Expiação para Daniel 8:14 é evidente. Ele indica uma relação tipológica: o Dia da Expiação típico aponta para um futuro julgamento antitípico no fim dos tempos. O Dia da Expiação anual era um dia de julgamento em Israel, quando o ritual de purificação do santuário terrestre representava a vindicação da justiça divina, a qual confirmava os fiéis (Lv 16:29-31), mas condenava os infiéis (Lv 23:29, 30) entre Seu povo. Todos aqueles cujos pecados já haviam sido perdoados em um estágio anterior de expiação (Lv 4:20, 26, 31, 35 etc.), e que haviam demonstrado contínua lealdade no Dia da Expiação (Lv 16:29, 31; 23: 26-32), ficavam moralmente “puros” (livres de qualquer impedimento no relacionamento divino-humano) como resultado da purificação do santuário (Lv 16:30) [Roy Gane, Cult and Character: Purification Offerings, Day of Atonement, and Theodicy (Winona Lake, IN: Eisenbrauns, 2005), p. 305-333]. Estamos começando a descobrir que há mais do que parece em Daniel 8, incluindo um julgamento que envolve o povo leal a Deus.

Daniel 8 não detalha o processo investigativo por meio do qual o “povo santo” do Senhor é assim considerado, e pelo qual o “chifre pequeno” é irremediavelmente considerado culpado de alta traição. A relação dos crimes do chifre pequeno deixa claro as acusações contra ele. Por outro lado, o comportamento do “povo santo” não é explicitado. A ênfase não está no que eles fazem, mas no Príncipe a quem pertencem (Dn 7:13, 14; cf. 9:25; 1Jo 5:11-13). O fato de eles e o chifre pequeno estarem em lados opostos implica que o povo do Senhor está fazendo exatamente o oposto do trabalho realizado pelo chifre, mantendo uma adoração verdadeira, centralizada no verdadeiro santuário do Senhor (cf. Hb 8:1, 2).

RELAÇÃO ENTRE DANIEL 7 E 8

De acordo com Knight, é em Daniel 7 que o processo de investigação judicial é descrito com alguns detalhes. Ele também reconhece que há um estreito paralelo entre Daniel 7 e 8 (referindo-se em 8:1 à visão do capítulo 7), o qual demonstra uma correspondência entre o juízo pré-advento e a purificação do santuário respectivamente.

Daniel 7
Daniel 8
Leão

Urso
Carneiro (Medo-Pérsia, v. 20)
Leopardo
Bode (Grécia, v. 21)
Animal terrível
Chifre pequeno: crescimento horizontal
Chifre pequeno
Chifre pequeno: crescimento vertical
Juízo pré-advento (v. 9-14)
Purificação do santuário (v. 14)


Daniel 8 repete o mesmo período histórico coberto por Daniel 7 (exceto Babilônia, que já havia passado e, portanto, não mais era relevante). Os impérios são os mesmos, e a natureza do problema do poder do “chifre pequeno” é a mesma. O fato de o mesmo símbolo ser usado (embora o chifre em Daniel 8 inclua expansão horizontal por Roma pagã/imperial no v. 9) reforça a proximidade do paralelo. Depois dos ataques do chifre, há uma solução divina em cada capítulo, que é regulamentada em favor dos santos e contra o poder que os oprimiu.

Os perfis proféticos correspondentes em Daniel 7 e 8 mostram que o juízo pré-advento e a justificação do santuário celestial são maneiras diferentes de descrever o mesmo evento: a vindicação de Deus diante dos seres criados por meio de um Dia da Expiação escatológico, que demonstra Sua justiça em condenar os desleais, mas salvar Seu povo leal e santo (Roy Gane, Who’s Afraid of the Judgment?, p. 40-45). Isso reforça a conexão entre Daniel 7 e 8 e confirma que o evento que começa no fim dos 2.300 “dias” proféticos nos envolve, como concluíram os pioneiros adventistas.

Temos o privilégio e a responsabilidade de levar o último convite evangélico a todo o mundo (Ap 14:6-12) durante a fase final da expiação, enquanto Cristo está realizando uma obra especial pela humanidade. O que poderia ser mais importante e urgente do que isso? Esse é o maior empreendimento da história da humanidade, e é totalmente impossível fazer isso somente pelo esforço humano. Como nunca antes, precisamos buscar e receber humildemente o poder do Espírito Santo (At 2; cf. Jl 2), que vem do santíssimo do santuário celestial, onde Jesus está ministrando agora. Esse poder nos impele a sair de nossa zona de conforto e alcançar pessoas para Cristo, a fim de que elas tenham oportunidade de ser resgatadas e desfrutar a vida eterna.

Continuemos respondendo ao desafio de Knight de explorar, viver e proclamar nossa visão apocalíptica em vez de neutralizá-la!

*ROY GANE é professor de hebraico e línguas do antigo Oriente Médio no Seminário Teológico da Universidade Andrews

(Artigo publicado na edição de março-abril da revista Ministério)



domingo, 16 de fevereiro de 2020

O QUARTO REINO


Clacir Virmes Junior e Isael Costa

Daniel 7 e a interpretação adventista

Algumas pessoas no meio adventista têm defendido a posição de que a única ou principal maneira de identificar os poderes correspondentes aos símbolos das profecias de Daniel, especialmente a do capítulo 7, é por meio das citações encontradas nos livros de Ellen White. Elas alegam que não é possível entender as visões de Daniel somente pela Bíblia. Entre esse grupo estão os que usam tal pretexto para confirmar o dom profético de Ellen White. Essa interpretação resulta da compreensão equivocada das profecias, da história da igreja e da função da manifestação profética moderna.

Neste artigo, procuramos analisar e fundamentar três conceitos. Primeiro, que a identificação dos poderes simbolizados pelos animais de Daniel 7, especialmente o quarto animal, pode ser feita considerando somente as informações bíblicas, sem a necessidade de se fundamentar nos comentários de Ellen White. Segundo, que os pioneiros adventistas chegaram à mesma conclusão somente por meio do estudo da Bíblia. Terceiro, que a própria Ellen White não se via como intérprete final da Bíblia.

O QUARTO ANIMAL DE DANIEL 7

Daniel 7 apresenta uma sequência de cinco reinos, sendo o último o reino de Deus. O capítulo se divide em duas seções, uma é a visão (Dn 7:1-14) e, a outra, sua interpretação (Dn 7:17-27). Os quatro animais que aparecem na visão representam quatro reinos que se levantaram da Terra (Dn 7:17, 23).

Uma leitura detalhada do livro mostra a similaridade entre as visões e sonhos descritos nele. Informações sobre esses reinos aparecem em quatro capítulos de Daniel (Dn 2, 7, 8 e 11). Eles descrevem a ascensão e queda sucessivas desses reinos que culmina com a manifestação e o estabelecimento do reino de Deus. A repetição do reino de Deus em cada capítulo sugere que os outros reinos mencionados também são recorrentes, de modo que cada bloco se apresenta como uma repetição acrescida de novos detalhes e ênfases em relação ao bloco anterior. Assim, tem sido praticamente unânime a posição de que Daniel 7 corresponde simetricamente ao capítulo 2, acrescido de novas informações.

Indispensável para a identificação do quarto reino de Daniel 7 é reconhecer sua correlação com o restante do livro. O único reino expressamente declarado aqui é o reino de Deus. No entanto, a repetição desses reinos ampliada em seus detalhes, que aparece nos outros capítulos de Daniel, ajuda a identificá-los. Por exemplo, em Daniel 2:37 e 38, o reino de Babilônia é descrito como sendo o primeiro numa sequência de cinco reinos. Daniel 5:28 e 31 revela que o reino que sucederia o babilônico seria o da Medo-Pérsia. Daniel 8:20 e 21 informa que a Medo-Pérsia seria derrotada pela Grécia. O reino grego, por sua vez, seria substituído por um rei (reino) “de feroz catadura”, o qual será destruído “sem esforço de mãos humanas” (Dn 8:23, 25, ARA). Essa frase ecoa o evento catastrófico provocado pela vitória e pelo estabelecimento do reino de Deus, a rocha de Daniel 2:34 e 45. Ao longo do livro, o quarto reino, diferentemente dos outros, não é nomeado. O quarto animal é a representação de um governo humano que, tão logo substituísse o terceiro reino, permaneceria até que o reino de Deus o destruísse.

Considerando as informações do contexto: (1) o quarto reino de Daniel 7 viria após o reino da Grécia (168 a.C.) e seria mais forte do que ele; (2) sofreria uma divisão (simbolizada pelos dez chifres/reinos de Dn 7:24); (3) subsistiria como um poder religioso, representado pelo chifre pequeno, que perseguiria os santos do Altíssimo por um período de tempo; (4) modificaria os Dez Mandamentos; e (5) seria destruído na manifestação do reino de Deus (Dn 7:20-22, 25, 26). Quanto à expressão “cuidará em mudar os tempos e a lei”, é importante destacar que o termo aramaico dat, traduzido por “lei” em Daniel 7:25, aparece uma única vez no Pentateuco, em Deuteronômio 33:2. Sua ligação com essa passagem mostra que a mudança não se refere à lei (torah) como um todo, mas aos Dez Mandamentos. Já o termo “tempos”, do aramaico, zemnin, que também seria mudado, refere-se a um tempo estabelecido, fixado, que se repete. O resultado inevitável dessa mudança foi a alteração do sábado semanal, período de tempo fixado, estabelecido, que se “repete” nos Dez Mandamentos.

Podemos concluir pelas evidências textuais que nenhum reino, nas profecias de Daniel, preenche tão adequadamente essas descrições quanto o Império Romano. Ele se estabeleceu logo após a queda do reino da Grécia. Primeiramente em sua fase imperial e, depois, como poder religioso opressivo por meio da Igreja Romana. Ele exercerá influência e domínio global até a manifestação do reino de Deus, por ocasião da segunda vinda de Cristo.

A INTERPRETAÇÃO DOS PIONEIROS

Nesta seção, destacamos três pioneiros do movimento adventista e como eles apresentaram a profecia de Daniel 7 em suas obras publicadas. Começamos com Guilherme Miller. Em 1836, cerca de oito anos antes de Ellen White receber seu chamado para ser a mensageira do Senhor, Miller publicou o livro Evidence from Scripture and History of the Second Coming of Christ, About the Year 1843. Fruto dos anos de estudo pessoal da Bíblia, esse livro foi uma exposição de suas conclusões quanto às profecias de Daniel e como elas apontavam para o iminente retorno de Cristo.

No terceiro capítulo, Miller apresentou a maneira como interpretava a profecia das 2.300 tardes e manhãs de Daniel 8:14. Antes de chegar a essa explicação, ele comparou as grandes profecias de Daniel 2, 7 e 8, e como isso pôde ajudá-lo a interpretar cada uma delas. Seu entendimento quanto a Daniel 7:19 e 20 foi: “Nesses versos aprendemos que o quarto animal seria diverso [i.e., diferente] dos outros. Isso foi verdade com Roma.” Em seguida, avançando para o significado do chifre pequeno, ele declarou: “Essa descrição não pode se aplicar a qualquer outro poder a não ser à Igreja de Roma” (William Miller, Evidence From Scripture an History of the Second Coming of Christ, About the Year 1843 [Brandon, VT: Vermont Telegraph, 1833], p. 42).

Em 1855, Tiago White publicou o livro The Four Universal Monarchies of the Prophecy of Daniel, and God’s Everlasting Kingdom. O pequeno volume de 48 páginas, dividido em três seções, é uma exposição dos capítulos 2, 7, 8 e 9 de Daniel. Quanto à identificação do quarto animal, ele escreveu: “Não há senão pouca disputa sobre o que é simbolizado pelo quarto reino. Nenhum reino que já existiu sobre a Terra corresponderá a ele, exceto o reino [império] romano” (Uriah Smith, Considerações sobre Daniel e Apocalipse, 2ª ed. [Engenheiro Coelho: SP, Centro White Press, 2014], p. 68, 69). Mais adiante, identificando o poder retratado pelo chifre pequeno por meio das características descritas no texto bíblico, ele afirmou: “Deve ser admitido que tal poder se levantou e que ele é o Papado”(James White, The Four Universal Monarchies of the Prophecy of Daniel, and God’s Everlasting Kingdom [Rochester, NY: Advent Review], p. 29). No artigo publicado na Review and Herald, em 17 de fevereiro de 1874, Tiago White apresentou as mesmas explicações tanto para o quarto animal quanto para o chifre pequeno de Daniel 7: “Essa besta representa o quarto império universal, que é Roma. Ela é a mesma besta simbolizada pela quarta, ou a parte de ferro da grande imagem metálica do capítulo 2 [de Daniel]. Roma corresponde à profecia na diversidade [i.e., diferença] dos outros reinos e na universalidade e tirania de seu governo férreo.”

O comentário de Uriah Smith conhecido como Considerações sobre Daniel e Apocalipse foi por longo tempo aceito como referência para a interpretação profética adventista. Sobre o quarto animal de Daniel 7, Smith escreveu: “Esse animal corresponde, naturalmente, à quarta divisão da grande imagem: as pernas de ferro. […] Com que exatidão Roma correspondeu à parte férrea da imagem! Com que precisão corresponde ao animal que temos diante de nós! Pelo espanto e terror que causou e por sua grande força, Roma correspondeu admiravelmente à descrição profética” (White, The Four Universal Monarchies, p. 30).

Comentando sobre o chifre pequeno de Daniel 7, Smith declarou: “Como esses chifres significam reinos, o chifre pequeno também deve denotar um reino, mas não da mesma natureza dos demais, porque é diferente dos outros que foram reinos políticos. Agora basta averiguarmos se desde 476 d.C. surgiu entre as dez divisões do Império Romano algum reino diferente de todos os demais; e se houve, qual foi? A resposta é: Sim, o reino espiritual do papado. Ele corresponde em todos os pormenores ao símbolo” (Smith, Considerações sobre Daniel e Apocalipse, p. 73).

Poderíamos citar outros pioneiros, como Joseph Bates, John Andrews, Alonzo Jones, Stephen Haskell e William Spicer, que interpretaram Daniel 7 de maneira igual. Contudo, mesmo nessa breve exemplificação, duas coisas ficam claras. Primeiro, em nenhum momento os pioneiros usaram os escritos de Ellen White para identificar os poderes descritos na profecia de Daniel 7, nem em outras profecias bíblicas. Miller não poderia ter chegado às suas conclusões pessoais com o auxílio dos escritos de Ellen White, uma vez que o dom profético foi dado a ela anos depois das descobertas dele. Mesmo Tiago White e Uriah Smith, que conviveram lado a lado com ela, não usaram seus escritos como fonte para a explicação das profecias. Segundo, para chegar às suas conclusões, os pioneiros se fundamentaram no estudo do texto bíblico e da história universal. Olhando para as características bíblicas dos símbolos, eles buscavam no relato dos movimentos históricos os poderes retratados pelas profecias.

ELLEN WHITE E A INTERPRETAÇÃO DA BÍBLIA

A relação entre a autoridade da Bíblia e a autoridade profética de Ellen White tem sido estudada por autores adventistas há muito tempo (Denis Kaiser, “Ellen G. White’s Role in Biblical Interpretation: A Survey of Early Seventh-day Adventist Perceptions”, Reflections 60 [2017], p. 1-6). É importante ressaltar que a autoridade de Ellen White está subordinada à autoridade bíblica. Isso pode ser constatado tanto em suas declarações quanto em estudos sérios feitos por eruditos adventistas.

Por exemplo, nas palavras de Frank Hasel, “Ellen White tratou as Escrituras com respeito e deferência ao longo da vida e valorizava a autoridade da Bíblia acima de qualquer outra, incluindo seu ministério profético” (Frank M. Hasel, “O Uso das Escrituras por Ellen White”, em Quando Deus Fala, eds. Alberto R. Timm e Dwain N. Esmond [Tatuí: SP, Casa Publicadora Brasileira, 2017], p. 351, 352). Ela “não se elevava a uma posição em que, com seus dons proféticos, ela se considerasse como a fonte autorizada para a interpretação das Escrituras. Em vez disso, ela afirmava, vez após outra, o grande princípio protestante” (Hasel, Quando Deus Fala, p. 353) Além disso, Ellen White “não assumia o papel de ser a intérprete oficial das Escrituras, mas encorajava os outros a serem estudiosos diligentes das Escrituras por conta própria” (p. 354). Em suas palavras: “O Senhor deseja que estudemos a Bíblia. Ele não deu nenhuma luz adicional para tomar o lugar de Sua Palavra. Esta luz [o dom de profecia] deve conduzir as mentes confusas à Sua Palavra”(Ellen G. White, Mensagens Escolhidas [Tatuí: SP, Casa Publicadora Brasileira, 2014], v. 3, p. 29). Ela também declarou: “Se há um ponto da verdade que não compreendem, com o qual não concordam, investiguem, comparem com outro. Adentrem bem fundo na mina da verdade da Palavra de Deus. Coloquem tanto vocês quanto suas opiniões no altar do Senhor, abandonem as ideias preconcebidas e deixem que o Espírito os dirija em toda a verdade”(Ellen G. White, Testemunhos para Ministros e Obreiros Evangélicos, [Tatuí: SP, Casa Publicadora Brasileira, 2014], p. 476). “A Bíblia é seu próprio expositor. Uma passagem será a chave que esclarecerá outras passagens, e deste modo haverá luz sobre o significado oculto da Palavra. Comparando diversos textos que tratam do mesmo assunto e examinando sua relação em todo o sentido, o verdadeiro significado das Escrituras se torna evidente” (Ellen G. White, Fundamentos da Educação Cristã [Tatuí: SP, Casa Publicadora Brasileira, 2016], p. 187).

Se queremos ser fiéis aos conselhos dados por Ellen White, a Bíblia deve ter primazia em nosso relacionamento com Deus. A escritora foi fundamental para o nascimento e desenvolvimento do movimento adventista, mas ela nunca se colocou no lugar das Sagradas Escrituras. Desde suas raízes mileritas, o adventismo nasceu como o movimento do “Livro”, isto é, da Bíblia, e não dos “livros”. Se queremos estar afinados com nossa herança denominacional, se queremos ser “adventistas históricos”, nada melhor do que nos voltarmos para a Bíblia como única fonte de fé e prática.

CLAVIR VIRMES JUNIOR é professor de Novo Testamento na Faculdade Adventista da Bahia (FADBA); ISAEL COSTA é professor de Antigo Testamento no seminário da mesma instituição

(Artigo publicado originalmente na edição de janeiro-fevereiro de 2020 da revista Ministério)



quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

ELLEN WHITE: QUEM FOI?


Por James R. Nix*

Uma pequena senhora que falava sobre Jesus

Diz-se que Ellen White é a escritora americana mais traduzida de toda a História: seu livro Caminho a Cristo foi traduzido para mais de 160 idiomas; treze outros foram traduzidos para mais de vinte e cinco línguas. Seus escritos moldaram a vida de adventistas e de pessoas que não são membros da igreja.

Ellen White nasceu no dia 26 de novembro de 1827, em Gorham, Maine, nordeste dos Estados Unidos. Ela e sua irmã gêmea, Elizabeth, eram as caçulas dos oito filhos de Robert e Eunice Harmon, membros da Igreja Metodista. Em 1842, ela foi batizada e se uniu à igreja de seus pais em Portland, Maine, para onde a família se mudou. Em Portland, a família também frequentava as reuniões dirigidas por Guilherme Miller, ex-pregador batista, que concluiu, baseado em estudos das profecias bíblicas, que Cristo retornaria por volta do ano 1843 (mais tarde, revisado para 1844).

Os Harmon tornaram-se mileristas, como são chamados os seguidores de Miller e, como consequência, foram desligados da igreja metodista em 1843. Como adolescente, Ellen considerava pesado fardo falar de Jesus aos outros. Mas ela cria piamente que Ele retornaria no dia 22 de outubro de 1844. Quando isso não aconteceu, Ellen e outros mileritas ficaram muito desapontados. Entretanto, poucas semanas mais tarde, em dezembro de 1844, Deus lhe deu a primeira das quase duas mil visões proféticas que recebeu como sonhos à noite, entre essa data e sua morte em 1915. A primeira visão confirmou que Deus ainda estava com o jovem grupo de crentes adventistas. Se fossem fiéis, um dia chegariam à Cidade Santa.

Ellen foi encorajada a compartilhar suas mensagens pelo jovem ministro adventista, Tiago White. Eles se casaram no dia 30 de agosto de 1846. A essa altura, eles começaram a guardar o sábado do sétimo dia, baseados nas evidências bíblicas contidas em um panfleto escrito por José Bates. Mais tarde, Ellen recebeu uma visão confirmando que o sábado era o dia correto de guarda.

O pequeno grupo de guardadores do sábado, que crescia lentamente, continuou a estudar a Bíblia, em busca da verdade. As visões dadas a Ellen White frequentemente confirmavam suas conclusões. As visões nunca substituíram sua necessidade de estudar a Bíblia.

Em 1851, Ellen White escreveu um livreto, o primeiro de mais de cem livros e panfletos que hoje levam seu nome. (Seu primeiro panfleto foi publicado no livro Primeiros Escritos.)

Tiago e Ellen White viajaram muito, falando e aconselhando os membros da igreja que crescia. O fato de ser mãe de quatro meninos já era desafio suficiente, sem falar na dor de precisar separar-se deles por conta das viagens para encorajar os crentes adventistas dispersos. Ela também experimentou a tragédia de perder dois de seus filhos, John Herbert, que morreu com cerca de três anos de idade, e Henry Nichols, aos dezesseis. Os outros dois filhos, James Edson e William Clarence, tornaram-se ministros adventistas do sétimo dia.

Muitas das visões dadas por Deus a Ellen White continham mensagens de esperança e encorajamento, outras incluíam advertências e repreensões. Era difícil transmitir algumas dessas mensagens incisivas. Ser mensageira do Senhor não era tarefa fácil! Deus falou por seu intermédio para dirigir a igreja em tempos de muitos desafios.

Ellen tornou-se popular como oradora, muito requisitada para as reuniões adventistas. Foi, talvez, mais conhecida como oradora que como escritora. Tornou-se oradora muito popular em temperança cristã entre os grupos de temperança não-adventistas.

Em 1863, Deus deu a Ellen White a mais abrangente visão sobre saúde. Embora não fosse sua primeira visão sobre o assunto, essa foi muito mais esclarecedora. Destacava a importância de uma boa dieta, exercícios físicos, descanso, ar puro e o conceito de que a preservação da saúde é um dever religioso. A visão foi escrita e publicada. Seus princípios foram posteriormente adotados por muitos adventistas em todo o mundo. Recentemente, estudos científicos demonstraram que a prática do estilo de vida recomendado por Deus propicia mais alta média de vida entre os adventistas, em relação à população em geral.

Ellen White sentiu-se incompleta, como escritora, para descrever o que Deus lhe havia mostrado; por isso, era leitora voraz. Ocasionalmente, escolhia frases que lia e ficavam gravadas na mente, usando-as em sermões e palestras. Ela descobriu que ler outros autores a ajudava a descrever, com mais detalhes, as coisas que Deus lhe havia mostrado em visão. A Sra. White nunca alegou ser infalível ou perfeita; ou que seus escritos se igualavam à Bíblia. Entretanto, cria firmemente que as mensagens que Deus enviava por seu intermédio eram de origem divina e que seus artigos e livros eram produzidos sob a direção do Espírito de Deus.

São muitas as histórias sobre sua generosidade. Enquanto morava na Austrália, mantinha peças de tecido à mão para que, se encontrasse alguma senhora que necessitasse de um vestido novo, pudesse oferecer-lhe. Comprava móveis usados para que, se surgisse uma necessidade, pudesse ajudar imediatamente. Ela frequentemente enviava recursos para ajudar ministros idosos que necessitavam de auxílio financeiro.

A Sra. White recebia muitas visitas e, normalmente, ia dormir cedo. Com frequência, levantava-se às duas ou três horas da manhã para escrever, enquanto havia silêncio. Alguns de seus livros, como o Caminho a Cristo, são devocionais. Outros, como Testemunhos Para a Igreja, são coletâneas de muitas cartas e manuscritos escritos por ela ao longo dos anos, oferecendo conselho.

Os cinco volumes de O Conflito dos Séculos são de natureza mais histórica, descrevendo o progresso do conflito cósmico entre Cristo e Satanás, iniciado no Céu, antes da criação, e que terminará com a erradicação do pecado, no fim do milênio. Os leitores desses livros são continuamente convidados a escolher o lado de Deus nessa batalha cósmica. Hoje, livros como A Ciência do Bom Viver e Educação são considerados clássicos na área.

Na época de seu falecimento, em 16 de julho de 1915, havia vinte e quatro livros publicados e dois quase concluídos. Isso não inclui outras cinquenta mil páginas de manuscritos inéditos, guardados no cofre de seu escritório. Como instruído por ela em seu testamento, têm sido produzidas várias compilações temáticas.

Por setenta anos, Ellen White transmitiu fielmente as mensagens que Deus lhe deu. Seu conselho era constantemente procurado pelos líderes da igreja. Apesar de sua pouca educação formal, suas visões resultaram no presente sistema educacional adventista mundial, desde creches a universidades. Embora não tenha estudado medicina, o fruto de seu ministério pode ser visto na rede de hospitais adventistas, clínicas e instituições para a formação de profissionais de saúde em todo o mundo. Apesar de não ter sido ordenada ao ministério, seus escritos continuam a influenciar milhões de pessoas em mais de duzentos países em que a Igreja Adventista está presente. A mensageira de Deus continua a ajudar pessoas a encontrar o Senhor, a aceitar Seu perdão e a partilhar Seu amor com outros.

Durante seus últimos anos de vida, Ellen White gostava de fazer passeios diários em sua charrete. Ao passar por alguma casa, observava: “Será que as pessoas desta casa sabem alguma coisa sobre Jesus?” E costumava parar para visitar os vizinhos, geralmente deixando frutas de seu pomar ou produtos da horta, além de alguma literatura. Sempre falava com eles sobre Jesus. Por muitos anos, após sua morte, ela foi lembrada como a pequena senhora, vestida de preto, que vinha em sua charrete e falava sobre Jesus.

Em nosso mundo cada vez mais apressado, onde as coisas espirituais são vistas por cima ou simplesmente ignoradas, os escritos de Ellen White podem ajudar a quem está procurando encontrar uma profunda experiência com Deus. Seus escritos sempre apontam para as Escrituras, onde Deus provê direção para Seu povo.

*James R. Nix é diretor do White Estate, em Silver Spring, Maryland, EUA.

FONTE: Artigo originalmente publicado no White Estate e traduzido pelo Blog Sétimo Dia.



segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

ATÉ QUANDO TEREMOS DE CONVIVER COM A VIOLÊNCIA, A FOME E A DOENÇA?


Ricardo André

I - Introdução:

A sociedade atual é marcada pela dor e sofrimento. A pobreza, a fome e as epidemias, como a AIDS, o ebola, a malária, e agora o novo coronavírus e tantas outras, se agravam cada dia, tomando proporções apocalípticas. Segundo a OMS, a dengue mata 25 pessoa por ano no mundo. A cólera mata 100 mil. Estas doenças estranhas parecem deixar a tecnologia científica desconcertada (Lc 21:11). Aproximadamente 57 milhões de pessoas morrem a cada ano no mundo devido a fome. Os diversos tipos de câncer matam milhares de pessoas no mundo. Projeta-se que, os casos de câncer aumentarão 50% até 2030, quando serão diagnosticados em todo o mundo quase 22 milhões de casos de câncer. Ao mesmo tempo, as mortes por câncer passarão de 8,2 milhões a 13 milhões por ano. Isso quer dizer que o número de pessoas que enfrentarão a perda de seus queridos por causa dessa doença aumentará. Milhões ao redor do mundo enfrentam, hoje, o doloroso luto.

Atualmente várias nações do mundo têm armas nucleares para a destruição mundial. Estimativas garantem que há 20 mil ogivas nucleares espalhadas pelo mundo. A maior parte delas são controladas pelos Estados Unidos e a Rússia. A decadência moral da sociedade é evidente em quase todos os lugares. A violência existe. A sociedade parece está impregnada de cobiça, lascívia, luxúria, e para satisfazer seus desejos animalescos cometem os crimes mais hediondos. O terrorismo de grupos radicais islâmicos parece uma praga que se espalhou pelo mundo, e mata centenas de pessoas.

A humanidade está chocada. É a fome, a guerra, o terrorismo, a violência. A Revista veja de 2005 em grande manchete destaca: “Socorro!” Uma pessoa é assassinada a cada 13 minutos. A criminalidade no Brasil, bate recorde, apavora a sociedade e os governantes não consegue vencer os bandidos do crime organizado. Essa situação é caótica, assombrosa até! A sociedade está assustada e amedrontada.

Essa violência em longa escala, gera medo no ser humano, a neurose do medo, do pânico, do temor, do assombro e do estresse. A corrupção está presente em quase todos os lugares.

De uma forma clara e sem titubear, milhares de pessoas em todo o mundo indagam-se: Até quando teremos de conviver com terrorismo, crise econômica, violência urbana, queda de bolsa, fome, doença ...?

As Sagradas Escrituras também apresentam uma pergunta semelhante. Ao abrir o quinto selo do Apocalipse, João vê os mártires clamando: “Até quando, ó Soberano santo e verdadeiro, esperarás para julgar os habitantes da terra e vingar o nosso sangue?" (Apocalipse 6:10, NVI). O fiel povo de Deus tem sofrido injustiça e morte por sua fidelidade a Jesus e a seus ensinos. De forma metafórica o sangue desses mártires clama a Deus, pedindo-Lhe que intervenha e o vingue. “Até quando, ó Soberano Senhor?” Esse tem sido o grito do povo de Deus que sofre ao longo da história.

“O simbolismo do quinto selo foi apresentado para encorajar aqueles que enfrentaram martírio e morte, com a certeza de que, apesar do aparente triunfo do inimigo, chegaria a hora da vindicação. Tal incentivo seria particularmente animador para os que viveram nos tempos terríveis de perseguição do fim da Idade Média, sobretudo durante a época da Reforma e depois dela [...]. Para eles deve ter parecido que o longo período de opressão nunca chegaria ao fim. A mensagem do quinto selo era uma garantia de que a causa de Deus triunfaria afinal. O mesmo encorajamento virá àqueles que enfrentarem o último grande conflito” (Comentário Bíblico Adventista, v. 7, p. 861).

Nos dias finais da história deste mundo, quando ocorrer a tríplice união do protestantismo, catolicismo e espiritismo prevista na profecia apocalíptica (Ap 16:13, 14), e essa tríplice aliança influenciar a nação norte-americana a impor por decreto a observância do falso sábado (domingo), diz a irmã Ellen G. White que “o povo de Deus entrará então num período de aflição e angústia que o profeta designa como ‘o tempo de angústia para Jacó’. Jer. 30:7. O clamor dos fieis perseguidos se elevará até ao Céu. E como o sangue de Abel clamou a Deus desde o pó, assim haverá vozes clamando desde a sepultura dos mártires, das profundezas do oceano, das cavernas dos montes e das masmorras dos conventos: ‘Até quando, ó verdadeiro e santo Dominador, não julgas e vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a Terra?’” (Testemunhos Para a Igreja, v. 5, p. 451).

II - O julgamento no santuário celestial

Os mártires clamavam por julgamento. “Até quando [...] não julgas nem vingas o nosso sangue?”, perguntaram eles. Seu pedido posicionou o quinto selo antes do julgamento final. Em Daniel 7: 9, e 10, Deus revela ao seu servo a primeira fase de julgamento final. Daniel vê uma cena de julgamento que ocorrerá no Santuário celestial antes do segundo advento de Jesus. Por isso é conhecido no meio adventista como o juízo pré-advento ou investigativo. Assim reza o texto: “Enquanto eu olhava, "tronos foram postos no lugar, e um ancião se assentou. Sua veste era branca como a neve; o cabelo era branco como a lã. Seu trono ardia em fogo, e as rodas do trono estavam todas incandescentes. E saía um rio de fogo, de diante dele. Milhares de milhares o serviam; milhões e milhões estavam diante dele. O tribunal iniciou o julgamento, e os livros foram abertos”.  

Muitas pessoas temem e sentem repulsa quando ouvem falar de Juízo final. Normalmente, não pensamos muito no juízo como uma coisa positiva. Entretanto, não precisamos temer o juízo. É preciso entender que esse juízo termina com boas novas para o povo de Deus. Primeiro, ele trará justiça aos santos. O verso 22 diz que Deus “fez justiça aos santos do Altíssimo”; isto é, o juízo decidiu em favor dos santos, do povo de Deus. Os verdadeiros cristãos têm um Substituto que Se apresenta em seu lugar no juízo. Alguém que já morreu por seus pecados. É por isso que não existe condenação (culpa, punição) para eles, nem agora nem no juízo. Isso são boas novas! Que boa razão para render-nos a Deus em fé e obedecer Àquele que nos deu “tão grande salvação” (Hb 2:3)! Segundo, ele provoca destruição final do ímpio chifre pequeno, símbolo do mal, poder político-religioso responsável por impor terríveis sofrimentos ao povo de Deus nos últimos dias (v. 26).

O verso 10 sugere que Cristo, que é representado na visão com o título de “Filho do homem”, irá julgar Seu povo com base nos livros. Diz o profeta Daniel: "Assentou-se o juízo, e abriram-se os livros." O profeta João, descrevendo a mesma cena, acrescenta: "Abriu-se outro livro, que é o da vida; e os mortos foram julgados pelas coisas que estavam escritas nos livros, segundo as suas obras." Ap 20:12. Os textos deixam claro que no Santuário Celestial, se guardam registros da conduta dos homens. Esses livros são registros de conduta.

A Bíblia Sagrada fala de dois livros: Livro da Vida (Ex. 32:32; Sal. 69:28) e Livro Memorial (Mal. 3:16,17). No Livro da Vida são registrados os nomes de todos os que já entraram para o serviço de Deus. No Livro de Memórias, as obras boas e também as más.

Ellen G. White diz: “No livro memorial de Deus toda ação de justiça se acha imortalizada. Ali, toda tentação resistida, todo mal vencido, toda palavra de terna compaixão que se proferir, acham-se fielmente historiados. E todo ato de sacrifício, todo sofrimento e tristeza, suportado por amor de Cristo, encontra-se registrado.” (O Grande Conflito, p. 481).

Mas sobre as obras más, ela diz: “Pecados de que não houve arrependimento e que não foram abandonados não serão perdoados nem apagados dos Livros de Registro, mas ali permanecerão para testificar contra o pecador no Dia de Deus” (Ibdem, p. 486).

Quando começará o Juízo Investigativo? Segundo Daniel 8:14, a resposta é que o santuário no Céu será purificado (ou que o juízo no Céu se assentará) no final da profecia dos 2.300 dias/anos, em 1844. O texto diz: “E ele me disse: Até duas mil e trezentas tardes e manhãs; e o santuário será purificado. E, é claro, ao término desse juízo Cristo virá para entregar ao santos o reino eterno (Dn 7:26-28).

“No tempo indicado para o juízo - o final dos 2.300 dias, em 1844 - iniciou-se a obra de investigação e apagamento dos pecados. Todos os que já professaram o nome de Cristo serão submetidos àquele exame minucioso. Tanto os vivos como os mortos devem ser julgados "pelas coisas escritas nos livros, segundo as suas obras" (Ellen G. White, Cristo em Seu Santuário, p. 115).

Portanto, desde 1844, estamos vivendo no grande Dia da Expiação, o tempo do juízo prefigurado no sistema do santuário terrestre pelo serviço anual em que o santuário terrestre era purificado (Lv 16). A palavra “expiação”, apesar de estar carregada de várias conotações, significa, basicamente, o ato pelo qual o pecador era reconciliado com Deus. Então, a expiação – que só Deus pode fazer por nós – tem que ser boas novas. Logo, não devemos estar vivendo com medo do juízo.

III - A obra de Cristo

a) Desde sua ascensão

Desde que Cristo subiu ao Céu, e entrando no Lugar Santo do Santuário, como nosso Sumo Sacerdote, ele iniciou uma obra de mediação ou intercessão pelos pecadores, prefigurado pelo ministério dos sacerdotes no santuário terrestre (Hb 7:25; 8:1, 2). “Assim como Cristo, por ocasião de Sua ascensão, compareceu à presença de Deus, a fim de pleitear com Seu sangue em favor dos crentes arrependidos, assim o sacerdote, no ministério diário, aspergia o sangue do sacrifício no lugar santo em favor do pecador” (Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, p. 357). 
 
b) Da ascensão até 1844

Porém o Sangue de Cristo, ao mesmo tempo que livraria da condenação da Lei o pecador arrependido, não cancelaria o pecado. Este seria removido somente no Dia da Expiação. “No tipo, esta grande obra de expiação, ou cancelamento de pecados, era representada pelas cerimônias do dia da expiação, a saber, pela purificação do santuário terrestre, a qual se realizava pela remoção dos pecados com que ele ficara contaminado, remoção efetuada pela virtude do sangue da oferta para o pecado” (Ibdem, p. 358).

E aqui é que entra a cena de Dn 7:9,10, o momento em que Cristo acrescentaria mais uma função a si, a de apagar os pecados. E essa função seria ministrada no Santíssimo, e Daniel vê trono, livros, ancião de dias... E historicamente essa visão teve acontecimento em 1844.

c) após 1844

Esse juízo iniciado em 1844, revela aos seres celestiais quem dentre os mortos dorme em Cristo, sendo, portanto, nEle, considerado digno de ter parte na primeira ressurreição. Também torna manifesto quem dentre os vivos, permanece em Cristo, guardando os mandamentos de Deus e a fé de Jesus. Estando portanto, nEle, preparado para a trasladação ao Seu reino eterno. É o ato de ser determinado quem ou o que será apagado, ou quem ou o que não será apagado. Com isto dizemos que é apagado: Nomes do Livro da vida e Pecados do Livro de Memórias.

O Juízo Investigativo diz respeito aos crentes. A Bíblia diz: “É tempo que comece o julgamento pela casa de Deus; e, se primeiro começa por nós, qual será o fim daqueles que são desobedientes ao Evangelho?” (1Pe 4:17).

Diz a Serva do Senhor: “Assim, no grande dia da expiação final e do julgamento investigativo, os únicos casos a serem considerados são os do povo professo de Deus. O julgamento dos ímpios constitui obra distinta e separada, e ocorre em ocasião posterior.” (Ellen G. White, O Grande Conflito, p. 480).

Os que pedem perdão, terão seus nomes no Livro da Vida, os rebeldes terão seus nomes apagados.

“Todos os que verdadeiramente se tenham arrependido do pecado e que pela fé hajam reclamado o sangue de Cristo, como seu sacrifício expiatório, tiveram o perdão acrescentado ao seu nome, nos livros do Céu; tornando-se eles participantes da justiça de Cristo, e verificando-se estar o seu caráter em harmonia com a lei de Deus, seus pecados serão riscados e eles próprios havidos por dignos da vida eterna” (Ellen G. White, A Fé Pela Qual Eu Vivo [Meditações Matinais, 1959], p. 212).

No final do juízo investigativo, estará decidida a sorte de todo ser vivente e Cristo virá em seguida. “Quando se encerrar a obra do Juízo de Investigação, o destino de todos terá sido decidido, ou para vida, ou para morte... Os justos e os ímpios estarão ainda a viver sobre a terra em seu estado mortal. Estarão os homens a plantar e a construir, comendo e bebendo, todos inconscientes de que a decisão final, irrevogável, foi pronunciada no Santuário Celestial.” (O Grande Conflito p. 490).

O drama terrestre será concluído tendo Satanás como o grande responsável e assumindo os pecados de todos à semelhança do Bode Azazel conduzido ao deserto (Lv 16: 10, 20-22). Nesse momento então cumprir-se-á Dn 7:18 “Mas os Santos do Altíssimo receberão o Reino e o possuirão para todo o sempre, de eternidade em eternidade.” O que significa essa promessa para você? Qual é a primeira coisa que você fazer quando chegar lá?

IV – Conclusão

É importante lembrar que esses capítulos proféticos de Daniel não são apenas profunda teologia, profecia ou história, todos eles nos enviam uma mensagem de esperança e promessa. Juntos, eles nos dizem que não importa quão mal vão as coisas, elas não vão durar; que, apesar das aparências, o Deus que traçou para nós a história do mundo desde o tempo de Daniel até o nosso e o futuro, trará um maravilhoso final em que o mal será castigado e os justos serão salvos.

A mensagem do Dilúvio percorreu 120 anos. A mensagem da Posse de Canaã percorreu 40 anos. A mensagem da Destruição de Sodoma e Gomorra durou mais ou meno 3 dias A última chance para Israel levou 490 anos (Dn 7:24, 25).

E a mensagem do Juízo Investigativo como antecedendo a Volta de Jesus, até quando? Felizmente, não nos compete saber quanto tempo mais haverá até volta de Jesus. É da alçada divina. Deus sabe quando Seu Filho deverá voltar para nos buscar. O que me concerne é estar preparado, vigilante, hoje. É isso que o Senhor espera de mim e de qualquer que ama a Sua vinda. A verdade é que, independentemente de quanto tempo tenhamos que esperar, é certo que Jesus virá, pois Ele mesmo deu Sua palavra de honra ao prometer: “Virei outra vez” (Jo 14:3; Ap 22:20). Seu segundo advento é um certeza divina! O apóstolo Paulo sabendo que, no tempo do fim, os que houvessem aceitado o evangelho eterno seriam tentados a perder a confiança nele por causa da aparente demora da volta de Jesus, ele escreveu: “Porque ainda um pouquinho de tempo, e o que há de vir virá, e não tardará” (Hebreus 10:37, ACF). Deus mantém conta certa do tempo. A Bíblia permanece verdadeira. As mensagens transmitidas por visões proféticas a João e Daniel estão tendo seu cumprimento no presente, e muitas outras no futuro bem próximo. As mensagens dadas à Igreja Remanescente pela inspirada profetisa Ellen G. White nos guiarão até ao fim. Muitos luminares brilhantes poderão apagar-se, tornando-se trevas, mas a luz profética brilhará e mais à medida que se aproximar do glorioso dia da volta de Jesus.

Vislumbrando aquele grande dia Ellen White escreveu: “Dentro de pouco tempo Jesus virá para salvar Seus filhos e dar-lhes o toque final da imortalidade. Este corpo corruptível se revestirá da incorruptibilidade, e este corpo mortal se revestirá da imortalidade. As sepulturas se abrirão, e os mortos sairão vitoriosos, clamando: "Onde está, ó morte, o teu aguilhão? Onde está, ó inferno, a tua vitória?" I Cor. 15:55. Os nossos queridos, que dormem em Jesus, sairão revestidos da imortalidade. E, ao ascenderem os remidos aos Céus, abrir-se-ão os portais da cidade de Deus de par em par, e neles entrarão os que observaram a verdade. Ouvir-se-á uma voz mais bela que qualquer música que já soou aos ouvidos mortais, dizendo: "Vinde, benditos de Meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo." Mat. 25:34. Então os justos receberão sua recompensa. Sua vida correrá paralela à vida de Jeová. Lançarão suas coroas aos pés do Redentor, tangerão as harpas de ouro e encherão todo o Céu de bela música” (Ellen G. White, Conselhos Sobre Mordomia, p. 350).

 Que dia será aquele, quando Ele abrir todos os cemitérios do mundo! Erguerá os mortos e nos unirá pela eternidade como os nosso queridos. Jesus promete tanto aos ressuscitados quantos aos vivos: “(...) voltarei e os levarei para mim, para que vocês estejam onde eu estiver” (João 14:3, NVI). Vidas solitárias e frustradas despertarão para a amizade com Jesus através dos tempos eternos.

Querido amigo, como está a sua fé e esperança na volta de Jesus? Esperando-O cada dia, preparado? Não me é tão importante que eu esteja esperando meu Senhor por 35 anos e quanto mais terei de esperar. O que me preocupa é meu preparo, da minha família e o da minha igreja nestes dias tão importante nos quais esperamos nosso Senhor. A vinda dEle é certa. Nunca percamos a fé e a esperança na Sua vinda. Ele é o Senhor do Advento. Nos preparemos e ajudemos a outros também a se prepararem para o glorioso encontro com Senhor. “Todo o que pretende ser um servo de Deus é convidado a realizar Seu serviço como se cada dia fosse o último.” (Ellen G. White, Maranata: O Senhor Vem![MM 1977], p. 106). Se fizermos dEle o Senhor do nosso coração, nós O receberemos alegremente por ocasião de Seu retorno à Terra.


Agora, convido você a orar a Deus. Na sua oração de consagração confirme ao Senhor o seu desejo de estar preparado quando Ele chegar e que deseja vê-Lo vindo naquela nuvem com glória e majestade! Não deixe esta decisão para mais tarde, pode ser tarde demais.


Que assim seja, é minha oração. “Amém. Vem, Senhor Jesus!” (Ap 22:20).