Michelson
Borges
Neste trimestre, os
irmãos da igreja Assembleia de Deus estão estudando em suas escolas dominicais
o tema “Os Dez Mandamentos: Valores divinos para uma sociedade em mudança”. Até
agora, tudo vinha muito bem. Estudaram o primeiro mandamento. O segundo e o terceiro.
Mas eis que chega o quarto, e o esperado acontece: dizem que esse mandamento
não é bem assim; é “controverso”. Temos que amar a Deus sobre todas as coisas?
Sim, claro. Não devemos adorar imagens? Sem dúvida. Não tomar o nome de Deus em
vão? Jamais. Lembre-se do dia de sábado – o sétimo dia da semana – para
santificá-lo? Aí, não. Esse mandamento era apenas para os judeus e foi “cravado
na cruz” – as desculpas de sempre. Lamentável! Será que o autor (ou autores)
desse guia de estudo tem noção do estrago que está fazendo ao desencaminhar
tantas pessoas? Afinal, a Assembleia de Deus é a maior denominação evangélica
do Brasil. Se ele (ou eles) estiver errado, estará atacando um dos dez
mandamentos da sagrada e imutável (Mt 5:17-19) lei de Deus, escrita com o dedo
dEle (Êx 31:18). Imagine se considerássemos o “não matarás” ou o “não
adulterarás” também controversos, passíveis de interpretação? Abriríamos mais
ainda a porta ao pecado e à transgressão. Então por que apenas um mandamento, o
quarto, é considerado “controverso”? Vamos analisar essa questão, em benefício
dos irmãos assembleianos e de todos os interessados no assunto. Para isso, é
muito importante que você confira os textos bíblicos citados e acesse todos os
links abaixo. E que faça isso com oração, pedindo orientação dAquele que
inspirou a Palavra de Deus, o Espírito Santo.
A lição nº 6 da Escola
Dominical deste trimestre (que pode ser lida aqui) começa afirmando que “o
sábado é um presente de Deus para o povo de Israel” e que “a fé cristã é isenta
de toda forma de legalismo”, já dando o tom do que vem a seguir. Para começo de
conversa, o sábado foi dado “por causa do homem [ser humano]” (Mc 2:27), no
Éden, para Adão e Eva, antes de existirem judeus ou quaisquer outros povos
sobre a Terra (Gn 2:1-3). Aliás, esse texto menciona que Deus fez três coisas
muito especiais e irrevogáveis no sétimo dia da criação: Ele descansou (cessou
Sua obra e deu exemplo do que fazer no sábado), santificou (separou para um
propósito especial) o sétimo dia e o abençoou (o que Deus abençoa ninguém pode
“desabençoar”). Guardar o sábado, portanto, não tem nada a ver com legalismo,
muito pelo contrário, tem a ver com celebração e adoração.
O guia prossegue: “Deus
celebrou o sétimo dia após a criação e abençoou este dia e o santificou (Gn
2.2,3). Aqui está a base do sábado institucional e do sábado legal. O sábado
legal não foi instituído aqui; isso só aconteceu com a promulgação da lei.”
Essa separação entre o sábado institucional e o legal é inteiramente
artificial. Prova disso é que em Êxodo 16, antes de terem sido dadas as tábuas
com os dez mandamentos, o povo hebreu já estava sendo orientado a guardar o
sábado. Neste momento, é muito importante que você leia este texto (“O sábado
antes do Sinai”) e assista a este vídeo (clique aqui), com o mesmo título. Leia
e assista com atenção, porque mais adiante o guia de estudos assembleiano
chegará ao ponto de afirmar que os patriarcas não guardaram o sábado!
“O sábado
institucional, portanto, não se refere ao sétimo dia da semana; pode ser
qualquer dia ou um período de descanso”, afirma o guia. Como assim? De ponta a
ponta, no Antigo e no Novo Testamento, a Bíblia é clara em afirmar que o sábado
da lei moral (tanto o “institucional” quanto o “legal”, para usar a linguagem
artificial do guia) é o sétimo dia da semana. De acordo com Gênesis 20:8-11, o
sábado é o memorial da criação e deve ser guardado/celebrado justamente porque
Deus criou em seis dias literais de 24 horas. Os adventistas são criacionistas
exatamente (e principalmente) por esse motivo, e pregam o que está escrito em
Apocalipse 14:6 e 7, ou seja, que devemos adorar “Aquele que fez o céu, e a
terra, e o mar, e as fontes das águas” (numa alusão clara ao texto de Êxodo
20:8-11). Se o sábado pode ser qualquer dia da semana, por que os evangélicos
insistem, então, no domingo? Não deveriam guardar nem defender qualquer dia
santo, e simplesmente riscar da Bíblia deles o quarto mandamento.
Como eu havia dito há
pouco, o guia afirma que “os patriarcas não guardaram o sábado. O livro de
Gênesis não menciona os patriarcas Abraão, Isaque e Jacó observando o sábado”.
Se isso fosse critério para a nossa vida, poderíamos adotar a poligamia, já que
alguns patriarcas tiveram mais de uma esposa, e dispensar de vez o dom de
línguas dos pentecostais, já que nenhum patriarca (aliás, nenhum dos servos de
Deus na Bíblia) jamais falou as tais “línguas estranhas” (na verdade, Deus
concede Seu Espírito àqueles que Lhe obedecem: At 5:32). Apesar de seus
deslizes, os patriarcas procuraram ser fieis à lei de Deus (conforme você já
deve ter visto nos links acima), e a lei de Deus inclui o sábado. (Sobre o
sábado através dos séculos, leia este texto [aliás, leia todo o conteúdo desse
site].)
Outra mentira: “Nenhum
outro povo na história recebeu a ordem para guardar esse dia [o sábado]; é
exclusividade de Israel (Êx 31.13,17 [esse texto menciona os filhos de Israel,
e eu me considero um deles]).” Que falta faz ler a Bíblia com atenção. Veja
isto: “Bem-aventurado o homem [aqui não diz judeu] que fizer isto, e o filho do
homem que lançar mão disto; que se guarda de profanar o sábado, e guarda a sua
mão de fazer algum mal. E não fale o filho do estrangeiro, que se houver unido
ao Senhor, dizendo: Certamente o Senhor me separará do Seu povo; nem tampouco diga
o eunuco: Eis que sou uma árvore seca. Porque assim diz o Senhor a respeito dos
eunucos, que guardam os Meus sábados, e escolhem aquilo em que Eu Me agrado, e
abraçam a Minha aliança: Também lhes darei na Minha casa e dentro dos Meus
muros um lugar e um nome, melhor do que o de filhos e filhas; um nome eterno
darei a cada um deles, que nunca se apagará. E aos filhos dos estrangeiros, que
se unirem ao Senhor, para O servirem, e para amarem o nome do Senhor, e para
serem seus servos, todos os que guardarem o sábado, não o profanando, e os que
abraçarem a Minha aliança, também os levarei ao Meu santo monte, e os alegrarei
na Minha casa de oração; os seus holocaustos e os seus sacrifícios serão
aceitos no Meu altar; porque a Minha casa será chamada casa de oração para
todos os povos” (56:1-8; os grifos em “estrangeiro” e “todos” são meus,
justamente para destacar o fato de que Deus deseja que todas as pessoas guardem
Seus mandamentos, inclusive o sábado.)
Outro ponto: “O sábado
e a circuncisão são os dois sinais distintivos do povo judeu ao longo dos
séculos (Gn 17.11).” Igualar o sábado (estabelecido antes do pecado) com a
circuncisão (depois do pecado) é outra leviandade. Como vimos, o sábado foi
dado para a humanidade e é eterno, pois será guardado inclusive na nova Terra
(Is 66:22, 23). Já a circuncisão, de fato, foi dada aos descendentes de Abraão
e foi revogada pelos apóstolos (At 15:1-31). Em Romanos 2:25-29, Paulo chega a
dizer que é inútil ser circuncidado e não guardar a lei de Deus.
“A expressão ‘Lembra-te
do dia do sábado, para o santificar’ (Êx 20.8) remete a uma reminiscência
histórica e, sem dúvida alguma, Israel já conhecia o sábado nessa ocasião. Mas
parece [parece?] não ser referência ao sábado da criação.” Simplesmente
absurdo! Como não se trata de referência ao sábado da criação, se o próprio
texto dá o motivo pelo qual o sábado deve ser lembrado e guardado? “Porque em
seis dias fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo que neles há, e ao
sétimo dia descansou; portanto abençoou o Senhor o dia do sábado, e o
santificou” (v. 11).
O guia passa a usar
Jesus com o objetivo de continuar descaracterizando o mandamento que o próprio
Mestre guardou (Lc 4:16): “O Senhor Jesus Cristo disse mais de uma vez que a
guarda do sábado é um preceito cerimonial. Ele colocou o quarto mandamento na
mesma categoria dos pães da proposição (Mt 12.2-4).” Nada a ver! Jesus comparou
a atitude dos discípulos de matar a fome no sábado (o que, definitivamente, não
é pecado) com a dos homens de Davi, que só tinham os pães da proposição para
comer e lhes foi permitido fazer isso. A lição é clara: Deus ama os seres
humanos e criou a lei para eles e não eles para a lei. Os fariseus legalistas
distorceram muitos mandamentos de Deus, inclusive o sábado, e Jesus veio
ensinar a correta observância de Sua lei. Imagine o Cristo do Sinai (o Eu Sou
de João 8:58) dizendo algo assim: “No monte Sinai Eu lhes dei Meus mandamentos,
agora venho lhes dizer que aboli somente o quarto.” Faz sentido? Mas faz muito
sentido o próprio Legislador ter vindo para ensinar como devemos guardar Sua
lei. Só Ele tem autoridade para isso.
Veja mais esta: “Se o
oitavo dia da circuncisão do menino coincidir com um sábado, ela tem que ser
feita no sábado, nem antes e nem depois. Assim, Jesus mais uma vez declara o
quarto mandamento como preceito cerimonial e coloca a circuncisão acima do
sábado.” Típico argumento non sequitur, ou seja, uma ideia não tem nada a ver
com a outra e não se segue a ela. Se preferir, pode chamar também de “balaio de
gato”. Sinceramente, quem escreveu essas coisas terá que dar contas a Deus!
Circuncisão era uma atividade religiosa, assim como o culto de sábado, a visita
aos doentes, etc. Que pecado há em se praticar essas coisas no sábado? Onde
está escrito isso? Pelo contrário, a Bíblia diz que “é lícito fazer bem aos
sábados” (Mt 12:12). Essas coisas não são atividades seculares nem são
remuneradas. Por que Deus “trabalha” no sábado? (Jo 5:17). Porque a atividade
dEle consiste unicamente em manter-nos a todos com vida. A atividade de Deus é
essencialmente “religiosa” e plenamente de acordo com o espírito do sábado.
Francamente, não usemos Deus o Pai nem o Filho para sancionar nossas
transgressões! Isso é grave!
Com isto eu tenho que
concordar: “Jesus é o Senhor do sábado (Mc 2.28). O sábado veio de Deus e
somente Ele tem autoridade sobre essa instituição.” E Ele em momento algum, em
versículo nenhum sequer sugeriu que o sábado devesse ser substituído pelo
domingo. Na verdade, em Mateus 24:20, Ele antevê Seus seguidores ainda
guardando o sábado, quatro décadas no futuro. Se Ele fosse transferir o dia de
guarda ou abolir o sábado, certamente teria feito algum comentário a respeito
disso.
Outro absurdo: “O
primeiro culto cristão aconteceu no domingo e da mesma forma o segundo (Jo
20.19, 26).” O quê? Aqui é melhor citar o texto na íntegra: “Chegada, pois, a
tarde daquele dia, o primeiro da semana, e cerradas as portas onde os
discípulos, com medo dos judeus, se tinham ajuntado, chegou Jesus, e pôs-Se no
meio, e disse-lhes: Paz seja convosco” (v. 19). Eles estavam fazendo culto?
Onde é dito isso? Estavam era com medo de ser mortos como o Mestre havia sido.
Como podiam estar celebrando a ressurreição, se ainda nem criam nesse evento? E
o verso 26 diz que Jesus tornou a aparecer oito dias depois, ou seja, numa
segunda-feira.
Mais uma mentira: “O
dia do Senhor foi instituído como o dia de culto, sem decreto e norma legal,
pelos primeiros cristãos desde os tempos apostólicos (At 20.7; 1Co 16.2; Ap
1.10). É o ‘sábado’ cristão! O sábado legal e todo o sistema mosaico foram
encravados na cruz (Cl 2.16,17), foram revogados e anulados (2Co 3.7-11; Hb
8.13). O Senhor Jesus cumpriu a lei (Mt 5.17,18), agora vivemos sob a graça (Jo
1.17; Rm 6.14).” O texto de 1 João 2:4 parece servir como uma luva em quem afirma
coisas como essas. Os primeiros cristãos, a começar por Maria, mãe de Jesus (Lc
23:56; texto escrito 30 anos depois), e os apóstolos guardavam o sábado (At
16:13). João, no Apocalipse, lá pelo ano 100 d.C., disse ter sido arrebatado em
visão no “dia do Senhor” (Ap 1:10), que, na Bíblia, é o sábado (Lc 6:5; leia
também isto). Quem ousou mudar o dia de repouso foi o imperador
pseudocristão/pagão Constantino, em 7 de março 323 d.C., tendo depois o aval da
Igreja Católica Apostólica Romana. Essa igreja, pelo menos, tem um argumento
“lógico” para o que fez: a autoridade do papa, que eles consideram até superior
à da Bíblia. Mas como ficam os evangélicos, ao perceber que não existe base
bíblica para se guardar o domingo? Têm que admitir que obedecem a um mandamento
católico...
Quanto a Colossenses
2:16 e 17, ali lemos o seguinte: “Ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber,
ou por causa dos dias de festa, ou da lua nova, ou dos sábados,que são sombras
das coisas futuras, mas o corpo é de Cristo.” O sábado da lei moral,
estabelecido na criação do mundo, não era sombra de coisas futuras, pois, como
já vimos, foi dado à humanidade antes do pecado. As cerimônias do santuário (a
chamada “lei cerimonial”), essas, sim, foram abolidas na cruz, pois apontavam
para Jesus, o “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (Jo 1:29). Leia
novamente Colossenses 2:16 e 17. Algum mandamento do Decálogo menciona comidas,
bebidas ou dias de festas? Claro que não. Isso pertence às cerimônias do
santuário. As festas judaicas – como Páscoa, Primícias, Dia da Expiação – eram
feriados nacionais, dias de descanso, por isso também chamadas de sábados, mas
eram distintas do sábado semanal do quarto mandamento.
E a conclusão do guia
da Assembleia de Deus é a seguinte: “A palavra profética anunciava o fim do
sábado legal (Jr 31.31-33; Os 2.11). Isso se cumpriu com a chegada do novo
concerto (Hb 8.8-12). Exigir a guarda do sábado como condição para a salvação
não é cristianismo e caracteriza-se como doutrina de uma seita.” Aqui fica
claro a quem eles querem atacar. Nenhum adventista do sétimo dia esclarecido
crê ou ensina que a salvação se conquista pela guarda do sábado. Isso seria
absurdo, e o guia mente uma vez mais. Cremos que a salvação é pela graça (Ef
2:8), inteiramente pelos méritos de Cristo. Obedecemos à lei de Deus porque
entendemos que Ele sempre quer o melhor para nós (Sl 119:97); porque ela é como
um espelho que mostra o pecado em nós mesmos (Tg 1:23-25) e aponta para Jesus
como a solução. A lei diagnostica o pecado; Jesus perdoa. Amamos a Cristo e por
isso obedecemos aos Seus mandamentos (Jo 14:15). Se isso é ser “seita”, prefiro
pertencer a essa seita. Os primeiros cristãos também enfrentaram esse tipo de
acusação (At 24:14).
O guia de estudos da
Assembleia de Deus deste trimestre acusa na capa a sociedade de estar em
mudança, mas se esquece de que os evangélicos aceitaram uma mudança muito pior
que a da sociedade: a mudança na lei de Deus, promovida pelo poder descrito em
Daniel 7:25 e Apocalipse 13. Oro para que muitas pessoas sinceras, ao estudar
esse guia da Escola Dominical, sejam despertadas pelo Espírito Santo, façam
perguntas, questionem a si mesmas e a seus líderes, e tenham a humildade de reconhecer
o verdadeiro Deus Criador e Seu memorial eterno da criação.
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