Adolfo
S. Suárez*
Resumo:
Ultizando-se de diversos acadêmicos, tais como Walter D. Mignolo, Gloria E.
Anzaldúa e Boaventura de Sousa Santos, o autor compõe um quadro
teórico-comparativo entre as modernas teorias sociais e o contexto
sócio-cultural vivido por Ellen G. White. Para formação de tal quadro teórico,
o autor elegeu uma das mais importantes crises vividas pelo movimento
adventista, ocorrida na Assembleia da Associação Geral de 1888. Perceber os
posicionamentos e o papel de Ellen G. White em tal momento histórico é poder
compreender melhor a personagem histórica. Ao final, é demonstrado que ela
detinha um poderoso “pensamento liminar”, fruto de uma vida “na fronteira”.
Essas características tornaram possível ser ela o ponto de equilíbrio que
possibilitou a resolução dessa crise.
Abstract: Using concepts developed by several scholars, such as
Walter D. Mignolo, Gloria E. Anzaldúa and Boaventura de Sousa Santos, the
author composes a theoretical-comparative framework between modern social
theories and socio-cultural context lived by Ellen G. White. To form this
comparative framework, the author choose one of the most important crisis that
take place in the Adventist movement, namely, the 1888 General Conference. To
realize the position and role of Ellen G. White in such a event is to
understand better this historical personality. The author demonstrates that she
had a powerful “border thinking,” produced by a life “in the frontier.” These
features make possible to she becomes a point of balance in the solution of
this crisis.
Introdução1
Recentemente, a Igreja
Adventista do Sétimo Dia (IASD) esteve presente na mídia nacional em pelo menos
quatro ocasiões. Primeiramente em 12 de setembro de 2007, quando a revista Veja
publicou uma reportagem com um título irônico: “Graças a Deus – e não a
Darwin”, na qual, além de fazer uma rápida descrição do sucesso do sistema
escolar adventista e ressaltar o fato de se ensinar o criacionismo, o repórter
destacou o crescimento impressionante das escolas adventistas nos últimos dez
anos: 37%. A revista menciona que, no mesmo período, as escolas católicas
tiveram taxa zero de expansão.2
A segunda ocasião foi
no dia 20 de janeiro de 2008, mediante o editorial “Criacionismo, não”,
publicado pelo jornal Folha de São Paulo (Editorial – A2). A matéria comenta e
avalia a participação da ex-ministra Marina Silva em um evento sobre
Criacionismo e Mídia, promovido pelo Centro Universitário Adventista de São
Paulo, campus Engenheiro Coelho.3 No programa Realidade (SBT), veiculado em 23
de janeiro de 2008,4 a jornalista Ana Paula Padrão apresentou uma matéria sobre
a longevidade dos adventistas de Loma Linda, Estados Unidos. Foi enfatizado o
estilo de vida saudável dessa população. Finalmente, a revista IstoÉ, em sua
edição de 14 de maio de 2008, trouxe uma reportagem de duas páginas a respeito
de internatos escolares adventistas. “Na contramão do processo de extinção dos
colégios internos”, afirma o articulista, “a igreja adventista [sic] expande
seus institutos e universidades pelo País”. A IstoÉ informou que, ao todo, já
são 18 instituições em regime de internato.5
A despeito dos detalhes
das matérias, existe algo importante que essas mídias não mencionaram, mas que
está por trás desses empreendimentos destacados: eles se fundamentam na
ideologia de Ellen G. White (1827-1915). Desde 1872, data de seu primeiro
artigo sobre o tema, intitulado “A educação ideal”, ela já vislumbrava uma
educação em expansão, fundamentada numa prática holística, ou seja, o
desenvolvimento da mente, do corpo e do espírito.6 Seguindo suas orientações,
hoje existem mais de 6.000 escolas, colégios e universidades ao redor do mundo.
No Brasil, de meia dúzia de alunos em 1896, a educação adventista conta
atualmente com o significativo número de 135.000 estudantes, em mais de 550
unidades escolares.
A partir de uma
concepção de saúde preventiva, e da compreensão de que a saúde é o “braço
direito” da missão evangelizadora,7 ela orientou o estabelecimento de
instituições que cuidassem do estilo de vida das pessoas. Como resultado desses
conselhos, a IASD tem hoje aproximadamente 660 hospitais, clínicas, lanchas e
aviões de serviço médico, orfanatos e lares para idosos.
Quanto aos internatos,
Ellen G. White era uma de suas grandes promotoras, pois tinha a convicção de
que haviam sido estabelecidos a fim de preservar os jovens das más influências.
No seu entender, essas instituições deveriam prover uma “atmosfera doméstica”
aos jovens, para resguardá-los “de tentações à imoralidade”.8 Diante desta
personalidade notável, capaz de orientar a implantação e desenvolvimento de
todo um estilo de vida, é necessário perguntar: quem foi Ellen G. White?
Elementos
teóricos e metodológicos
Ellen G. White faz
parte do trio de fundadores da IASD, ao lado de seu marido Tiago White e de
José Bates. Entretanto, sua influência literária e ideológica, assim como seu
exemplo de vida, é muito maior que a de qualquer outro líder da denominação, seja
do passado ou da atualidade. O historiador adventista George R. Knight afirma
que ela tem sido a adventista de maior influência na história desta Igreja. Sua
presença pessoal, assim como seus escritos, fez muito para moldar e guiar a
IASD durante as sete décadas de seu ministério. E desde sua morte, em 1915,
seus conselhos e percepções continuam iluminando e dirigindo esta Igreja.9
Os traços biográficos
de Ellen G. White mostram-nos uma pessoa forte e frágil, que transita a vida
toda entre dois mundos: o do feminino e o do masculino, o da saúde e o da
doença, o da submissão e o da “rebeldia”, o da obediência e o da
“transgressão”, o da consciência tranquila e o da consciência em luta, o do
espiritual e o do “secular”. De fato, observa-se uma mulher em intensa luta por
viver numa espécie de “encruzilhada” ou “fronteira” porque, mesmo que ela
sempre se empenhou intensamente na manutenção de uma denominação religiosa que
deveria caminhar em unidade de pensamento e prática, em alguns momentos ela
aparentemente possui um comportamento e discurso tidos como diferentes,
inaceitáveis, condenáveis. E sua postura na crise de Minneapolis (1888) é uma
prova disso. De igual maneira, Ellen G. White vive como quem está dentro de um
território geográfico e imaginário seguro, delimitado, mas também oferece
claras evidências de que está num lugar de não pertença, caminhando na direção
de um mundo mais ideal, diferente, melhor.
Esta vida “ambígua”,
característica de quem caminha no limiar territorial, de quem vive na fronteira,
e de quem luta contra a subalternização do saber e do viver, parece apontar
para elementos teóricos de três conceituados estudiosos: Walter D. Mignolo,10
Gloria E. Anzaldúa11 e Boaventura de Sousa Santos.12
A primeira teoria é o
pensamento liminar, de Walter Mignolo. Destaco duas razões pelas quais
considero que sua teoria oferece um parâmetro apropriado para compreender a
vida e obras de Ellen G. White. Primeiramente, a teoria de Mignolo permite o
reconhecimento e o resgate de teorias alternativas; permite voltar nossa
atenção para as mais diversas áreas, focando os olhares não apenas no que está
dentro do padrão da chamada “ciência”, mas também naquilo que está nas
“periferias”. Portanto, possibilita a valorização de outras lógicas, geralmente
“ignoradas” pela modernidade ocidental, acostumada à exploração de figuras
conhecidas, e que facilmente rejeita estudos sobre pessoas “diferentes”. A
segunda razão é que a teoria de Mignolo coloca em pauta a temática da não
hegemonização do conhecimento; a partir do pensamento liminar – e do pensamento
subalterno – pode-se argumentar que vale a pena discutir as ideias de uma
autora desconhecida, que, embora não seja uma teórica de renome, é
significativa para um grupo representativo da sociedade: os adventistas do
sétimo dia.
O segundo conceito que
norteará esta exposição é o conceito de fronteira, formulado por Gloria
Anzaldúa. Desta autora, destaco seu valor especialmente devido à possibilidade
do reconhecimento da existência de ideias importantes que nascem nas
“fronteiras”, que devem ser resgatadas. Essas ideias podem ser fruto de
reflexão “dupla”, que permite enxergar a vida e seus dilemas tanto pelo olhar
“comum” como pelo olhar diferente, “transgressivo”.
Finalmente, a terceira
teoria que orienta esta reflexão é a sociologia das ausências, de Boaventura de
Sousa Santos, a qual estabelece a possibilidade de pensar que não há uma única
forma padrão de racionalidade, o que permite outras alternativas ideológicas.
Especialmente, Santos abre margem para a valorização de conhecimentos leigos e
populares, tornando visível e presente o que o conhecimento padronizado taxa
como invisível e ausente.
Como se percebe, os
três autores mencionados caminham numa mesma direção: valorizar o não
valorizado, pôr em pauta o esquecido, trazer para o centro o que está à margem.
Em resumo: as ideias “liminares”, “fronteiriças” e “ausentes” têm seu espaço,
desde que amparadas por uma teoria e prática humanizadoras.
Farei, então, uma
abordagem sócio-cultural da pessoa de Ellen G. White, refletindo sobre sua
atuação a partir da ótica dos teóricos acima mencionados. O objetivo é
descrever e entender de que maneira Ellen G. White pode ser configurada como
tendo vivido nas “fronteiras” de sua sociedade e da IASD, e como isto pode ser percebido
no desdobramento dos acontecimentos de Minneapolis.
A
singularidade de Ellen G. White
Numa análise social e
cultural, encontramos vários elementos que evidenciam Ellen G. White como uma
pessoa no mínimo diferente e singular, e, em alguns casos, extraordinária. Eis
alguns exemplos:
1. Mulher em meio a
líderes religiosos. Líderes religiosos masculinos costumam ser inflexíveis,
irredutíveis, pois além de terem ao seu favor uma cultura machista, ainda tem o
grande trunfo de legitimar seu poder através da autoridade divina. Ainda hoje
as mulheres têm pouco espaço nos ambientes ligados à religião.
2. Seu carisma é outro
aspecto singular. E entenda-se, aqui, carisma como qualidade especial de
liderança, derivada de sanção divina, mágica, ou apenas de individualidade
excepcional. É fato histórico conhecido que a presença de Ellen G. White nas
reuniões campais pioneiras garantia uma grande frequência; havia um impacto
especial, diferente, quando ela pregava; havia expectativa. Referindo-se a
essas reuniões em fins da década de 1860, Arthur White afirma que “sua presença
era uma grande atração”.13 Em sua tese de doutorado defendida na John Hopkins
University, Ronald Graybill argumenta que o carisma de Ellen G. White se ajusta
à definição clássica de Max Weber,14 o qual afirma que a qualidade de uma
personalidade individual ocorre em virtude de ser dotada com qualidade
sobrenatural, sobre-humana, ou pelo menos com poderes ou qualidades
excepcionais.15
3. Escritora prolífica
e, provavelmente, a segunda autora mais traduzida de todos os tempos.16 Mais
ainda: dentre as mulheres notáveis da América do Norte, apenas Ellen G. White
teve uma obra literária prolífica, na verdade impressionante.
4. O dr. Malcolm Bull,
professor na Oxford University, nos chama a atenção para um detalhe muito
interessante. Ele diz:
Ao contrário do profeta
mórmon Joseph Smith, Ellen White não proclamou sua revelação e juntou um grupo
de partidários; até certo ponto, ela teve um tipo particular de experiência
religiosa que chegou a ser aceita como autorizada dentro de um grupo existente.
O ministério profético de Ellen White era um aspecto de experiência social
adventista, não só a experiência psicológica de um único indivíduo.17
O que o dr. Bull destaca é que Ellen G. White
não chamou a atenção para si, usando a seu favor o fato de possuir um dom
divino. Por que isso é significativo? Porque durante muitos anos a IASD foi
classificada como “cristianismo de fronteira” devido a, entre outras razões, a
reivindicação de “ter na pessoa de Ellen G. White um profeta moderno”, o que –
segundo esses críticos – significava colocá-la acima das Escrituras. George R.
Knight lembra o seguinte:
Durante o início do
século vinte, a maioria dos protestantes [ainda] considerava o adventismo uma
seita a ser evitada devido a seus pontos de vista heréticos. Muitos
classificavam os adventistas, assim como as testemunhas de Jeová, os cientistas
cristãos e os mórmons, como subcristãos.18
Um dos pontos
“heréticos” ainda é o dom profético. Ora, quando devidamente analisada, não há
semelhança entre Ellen G. White e qualquer outro pretenso profeta moderno: em
nenhum momento ela usou o dom profético para benefício próprio, seja em forma
de realização psicológica, financeira, familiar e mesmo religiosa. Além do
mais, há bastante base bíblica para uma manifestação profética.19
6. Há mais um aspecto
para o qual o dr. Bull chama a nossa atenção, que mostra a singularidade de
Ellen G. White:
Adotando o lema “Julgai
todas as coisas, retende o que é bom” [1Ts 5:21], Miller acumulou fatos
bíblicos e históricos para apoiar suas conclusões. Como o pregador
contemporâneo Charles Finney, Miller falou com audiências como se o fizesse
para um júri, construindo a evidência gradualmente para o caso que
apresentava.20
Revelando sua herança
ideológica deísta, Miller via a Bíblia como um “banquete da razão”;21 daí sua
estratégia de convencer racionalmente o auditório. A despeito de beber da fonte
milerita, Ellen G. White seguiu uma estratégia completamente diferente em seus
discursos e escritos. O historiador Alberto R. Timm atenta para o fato de que
nos escritos de Ellen G. White não encontramos “as tecnicalidades próprias da
exegese científica e nem mesmo a estruturação característica da teologia
sistemática convencional”. Além disso, “as discussões teóricas aparecem
frequentemente intercaladas de lições práticas para a vida diária”.22
Mas é justamente essa
diferença que, somada às várias que aqui já apresentei, tornam Ellen G. White
uma pessoa diferenciada, singular. Como o dr. Timm sugere, “é nessa abordagem
não sistemática que se encontram declarações embrionárias que fornecem os
parâmetros necessários para a elaboração de uma teologia verdadeiramente
integrativa da Palavra de Deus”.23 Em outras palavras, é mediante o discurso e
texto “polifônico-integrativo, caracterizado pelo inter-relacionamento
temático”, que Ellen G. White desenvolve seu raciocínio, em vez da linguagem
monofônico-concreta. Assim fazendo, seus escritos se tornam “uma fonte
inesgotável de conhecimento, estimulando o leitor a buscar um conhecimento
experiencial cada vez mais profundo de Cristo e de sua Palavra”.24
Embora
introdutoriamente já apresentei diversos exemplos da singularidade de Ellen G.
White, agora quero argumentar de maneira mais prolongada sobre dois exemplos
específicos: um ligado à sua infância e outro referente à crise de 1888.
Singularidade
na infância: a amarga lição de ser diferente
Sabemos que aos nove
anos de idade, Ellen G. Harmon (depois White) sofreu um acidente, cujas
consequências a afetaram pelo resto de sua vida.25 Um dia, na volta para casa,
ela e a sua irmã gêmea Elizabeth foram hostilizadas por uma colega quatro anos
mais velha. Num dado momento, quando Ellen virou a cabeça para ver a que
distância estava a garota, esta jogou uma pedra que acertou em cheio o seu
nariz; no mesmo instante, Ellen perdeu o sentido e caiu ao chão, desmaiada. O
acidente foi deveras grave, deixando-a inconsciente durante três semanas.
Diante de tão assustador quadro, que a reduzira “quase a um esqueleto”, apenas
sua mãe acreditava em seu restabelecimento. Na ocasião, uma bondosa vizinha até
se ofereceu para comprar o vestido de sepultamento de Ellen, mas sua mãe a
impediu justamente por acreditar que não morreria.
Após o acidente, Ellen
não conseguia ver felicidade alguma em sua vida. A pedra lhe havia quebrado o
nariz e desfigurado o rosto, e as pessoas tinham pena dela por causa disso. Ela
própria, ao se olhar no espelho, ficou chocada com a mudança ocorrida em sua
aparência. “Cada traço do meu nariz parecia mudado”, diz ela. “Os ossos de meu
nariz haviam-se fraturado, causando essa desfiguração.”26
Todavia, enquanto
lutava e resistia contra a morte física, houve uma “morte” que não pôde ser
evitada. Relembrando os momentos de infelicidade que se seguiram à recuperação,
ela própria afirma: “Quando pude voltar a brincar com minhas amiguinhas, fui
forçada a aprender a amarga lição de que nossa aparência pessoal influencia no
tratamento que recebemos de nossos companheiros”.27
Os que a visitavam
sentiam pena,28 mas não era a pena que a magoava. Causava-lhe imensa dor o fato
de ser rejeitada. Sentia-se rejeitada por ser diferente. “Quão mutável a
amizade de meus jovens amigos”, relata. “Um rosto bonitinho, um vestido
elegante, os atrai; mas permita-se que a desgraça os atinja, e a frágil amizade
esfria ou se rompe.”29 Entretanto, ela sabia que não são apenas as crianças que
sabem rejeitar. “Esses coleguinhas de escola não eram diferentes da maioria dos
adultos”, escreve Ellen G. White. Ao recordar sua rejeição na infância – e
lembremos que esse relato autobiográfico é feito na vida adulta – é provável
que ela tenha em mente as rejeições durante toda a sua vida, especialmente
quando seus conselhos e orientações estavam na contramão daquilo que a maioria
esperava. A crise de Minneapolis é um claro exemplo de rejeição.
Quando ela afirma que
as consequências desse acidente a afetaram pelo resto da vida,30 será que está
se referindo apenas a questões físicas? Ou ela se refere também a questões
emocionais? Creio que a segunda opção é bastante provável. Um incidente em especial
ilustra isso. Por ocasião do acidente, Robert, seu pai, estava no estado de
Geórgia a negócios. Ellen G. White relata em palavras vívidas o que aconteceu:
Ao chegar em casa, [meu
pai] abraçou meu irmão e minhas irmãs e perguntou por mim. Recuei timidamente,
enquanto minha mãe me apontava, mas meu próprio pai não me reconheceu. Foi-lhe
muito difícil acreditar que eu era sua pequena Ellen, a quem deixara poucos
meses antes como uma feliz e saudável criança. Isso feriu profundamente meus
sentimentos, mas tentei parecer animada, embora com o coração despedaçado.31
Não ser reconhecida
pelo próprio pai, a quem devotava admiração especialmente pelo seu fervor religioso
– sem dúvida, isso deve ter marcado profundamente a vida da pequena Ellen.
Temos, então, dois elementos de destaque logo na sua infância: rejeição e não
reconhecimento. Pessoas rejeitadas e irreconhecíveis vivem à margem ou, para
quem o preferir, pessoas que vivem à margem costumam ser rejeitadas e
irreconhecíveis. Vivem na fronteira. Esta é a tese defendida por Gloria
Anzaldúa, teórica cultural. Anzaldúa foi considerada como estando às margens do
cânone acadêmico. Afinal de contas, ela era cigana: nascida nos Estados Unidos,
mas de ascendência mexicana; ela era pobre: sua família possuía recursos
escassos; e ela era militante: ela se envolvia em causas sociais, algo incomum
para quem pretende construir uma carreira intelectual. Todavia, ainda assim conquistou
um espaço de respeito entre aqueles que refletem e escrevem a partir das
fronteiras. Ela própria diz:
Sou uma mulher da raia.
Cresci entre duas culturas, a mexicana (de forte influência índia) e a cultura
de expressão inglesa (que conheci enquanto membro de um povo colonizado na sua
própria terra). Tenho passado toda a minha vida com um pé de cada um dos lados
dessa fronteira entre o Texas e o México, e também de outras.32
Se bem que Anzaldúa reflete a partir de uma
fronteira geográfica específica – Texas e o México – sua “teoria se aplica a um
contexto mais amplo, já que ela reconhece que as fronteiras também existem em
outros espaços físicos e sociais”.33 Obviamente, a rejeição e a
irreconhecibilidade são atitudes sociais profundamente marcantes, pois negam à
pessoa o direito de pertencer a um grupo/mundo, forçando-a a passar a vida com
um pé de cada um dos lados dessa fronteira. As palavras de Ellen G. White –
“fui forçada a aprender a amarga lição de que nossa aparência pessoal
influencia no tratamento que recebemos de nossos companheiros”34 – parecem o
reflexo de uma profunda crise de rejeição em função dessa negação sofrida: ela
não era como se esperava que fosse. Ela era diferente; o tratamento dos amigos
e do pai confirma isso.
Em decorrência do
acidente, Ellen precisou enfrentar uma grande perda, que é relatada por ela da
seguinte maneira:
Minhas professoras
aconselharam-me a abandonar a escola, e não retomar os estudos antes de minha
saúde melhorar. A mais dura luta da minha juventude foi ceder à minha
fragilidade, e decidir que era necessário abandonar os estudos e renunciar à
esperança de ganhar uma educação.35
A fragilidade física a
afastou da escola para sempre, e ela classifica isso como “a mais dura luta” de
sua juventude. A razão do abandono é relatada por ela nos seguintes termos:
Meu sistema nervoso
estava abalado, e minhas mãos tremiam tanto que pouco progresso fiz na escrita,
e não pude conseguir mais do que simples cópias com má caligrafia.
Esforçando-me por me concentrar nos estudos, as letras da página pareciam
embaralhar-se, grandes gotas de suor afloravam-me ao rosto, e eu me esforçava e
desfalecia. Tinha tosse rebelde, e meu organismo todo parecia debilitado.36
No entanto, ela sempre
insistiu em seu desejo de frequentar a escola; na pré-adolescência, essa era
uma vontade que a deixava muito ansiosa, mas estava consciente de que isso
colocaria em risco sua própria vida.37 Finalmente, aos 12 anos de idade
reconheceu que não mais poderia ir à escola.38 Mais tarde, quando adulta, em
diversas ocasiões demonstrou interesse e vontade em estudar para melhor
desempenhar seu ofício de escritora. Mas o tempo de instrução formal já havia
passado para ela.
O leitor pode afirmar:
Ora, qualquer criança pode ser rejeitada por algum motivo, assim como qualquer
criança pode não ser reconhecida e aceita como deveria. Se você estiver
pensando assim, seu raciocínio está correto. No entanto, em relação a Ellen G.
White, podemos pensar que ela não era uma criança qualquer; de alguma maneira,
e guardando as devidas proporções, seu chamado ecoa Isaías 49:1: “O Senhor me
chamou desde o nascimento, desde o ventre de minha mãe fez menção do meu nome”.
Creio que o pastor Stockman, que dirigia a igreja metodista frequentada pela
pequena Ellen, teve essa percepção quando disse: “Ellen, você é tão menina! Sua
experiência é muitíssimo singular. Jesus deve estar preparando você para algum
trabalho especial”.39 O pastor Stockman tinha profunda percepção espiritual:
realmente, Ellen G. White havia sido chamada desde a infância para um trabalho
singular; podemos ver isso na maneira extraordinária como Deus conduziu seu
ministério.
A rejeição e o não
reconhecimento que ela sofreu na infância foram elementos pedagógicos muito
importantes para uma mulher que passou a vida ensinando que Deus não nos
rejeita; sobre rejeição, ela entendia desde a infância. Mas Ellen G. White
também aprendeu que Deus nos aceita sempre; isso é revelado em diversas
citações, como a que se segue, onde ela reflete sobre a capacidade e interesse
de Cristo de nos aceitar:
[Jesus diz:] Conheço as
vossas lágrimas; também eu chorei. Aqueles pesares demasiado profundos para
serem desafogados em algum ouvido humano, eu os conheço. Não penseis que estais
perdidos e abandonados. Ainda que vossa dor não encontre eco em nenhum coração
na Terra, olhai para mim e vivei.40
Sem dúvida alguma, sua
percepção aguda do que significava ser rejeitada e não reconhecida a
capacitaram a compreender profundamente a aceitação e o acolhimento de Deus.
Parece-me, então, que a amarga lição de ser diferente é um traço de
singularidade de Ellen G. White.
Singularidade
na atuação na crise de 1888: não submissão ao pensamento dominante na IASD
Em sua obra clássica
sobre a história da Igreja Adventista, Schwarz e Greenleaf falam de
controvérsia ao referir-se à Assembleia da Associação Geral de 1888, ocorrida
em Minneapolis, especialmente ao mencionar a aparente rejeição das palestras
proferidas por Waggoner e Jones.41 Controvérsia. Normalmente, uma controvérsia
acaba originando alguma crise, pois controvérsia implica em diferenças, e
quando não se sabe lidar com as diferenças – sejam quais elas forem – podem
surgir desavenças, e, então, a crise está instaurada. É muito fácil ilustrar
isso com a metáfora do casamento ou do namoro: qualquer controvérsia entre os
cônjuges ou namorados pode se transformar em crise, dependendo de como o casal
se comporta. Se não houver acordo, até uma salada mal temperada, uma camisa mal
passada, um atraso no horário combinado, ou o esquecimento de uma data
especial, pode ecloir em uma grande crise. E foi exatamente isso o que ocorreu
em 1888: uma crise.
Ao tratar do
relacionamento entre William White e sua mãe Ellen G. White, o dr. Jerry Moon
argumenta que a sessão de Minneapolis é lembrada como “a ocasião de uma crise
denominacional de primeira magnitude, que teve um impacto posterior que durou
anos no corpo” da Igreja Adventista.42 A própria Ellen G. White, numa carta
escrita no mesmo dia do encerramento da Assembleia, disse que naquela ocasião,
“inveja, más suspeitas e ciúmes atuaram como fermento até que toda a massa
parecia estar levedada”.43 Ela foi ainda mais enfática ao afirmar que “tivemos
a luta mais difícil e incompreensível entre dois bandos que alguma vez houve em
nosso povo”.44
Coincidentemente,
naqueles dias próximos ao evento de Minneapolis, Ellen G. White estava numa
crise pessoal causada por uma doença nervosa. Arthur White afirma que isso lhe
trouxe um profundo desânimo.45 Sobre essa crise pessoal, ela afirmou:
Não sentia nenhum
desejo de recuperar-me. [...] Não tinha força nem sequer para orar, nem nenhum
desejo de viver. Descansar, apenas descansar, era o meu desejo; estar em
silêncio e descansar. Ao me encontrar por duas semanas vítima de uma prostração
nervosa, havia esperado que ninguém suplicasse ao trono da graça em meu favor.
Quando a crise chegou, a impressão era que eu morreria. Este era meu
pensamento. Mas não era a vontade de meu Pai celestial. Meu trabalho ainda não
havia terminado.46
Controvérsia e crise. Duas palavras que
ocuparam um lugar importante no cenário de 1888, em Minneapolis. O conceito de
crise normalmente é visto como negativo. Mas as crises não são sempre negativas
em seus resultados. O psiquiatra alemão Erik Erikson, ao se referir à confusão
reinante na personalidade de sujeitos de pós-guerra, entende que a crise está
plenamente ligada à identidade. As crises podem desencadear possibilidades que
apontam para a identidade. Então, se o ser humano quiser solidificar sua
identidade, precisa enfrentar e superar a crise. Pode-se até afirmar que quando
não há crise, provavelmente não há identidade segura e madura.
Nesse sentido, a crise
não é uma catástrofe iminente, mas um ponto decisivo e necessário, uma espécie
de momento crucial, momento em que o desenvolvimento deve seguir uma ou outra
direção.47 A crise implica na necessidade de resolver o fracasso transitório que
resulta da tentativa de formar uma identidade estável, fugindo da confusão de
papéis.48 Podemos inferir, então, que, depois de uma crise, a pessoa ou
instituição pode alcançar sua identidade própria. Obviamente, para isso precisa
enfrentar a crise da maneira apropriada e madura.
Em decorrência do
cenário crítico instaurado em Minneapolis, perguntamos: qual foi a reação de
Ellen G. White diante da crise? A resposta a essa pergunta confirma a tese aqui
defendida: de que ela era extraordinariamente singular, notável. Além disso,
foi na crise de 1888 que, mais claramente do que em qualquer outra situação,
ela mostrou nitidamente seu espírito “liminar” e “insubmisso”, e esteve
disposta a arcar com as consequências disso.
Em seus dias, Ellen G.
White desempenhou um papel fundamental no surgimento e organização da IASD. Era
um papel “profético”. Mas ocorre que era a única mulher, convivendo com muitos
homens costumeiramente insensíveis e rudes, com uma liderança machista, que não
poucas vezes a rejeitou devido aos seus discursos e advertências, e talvez ao
próprio fato de ser mulher.
Após o início oficial
da organização adventista, em 1863, de modo geral o pensamento teológico da
denominação enfatizava o legalismo – argumentando que a vida cristã consistia
unicamente na estrita obediência à lei de Deus (os Dez Mandamentos contidos em
Êxodo 20).
Considerando que desde
o século dezenove os adventistas viviam numa cultura em grande parte cristã,
eles tendiam a não enfatizar as crenças em comum com outros cristãos. Afinal de
contas, por que pregar graça salvadora aos batistas? Eles já criam nela; ou
falar sobre oração aos metodistas? Eles não precisavam ser convencidos desse
assunto.49
Segundo a lógica dos
pioneiros, o importante “era pregar as verdades peculiarmente adventistas, para
que as pessoas pudessem converter-se doutrinariamente ao adventismo do sétimo
dia”.50 Houve, então, um distanciamento entre o adventismo e o cristianismo em
geral. Daí que, “próximo ao final da década de 1880, o adventismo precisava de
uma correção de curso em sua teologia”.51
Essa postura rígida
fora motivada, entre outras coisas, pelo projeto nacional norte-americano da
lei dominical e por questões de liberdade religiosa. Havia uma necessidade
imperante de manter intacta a importância da lei de Deus como um todo, e do
sábado especificamente. Afinal, como mudar de identidade doutrinária
precisamente no momento em que se exigia uma postura clara quanto ao sábado?52
Os líderes mais idosos
temiam que a nova ênfase que A. T. Jones e E. J. Waggoner estavam trazendo para
a Igreja – a exaltação de Jesus e o que significava ser salvo por ele –
silenciasse ou mesmo destruísse os ensinos característicos do adventismo.
Devemos, portanto, encarar as reuniões de de 1888 como “uma crise de identidade
de primeira ordem”.53
Foi nesse contexto que
ocorreu a reunião com a liderança mundial da Igreja. Nela, os dois jovens
pregadores Alonso T. Jones e Ellet J. Waggoner – de 38 e 33 anos
respectivamente – enfatizaram a necessidade do evangelho da “graça”. Esse
discurso pareceu liberal ao pensamento dominante, representado por Uriah Smith
e George I. Butler – 56 e 54 anos, respectivamente. Além da idade, imaginemos a
desproporcionalidade da “batalha”: dois jovens redatores da Califórnia
desafiando o redator-chefe da principal editora e o presidente da Associação
Geral. Para Butler, os dois pregadores não passavam de “frangotes” e de
“queridinhos dos White”.
Uma revisão dos
diálogos e da maneira como os contendores argumentavam, confirma a tese de
George Knight, de que “o fator central na dinâmica das reuniões da Assembleia
da Associação Geral de 1888 foi o conflito de personalidades”.54 Mais ainda: o
dr. Knight afirma que “a forte personalidade dos vários participantes da
Assembleia ajudou a montar o cenário para o conflito de Minneapolis”.55 Butler
admitia que tinha em sua natureza “muito do ferro, e pouco do amor de Jesus”,
ao passo que Smith dizia não estar preparado para mudar de opinião simplesmente
pela sugestão de uma novidade.56 Por outro lado, Waggoner parecia amar
discussões e contendas, enquanto que Jones tinha “o costume de tratar os outros
como se estivessem sob o seu comando”.57
O que impressiona nessa
guerra de egos é a postura de Ellen G. White; suas palavras impressionantes
são: “Precisamos agora [...] de uma religião de humildade”.58 Se bem que ela
possuía “credenciais ministeriais”, jamais foi ordenada ao ministério e nunca ocupou
alguma função oficial na Igreja.59 Por isso – e considerando ainda sua
importante credibilidade como mensageira do Senhor – teve a plena liberdade de
ser uma mediadora neutra entre os dois grupos contendores, especialmente entre
1884 e 1886. Mas, corajosamente, já em 1887 ela estava declarando que a Igreja
deveria ouvir os dois jovens pastores. Perto do encerramento dos trabalhos da
Assembleia de 1888, esse apoio se transformara em defesa aberta.60
Realmente, o que mais
incomodou à liderança da IASD foi o fato de Ellen G. White apoiar os dois
jovens pregadores, dizendo que essa fora “uma preciosa mensagem que Deus
enviara”. A postura de Ellen G. White incomodava profundamente porque
os adventistas do
sétimo dia tradicionalistas recorriam a pelo menos quatro formas de autoridade
humana para solucionar questões bíblicas e teológicas que perturbavam a
denominação em 1888”.61
A primeira era
simplesmente deixar que especialistas resolvessem as controvérsias. Essa
postura contrariava claramente “as raízes radicais e bíblicas da sola Scriptura
[somente as Escrituras] dos fundadores de sua mensagem”.62
A segunda forma de
autoridade humana era centralizar-se no poder da autoridade. Os representantes
da Igreja queriam fazer prevalecer sua voz devido à sua função ou cargo. A este
respeito, e referindo-se respectivamente ao presidente da Associação Geral da
IASD e ao redator-chefe da principal editora, Ellen G. White disse
enfaticamente:
Não devemos achar que o
pastor Butler e o pastor Smith são os guardiões da doutrina dos adventistas do
sétimo dia e que ninguém pode ousar expressar uma ideia que difira da deles.
Meu apelo tem sido: investiguem as Escrituras por vocês mesmos. [...] Nenhum
ser humano deve servir de autoridade para nós.63
A terceira forma de
autoridade humana oficializada pelos adventistas era a tradição religiosa.
Recorriam ao pensamento de que se “assim sempre cremos, assim continuaremos
crendo”. A última categoria era o explícito desejo de dogmatizar o pensamento
teológico pré 1888.
Resulta que o discurso
dos jovens pregadores californianos contrariava o pensamento teológico
dominante na IASD. Portanto, ao apoiá-los explicitamente, embora não
incondicionalmente, Ellen G. White se colocara como uma “pensadora liminar”,
uma “fronteiriça” que contrariava a forte liderança masculina da IASD, não
apenas rejeitando as formas de autoridade estabelecidas ao longo dos últimos
vinte anos, mas especialmente considerando-as espúrias e falsas. Qual foi o
resultado disso? Levantou-se uma oposição a Ellen G. White por parte da
liderança, oposição esta que se intensificou pelo fato de que ela reprovava
veementemente as “atitudes de muitos líderes da Igreja, além das profundas
concepções e claras mensagens relacionadas à política dos homens que
administravam as finanças da Associação Geral e da editora”.64
Ellen G. White
demonstrou possuir um “outro pensamento”, diferente daquele sustentado pela
maioria. Sua opinião era de que se houvesse algum ponto que não estivesse
claramente definido, e que não suportasse a prova da crítica, então deveria ser
abandonado, sem medo e sem orgulho.65 Contrariando a tendência de sustentar as
crenças com base na tradição religiosa e na autoridade humana, ela afirmou que
deveria haver evidência bíblica para cada ponto em que se avançasse.
Ter “outro pensamento”,
que destoe da maioria, mas que seja maduro, equilibrado, confiável, é o que
Walter Mignolo chama de “pensamento liminar”, necessário para obter ou
recuperar o direito de ser:
Um outro pensamento
[... e] uma maneira de pensar que não seja inspirada em suas próprias
limitações e que não pretenda dominar e humilhar; uma maneira de pensar que
seja universalmente marginal, fragmentária e aberta; e, como tal, uma maneira
de pensar que, por ser universalmente marginal e fragmentária, não seja
etnocida.66
“Outro pensamento” é
necessário não com objetivos de “salvação”, mas para
a descolonização e a
transformação da rigidez de fronteiras epistêmicas e territoriais estabelecidas
e controladas pela colonialidade do poder, durante o processo de construção do
sistema mundial colonial/moderno”.67
Mignolo entende que um
“outro pensamento” poderia ser implementado, não para necessariamente dizer a
verdade em oposição às mentiras, mas para pensar de outra maneira, caminhar
para “uma outra lógica” – em suma, para mudar os termos, e não apenas o
contexto da conversação.68
Na crise de
Minneapolis, claramente percebemos que Ellen G. White vai numa lógica não
esperada nem pela liderança nem pelos jovens reformadores, e sua intenção não é
meramente suavizar o discurso; sua intenção é mudar os termos, alterar a
estrutura do debate. Ela disse ainda em 1887: “Um reavivamento da verdadeira
piedade entre nós, eis a maior e a mais urgente de todas as nossas
necessidades. Buscá-lo, deve ser nossa primeira ocupação”.69 Aqui há uma
postura sábia e bastante madura: antes de discussões teológicas sobre a lei em
Gálatas – e outras questões – era necessária uma postura espiritual diferente.
Essa era a questão fundamental; se isso fosse resolvido, o conteúdo das discussões
seria compreendido da maneira apropriada.
Isso é o que podemos
denominar de “pensamento liminar”. Para Mignolo, o pensamento liminar é fruto
de uma vida na fronteira. Ou seja, o pensar diferente, o “outro pensamento”, é
produzido pelas pessoas que estão sem estar. Pertencem a um grupo, mas por serem
diferentes são capazes de percepções diferentes, ou divergentes, não captadas
por outros. Por transitar no limiar territorial, são capazes de uma
“consciência dupla, uma gnose liminar”, que lhes atribui
um potencial
epistemológico que lhe[s] foi tomado: conhecer tanto a razão do senhor quanto a
razão do escravo, enquanto o senhor [o dominante colonizador] conhece apenas
sua própria razão e [a] não razão do escravo”.70
Percebemos algo
interessante: Ellen G. White conhecia as razões dos “senhores” (Butler e
Smith), pois ela própria em algum momento da vida havia se inclinado a pensar
como eles a respeito do assunto debatido.71 Mas também conhecia por experiência
própria a necessidade de evitar uma religião legalista, e entender a vida
cristã da perspectiva de um relacionamento com a Pessoa de Jesus Cristo.
Posteriormente, em seu clássico O Desejado de Todas as Nações (1898), ela
escreveu que “o maior de todos os enganos do espírito humano, nos dias de
Cristo, era que um mero assentimento à verdade constituísse justiça”. Ela
entendia que “o conhecimento teórico da verdade” era insuficiente para a
salvação. E, como que numa recapitulação da disputa de Minneapolis, afirma
categoricamente:
Muitos se têm na conta
de cristãos, simplesmente porque concordam com certos dogmas teológicos, não
introduziram, porém, a verdade na vida prática. Não creram nela [a verdade] nem
a amaram; não receberam, portanto, o poder e a graça que advêm mediante a
santificação da verdade. Os homens podem professar fé na verdade; mas, se ela
não os torna sinceros, bondosos, pacientes, dominados, tomando prazer nas
coisas de cima, é uma maldição a seu possuidor e, por meio de sua influência,
uma maldição ao mundo.72
Não foi algo
insignificante Ellen G. White contrariar o presidente da IASD, principalmente
se lembrarmos que o pastor Butler ameaçou-a abertamente ao dizer que, se ela
não propusesse uma devida interpretação à questão da lei em Gálatas, diminuiria
a confiança do povo em seus “testemunhos” (escritos).73 Em outras palavras: “Ou
a senhora diz que a lei em Gálatas é a lei cerimonial, ou o povo, e mais
especificamente eu – o presidente da Associação Geral – não mais confiarei em
suas visões e orientações”. A resposta de Ellen G. White foi um frustrante
silêncio; ela “se recusou a ser um joguete na mão dos tradicionalistas que
praticamente exigiam que ela resolvesse a questão de Gálatas”.74
Eu diria que Ellen G.
White enfrentou com extraordinária firmeza o modelo de racionalidade que
Boaventura de Sousa Santos chama de “indolente”, mas que também podemos
chamá-lo de insensível e atrevido. De acordo com Santos, a razão indolente
impossibilita mudanças e transformações que signifiquem uma verdadeira
reforma.75 Por ser arrogante, a indolência imagina-se incondicionalmente livre,
sem necessidade de provas e argumentos; por ser metonímica, a indolência se
“reivindica como a única forma de racionalidade”, a única correta, não se dando
ao trabalho de buscar outras razões e lógicas; por ser proléptica, a indolência
não pensa no futuro, pois julga saber tudo agora, e se “concebe como uma
superação linear, automática e infinita do presente”.76
Claramente, Ellen G.
White enfrenta a arrogância de opiniões dogmatizadas pela tradição, que
reivindicam estar corretas porque sempre o estiveram, e que se julgam
autossuficientes, necessárias para o presente, e ponto final. “Para que
discutir? Sempre estivemos certos e sempre estaremos”, é o discurso indolente.
Por isso, apontando a caneta para Butler, afirmou em dezembro de 1888:
Não devemos achar que o
pastor Butler e o pastor Smith são os guardiões da doutrina dos adventistas
[...] e que ninguém pode ousar expressar uma ideia que difira da deles. [...]
Nenhum ser humano deve servir de autoridade para nós”.77
Mas ela não se
posiciona ingenuamente em favor de um dos lados. Foi a Jones e Waggoner que ela
disse em princípios de 1887: “Precisamos agora [...] de uma religião de
humildade”.78 Como que abominando a arrogância do pensamento que se acha tão
livre, independente e correto, a ponto de não precisar de provas e argumentos,
ainda em abril de 1887 a advertência de Ellen G. White a ambas as duplas foi a
seguinte: “Desejamos evidência bíblica para cada ponto em que avançamos”.79
Entretanto, ela reserva suas palavras mais duras aos que insistiam na manutenção
de uma religião legalista com base na tradição; a esses, Ellen G. White disse:
“Que Deus me livre das ideias de vocês, se ao recebê-las eu me tornasse tão
anticristã em espírito, palavras e obras como vocês”.80
Toda a coragem,
determinação e franqueza de Ellen G. White tiveram um alto preço. Foi acusada
de modificar sua teologia a respeito da lei em Gálatas; foi tratada com
desconfiança, e, para completar, a acusação de conspiração, em complô com
Jones, Waggoner e seu filho William, não pode ser desfeita. Foi nesse período
que ela atingiu o ponto mais baixo e crítico de sua influência.81 Como ela
reagiu a tudo isso? Ela não mudou de ideia quanto à importância da centralidade
de Cristo e da Palavra de Deus. Sete anos depois da Assembleia, em 1895, ela escreveu
que Jones e Waggoner eram “os homens a quem Deus comissionou para dar uma
mensagem especial ao mundo”.82 E advertiu com solenidade:
Se rejeitardes os
mensageiros delegados por Cristo, rejeitais a Cristo. Negligenciai essa grande
salvação conservada diante de vós durante anos, desprezai essa gloriosa oferta
de justificação pelo sangue de Cristo, e a santificação pelo poder purificador
do Espírito Santo, e não restará mais sacrifício pelos pecados, mas uma certa
expectação horrível de juízo e ardente indignação.83
Ellen G. White lutou
tenazmente contra o desejo quase generalizado de esquecer, ignorar, a essência
de Minneapolis. Ela não queria que a mensagem que os adventistas precisavam
ouvir caísse no esquecimento. Ela não queria que a mensagem de Deus fosse
tornada “ausente”. Ela queria, sim, que esse “outro pensamento” – a supremacia
da Palavra, a salvação unicamente por meio de Cristo e o evangelho da graça –
fossem o centro da ideologia e da prática da Igreja Adventista. Por isso, após
1888 ela é encontrada promovendo em diversos lugares a centralidade da Pessoa
de Cristo, com muito mais intensidade do que antes. Ela sabia que caso não
colocasse essa temática em pauta, seria facilmente esquecida porque ainda não
havia lugar para ela, de maneira consistente, na mentalidade dos chamados
“tradicionalistas”.
Isso nos remete
novamente a Boaventura de Sousa Santos, que adverte que a visibilidade dos
conhecimentos legitimados pela maioria dominante e poderosa causa a
invisibilidade de formas de conhecimento que não se encaixam em nenhuma forma
de conhecer oficialmente aceita. Santos se refere “aos conhecimentos populares,
leigos, plebeus”,84 e – por inferência – aos conhecimentos da minoria, dos
jovens teólogos, dos “frangotes”. Do lado de cá da linha está o conhecimento
“verdadeiro”, que determina o que é falso; é o conhecimento “inverificável”,
“infalível”. Do lado de lá está o conhecimento “falso”, irreal, “mera opinião”,
que não obedece ao critério de verdade.85 O que está do lado de cá é colocado
em evidência; o que está do lado de lá, é tornado ausente. Butler e Smith
representam a maioria poderosa, e que é visível; Jones, Waggoner e Ellen G.
White representam a minoria que pode ser tornada invisível, ausente. Mas, como
isso ocorre? Como algo relevante e verdadeiro pode ser tornado ausente,
invisível e “incorreto”?
O sociólogo Boaventura
de Sousa Santos nos ajuda a entender a questão, argumentando que certas coisas
e ideias são tornadas ausentes pela preponderância da razão metonímica, a qual
usa cinco lógicas ou maneiras para produzir a não existência.86 Primeiramente,
fazendo uso da “monocultura do saber e do rigor do saber”, a lógica metonímica
atribui não existência a todo saber não legitimado pelos cânones de verdade
(taxando-o de ignorância); a seguir, pelo uso da “monocultura do tempo linear”,
a razão metonímica torna invisível tudo o que é assimétrico em relação ao que
se entende como avançado ou apropriado para a época (taxando-o de atrasado ou
residual); além disso, mediante parâmetros de classificação racial, sexual e
social – lógica da classificação social – taxa-se como inferior o que não se
enquadra no padrão. Em quarto lugar, pelo uso da “lógica da escala dominante”,
taxa-se como local aquilo que não é global e universal; e, finalmente, pela “lógica
produtivista”, considera-se como improdutivo aquilo que não se desenvolve
economicamente.
O sentido geral de
“metonímica” é tomar a parte pelo todo; neste caso em que ora está sendo usado,
metonímica é a razão que reivindica ser a única forma correta de racionalidade.
Na crise de 1888, a “razão metonímica” é representada pelo pensamento dominante
de Butler e Smith, enquanto que Jones, Waggoner e Ellen G. White representam a
“razão impotente”, aquela que não se exerce porque pensa que nada pode fazer.
De maneira que, das cinco lógicas mencionadas acima, três aparecem de modo
claro, o que tipifica a teoria de Boaventura de Sousa Santos.
Primeiramente, Butler e
Smith tenta desqualificar o discurso de Jones e Waggoner argumentando que ele
não se enquadra nos cânones de verdade, pelo menos da verdade que se
convencionara como verdadeira: “A lei é importante e é nossa identidade
inegociável, e ponto final”. Também havia a questão da lei dominical que se
desenrolava assustadoramente no país, a ponto de, em 1882, as autoridades
californianas prenderem William White, o filho de Ellen G. White, porque ele fazia
funcionar a editora Pacific Press aos domingos.87 Diante de tudo isso, Butler e
Smith, e a “velha guarda”, criam que
remendar a validade da
interpretação profética adventista era bastante ruim, mas fazer mudanças
expressivas na teologia da lei significava desastre total. Afinal de contas, os
adventistas eram conhecidos por defenderem tenazmente a perpetuidade da lei no
ambiente hostil do evangelicalismo de fins do século dezenove.88
De modo que os líderes
da IASD fizeram todo o esforço possível para silenciar os dois jovens pastores,
e como não conseguiram seu intento, passaram a tratá-los de maneira bastante
rude.89
Em segundo lugar,
Butler e Smith argumentam que o discurso de Jones e Waggoner é assimétrico, não
se harmoniza com o que vem se ensinando nas últimas quatro décadas; é avançado
demais. É bom lembrar que, com a finalidade de defender a verdade do sábado num
ambiente religioso hostil, os adventistas optaram por proteger sua teologia
“interpretando a lei em Gálatas como regulamentos cerimoniais”. De tal maneira
“que a liderança da igreja entendeu que Jones e Waggoner estavam colocando em
risco uma das colunas centrais do adventismo”.90 Criam que essa nova teologia
era inovadora demais, estava fora do esquema, estava errada e não merecia credibilidade.
Em terceiro lugar,
Butler e Smith, usando subliminarmente de certo tipo de classificação social –
pois eles como mais velhos se consideravam melhores e mais confiáveis – taxam
como inferior e insignificante o argumento de Jones e Waggoner, pois criam que
a questão já fora resolvida definitivamente já em 1856, quando Stephen Pierce,
pastor adventista pioneiro, havia desafiado o ponto de vista de J. H. Waggoner
(pai de E. J. Waggoner) a respeito de que a lei em Gálatas era os Dez
Mandamentos. Pierce afirmou que a lei em Gálatas era a lei cerimonial.
Nessa ocasião, Tiago e
Ellen G. White se inclinaram ao ponto de vista de Pierce. Mais ainda: Butler e
Smith alegaram que Ellen G. White tivera uma visão e depois escrevera a J. H.
Waggoner afirmando que a lei em Gálatas não podia ser a lei moral.91 A verdade
é que essa carta nunca foi encontrada. Além do mais, devemos lembrar que, na
IASD, Smith “era autoridade insuperável em interpretação profética”,92 a ponto
de um dos jornais de Minneapolis anunciar sua chegada às reuniões de 1888 nos
seguintes termos: “O pastor Uriah Smith… tem a reputação de ser um dos
escritores e oradores mais capazes da Assembleia, e é também um profundo
erudito”.93
Para Boaventura de
Sousa Santos, a alternativa à razão indolente é a instauração de uma razão
cosmopolita, a fim de creditar existência reconhecida e visibilidade às
práticas autônomas e
democráticas que não ocupam o lugar do inteligível e/ou compreensível e que
muitas vezes se apresentam desvalorizadas ou vazias de conteúdo frente a outras
consideradas verdadeiras e legítimas”.94
Isso permitirá
compreender que, de acordo com o “antropologiano” Darcy Ribeiro,
o saber erudito é
tantas vezes espúrio e o não saber popular alcança, contrastantemente,
altitudes críticas, mobilizando consciências para movimentos profundos de
reordenação social”.95
No caso de Minneapolis,
a razão cosmopolita foi instaurada provocando profundas mudanças sociais e
teológicas. Há dois fatos claros para comprovar isso. O primeiro é que os dois
presidentes que sucederam a George Butler – os pastores O. A. Olsen (1888) e
George A. Irwin (1897-1901) – “reagiram positivamente aos jovens reformadores e
lhes deram ampla publicidade durante a década de 1890”. Eles se comunicaram com
a IASD “por meio das igrejas, lições da Escola Sabatina, colégios, escolas
ministeriais e editoras da denominação”.96
O segundo é a
transformação do ministério literário de Ellen G. White; após 1888, ela
escreveu livros que proclamavam mais amplamente a Cristo e a salvação por ele
oferecida: Caminho a Cristo (1892), O Maior Discurso de Cristo (1896), O
Desejado de Todas as Nações (1898), Parábolas de Jesus (1900) e os seis belos
capítulos cristocêntricos que compõem a primeira seção de A Ciência do Bom
Viver (1905). E mesmo seu envio à Austrália, sob o pretexto de que havia uma
grande obra a ser realizada nesse continente, acabou sendo mais um enraizamento
do adventismo como razão cosmopolita, além do que, por ironia e providência “os
anos que Ellen White passou na Austrália foram os mais produtivos” pelo fato de
“haver ajudado a estabelecer um sólido programa educacional naquele país novo”
e “por haver escrito O Desejado de Todas as Nações”,97 obra de grande
influência e impacto devocional entre os adventistas e mesmo entre os
simpatizantes da IASD.
Considerações
finais
Neste artigo, minha
intenção foi enfatizar a singularidade de Ellen G. White. Em termos sociais e
culturais, ela não foi uma pessoa comum; ela teve a ousadia de pensar e agir de
modo diferente. Por isso, vejo nela muitos dos elementos teóricos propostos
pelos pensadores pós-coloniais Walter Mignolo, Gloria Anzaldúa e Boaventura de
Sousa Santos.
De modo geral, é
possível medir a influência da figura e escritos de Ellen G. White verificando
seu impacto nas sociedades norte-americana e mundial. E quando atentamos para
isso, a convicção se fortalece ainda mais. Malcolm Bull, pesquisador e
professor da Oxford University, afirma:
O adventismo do sétimo
dia é uma das mais habilmente diferenciadas, sistematicamente desenvolvidas e
institucionalmente bem-sucedidas de todas as alternativas de estilo de vida
norte-americano. [...] O adventismo do sétimo dia está agora a caminho de se
tornar uma das principais religiões mundiais. [...] Durante o último século,
dobrou sua sociedade constantemente a cada quinze anos ou menos, com uma taxa
que se acelera com o passar do tempo. E mesmo se sua taxa atual de crescimento
for reduzida, há toda razão para supor que antes da primeira metade do século
vinte haverá por volta de cem milhões de partidários adventistas.98
A influência desta
adventista norte-americana – Ellen G. White – é notável e impressionante. Para
os acadêmicos, isso é motivo de pesquisa. Afinal, quem foi essa pessoa
extraordinária que, com quase nenhum estudo formal, foi capaz de escrever
aproximadamente cem mil páginas, e suscitar todo um estilo de vida? Para os
adventistas do sétimo dia, é uma comprovação de que, no momento certo, Deus
suscitou sua mensageira, e de que suas orientações são seguras.
Referências
1 Palestra da Semana
Acadêmica da Faculdade Adventista de Teologia (FAT) do Unasp-EC (“A mensagem da
justificação pela fé na IASD: Minneapolis, 120 anos depois”), proferida em 2 de
junho de 2008. ↑
2 Marcos Todeschini,
“Graças a Deus – e não a Darwin”, Veja, 12 de setembro de 2007. Disponível em
http://veja.abril.com.br/120907/p_116.shtml, acessado em 2 de abril de 2008. ↑
3 A matéria está disponível
em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2001200802.htm, acessado em 30 de
maio de 2008. ↑
4 A matéria pode ser
vista em http://www.sbt.com.br/sbtrealidade/multimidia/, sob o título
“Longevidade”. ↑
5 Aziz Filho e Jonas
Furtado, “O colégio interno não é mais aquele”, IstoÉ, 14 de maio de 2008.
Disponível em http://www.terra.com.br/istoe/edicoes/2010/artigo88167-1.htm,
acessado em 13 de maio de 2008. ↑
6 Ellen G. White,
Testemunhos para a Igreja (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2006), v. 3,
p. 131-160. ↑
7 Idem, Conselhos Sobre
Saúde (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1998), p. 212, 219. ↑
8 Idem, Conselhos Sobre
Educação (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1994), p. 154. ↑
9 George R. Knight, Meeting Ellen White: A Fresh Look
at Her Life, Writings, and Major Themes (Hagerstown, MD: Review and Herald,
2006), p. 7. ↑
10 Culturalista e
crítico literário, Walter Mignolo é Doutor pela École des Autes Etudes, Paris,
em 1974. Cidadão argentino, foi docente na Universidade de Toulouse, na França,
e nas Universidades de Indiana e Michigan, nos Estados Unidos da América. Desde
1993 é professor de Literatura e Antropologia Cultural na Duke University,
Estados Unidos. ↑
11 Nascida no Vale do
Rio Grande, no sul do Texas, em 1942, Gloria Anzaldúa recebeu seu diploma
superior da Universidade Pan American; concluiu o mestrado na Universidade do
Texas, em Austin, e estava em vias de completar seu doutorado na Universidade
da Califórnia em Santa Cruz quando, em 15 de maio de 2004, faleceu aos 61 anos,
devido a complicações relacionadas à diabetes. ↑
12 Boaventura de Sousa
Santos é doutor em Sociologia do Direito pela Yale University; atualmente é
professor da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, assim como
diretor do Centro de Estudos Sociais e do Centro de Documentação 25 de abril,
na mesma universidade. No momento, é um dos principais intelectuais das
Ciências Sociais. Sua produção bibligráfica enfoca uma “sociologia das
emergências” (com o propósito de valorizar as diversas experiências humanas), a
qual se contrapõe à “sociologia das ausências” (que motiva o desperdício da
experiência). ↑
13 Arthur L. White, Ellen White: Woman of Vision
(Nampa, ID: Pacific Press, 2003), p. 147. ↑
14 Maximillian Carl
Emil Weber (1864-1920) foi um intelectual alemão, jurista, economista,
sociólogo, historiador e político. Weber é considerado, junto com Karl Marx e
Émile Durkheim, um dos fundadores da sociologia e dos estudos comparados sobre
cultura e religião, disciplinas às quais deu um impulso decisivo. ↑
15 Ronald D. Graybill, “The Power of Prophecy: Ellen
G. White and the Women Religious Founders of the Nineteenht Century”, (tese de
Ph.D., John Hopkins University, 1983), p. iv. Para uma melhor
compreensão do “profeta” no conceito weberiano, veja Max Weber, Economia e
Sociedade: Fundamentos da Sociologia Compreensiva (Brasília: Editora UnB,
1999), v. 1. ↑
16 Uma pesquisa
realizada por Roger W. Coon, feita na Biblioteca do Congresso, Washington,
D.C., revelou os seguintes dez escritores modernos mais traduzidos: 1. Vladimir
I. Lenin, líder comunista russo – 222 línguas; 2. Georges Simenon, escritor
franco-belga de romance policial – 143 línguas; 3. León Tolstoy, romancista
russo – 122 línguas; 4. Ellen G. White, co-fundadora da IASD – 117 línguas
(mais de 140 a partir de 1996 tornam Ellen White possivelmente a segunda
escritora mais traduzida de todos os tempos); 5. Karl Marx, filósofo socialista
alemão – 114 línguas; 6. William Shakespeare, dramaturgo inglês – 11 línguas;
7. Agatha Christie, escritora inglesa de romance de mistério – 99 línguas; 8.
Jakob e Wilhelm Grimm, organizadores alemães de numerosos contos – 97 línguas;
9. Ian Flewming, criador britânico dos romanes policiais de James Bond – 95
línguas; 10. Ernest
Hemingway, romancista norte-americano – 91 línguas (Coon, A Gift of Light
[Washington, DC: Review and Herald, 1983], p. 30-31). ↑
17 Malcolm Bull e Keith Lockhart, Seeking a Sanctuary:
Seventh-day Adventism and the American Dream, 2a ed. (Bloomington,
IN: Indiana University Press, 2007), p. 28. Nas palavras do crítico literário
estadunidense Harold Bloom, professor nas universidades de Yale e Nova York, a
obra de Bull e Lockhart é o melhor estudo a respeito do adventismo, sob a
perspectiva da sociologia da religião (Bloom, The American Religion). ↑
18 George R. Knight,
Uma Igreja Mundial: breve história dos adventistas do sétimo dia (Tatuí, SP:
Casa Publicadora Brasileira, 2000), p. 143. ↑
19 Hoje parece haver um
tratamento diferente em relação à IASD. Pelo menos é o que se percebe no Censo
Demográfico de 2000, que classifica a IASD como “Igreja Evangélica de Missão”. ↑
20 Bull e Lockhart, Seeking a Sanctuary, p. 27. ↑
21 William Miller, Miller’s Apology and Defence
(Boston, MT: Joshua V. Himes, 1845), p. 12. ↑
22 Alberto R. Timm,
“Teologia nos escritos de Ellen White”, palestra apresentada no Concílio
Ministerial da Associação Geral da Igreja Adventista do Sétimo Dia, Toronto,
Canadá, em 29 de junho de 2000, p. 1. ↑
23 Ibidem. ↑
24 Ibidem. ↑
25 Dados biográficos
sobre a infância e juventudade de Ellen G. White podem ser encontrados em:
Ellen G. White, Life Sketches of Ellen G. White (Mountain View, CA: Pacific
Press, 1948); idem, Testemunhos para a Igreja, v. 1, p. 9-112; idem, Vida e
Ensinos (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2007). ↑
26 Idem, Testemunhos
para a Igreja, v. 1, p. 10. ↑
27 Idem, Life Sketches
of Ellen G. White, p. 18. ↑
28 Idem, Testemunhos
para a Igreja, vol. 1, p. 10. ↑
29 Ibid., p. 12. ↑
30 White, Life Sketches of Ellen G. White, p. 17. ↑
31 Idem, Testemunhos
para a Igreja, vol. 1, p. ↑ 11-12.
32 Gloria E. Anzaldúa, Borderlands/La Frontera: The
New Mestiza (San Francisco: Spinsters/Aunt Lute, 1987), prefácio. ↑
33 Sonia Torres, “La
conciencia de la mestiza/towards a new consciousness: Uma conversação
Interamericana com Gloria Anzaldúa”, Revista de Estudos Feministas 13/3 (2005). Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-026X2005000300016>,
acessado em 23 de abril de 2008. Sonia Regina Aguiar Torres da Cruz é doutora
em Literatura Comparada (UFRJ, 1998), e professora-adjunta do Instituto de
Letras da Universidade Federal Fluminense. ↑
34 White, Life Sketches of Ellen G. White, p. 18. ↑
35 Ibid., p. 19. ↑
36 White, Testemunhos
para a Igreja, v. 1, p. 13. ↑
37 Idem, Life Sketches of Ellen G. White, p. 29. ↑
38 Idem, Testemunhos
para a Igreja, v. 1, p. 13. ↑
39 Ibid., p. 29. ↑
40 Ellen G. White, O
Desejado de Todas as Nações (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1990), p.
483. ↑
41 Richard W. Schwarz e
Ffloyd Greenleaf, Portadores de Luz: história da Igreja Adventista do Sétimo
Dia (Engenheiro Coelho, SP: Imprensa Universitária Adventista, 2009), p. 182. ↑
42 Jerry Allen Moon, W. C. White and Ellen G. White:
The Relationship Between the Prophet and Her Son, Andrews University Seminary
Doctoral Dissertation Series 19 (Berrien Springs, MI: Andrews University Press,
1993), p. 82. ↑
43 Ellen G. White,
Mensagens Escolhidas (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1996), v. 3, p.
178. ↑
44 Idem, carta 82, 1888, em White, Ellen White: Woman
of Vision, p. 264. ↑
45 Ibid., p. 257. ↑
46 Ibidem. ↑
47 Erik Erikson,
Identidade, Juventude e Crise (Rio de Janeiro: Guanabara, 1987), p. 14. ↑
48 Calvin Stanley Hall, Gardner Lindzey e John B. Campbell,
Teorias da Personalidade (Porto Alegre, RS: Artmed, 2000), p. 173. ↑
49 George R. Knight, A Mensagem de 1888 (Hagerstown,
MD: Review and Herald, 1998), p. 23. ↑
50 Idem, Em Busca de
Identidade: o desenvolvimento das doutrinas adventistas do sétimo dia (Tatuí,
SP: Casa Publicadora Brasileira, 2005), p. 92. ↑
51 Ibidem. ↑
52 Para uma melhor
compreensão da questão das leis dominicais e sua influência no espírito dos
debates de Minneapolis, ver: Knight, A Mensagem de 1888, p. 56-57, 121-125;
idem, Em Busca de Identidade, p. 86-89, 91-93. ↑
53 Ibid., p. 92 ↑
54 Idem, A Mensagem de
1888, p. 26. ↑
55 Ibid., p. 30. ↑
56 Ibid., p. 26, 28. ↑
57 Ibid., p. 28, 29. ↑
58 Carta de Ellen G.
White E. J. Waggoner e A. T. Jones, 18 de fevereiro de 1887. ↑
59 Knight, Uma Igreja
Mundial, p.105. ↑
60 Idem, A Mensagem de
1888, p. 30. ↑
61 Idem, Em Busca de
Identidade, p. 93-95. ↑
62 Ibid., p. 93. ↑
63 Carta de Ellen G.
White a William M. Healey, 9 de dezembro de 1888. ↑
64 Herbert E. Douglass,
Mensageira do Senhor: o ministério profético de Ellen G. White (Tatuí, SP: Casa
Publicadora Brasileira, 2000), p. 235. ↑
65 Ellen G. White,
carta a George I. Butler, de 5 de abril de 1887. ↑
66 Walter D. Mignolo,
Histórias Locais, Projetos Globais: colonialidade, saberes subalternos e
pensamento liminar (Belo Horizonte: UFMG, 2003), p. 104. ↑
67 Ibid., p. 35. ↑
68 Ibid., p. 106. ↑
69 Ellen G. White, Review and Herald, 22 de março de
1887. ↑
70 Mignolo, Histórias
Locais, Projetos Globais, p. 217. ↑
71 Knight, A Mensagem
de 1888, p. 37. ↑
72 White, O Desejado de
Todas as Nações, p. 309-310. ↑
73 Carta de George. I.
Butler a Ellen G. White, 1 de outubro de 1888. ↑
74 Knight, A Mensagem
de 1888, p. 59. ↑
75 Cristina Contrera,
“Apuntes sobre algunas ideas tratadas por el Prof. Boaventura de Souza Santos”,
http://ipes.anep.edu.uy/documentos/curso_dir_07/produccion/Boa.pdf, acessado em
29 de abril de 2008. Uma compreensão da “sociologia das ausências” pode ser
obtida em Boaventura de Sousa Santos, “Para uma sociologia das ausências e uma
sociologia das emergências”, em Boaventura de Sousa Santos, org., Conhecimento
Prudente para uma Vida Decente: um discurso sobre as ciências revisitado (São
Paulo: Cortez, 2004), p. 777-821. ↑
76 Santos, “Para uma
sociologia das ausências e uma sociologia das emergências”, p. 780. ↑
77 Ellen G. White,
carta a William M. Healey, 9 de dezembro de 1888. ↑
78 Knight, A Mensagem
de 1888, p. 26. ↑
79 Ibid., p. 46. ↑
80 Ellen G. White, manuscrito 55, 1890. ↑
81 Idem, manuscrito 24,
1888. ↑
82 Idem, Testemunhos
para Ministros e Obreiros Evangélicos (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira,
1993), p. 79. ↑
83 Ibid., p. 97. ↑
84 Boaventura de Sousa
Santos, “Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de
saberes”, Revista Crítica de Ciências Sociais 78 (2007). Disponível em
http://www.ces.uc.pt/bss/documentos/Para_alem_do_pensamento_abissal_RCCS78.pdf,
p. 3, acessado em 23 de abril de 2008. ↑
85 Santos, “Para além
do pensamento abissal”, p. 4. ↑
86 Essas cinco lógicas
são desenvolvidas em Santos, “Para uma sociologia das ausências e uma
sociologia das emergências”, p. 787-789. Ver também Contrera, “Apuntes sobre
algunas ideas tratadas por el Prof. Boaventura de Souza Santos”. ↑
87 Knight, Em Busca de
Identidade, p. 93-94. ↑
88 Idem, A Mensagem de
1888, p. 36. ↑
89 Idem, Meeting Ellen White, p. 63. ↑
91 Ibid., p. 38. ↑
92 Ibid., p. 27. ↑
93 Pioneer Press, 17 de
outubro de 1888, em Knight, A Mensagem de 1888, p. 26. ↑
94 Contrera, “Apuntes
sobre algunas ideas tratadas por el Prof. Boaventura de Souza Santos”. ↑
95 Darcy Ribeiro, O
Povo Brasileiro: a formação e o sentido do Brasil (São Paulo: Companhia de
Bolso, 2007), p. 15. ↑
96 Knight, Uma Igreja
Mundial, p. 94. ↑
97 Douglass, Mensageira
do Senhor, p. 64. ↑
98 Bull e Lockhart, Seeking a Sanctuary, p. xiii. ↑
*Adolfo
S. Suárez, Mestre em Ciências da Religião
Professor das
Faculdades de Teologia, Pedagogia e Direito do Unasp-EC
Fonte: Revista
Parousia, 1° e 2° Semestre de 2009, UNASPRESS
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