Teologia

sexta-feira, 30 de setembro de 2022

VOLTA DE JESUS: A ÊNFASE ESQUECIDA


 por Rubens Lessa*

Quando se prega ou escreve sobre a volta de Jesus, a tendência é girar em torno de assuntos periféricos

Quando eu era criança, quase todas as pregações sobre a volta de Jesus me deixavam assustado e com medo. E pensava: "Quando eu me tornar adulto, esse temor vai desaparecer." Ledo engano. Na adolescência e juventude, fui perseguido pelo mesmo sentimento: expectativa, sensação de despreparo, ideia de perigo à vista.

Tenho pensado muito sobre isso, ultimamente, e noto que a maioria das pessoas de minha faixa etária passou pela mesma experiência.

Por quê?

Ao buscar uma resposta que me pudesse convencer, fiz duas coisas: puxei gavetas do arquivo da memória e examinei exemplares antigos da Revista Adventista e de O Atalaia. Examinei também as edições mais recentes de nosso órgão denominacional. Conclusão: a ênfase dos artigos publicados em nossas revistas e dos sermões que tenho ouvido ao longo do tempo, recai num chavão: sinais e iminência da volta de Jesus.

Mas o leitor deve estar perguntando: Não devemos falar sobre esses aspectos? Sim, devemos, mas sem nos esquecermos da ênfase que a volta de Jesus merece.

Relembrando

Em setembro de 1917, quando a Primeira Guerra Mundial estava em andamento, a Revista Mensal, precursora da Revista Adventista, publicou um artigo de F. S. Spies, intitulado: "Acaso não virá logo?" O autor conta que, numa campal realizada na América do Norte, estava presente um idoso irmão que havia durante quase toda a sua vida cooperado na proclamação da terceira mensagem. Ele estava triste e abatido, sentado no fundo de sua barraca. Ao passar por ali, um dos dirigentes perguntou-lhe: "Que tem o irmão? Parece triste e desanimado."

- Sim - respondeu o velho. - Já há quase 50 anos que estou a pregar a este povo que Jesus logo virá. Esta verdade tem esforçado minha alma nas lutas e tentações. Ainda creio nela tão firmemente como nunca antes. Mas estou ficando cada dia mais velho e mais fraco. Eu contava que havia de ver a Jesus vindo nas nuvens do céu, sem primeiro morrer, mas esta esperança vai-se desvanecendo. E isto que me faz abatido e triste. Ah , acaso não virá logo?

Um pouco antes de estourar a Segunda Guerra Mundial, em 1939, L. H. Christian escreveu um artigo na Revista Adventista, sobre "Sinais do dia por vir". Ele menciona os marcos proféticos, os sinais que proclamam a proximidade do fim e "nossa relação com o Céu". No segundo parágrafo, adverte: "A humanidade vive hoje uma atmosfera de intensa expectação. Por toda a parte o povo diz: Alguma coisa vai suceder, algum grande acontecimento tem que ocorrer', mas não sabe qual é."

Em maio de 1942, J. E Wright fez veemente apelo aos leitores de nossa Revista, ressaltando as palavras de Jesus: "Estai vós apercebidos". O artigo, de forte conteúdo espiritual, alertava: "Oh, se pudéssemos avaliar, na íntegra, compreender profundamente a solenidade da hora presente! Estamos na hora do juízo; a tríplice mensagem está atingindo agora os remotos confins da Terra. Estamos mais próximos do fim, do que pensamos."

"Está chegando a hora zero", foi o título de um artigo escrito por Valdemar R. da Silva, em O Atalaia de julho de 1944. Esse título, na verdade, é uma frase dita por Churchill, referindo-se à invasão da Europa pelos aliados. O Pastor Silva diz inicialmente: "Isto nos leva a pensar seriamente numa outra 'hora zero', decisiva para toda a humanidade, e que rapidamente se aproxima: a 'hora zero' para o mundo, a qual está mais próxima do que pensam muitos descuidados e procrastinadores."

O assunto da volta de Jesus sempre teve espaço nobre em nossas publicações. O Atalaia de setembro de 1939 trazia na página 7: "Prepara-te para te encontrares com o teu Deus"; Revista Adventista: "Quando vem Jesus?" (março de 1940); "Guarda, que houve de noite?" (outubro/1940); "Por que desejo a volta de Jesus" (dezembro/1940); "Jesus voltará" (maio/1943).

Todos os artigos publicados por nossas revistas, durante as duas guerras mundiais, são interessantes, mas o único a dar a ênfase adequada foi o de dezembro de 1940. N . P. Nielsen começa dizendo: "Alguém me fez a pergunta: Por que o senhor deseja que Jesus venha outra vez?"

Qual foi a resposta? Bem, controlemos nossa curiosidade por alguns instantes...

Ênfase recente

No dia 9 de julho de 1990, na cidade de Indianapolis, o Pastor Enoch de Oliveira, de saudosa memória, pregou eloquentemente sobre o tema: "Nos O veremos no cumprimento da profecia". Antes do apelo, disse: "A hora está avançada. Dias de tribulação há muito preditos acham-se diante de nós. O dia eterno em breve raiará. O que fazemos, temos de realizar depressa. Se perdermos este sentido de urgência, perderemos a própria essência do adventismo." Numa assembleia daquela natureza, a mensagem foi oportuna. Eu estava presente. Senti-me comovido.

Explorando outro ângulo, Francisco Lemos afirmou na Revista Adventista de novembro de 1991: "É lastimável que continuemos a vincular o preparo para o segundo Advento com as nossas obras e nosso esforço próprio". Na mesma edição, Paulo Pinheiro analisou "como a igreja vê a volta de Jesus". Várias crianças de uma escola adventista foram entrevistadas.

Alguns trechos:

"Se Ele vier hoje, não estarei preparado para um lugar tão bonito como aquele" (Bruno, 10 anos).

"Se Jesus vier hoje, não vou estar preparado, porque há muitas coisas para fazer e não as fiz ainda" (Daniel, 10 anos).

"Eu espero Jesus feliz, alegre, contente e, às vezes, triste" (Eliane, 10 anos).

"Jesus pode vir hoje, amanhã, qualquer dia; mas que vou com Ele, eu vou" (Felipe 10 anos).

E o que pensam os adultos? Na Casa Aberta de 1991, uma pesquisa realizada em nome da Revista Adventista, mostrou as tendências de nosso povo. Dos 455 entrevistados:

• 83,8% disseram que o assunto da volta de Jesus lhes causa alegria;

• 94,2% afirmaram que somente Deus sabe o dia;

• 95,7% acharam que Cristo não veio porque a igreja não está preparada como deveria;

87,6% disseram que crer em Cristo e depender inteiramente dEle é a condição para estar preparado.

Luz no final do túnel

Outro artigo que despertou minha atenção para o enfoque que precisamos dar ao tema da volta de Jesus, foi escrito por Lester Bennett, na edição de janeiro de 1988. Logo no início, ele afirma: "Vejo na Igreja Adventista não apenas uma crença na Segunda Vinda, mas uma fascinação a respeito do tempo em que ela deverá ocorrer."

Aqui está o nó górdio. Precisamos desatá-lo, sob pena de continuarmos no mesmo diapasão. Nosso erro é o seguinte: falamos mais sobre o tempo, ou a iminência do evento, do que sobre a "bendita esperança". Foi por isso que, na infância, adolescência e juventude, eu ficava com medo e assustado. A volta de Jesus era apresentada como um dia de juízo. Além disso, os pregadores salientavam muito a perseguição, as pragas, o tempo de angústia. Passei a depositar minha fé nos "sinais", e não em Cristo e Suas promessas. O fato é que ouvi muito pouco sobre a promessa: "Virei outra vez" (João 14:3). Por que se prega tão pouco sobre João 14:1-3?

Quando meu pai descansou em Cristo, a volta de Jesus passou a ter mais significado para mim. O desejo de rever esse ente querido, que me inspirou a trabalhar na obra do Senhor, despertou em mim outras expectativas. Passei a falar menos sobre os acontecimentos que precederão a volta de Jesus, para falar mais e mais sobre o encontro com Ele. Sim, os sinais são ainda importantes para mim, pois foram preditos pelo próprio Jesus, mas Jesus é mais importante do que os sinais! É importante saber que Jesus está às portas, mas será muito mais significativo encontrá-Lo na nuvem de glória.

Cumprindo o que prometi linhas atrás, volto agora à pergunta dirigida ao Pastor Nielsen: "Por que o senhor deseja que Jesus venha logo?" Sua resposta foi sublime e inteligente: "Porque Ele é meu Amigo. Perdoou os meus pecados. Ele me ama e aprendi a amá-Lo. Desejo vê-Lo como Ele é. Ouvi a Seu respeito, mas quero contemplá-Lo face a face e estar em Sua presença. Doces são as histórias de Seu maravilhoso amor, e elas me cativaram a alma. Quero vê-Lo em toda a Sua formosura e deleitar-me nos sorrisos de Seu amor. Sim, alegro-me de que Ele virá outra vez, pois é meu Amigo."

Meus irmãos, o encontro com Jesus é o assunto que deve conquistar todas as nossas afeições, e não questões periféricas. Neste sentido, Paulo deixou-nos um grande exemplo. Se, diante do carrasco, o apóstolo tivesse posto os olhos na espada que ia decepar sua cabeça, teria sucumbido. Notemos, porém, o que ele fez: "O apóstolo estava a olhar para o grande além, não com incerteza ou terror, mas com esperança gozosa e anelante expectativa. Ao encontrar- se no lugar do martírio, não vê a espada do carrasco ou a terra que tão “logo lhe há de receber o sangue; olha, através do calmo céu azul daquele dia de verão, para o trono do Eterno” (Atos dos Apóstolos, p. 511 e 512).

Muitos adventistas estão sucumbindo porque só olham para os "sinais". O que os sinais lhes dizem? Que haverá perseguição, fome, angústia e sofrimento, antes da volta de Jesus. Ao pensarem nessas coisas, perdem a visão do Salvador e do feliz companheirismo com Ele, através da eternidade. Essa maneira de encarar os acontecimentos do fim é obra de Satanás, que, com astúcia, leva muitos adventistas a desenvolver uma perspectiva pessimista quanto aos temas escatológicos.

O que é mais importante para noivos que verdadeiramente se amam: os preparativos para o casamento, ou o momento a partir do qual estarão juntos para sempre?

Na casa paterna

Se o filho pródigo, ao tomar a decisão de retornar à casa paterna, tivesse pensado nos perigos do caminho e duvidasse da possibilidade de o pai recebê-lo com alegria, teria permanecido na "terra longínqua". Ele, no entanto, estava convicto de que o pai estava ansioso por sua volta.

"O pai disse aos seus servos: Trazei depressa o melhor vestido, e vesti-lhe, e ponde-lhe um anel na mão, e alparcas nos pés; e trazei o bezerro cevado, e matai-o; e comamos, e alegremo-nos; porque este meu filho estava morto, e reviveu, tinha-se perdido, e foi achado. E começaram a alegrar-se" (Lucas 15:22-24).

A volta de Jesus será a maior festa de todos os tempos. Doenças, defeitos físicos e mentais, tristezas e angústias, guerras e desavenças, desigualdades e injustiças, sofrimento e morte - tudo estará no passado. Na presença do Rei dos reis, haverá alegria eterna.

Quando passarmos a falar mais do encontro com nosso Redentor, entenderemos os sinais como avisos de que nosso Amigo está às portas. E, com alegria, anunciaremos ao mundo esta empolgante notícia.

Que o Dono e Anfitrião da festa seja a nossa paixão suprema, a nossa esperança, a alegria e motivação de nossa vida! "Ora vem, Senhor Jesus" (Apoc. 22:20).

 

*Rubens da Silva Lessa, editor da Revista Adventista

 

FONTE: Revista Adventista, maio 1997, p. 08-10.

 

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