Teologia

sábado, 16 de janeiro de 2021

ENTENDENDO MEUS AMIGOS BUDISTAS


 Amy Whitsett

Faculdades e universidades são lugares onde há diversas pessoas e uma grande variedade de ideias. Esta série de textos intitulada “Vida no Campus” analisa a maneira de entender e ser amigo de alguém de outra fé e ao mesmo tempo permanecer fiel aos seus próprios valores e princípios.

 

Quando nos mudamos para o Laos, lembro- -me de que nossos novos amigos nos levaram para uma viagem especial a um dos vários locais famosos do país que marcam o caminho por onde Buda passou ao viajar pelo sudeste da Ásia. Nossos amigos nos levaram a um templo e nos disseram que esse templo era especial porque possuía uma marca da presença de Buda que havia sido preservada em uma pedra. Imagine como fiquei chocada quando descobri que essa marca não era uma pegada normal, mas obviamente uma pegada produzida, com cerca de um metro de comprimento por 60 cm de largura. Enquanto observava aquela pegada, notei várias das prováveis marcas que dizem ter sido encontradas no corpo de Buda – dedos dos pés perfeitamente alinhados, sem arco, e vários símbolos. Fiquei ainda mais chocada quando meu amigo cristão comentou: “Uau! Você pode imaginar como Buda era alto?!”

Enquanto eu continuava aprendendo sobre o budismo e como ele é vivido e expresso no Laos, não levou muito tempo para compreender que, assim como muitos outros heróis e heroínas importantes culturalmente, Buda se tornou, de certo modo, uma grande lenda, através da narração de uma história tantas vezes contada e recontada, composta de uma mistura de verdades e exageros, uma história que serve para descrever e ajudar as pessoas a entenderem Buda, como também uma história que enfatiza certas crenças e práticas que definem a cultura. Assim, quem era Buda e o que o levou às crenças que finalmente se tornaram no budismo?

Buda recebeu o nome de Siddhartha Guatama, onde atualmente é o Nepal, próximo da fronteira com a Índia. Embora não se saiba exatamente quando ele nasceu, os historiadores acreditam que pode ter sido há cerca de 2.600 anos, mais ou menos por volta da época de Nabucodonosor. Portanto, ele teria sido um contemporâneo de personagens bíblicos como Daniel, Zacarias, Ageu e Ester. Por ser o filho de um governante de uma cidade-estado ou de um pequeno reino, por ocasião de seu nascimento, os sábios indicaram que ele estava destinado a ser tanto um poderoso rei como um grande e santo homem. Desejando que seu filho seguisse seus passos, o pai de Siddhartha o protegeu do sofri- mento do mundo fora do palácio e fez o máximo que pôde para proporcionar a ele tudo o que as riquezas e o poder são capazes de oferecer. Entretanto, Siddhartha ficou revoltado. Aos 29 anos, idealizou um plano de fuga e saiu para explorar o reino.

Vestido como um plebeu, ele percorreu a área ao redor do palácio, onde ele se deparou com o sofrimento que nunca lhe foi permitido ver e, mais especificamente, um homem doente, um homem idoso, um homem à morte e um religioso ascético. Ao vê-los, ele começou a se perguntar o que causava o sofrimento e o que se poderia fazer para evitá-lo. Compreendendo que uma vida de indulgência não o havia deixado satisfeito, fato que lhe causou um sofrimento ainda maior, deixou para trás o palácio e sua família, trocando-os por uma vida de ascetismo extremo, na qual jejuava e meditava por longos períodos. Diz um relato que ele chegava a desmaiar enquanto meditava, devido ao longo período de jejum, e certa vez caiu em uma poça d’água de chuva. Esse relato diz que ele teria se afogado, se não fosse uma jovem tê-lo encontrado e o reanimado com um pouco de mingau de arroz. Siddhartha logo reconheceu que o ascetismo não era a resposta para o sofrimento. Ele entendeu que a indulgência e o ascetismo eram dois extremos opostos e se convenceu de que deveria haver outra solução entre os dois que lidaria de forma mais eficaz com o sofrimento. Assim, iniciou uma jornada na qual buscou o “caminho do meio”, através da meditação. Sua busca, dizem, levou-o a um lugar chamado Bodhi Gaya, localizado atualmente em Bihar, na Índia, onde ele se assentou debaixo de uma figueira, mais tarde conhecida como árvore Bodhi, e jurou não se levantar dali até descobrir a verdade. Passados 49 dias de meditação, ele descobriu o “caminho do meio” e alcançou a “iluminação” com a idade de 35 anos. A partir de então, ele se tornou conhecido como “Buda, o Iluminado”.

CRENÇAS BÁSICAS DO BUDISMO

O budismo procura explicar por que nós sofremos e propõe meios de como suportar ou eliminar o sofrimento. A “solução” que Buda “descobriu” se tornou mais do que apenas um conjunto de crenças religiosas ou filosóficas. Com o tempo, veio a formar a base de muitas cosmovisões asiáticas.

Dizem que Buda alcançou a iluminação quando descobriu as Quatro Verdades Nobres e o Caminho Óctuplo. As Quatro Verdades Nobres sustentam que a vida é sofrimento, que o sofrimento é causado pelo apego ao desejo, que o sofrimento é superado, portanto, pela eliminação do desejo; e que, finalmente, há um caminho a seguir para eliminar o desejo. O Caminho Óctuplo, afirmou Buda, possui oito componentes: ter uma visão correta, desenvolver a intenção correta, cultivar a fala correta, praticar a ação correta, ter um estilo de vida correto, realizar esforço correto, ter consciência plena correta e manter a concentração correta. Ele chamou essas oito formas “corretas” de o “Caminho do Meio”, porque evita os extremos da indulgência e do ascetismo.

Também, no coração do budismo está a crença no karma. No Ocidente, o karma é visto frequentemente como um acontecimento, bom ou mau, relacionado diretamente com as ações da pessoa. Não faltam vídeos on-line de pessoas fazendo algo rude e imediatamente tropeçando, caindo ou “colhendo a recompensa”. No budismo, porém, o karma é muito mais que isso. Acredita-se que o karma seja uma lei natural, muito parecida com a gravidade, que governa a maioria dos acontecimentos da vida.

Está intimamente ligado à reencarnação, na qual os atos da pessoa acumulam méritos, bons ou maus, que afetam tanto a vida presente como também o seu futuro. Nesse sistema de crença, se a pessoa nasce rica e inteligente, é por causa de algum bom mérito recebido em uma vida passada. Por outro lado, se alguém é pobre, deficiente ou pouco inteligente, é o resultado natural das más escolhas feitas anteriormente. Enquanto o karma, tecnicamente, afeta apenas a pessoa em questão, muitos acreditam que possa afetar os outros também.

Essa crença no karma afeta em grande medida a cosmovisão da pessoa, porque afirma que qualquer coisa que acontece – boa ou má, quer mude completamente a vida ou seja insignificante – pode ser atribuída a um bom ou mau pensamento ou ação numa existência anterior.

FÉ E ESTILO DE VIDA

Muitas práticas e valores do budismo decorrem destes três conceitos: o apego ao desejo, o karma, e as Quatro Verdades Nobres, juntamente com os Oito Caminhos Nobres – e eles permeiam a vida do budista. Na Ásia, os budistas participam regularmente dos rituais e festivais para obter méritos e os filhos dedicam seu tempo como monges para obter méritos para si mesmos e para seus pais. No Ocidente, os adeptos se esforçam por se manter conscientes de seus desejos e motivações, bem como para encontrar maneiras de viver em paz com os outros e com o mundo natural.

 Embora o objetivo final de um budista seja alcançar a iluminação (que leva a um estado de impermanência, que não é existência nem inexistência), as três grandes escolas do budismo têm ensinamentos ligeiramente diferentes sobre como isso acontece e quem pode alcançá-lo. No entanto, uma crença que os diferentes ramos têm em comum é o desejo da pessoa de melhorar o próprio estado nesta vida e, assim, melhorar a própria existência na próxima.

O QUE OS ADVENTISTAS TÊM EM COMUM COM OS BUDISTAS

Embora seja difícil encontrar outra religião cuja cosmovisão seja mais dessemelhante do adventismo, os adventistas do sétimo dia ainda compartilham muito em comum com nossos amigos e vizinhos budistas. Todos desejamos ver um mundo melhor, onde a dor e o sofrimento sejam minimizados, se não erradicados. Todos desejamos viver uma vida boa, que normalmente definimos como algo entre os extremos do ascetismo e da indulgência. Queremos vencer os maus traços de caráter, como o egoísmo, a raiva, a luxúria e, no lugar deles, demostrar generosidade, paciência e amor pelos outros.

O que desejamos é levar uma vida de amor e justiça.

Enquanto os budistas creem que cada uma dessas coisas acontece pelo despertar do que é bom dentro de si mesmo, os adventistas do sétimo dia acreditam que o bom caráter vem de se submeter à vontade de Deus e permitir que Ele transforme o nosso coração pela habitação do Seu Santo Espírito em nós. Enfim, os adventistas acreditam que a solução final para o sofrimento é encontrada na volta de Cristo e em Sua promessa de uma Terra renovada.

COMO SER AMIGO DE UM BUDISTA E PERMANECER FIEL À FÉ ADVENTISTA

Ao fazer amizade com os budistas, não tenha medo de se abrir e revelar no que você acredita. Mantenha a sua honestidade e viva uma vida que demonstre o seu compromisso com Cristo. Utilize o método de Cristo de se misturar com as pessoas, demonstrar simpatia e ministrar às necessidades de seus amigos e colegas budistas como uma maneira de promover a confiança.

E quando você ganhar a confiança deles, ore para que Deus Se revele a eles, de maneira pessoal. Ore por eles e com eles. E quando Deus os tocar, ajude-os a responder a Ele fazendo uma curta oração de agradecimento, encoraje-os a partilhar sua experiência com os amigos e se ofereça para ensinar a eles mais sobre esse Jesus que acabou de responder à sua oração. Pergunte a Deus como Ele quer que você viva e ministre às necessidades de seus amigos. Dedique algum tempo para ficar a sós e em silêncio, a fim de ouvir a resposta que Ele vai lhe dar, e então, obedeça! Deus não deseja nada mais do que ser parceiro daqueles que se dedicam a partilhar Seu amor com aqueles que ainda não O conhecem.

 

Amy Whitsett ASN pelo Atlantic Union College, Massachusetts, EUA, é diretora associada do Centro de Missão Global para as Religiões do Oriente Asiático. Depois de trabalhar 16 anos como plantadora de igrejas em grande parte dos países budistas da Ásia, atualmente está estudando para obter o mestrado em Liderança Global no Fuller Theological Seminary, Pasadena, Califórnia, EUA. E-mail: whitsetta@gc.adventist.org.

 

FONTE: Revista Diálogo Universitário

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