Teologia

sexta-feira, 22 de maio de 2020

BARAQUE: LÍDER MILITAR, GANHOU A GUERRA E PERDEU A GLÓRIA


Ricardo André

Neste artigo quero meditar na vida de um personagem bíblico ilustre quase desconhecido, que viveu no período dos juízes em Israel: o líder militar que ganhou a guerra e perdeu a glória.  Isso mesmo, Baraque é o nome dele. O relato sobre a experiência dele, em Juízes 4 e 5, ensina-nos importantes lições espirituais.

Depois de 80 anos de paz o povo de Israel novamente tornou-se descuidado espiritualmente e abandonou a Deus (Jz 2:19). Como resultado, o Senhor permitiu que Jabim, descrito como “rei de Canaã, que reinava em Hazor” (Jz 4:2), devastasse o território do Norte de Israel e colocasse a nação novamente sob domínio estrangeiro. Sísera era o general responsável por comandar todo esse exército (Juízes 4:13).

Durante vinte anos as poderosas forças dos cananeus tinham oprimido os israelitas. Após esse período de opressão (Jz 4:2), O senhor suscitou uma profetiza e juíza por nome Débora, que atendia em algum local entre Ramá e Betel, na região montanhosa de Efraim (v. 5), a fim de livrar o povo de Deus da opressão. “Ela é a única de quem se diz possuir o dom de profecia” (Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, v. 2, p. 337). Certamente na ocasião a inspiração divina era necessária.

A convocação de Baraque

Assim, Débora mandou chamar Baraque, que vivia cerca de 140 km ao norte, em Quedes de Naftali (atualmente Tell Qades). Baraque foi intimado para liderar o exército de Israel na guerra por uma profetiza. Na verdade, ele fora escolhido pelo Céu para enfrentar as forças de Sísera, no monte Tabor, aceitou o dom profético de Débora e creu que Deus poderia usá-lo para livrar Israel (Hb 11:32, 33).

O desafio era vencer Jabim, rei dos cananeus, que possuía 900 carros de ferro, cujas rodas estavam equipadas com mortíferas foices de ferro. Débora esclareceu que Deus libertaria a Israel dali até às planícies junto ao ribeiro de Quisom (v. 7). Ora, uma coisa é professar crer no dom profético, porém é muito diferente crer nele a ponto de colocar toda a reputação e futuro na inspiração. Mas Baraque fez exatamente isso. Foi e recrutou dez mil homens das tribos de Naftali e Zebulom como foi instruído. Mas, para ele e seu exército ir à batalha, impôs a seguinte condição: "Se você for comigo, irei; mas, se não for, não irei" (4:8). Ao dizer isto, Baraque estava pedindo que Débora arriscasse sua vida e fizesse aquilo que ele próprio deveria fazer. Pedir a uma mulher que se colocasse numa situação de perigo mortal, como ir a uma batalha, era completamente contrário aos costumes da época. E o mais curioso é que ela aceitou (v. 9). Débora poderia ter hesitado e falado de sua importante posição e da necessidade de permanecer ali debaixo da palmeira. Mas confiava implicitamente na voz do Céu e foi à batalha. Sua coragem, baseada na absoluta confiança na Palavra de Deus, foi espantosa.

Há quem diga que, ao pedir para Débora ir para a batalha, e que se ela se recusasse ele não iria, Baraque estava sendo covarde ou com falta de fé. Eu não acredito nessa abordagem. Penso que simplesmente desejava que estivesse presente alguém que pudesse dar orientação e ajuda divina para uma ocasião tão importante como a peleja contra o exército de Jabim.

Sobre isso, o Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, v. 2, p. 338, afirma: “Provavelmente Baraque percebeu que, sozinho, não sustentaria a disposição de ânimo dos hebreus. A presença de Débora deixaria claro que o empreendimento era de Deus. Ele possivelmente desejaria que todos vissem que quem iniciou a campanha foi a profetisa, e não ele. O fato de Baraque seguir a orientação profética num empreendimento perigoso o dignificou”.

Curioso é que, ao concordar em ir à batalha, Débora afirmou: "Está bem, irei com você. Mas saiba que, por causa do seu modo de agir, a honra não será sua; porque o Senhor entregará Sísera nas mãos de uma mulher" (4:9). A primeira impressão é que Débora estava se referindo a ela mesma como a pessoa que venceria Sísera. Mas, não, referia-se a Jael, uma nômade, camponesa do povo queneu, que adquirira parentesco com os israelitas através de Moisés (4:11 e 17). A glória pela vitória na batalha seria dela e não de Baraque. Por quê? Por que ela matou Sísera, comandante das tropas dos cananeus, após ele ter fugido da guerra e ter sido escondido por Jael na sua barraca (4:18-22). Jael foi uma heroína. Ela precisou de muita coragem e força física para fazer o que fez.

Muitas pessoas acham que a ação dela contra Sísera foi enganosa e traiçoeira. Mas, note o seguinte pensamento de Ellen G. White: “A princípio, Jael ignorou a identidade do seu visitante e resolveu lhe dar guarida; mas, depois, ao saber que era Sísera, o inimigo de deus e de Seu povo, mudou de ideia. E, enquanto ele jazia adormecido diante dela, Jael dominou sua natural relutância de um ato como aquele e o matou, cravando-lhe uma estaca na fronte que o prendeu a terra. Quando Baraque, em perseguição ao inimigo, passou por aquele caminho, foi convidado por Jael a contemplar o jactancioso capitão morto, a seus pés – morto pela mão de uma mulher” (Ibdem, p. 1107).

É importante ressaltar também que suas ações não foram motivadas pela maldade; foram atos punitivos, ordenados por Deus, sobre pessoas para quem a porta da graça se havia fechado (Jz 5:24-27; At 5:1-11; Hb 10:26-31).

Baraque, um herói da fé

Ao final da guerra com a vitória do povo de Israel devido a intervenção de Deus, Baraque e Débora entoaram um cântico de louvor a Deus, chamado de o “cântico de Débora” onde atribuem a vitória ao Senhor Deus (Jz 5). Além disso, o cântico também diz que sem a dedicação integral do povo de Deus, Ele não lhes teria dado a vitória. A união dinâmica entre a cooperação humana e o livramento divino exige nossa consideração, caso também queiramos vencer nas batalhas da vida.

Baraque tornou-se referência de um vencedor para o profeta Samuel, anos depois. “Então o Senhor enviou Jerubaal, Baraque, Jefté e Samuel, e os libertou das mãos dos inimigos que os rodeavam, de modo que vocês viveram em segurança”, disse Samuel (1Sm 12:11, NVI). E mais: na famosa galeria dos heróis da fé, de Hebreus, capítulo 11, lá está o nome de Baraque. É citado como exemplo de um homem de fé (v. 32, 33).

Lições para nós

Caro amigo leitor, nós estamos sendo a cada dia sacudidos pela mesma batalha espiritual, hoje. Ellen G. White escreveu: “A luta contra o próprio eu é a maior batalha que já foi ferida. A renúncia de nosso eu, sujeitando tudo à vontade de Deus, requer luta; mas a alma tem de submeter-se a Deus antes que possa ser renovada em santidade” (Caminho a Cristo, p. 43).

Temos que aprender que os esforços humanos não transforma nosso coração, nem o coração dos outros: “A educação, a cultura, o exercício da vontade, o esforço humano, todos têm sua devida esfera de ação, mas neste caso são impotentes. Poderão levar a um procedimento exteriormente correto, mas não podem mudar o coração; são incapazes de purificar as fontes da vida. É preciso um poder que opere interiormente, uma nova vida que proceda do alto, antes que os homens possam substituir o pecado pela santidade. Esse poder é Cristo. Sua graça, unicamente, é que pode avivar as amortecidas faculdades da alma, e atraí-la a Deus, à santidade. Disse o Salvador: "Aquele que não nascer de novo"- não receber um novo coração, novos desejos, propósitos e motivos, que conduzem a uma nova vida - "não pode ver o reino de Deus." João 3:3” (Ibdem, p. 18).

Não é pelo nosso poder ou sabedoria que faremos a obra do Senhor. Somente o coração consagrado pode entrar no campo de batalha com a segurança da vitória. “Tudo depende da reta ação da vontade. O poder da escolha deu-o Deus ao homem; a ele compete exercê-lo. Não podeis mudar vosso coração, não podeis por vós mesmos consagrar a Deus as vossas afeições; mas podeis escolher servi-Lo. Podeis dar-Lhe a vossa vontade; Ele então operará em vós o querer e o efetuar, segundo a Sua vontade” (Ibdem, p. 47).

Que o exemplo de Baraque, um homem que só foi para a guerra sabendo que o Senhor Deus estaria com ele através da palavra e presença profética, nos inspire nas atividades e lutas diárias. Conseguiremos a vitória na guerra contra o eu, contra o pecado e suas armadilhas, se levarmos na mente e no coração a certeza de que o Deus dos exércitos está ao nosso lado em cada passo, em cada decisão que precisaremos tomar. É preciso também que nos rendamos a Ele, e com Ele cooperamos, Sua atuação em nós “efetua em vocês tanto o querer quanto o realizar, de acordo com a boa vontade dele” (Filipenses 2:13, NVI). Então será possível dizer “tudo posso naquele que me fortalece” (Filipenses 4:13). A força que sustinha o apóstolo Paulo, a força locomotora de sua vida era Cristo! Ele nos ensina que como cristãos somos fortes em Cristo Jesus. Em sua fraqueza diante dos inimigos espirituiais o cristão confia na força de Jesus. Apesar das vicissitudes, das enormes dificuldades, não somente o cristão recebe o alento, o bálsamo que necessita, o perdão e a paz, mas a força e o ânimo para enfrentar novas lutas.



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