Teologia

domingo, 5 de maio de 2019

COMO SER PERFEITO NUM MUNDO CAÍDO


Ricardo André

No Seu famoso Sermão da Montanha Jesus disse aos Seus ouvintes e diz-nos hoje, imperativamente que devemos ter a perfeição de Deus, o Pai. “Portanto, sejam perfeitos como perfeito é o Pai celestial de vocês" (Mateus 5:48, NVI). Note que Deus ordenou perfeição. Sua vontade é que sejamos perfeito. A perfeição é um assunto muito debatido pelos teólogos e difícil de compreender. É possível que alguns ao lerem esse mandamento do Senhor estejam pensando: É impossível atender ao que Deus requer de nós, que é a perfeição.

Mesmo numa análise rápida e superficial, é fácil concluir que nós, seres humanos, por melhores que sejam, não seremos perfeitos. As Sagradas Escrituras, em Romanos 3:23, diz: “Pois todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus” (Romanos 3:23, NVI).

Em face do pecado, tudo que é humano é imperfeito. Faz parte da natureza humana a imperfeição. A perfeição e a santidade absoluta deixaram de ser características inerentes, desde que o ser humano caiu em pecado. Os pensamentos não são inerentemente puros, as intenções nem sempre são as melhores e, como resultado, as atitudes, as obras e as ações dos homens também não são perfeitas.

Mas, então, por que Deus espera que sejamos perfeitos como Ele? Qual era a intenção de Jesus ao recomendar que fôssemos “perfeitos”? Que é a perfeição? Como ter a mesma perfeição de Deus? Todas estas perguntas e mais algumas buscaremos respostas na Bíblia e no Espírito de Profecia.

O Conceito bíblico

Antes de mais nada é preciso que entendamos que se Jesus, imperativamente, disse que devemos ter a perfeição do Pai, foi porque era possível. Deus, como um Pai amoroso e bondoso, jamais pediria de Seus filhos alguma coisa impossível de ser feito. “A injunção é: ‘Sede vós, pois, perfeito, como é perfeito o vosso Pai, que está nos Céus’. Mt 5:48. Aqui Ele nos mostra que podemos ser tão perfeitos em nossa esfera quanto Deus o é na Sua” (Ellen G. White, Testemunhos Para a Igreja, v. 4, p. 455).

Na verdade, foi a Igreja Católica Romana que desenvolveu, durante a Idade Medieval a falsa interpretação de perfeição. Para ela perfeito significa absoluto, total, sem defeito ou pecado. E foi justamente essa falsa interpretação medieval que literalmente impeliu as pessoas, a exemplos dos monges, a tentativas monásticas de vida, e influenciou a visão conceitual de perfeição de mundo.

O Minidicionário da língua portuguesa de Aurélio, afirma que perfeição “é ausência de quaisquer defeitos”.

Segundo o Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, a palavra “perfeito”, em Mateus 5:48, vem do grego teleios, e significa “literalmente, ‘alguém que atingiu o alvo’, ou ‘completo’, de telos, ‘fim’, ‘cumprimento’, ‘conclusão’ ou ‘limite’. [...] uma pessoa ‘madura’ no sentido físico e intelectualmente (1Co 14:20), ‘homens amadurecidos’” (p. 354).

De acordo com o Dicionário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, perfeito no original hebraico tam ou tamim, significa “completo”, “certo”, “pacífico”, “sensato”, “íntegro, “irrepreensível”; do grego teleios, “completo, “perfeito”, completamente crescido”, “maduro”, “totalmente desenvolvido”, “que cumpriu seu propósito” (p. 1060).  Portanto, essa palavra não tem nada ver com o conceito absoluto de perfeição ou impecabilidade desenvolvida pela Igreja medieval.

De acordo com a etmologia bíblica, as pessoas são teleios (perfeitas) quando são adultas ou atingiram a estatura plena. Assim, um estudante que tem um conhecimento de matemática é teleios (maduro ou perfeito) em comparação com o aprendiz que está apenas começando.

A ideia básica dessa palavra bíblica, e daquelas que estão intimamente relacionadas com ela, é que todas as coisas tem um fim, um propósito, um alvo, ou um objetivo. Assim, então, um homem será perfeito (teleios) se ele cumprir a finalidade para o qual ele foi criado.

Precisamos, portanto, perguntar para que fim ou propósito foram criados os seres humanos. A Bíblia não nos deixa dúvida alguma nessa questão: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança” (Gn 1:26). Os seres humanos deem ser semelhantes a Deus no caráter. Por isso, é muito natural para Jesus reivindicar em Mateus 5:48 que os cristãos se tornem teleios (perfeitos ou maduros) em amor, como o Pai no Céu. Afinal, “Deus é amor” (I Jo 4:8) Os cristãos devem agir com Deus, e não como o Diabo.

“Logo, o ser humano é perfeito aos olhos de Deus quando alcançou o grau de desenvolvimento esperado dele em determinado momento. É um cristão maduro, completamente dedicado ao Senhor, que, embora ainda tenha fraquezas a superar, prossegue rumo ao alvo da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus (Filipenses 3:12-15)” (Dicionário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, p. 1061).

A Perfeição é um ato de Deus

A perfeição é importante, é possível. Não precisamos esperar até chegar ao Céu, por um tipo de perfeição. Deus prometeu perfeição de caráter - e esta deve ser desenvolvida aqui. É um fato mais do que reconhecido que, por nós mesmos, somos incapazes de ser santos e perfeitos. Nuca devemos esquecer que a perfeição é obra de Deus, não nossa. Observe algumas evidências bíblicas:

“É Deus quem me reveste de força e torna perfeito o meu caminho” (2 Samuel 22:33, NVI).

“Ele é o Deus que me reveste de força e torna perfeito o meu caminho” (Salmos 18:32, NVI).

“O Deus de toda a graça, que os chamou para a sua glória eterna em Cristo Jesus, depois de terem sofrido durante pouco de tempo, os restaurará, os confirmará, lhes dará forças e os porá sobre firmes alicerces” (1 Pedro 5:10, NVI).

“O Deus da paz, que pelo sangue da aliança eterna trouxe de volta dentre os mortos a nosso Senhor Jesus, o grande Pastor das ovelhas, os aperfeiçoe em todo o bem para fazerem a vontade dele, e opere em nós o que lhe é agradável, mediante Jesus Cristo, a quem seja a glória para todo o sempre. Amém” (Hebreus 13:20, 21, NVI).

“Perfeito” é algo que pertence a Deus e que nos advém pelo contato com Ele – não como posse, mas como dádiva. Nossa relação com Ele determina nossa participação nesse tipo de inteireza ou perfeição. Em outras palavras, quando temos fé em Jesus e reconhecemos nossa imperfeição, nos registros celestiais Deus substitui todas as nossas dívidas pelo crédito da vida pura, justa e perfeita de Seu Filho. Ele aceita a perfeição e a santidade de Jesus. Desse modo, somos feitos santos e perfeitos (Gn 17:1).

Ellen G. White deixa claro que a perfeição de caráter é fruto de nosso relacionamento com Deus, quando afirma: “Cristo procura reproduzir-Se no coração dos homens”. Como resultado, “recebendo o Espírito de Cristo - o espírito do amor abnegado e do sacrifício por outrem - crescereis e produzireis fruto. As graças do Espírito amadurecerão em vosso caráter. Vossa fé aumentará; vossas convicções aprofundar-se-ão, vosso amor será mais perfeito. Mais e mais refletireis a semelhança de Cristo em tudo que é puro, nobre e amável” (Parábolas de Jesus, p. 67 e 68).

Ela ainda afirmou: “Por meio da fé em Cristo, toda deficiência de caráter pode ser suprida, toda contaminação removida, corrigida toda falta, e toda boa qualidade desenvolvida” (Educação, p. 257 e 258).

À semelhança de Jesus em Mateus 5, a definição de perfeição de caráter que Ellen White dá centraliza-se no desenvolvimento do caráter de amor de nosso Deus. Esse ponto de vista se aprofunda quando é comparado com a versão de Lucas para o Sermão do Monte. Depois de fornecer essencialmente a mesma palestra de Mateus 5:43-47, Lucas apresenta Jesus concluindo assim: “Sejam misericordiosos, assim como o Pai de vocês é misericordioso" (Lucas 6:36, NVI). Assim, Tendo em mente qual era o assunto em pauta, abordado por Jesus, fica fácil entendermos em que sentido devemos ser perfeitos em relação ao nosso Pai celestial. Esta maturidade espiritual tem a ver com a atitude de amor e misericórdia para com os nossos amigos e inimigos. Atingir essa meta não é fácil e não se alcança em um dia, mas é a luta de toda uma vida.

A perfeição é um processo

A perfeição é um processo que começa quando nascemos de novo, quando Cristo, através do Seu sacrifício, imputa Sua justiça a cada um de nós, e continua incessantemente através da eternidade. É como uma criança recém-nascida que inicia o crescimento.

Lembro-me que no dia do nascimento do meu filho, Martin Luther King, liguei logo cedo para a maternidade. Quando a enfermeira atendeu fiz a pergunta:
- Meu filho nasceu perfeito?
Ao que ela respondeu:
- Não!
Quando ela respondeu “não”, tomei um susto! Em seguida ela completou:
- Ele nasceu sem os dentes.
Ufa! Que alívio cheguei a pensar que ele tinha nascido com algum defeito físico. Quando entendi a brincadeira da enfermeira pus-me a ri. Mas, essa experiência me fez pensar e compreender que a vida cristã é similar ao nascimento e o desenvolvimento de um recém-nascido.

Ao nascer uma criança observamos os lindos dedinhos, as mãos delicadas. São praticamente perfeitos. Mas ainda não chegaram a um desenvolvimento completo. Haverá necessidade de amadurecimento. Os olhos, os ossos, os órgãos passam por transformações. Os músculos esticam, os dentes virão, o cabelo atingirá novas cores e formato. Aquele corpo desajeitado é um tanto desengonçado vai adquirindo forma e beleza até se transformar num adulto. Dizem que o homem atinge a maturidade física e emocional aos 25 anos e a mulher lá pelos 22 anos.

Ali naquela criança, em forma latente estão todas os ingredientes da perfeição, que serão desenvolvidos até atingirem a perfeição. No livro Parábolas de Jesus, Ellen G. White diz que “nossa vida pode ser perfeita em cada fase de desenvolvimento; contudo haverá progresso contínuo, se o propósito de Deus se cumprir em nós” (p. 65).

A perfeição na experiência de Paulo

O apóstolo Paulo conta sua própria experiência de perfeição e a sua experiência pode repetir-se em cada cristão. Paulo fez um exame introspectivo! Olha para si mesmo! Qual é a sua relação com Cristo Jesus? Será que já alcançou à plenitude da estatura do Mestre? Em Filipenses 3:12 ele responde: “Não que já a tenha alcançado, ou que seja perfeito”. Nos versículos 13 e 14 registrou na sua pastoral aos filipenses, sua inquebrantável decisão, dizendo: “Esquecendo-me das coisas que atrás ficam, e avançando [...] prossigo para o alvo”.

Paulo reconhece que a vida cristã é uma vida de crescimento. O cristão tem que crescer “até que todos alcancemos a unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, e cheguemos à maturidade, atingindo a medida da plenitude de Cristo” (Efésios 4:13, NVI).

A perfeição é um caminho. Notamos nesta mensagem de Paulo um pouco de contradição. Por exemplo, em Fp 3:12, ele se refere ao fato de não ter alcançado a perfeição, ao passo que no capítulo 3:15 diz: “Por isso todos quantos já somos perfeitos [...]”. Mas não se trata de uma contradição nem um erro teológico. Para Paulo a perfeição não é um ponto final de chegada aqui neste mundo, mas é um caminho. Nele, vamos alcançando objetivos de perfeição e deixando-os para trás, para seguir em busca de novos objetivos, até que cheguemos à meta final que inclui também a perfeição física. Mediante nosso pedido de perdão por deslizes cometidos, a justiça de Cristo é comunicada para manter nossa vida santa e perfeita. Isto é um ato de fé da nossa parte, e de graça da parte de Deus. Essa é a dinâmica do amor divino! Perfeitos são aqueles que não se desviam do caminho. Prosseguem pela fé. Nunca saem do caminho. Que caminho? Jesus Cristo (Jo 14:6). Então, a perfeição do cristão é a perfeição de Cristo, vivida pela fé. Como Cristo é o único igual ao Pai, o crente que vive pela fé a perfeição de Cristo pode ser perfeito como nosso Pai que está nos céus.

Ao mesmo tempo, devemos lembrar-nos do seguinte: “Enquanto Satanás reinar, teremos de subjugar o próprio eu, teremos obstáculos a vencer, e não há lugar de parada, nenhum ponto a que possamos chegar e dizer que o atingimos plenamente” (Ellen G. White em Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, v. 7, p. 1056).

Querido leitor, Jesus Cristo é quem nos concede forças para vencermos todos os obstáculos de nossa vida. Ele é o nosso refúgio e nossa fortaleza. Está você disposto a se esforçar não para ser perfeito, pois não podes, mas se esforçar para andar com Deus e ser perfeito (Gn 17:1)? Então faça seu primeiro esforço aceitando que Ele seja o seu Salvador pessoal, dizendo: andarei na Sua presença e como consequência serei perfeito. Então se levante e comece desta caminhada rumo ao Céu e à vida eterna com nosso amado Pai celestial.

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