Teologia

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

O QUE OS ADVENTISTAS TÊM PARA COMPARTILHAR COM A COMUNIDADE CIENTÍFICA?


Ricardo André

No período em que estudava para obter minha graduação em História, a cada período solicitava ao Departamento de História minha dispensa às aulas das sextas-feiras à noite, que para nós, adventistas, já é sábado. A coordenação do curso, bem como meus professores se esforçaram ao máximo para fazer os ajustes necessários, a fim de que não perdesse as disciplinas daquele dia. Com isso, alguns professores e colegas de turma algumas vezes me perguntavam sobre as crenças adventistas. Eu educadamente oferecia algumas respostas, mas acabava ali. Haveria uma maneira melhor de compartilhar minha fé?

Sou cristão adventista desde os meus 11 anos de idade. Logo sou 100% criacionista. Acredito na existência de um Deus amoroso que criou todas as coisas animadas e inanimadas em nosso mundo em seis dias de 24 horas, e no sétimo dia descansou, abençoou e santificou esse dia, instituindo-o como dia de descanso e adoração (Gn 2:1-4; Êx 20:8-11). Continuo sendo criacionista. A Faculdade não mudou minha cosmovisão. Trabalho nas escolas públicas de Lagarto como professor de História. Nesta área, a imensa maioria dos historiadores são evolucionistas ateístas. Convivo com colegas de minha área, bem como de outras áreas do conhecimento, que acreditam no modelo evolucionista. Alguns deles são ateus, agnósticos ou simplesmente não dão importância ao fato da existência ou não de Deus. Já tivemos alguns momentos na sala de professores alguns diálogos sobre a temática da origem da vida. Em todas essas ocasiões tentei mostrar, de forma respeitosa, que a teoria criacionista dá sentido e dignidade a vida humana, pois ela ensina que fomos criados a “imagem e semelhança” de Deus (Gn 1:26-28). Logo, temos uma origem superior. Não evoluímos de seres inferiores. Não estamos aqui como obra do acaso, mas viemos das mãos do Criador.

Todavia, confesso que não possuo a disposição de fazer apologética. O objetivo de minha vida é compartilhar Jesus, o cristianismo e a mensagem adventista. A seguir apresento algumas de minhas ideias sobre como e o que compartilhar no meio acadêmico.

CUIDADO COM AS ABORDAGENS DEFICIENTES NO COMPARTILHAR

Primeiramente, gostaria de compartilhar como penso que a abordagem não deve ser feita. A imensa maioria dos professores das universidades acreditam que a religião e a fé são prejudiciais para a sociedade porque envenenam a mente fazendo com que dependam de algo irreal, não verificável, anticientífico; suprimem o pensamento crítico e são responsáveis por grande parte da violência no mundo. Ao procurar conquistar essas pessoas hoje, somos tentados a utilizar a argumentação incisiva, a ridicularização, a crítica ácida, a chacota da teoria evolucionista. Tais abordagens contraproducentes contêm fortes argumentos que condenam as ideias equivocadas e apresentam as características mais objetáveis dos oponentes. Contudo, até os oponentes mais acirrados devem ser tratados com respeito, deferência e amor.

Em 1 Pedro 3:15, 16, lemos: “Antes, santifiquem Cristo como Senhor em seu coração. Estejam sempre preparados para responder a qualquer pessoa que pedir a razão da esperança que há em vocês. Contudo, façam isso com mansidão e respeito, conservando boa consciência, de forma que os que falam maldosamente contra o bom procedimento de vocês, porque estão em Cristo, fiquem envergonhados de suas calúnias”. Embora devamos estar sempre preparados para explicar o que e por que cremos, devemos fazê-lo com respeito e bondade. Portanto, discuta as questões apresentadas com respeito. Enfatize o fato de que a evolução, o ateísmo, o materialismo e outras ideologias são apenas hipóteses, modelos ou paradigmas que não foram comprovados e que outras explicações são possíveis.

Ellen G. White aconselha nesse sentido:

“Na defesa da verdade, devem-se tratar os mais cruéis adversários com respeito e deferência” (Testemunhos Para a Igreja, v. 6, p. 122)

“Os grandes homens, os homens cultos, podem melhor ser atingidos pela simplicidade de uma vida piedosa, do que pelos argumentos incisivos que se possam acumular sobre eles. Causam-se boas impressões quando a religião é cheia de vitalidade, de molde a promover vida e progresso” (Evangelismo, p. 557).

“Falai a verdade em tons e palavras de amor. Cristo Jesus será exaltado” (Ibdem, p. 576).

“Apresente-se a verdade tal como é em Jesus, mandamento sobre mandamento, regra sobre regra, um pouco aqui, um pouco ali. Falai do amor de Deus com palavras de fácil compreensão. A verdade bíblica apresentada com a humildade e o amor de Jesus exercerá influência notável sobre muitas mentes. [...] Insisti sobre a necessidade da piedade prática. Tornai-lhes patente que sois um cristão, desejando paz, e que amais sua alma. Vejam eles que sois conscienciosos. Assim lhes granjeareis a confiança; e haverá tempo suficiente para as doutrinas. Seja o coração conquistado, o solo preparado, e depois semeai a semente, apresentando em amor a verdade como é em Cristo” (Ibdem, p. 199-200).

A partir das orientações de Ellen White, penso que a apologética não é a melhor abordagem para atrair os da comunidade científica, ou seja, a de atacar a ciência; dizer aos cientistas ou professores que eles não têm moral; proferir frases prontas; ignorar suas ideias e entrar em discussão. Essas abordagens criam a imagem negativa de que os cristãos são contra a ciência, quando na verdade não somos. É importante que se diga que o pensamento religioso não é absolutamente contrário aos métodos da ciência. Muitos dos grandes cientistas do mundo ocidental eram cristãos que não só acreditavam em Jesus, mas também na criação. Galileu, Blaise Pascal, Robert Boyle, Nicolas Steno, Isaac Newton e James C. Maxwell são apenas alguns que fazem parte de centenas de nomes do passado e do presente que deram ou estão dando grandes contribuições para a investigação científica, e sem rejeitar a crença em Deus. A ciência se desenvolveu, ao longo de muitos séculos, impulsionada por esses e outros cientistas que foram cristãos comprometidos.  Milhares de cientistas no mundo acadêmico de hoje são cristãos praticantes, mostrando, assim, que a prática de ambas, pesquisa científica rigorosa e fé cristã, não são mutuamente exclusivas, mas de reforço.

Como uma clara demonstração de que os cristãos adventistas não são contra a ciência, a escritora cristã norte-americana Ellen G. White, incentivava os cristãos a “adquirir conhecimento das ciências” (Manuscript Releases, 21 v., 1981-1993). Ela também incentivou aqueles que se preparavam para ser pastores a “primeiro obter razoável grau de preparo mental” a fim de poder “enfrentar com êxito as estranhas formas de erros religiosos e filosóficos associados, cuja exposição requer conhecimento de verdades científicas, bem como escriturísticas” (Obreiros Evangélicos, p. 81).

O termo compartilhar envolve uma abordagem melhor que a apologética, pois não enfatiza o argumento. Compartilhar não exige que se diga tudo. Por várias razões, Jesus pediu que o leproso curado ficasse em silêncio (Mt 8:2-4). Depois da confissão de Pedro, Jesus recomendou que os discípulos não dissessem nada, porque havia tanto “falso conceito do Messias, que um anúncio público do Mesmo não lhes daria ideia exata de Seu caráter e de Sua obra.” (Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, p. 414). Os três discípulos que presenciaram a transfiguração de Cristo não deveriam compartilhar a experiência com outros, porque “apenas despertaria o ridículo, ou ociosa admiração” (Ibdem, p. 426). Deus não é mencionado no livro de Ester, e ela não revelou sua origem judaica, mesmo assim, era fiel. Os valdenses levavam bíblias consigo, secretamente, e compartilhavam o evangelho somente com aqueles em quem confiavam (Ellen G. White, O Grande Conflito, p.70, 71).

O MÉTODO DE JESUS É O MELHOR

Se o debate acirrado para demonstrar as fraquezas e contradições das ideias dos evolucionistas ateístas não é o melhor método para compartilhar a nossa fé, então, qual é o melhor método? Podemos buscar em Deus a melhor maneira de compartilhar de nossa fé em cada situação.

Ellen White afirmou: “Os jovens pastores devem evitar debates, pois estes não aumentam a espiritualidade, nem a humildade de espírito. Em alguns casos, talvez seja necessário enfrentar um orgulhoso alardeador contra a verdade de Deus, num debate franco; geralmente, porém, esses debates, sejam orais, sejam escritos, resultam em mais dano do que bem” (Testemunhos Para a Igreja, v. 3, p. 213).

Ellen White ainda afirmou que o resultado de um debate com violenta discussão “é um estado febril de coisas. Faltam calma, ponderação e discernimento. Caso se deixe passar essa agitação, ou haja reação por meio de procedimento indiscreto, o interesse nunca mais poderá ser despertado. Os sentimentos e simpatias do povo foram estimulados, mas a sua consciência não foi convencida, nem o coração quebrantado e humilhado perante Deus” (Ibdem, p. 218).

C. S. Lewis afirmou: “Atraímos as pessoas a Cristo não as fazendo desacreditar naquilo em que acreditam, de maneira ruidosa, dizendo a elas quão erradas elas estão e quão certos nós estamos, mas mostrando a elas uma luz tão bela que elas desejarão conhecer a fonte dessa luz de todo coração. (“Christian Apologetics”, em God in the Dock: Essays on Theology and Ethics, Walter Hooper, ed.(Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 1970), p. 89-103, especialmente p. 92, 93 e 103.

Quando pregou em Atenas, Paulo usou a lógica e a filosofia. “Considerando o tempo assim gasto, e concluindo que seu ensino em Atenas fora pouco produtivo, decidiu seguir outro plano de trabalho em Corinto, nos seus esforços para atrair a atenção dos descuidados e indiferentes. Decidiu evitar discussões e argumentos elaborados e nada se propor saber entre os coríntios, ‘senão a Jesus Cristo, e Este crucificado’. Estava disposto a pregar-lhes, não com ‘palavras persuasivas de sabedoria humana, mas com demonstração de Espírito e de poder’. 1 Coríntios 2:2 e 5” (Ellen G. White, Atos dos Apóstolos, p. 244). Paulo lhes mostrou “um caminho mais excelente”, com o maior deles sendo o amor (1 Coríntios 12:31; 13).

Pessoalmente, acredito que os métodos usados por Jesus, conforme descritos em O Desejado de Todas as Nações, consistem no melhor guia para compartilhar a nossa fé. No Sermão do Monte, Jesus “não atacou, todavia, diretamente os erros do povo”, no entanto, “ensinou-lhes alguma coisa infinitamente melhor do que haviam conhecidos” (p. 299). “Os homens podem combater ou desafiar a nossa lógica, podem resistir a nossos apelos; mas a vida de amor desinteressado é um argumento que não pode ser contradito” (p. 142). Na Sua maneira de tratar com Tomé, “Jesus não esmagou Tomé com censuras, nem entrou com ele em discussão. Revelou-Se ao duvidoso.” (p. 808).

A melhor maneira de atrair os céticos para a luz da verdade, muito mais do que ter o melhor modelo científico, ou provar que estamos certos e eles errados, é compartilhar da melhor maneira a respeito de Cristo como Deus: um Deus poderoso que faz muito mais do que os seres humanos podem explicar e um Deus bom, em quem podemos confiar em face do mal. Podemos apresentar um Deus cuidadoso em face do mal, uma comunidade segura, acolhedora e plena da graça diante do fracasso, e a ciência em ação para tornar o mundo um lugar melhor. Os questionamentos virão com base no estilo de vida. Se nossa vida for coerente com a fé que nós professamos, isso irá convencer a muito no mundo acadêmico da existência de um Deus amoroso.

Ellen White afirmou: “A última mensagem de graça a ser dada ao mundo é uma revelação do caráter do amor divino.” (Parábolas de Jesus, p. 415). Note que não é a “verdade teológica” dos “fanáticos religiosos”, mas a “verdade genuína, segundo se manifesta na vida” (O Desejado de Todas as Nações, p. 309).

Ellen G. White, num único parágrafo, resume o que Jesus fazia para alcançar as pessoas e conduzi-las à salvação: “Unicamente o método de Cristo trará verdadeiro êxito no aproximar-se do povo. O Salvador misturava-Se com os homens como uma pessoa que lhes desejava o bem. Manifestava simpatia por eles, ministrava-lhes às necessidades e granjeava-lhes a confiança. Ordenava então: “Segue-Me.” (A Ciência do Bom Viver, p. 143).

Vamos analisar isso um pouco.

1) Jesus se misturava com as pessoas como Alguém que lhes desejava o bem. (Ele estabelecia relacionamentos).

2) Jesus tinha compaixão pelas pessoas. (Ele criava vínculos).

3) Jesus ministrava-lhes as necessidades. (Isso também estabelecia vínculos).

4). Quando Ele combinava o primeiro, o segundo e o terceiro elementos, ganhava a confiança das pessoas.

5) “ordenava então: ‘Segue-Me’” (para que se tornassem Seus discípulos).

O que vemos aqui é um modelo integral (holístico) de trabalho de Jesus. Esse método de ministério podem guiá-los ao trabalharem com as pessoas materialistas. Todos esses passos, atuando juntos, trarão “verdadeiro êxito”.

Paulo chegou a dizer: “Embora seja livre de todos, fiz-me escravo de todos, para ganhar o maior número possível de pessoas” (1 Coríntios 9:19-23).

No evangelho eterno a ser dado ao mundo (Apocalipse 14:6) está incluído o relato da mulher que lavou os pés de Jesus (Mateus 26:6-13). A hora do juízo (Apocalipse 14:7) está baseada na maneira como tratamos os menos afortunados entre nós (Mateus 25:31-47). Jesus usou o sábado para curar e está preocupado com o modo como as pessoas são tratadas (Isaías 58). A mensagem de Elias faz parte da mensagem final sobre os relacionamentos restaurados (Malaquias 4:5, 6).

Portanto, é através do desenvolvimento de amizades saudáveis com os materialistas e os ajudando que teremos oportunidades de apresentar a Jesus, o compassivo Salvador, a essas pessoas, de refletir com elas a respeito do materialismo puro como algo insatisfatório, sobre o Big Bang e a segunda lei da termodinâmica que apontam para um começo e para “Alguém que deu origem a esse começo”; sobre a sintonia fina das constantes físicas que parece indicar um Universo projetado para a vida. Falar sobre o complexo projeto biológico que sugere a necessidade de um “Projetista”; a respeito da consciência humana expressada no autoconhecimento e no livre-arbítrio que implica uma “Consciência Maior”; refletir ainda a respeito dos valores morais que regem a nossa sociedade que não podem ter surgido como consequência da seleção natural aleatória, a partir da matéria e da energia; sobre mundo real, complexo e cercado de informações, a estrutura exige um Criador inteligente.

Os adventistas têm algo a oferecer, e os métodos usados por Jesus funcionam!




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