A ORIGEM DA MENTIRA DO ARREBATAMENTO SECRETO
Sérgio
Santeli*
A Reforma Protestante
abalou os fundamentos do Romanismo pregando e ensinando as profecias de Daniel
e Apocalipse, usando o historicismo como base hermenêutica de interpretação.
Todos os grandes teólogos conservadores então concordavam que as profecias
apocalípticas de Daniel e Apocalipse se cumpriram através da História. Para
contra-atacar a Reforma Protestante e tentar neutralizá-la o Romanismo criou a
Ordem dos Jesuítas, e muito cedo incumbiu o sacerdote jesuíta Francisco Ribera
de criar uma nova linha de interpretação profética cujo cumprimento das
profecias apocalípticas se dará no futuro (Futurismo). O chifre pequeno de
Daniel 7 e 8, a besta de Apocalipse 13, e o anticristo de 2 Tessalonicenses
2:3, 4, 8, 9 não mais representariam Roma papal.
Nos dois séculos
seguintes essa teoria se infiltrou no Protestantismo pela influência de grandes
universidades européias como a de Oxford. Famosos líderes do mundo protestante
adaptaram essa corrente de interpretação em sua visão profética de Daniel e
Apocalipse. Samuel Roffey Maitland (1792-1866), James Todd, William Burgh e,
principalmente, John Nelson Darby (1800-1882) contribuíram para estabelecer as
bases do Futurismo profético, agora chamado de Dispensacionalismo entre os
protestantes.
Darby fez três viagens
aos Estados Unidos nas quais pregava de forma ousada as ideias do
Dispensacionalismo profético. Segundo creem, as profecias escatológicas do
Antigo Testamento devem ser interpretadas literalmente. Se o texto bíblico diz
que Israel irá possuir a terra prometida para sempre, então significa
exatamente isso, ao pé da letra.
Em uma de suas viagens
aos Estados Unidos, Darby influenciou um advogado chamado Cyrus Scofield, o
qual, após converter-se, se tornaria ministro ordenado da Igreja Congregacional.
Sua obra, a Bíblia de Referência de Scofield (1909), foi a responsável pela
popularização do Dispensacionalismo profético nos Estados Unidos e em vários
outros países que mais tarde a traduziram.
A partir da década de
1990, outro lançamento também contribuiu para a popularização dessa teoria
entre os evangélicos: a série de livros de ficção religiosa Left Behind
(Deixados Para Trás), dos autores Tim LaHaye e Jerry Jenkins.
Somando tudo isso, o
resultado é que hoje mais de 80% do mundo protestante acredita no
Dispensacionalismo (Futurismo profético) em lugar do Historicismo da Reforma
Protestante. Como desfazer esse conflito? Ditos protestantes que não seguem os
ensinos dos Reformadores?
Acreditar que as
profecias do Antigo Testamento só podem se cumprir de forma estritamente
literal significa ignorar o uso que os próprios autores inspirados do Novo
Testamento fazem do texto bíblico. Mateus, por exemplo, vê o cumprimento
profético de Oseias 11:1 (que, primariamente, se refere a Israel) no retorno de
Jesus do Egito com Seus pais após a morte de Herodes (2:15). Claramente, para
Mateus, Israel era um tipo de Cristo, logo temos um cumprimento tipológico e
não literal da profecia.
O mesmo ocorre com o
evangelista Lucas, quando afirma que “assim está escrito” que “o Cristo havia
de ressuscitar dentre os mortos no terceiro dia” (24:46). Na mente de Lucas,
Israel também é um tipo de Cristo. Por isso ele faz uma aplicação tipológica de
Oseias 6:1 e 2 (originalmente feita para Israel). Mais uma vez o autor bíblico
não faz uma aplicação estritamente literal.
Ainda em outro exemplo,
em Mateus 2:23, o autor inspirado usa a palavra “profetas” (plural) para
expressar o que vários textos proféticos teriam profetizado: “Ele será chamado
Nazareno [grego Natzrati].” Acontece que não há nenhuma profecia do Antigo
Testamento sobre isso que possa ser aplicada literalmente a Jesus. O autor
bíblico vê um cumprimento pelo sentido, por causa da palavra hebraica netzer em
Isaías 11:1: “Do tronco de Jessé sairá um rebento [netzer].” Outros profetas
também falaram disso (Jr 23:5, 33:15; Zc 3:8 e 6:12). Para todos os efeitos, a
aplicação feita por Mateus está longe de ser literal.
Portanto, sustentar que
todas as profecias do Antigo Testamento têm que se cumprir de forma
estritamente literal é violar o próprio entendimento que os autores do Novo
Testamento possuíam. Logo, o Dispensacionalismo não passa no teste bíblico.
E o que dizer dessa
teoria do arrebatamento secreto extraída pelos dispensacionalistas de Mateus
24:40 e 41? Ela se sustenta pela Bíblia? Uma leitura atenta do contexto de
Mateus 24 já é suficiente para extrair três razões contrárias a essa teoria:
1. Jesus alertou
explicitamente contra qualquer um que ensinasse que Seu retorno seria secreto:
“Portanto, se vos disserem: Eis que Ele está no deserto, não saiais. Ou: Ei-lo
no interior da casa, não acrediteis. Porque, assim como o relâmpago sai do
oriente e se mostra até no ocidente, assim há de ser a vinda do Filho do Homem”
(v. 26, 27).
Alguém já viu um
relâmpago aparecer de forma secreta?
2. Jesus declarou
explicitamente que o mundo inteiro seria testemunha do Seu retorno: “Então
aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem; todos os povos da terra se
lamentarão e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder
[grego dynamis, de onde vem a palavra “dinamite”] e muita glória.”
3. Jesus descreveu
explicitamente o destino dos que serão deixados para trás: “Assim como foi nos
dias de Noé, também será a vinda do Filho do Homem… veio o dilúvio e os levou a
todos” (37-39). Ou seja, os que forem deixados para trás serão destruídos “como
foi nos dias de Noé”. Não haverá segunda chance. Esse é um grande engano que o
inimigo disseminou dentro do protestantismo graças a essa doutrina
dispensacionalista do arrebatamento secreto (ver Hb 9:27, 28).
Sendo assim, a corrente
futurista de interpretação profética (incluindo o Dispensacionalismo dentro do
Protestantismo) carece de fundamento bíblico. Só nos resta a confiança do
Historicismo defendido pelos Reformadores.
Você está pronto para
os últimos eventos deste mundo? Falta muito pouco para Jesus voltar nas nuvens
do céu. “Naquele dia se dirá: Eis que este é o nosso Deus, em quem esperávamos,
e Ele nos salvará” (Is 25:9).
Quem viver verá…
*Sérgio Santeli é pastor
em São Bernardo do Campo, SP
Bibliografia:
Dwight K. Nelson,
Ninguém Será Deixado Para Trás, Casa Publicadora Brasileira.
Hans K. LaRondelle, O
Israel de Deus na Profecia, Unaspress.
João Alves dos Santos,
Dispensacionalismo e suas implicações doutrinárias.
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