Teologia

terça-feira, 28 de novembro de 2017

AS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ E A PRÁTICA DESTRUTIVA DE OSTRACIZAR OS MEMBROS DA FAMILIA QUE ABANDONAM A RELIGIÃO


Ricardo André

As Testemunhas de Jeová possuem uma política, que diríamos assaz destrutiva, que é a de ostracizar os membros da família que deixam sua religião. O “ostracismo” é a proibição de toda comunicação desnecessárias com ex membros da religião. É dito às Testemunhas que evitem os “desassociados” (expulsos por algum erro) ou simplesmente se afastarem. Mesmo aqueles jovens que foram criados como testemunhas de Jeová, mas que nunca foram batizados e os que simplesmente saem da religião, mas que não cometeram pecado algum são ostracizados pelos parentes Testemunhas de Jeová.

É ensinado que os desassociados certamente morrerão no Armagedon. As Testemunhas que os verem na rua, não poderão dar sequer um "oi". Espera-se que os filhos, filhas, mães e pais cortem o contato, enquanto só fazendo exceções em casos de emergência e negócios familiares. Nesse sentido, filhos são desprezados e evitados pelos seus pais, irmãos e tios ou outros parentes Testemunhas de Jeová. Inacreditavelmente, os próprios pais cortam relações com seus filhos simplesmente por eles não seguirem a mesma religião ou por abandonarem-na, levando-os ao isolamento, e, em casos extremos, até a pensamentos suicidas.

A verdade é que esta prática tem causado traumas na vida de muitas famílias desfeitas. Como é o caso da jovem Victoria Summer, ex- testemunha de Jeová, que foi abandonada pelos seus familiares. “A falta de amor é tão grande por parte de seus pais, adeptos dessa denominação religiosa, que nem presenciaram o nascimento e nem mesmo acompanham o crescimento da neta que tem apenas um ano de idade. Devido ao isolamento por parte de seus familiares, Victoria Sammers resolveu levar um buquê de flores e um cartaz com uma mensagem a seus pais na entrada da Congregação que frequentam. Nesse protesto ela chama a atenção das pessoas para as práticas preconceituosas e discriminatórias que ex-adeptos sofrem por deixarem de ser Testemunhas de Jeová. Com certeza, uma maneira de denunciar uma prática que leva a destruição de lares e famílias e que as Testemunhas de Jeová escondem do grande público. Não existe saída honrosa dessa denominação religiosa que insiste com essa política desamorosa e que condena a morte social milhares de pessoas no mundo todo” (http://extestemunhasdejeova.blogspot.com.br/2014/09/abandonada-pela-familia-por-deixar-de.html).

No JW.ORG (Site Oficial das TJ), a Organização nega essa prática: “Nós não evitamos Testemunhas de Jeová batizadas que pararam de participar na pregação ou até de se associar conosco. Na verdade, nós procuramos contatar essas pessoas e reavivar seu interesse pelas coisas de Deus” (https://www.jw.org/pt/testemunhas-de-jeova/perguntas-frequentes/ex-membros/). Apesar de algumas frases depois da declaração acima, a Torre de Vigia admite: “Aqueles que formalmente dizem que não querem mais ser parte da organização também são evitados,” eles não estão a ser completamente honestos. O resultado de você simplesmente “afastar-se” ou “formalmente dizer” que não quer fazer parte da organização, é o mesmo — ou seja, ostracismo.

Embora as Testemunhas de Jeová negue, na prática o que vemos são ex-testemunhas de Jeová sendo rejeitadas pelas próprias famílias. O Site da BBC Brasil no dia 31 de julho deste ano publicou uma importante matéria que trouxe à baila essa questão, inclusive com depoimentos de ex-testemunhas de Jeová que sofreram o ostracismo de seus entes queridos e amigos. (http://www.bbc.com/portuguese/internacional-40780269).

Como se vê, não é fácil desligar-se dessa organização religiosa. Os que corajosamente decidem abandonar a religião sofrem essa pressão da família e dos antigos amigos TJ. Eles sofrem uma dor emocional intensa causada pelo ostracismo imposto pela organização.

Tal política do ostracismo é amplamente incentivados pelo Corpo Governante das Testemunhas de Jeová, através de suas literaturas, notadamente a Sentinela. Considere as citações seguintes da literatura oficial da Torre de Vigia:

“Os pais dela haviam sido desassociados. Ela não o foi, mas dissociou-se voluntariamente por escrever à congregação uma carta retirando-se dela…Ela se mudou, mas anos depois voltou e verificou que as Testemunhas locais não conversavam com ela…Tal rejeição é apropriada também para com todo aquele que repudia a congregação…Os cristãos, por evitarem também aqueles que deliberadamente se dissociaram, são protegidos contra possíveis conceitos críticos, destituídos de apreço, e mesmo apóstatas…Pense também em como se sentiam os irmãos, as irmãs ou os avós do transgressor. Todavia, colocarem a lealdade ao seu justo Deus à frente da afeição familiar podia salvar-lhes a vida” (A Sentinela, 15 de Abril, 1988, págs. 26-28).

“Isso talvez resulte numa provação para os cristãos quando o cônjuge, o filho, o pai, a mãe, ou outro parente próximo é desassociado ou se dissocia da congregação (…) Esses princípios aplicam-se tanto para os que foram desassociados como para os que se dissociaram (…) Assim, evitamos também o convívio social com quem foi expulso. Isso significa que não vamos com ele a piqueniques, festas, jogos, compras, ao cinema, nem tomamos refeições com ele, quer em casa quer num restaurante (…) quando o desassociado ou dissociado é um parente que vive fora do círculo familiar imediato e fora do lar (…) poderá ser possível ter quase nenhum contato com tal parente” (Nosso Ministério do Reino, Agosto 2002, p. 3, 4).

“E todos sabemos de experiência no decorrer dos anos que um simples “Oi” dito a alguém pode ser o primeiro passo para uma conversa ou mesmo para amizade. Queremos dar este primeiro passo com alguém desassociado?” (A Sentinela, 15 de Dezembro, 1981, p. 20).

Como se “rejeitar” o ex-membro não fosse suficiente, a Torre de Vigia também admoestou os seus seguidores a “odiar” com “ódio piedoso” todas as ex-Testemunhas de Jeová:

“Mais do que isso, queremos odiar aqueles que voluntariamente se mostram odiadores de Jeová e odiadores do que é bom…Nós os odiamos, não no sentido de querer prejudicá-los ou de desejar-lhes o mal, mas, no sentido de evitá-los assim como evitaríamos veneno ou uma cobra venenosa, porque eles podem envenenar-nos, em sentido espiritual” (A Sentinela, 15 de Dezembro, 1980, p. 8).

“O ódio piedoso é uma proteção poderosa contra a transgressão, assim como o amor piedoso torna um prazer fazer o que é correto (…) Estamos fazendo isso? (…) Os apóstatas estão incluídos entre os que mostram seu ódio por Jeová por se revoltarem contra ele. A apostasia é, na realidade, uma rebelião contra Jeová. (…) Outros afirmam crer na Bíblia, mas rejeitam a organização de Jeová e tentam ativamente obstaculizar a sua obra. (…) o cristão precisa odiar (no sentido bíblico da palavra) os que se agarraram inseparavelmente à maldade.” (A Sentinela, 1 de Outubro, 1993, p. 19).

O ostracismo é uma prática que tem sustentação bíblica?

A pergunta de capital importância é: Será que a Bíblia apoia a prática das Testemunhas de Jeová de ostracismo? Não! Absolutamente!

A pergunta que fazemos é: O que Jesus espera do relacionamento entre seus seguidores? A resposta é simples: Que vivamos o amor que ele nos ensinou. A política destrutiva das Testemunhas de Jeová de ostracizar seus ex-membros nega frontalmente esse princípio estabelecido por Jesus Cristo. Ele disse que os Seus verdadeiros seguidores seriam reconhecidos pelo “amor” que eles tivessem entre si, e que o padrão desse amor foi estabelecido por Jesus, no Calvário: "Um novo mandamento lhes dou: Amem-se uns aos outros. Como eu os amei, vocês devem amar-se uns aos outros. Com isso todos saberão que vocês são meus discípulos, se vocês se amarem uns aos outros" (João 13:34,35, NVI). Porém, esse amor não é vivido na teoria, mas na prática. João exortou: Filhinhos, não amemos de palavra nem de boca, mas em ação e em verdade (1 Jo 3:18). O que caracteriza o verdadeiro discípulo não é o falar, mas o praticar o amor. O respeito com o semelhante, o atendimento ao pobre necessitado, o perdão mútuo e a ajuda recíproca são algumas maneiras práticas de demonstrar o amor recíproco.

Ao praticarem o ostracismo com seus próprios entes queridos que abandonaram a crença, as Testemunhas de Jeová, caem no erro de acreditar que somente as regras aceitas pela religião estão corretas, excluindo, julgando e sendo injustas com qualquer um fora disso. Assim, se esquecem do básico: Amar a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo (Mateus 22:36-40).

De fato, a Bíblia permita o ato de expulsar um cristão da afiliação da igreja se tiver comportamento imoral: “Quando vocês estiverem reunidos em nome de nosso Senhor Jesus, estando eu com vocês em espírito, estando presente também o poder de nosso Senhor Jesus Cristo, entreguem esse homem a Satanás, para que o corpo seja destruído, e seu espírito seja salvo no dia do Senhor” (1 Coríntios 5:4,5). Todavia, esta disciplina deve ser administrada com humildade e com o coração cheio de amor e da simpatia de Cristo para o bem do destino eterno do crente pecador:

“Irmãos, se alguém for surpreendido em algum pecado, vocês, que são espirituais deverão restaurá-lo com mansidão. Cuide-se, porém, cada um para que também não seja tentado” (Gálatas 6:1, NVI).

“Aceitem o que é fraco na fé, sem discutir assuntos controvertidos” (Romanos 14:1, NVI).

Na Igreja Cristã Primitiva a disciplina não era feita do modo escarnecedor, “odioso”, que os anciãos das Testemunhas de Jeová interrogam espiritualmente os seguidores “fracos” para forçar a confissão de atos que eles possam considerar ofensas passíveis de desassociação e obrigar os amigos e parentes Testemunhas de Jeová a “ostracizá-los”, por cortar completamente toda a comunicação desnecessária com eles.

Deveria a política do “ostracismo” ser considerada uma forma “amorosa” de disciplina espiritual?  Lemos na Bíblia que a disciplina espiritual é sempre para ser acompanhada por tentativas amorosas de reconciliação:

"Se o seu irmão pecar contra você, vá e, a sós com ele, mostre-lhe o erro. Se ele o ouvir, você ganhou seu irmão. Mas se ele não o ouvir, leve consigo mais um ou dois outros, de modo que ‘qualquer acusação seja confirmada pelo depoimento de duas ou três testemunhas’. Se ele se recusar a ouvi-los, conte à igreja; e se ele se recusar a ouvir também a igreja, trate-o como pagão ou publicano” (Mateus 18:15-17, NVI).

A punição que lhe foi imposta pela maioria é suficiente. Agora, pelo contrário, vocês devem perdoar-lhe e consolá-lo, para que ele não seja dominado por excessiva tristeza. Portanto, eu lhes recomendo que reafirmem o amor que têm por ele” (2 Coríntios 2:6-8, NVI).

As linhas de comunicação são para ser mantidas abertas em todas as situações:

“Irmãos, em nome do nosso Senhor Jesus Cristo nós lhes ordenamos que se afastem de todo irmão que vive ociosamente e não conforme a tradição que receberam de nós”. Se alguém não obedecer à nossa palavra por esta carta, marquem-no e não se associem com ele, para que se sinta envergonhado; contudo, NÃO O CONSIDEREM COMO INIMIGO, MAS CHAMEM A ATENÇÃO DELE COMO IRMÃO” (2 Tessalonicenses 3:6, 14,15, NVI).  Note que a exortação de Paulo é de que os que recebem a disciplina não deve ser considerado inimigo. E o pecador arrependido deve ser recebido de volta imediatamente sem um longo período de avaliação de desempenho (Lucas 15:18-23). 

Embora a “associação” com um “irmão” expulso seja limitada (2 Tessalonicenses 3:6, 14; 1 Coríntios 5:11), eles são autorizados a falar com ele e a “admoestá-lo” a se converter do seu caminho pecaminoso. Não há nenhuma indicação em nenhum destes textos de que apenas os “anciãos” estão autorizados a comunicar com “irmãos” expulsos. Ao invés de isolar o crente errante, deve-se manter sempre o canal de comunicação, para falar-lhe em tom que apele para o bom-senso, lembrando as palavras de Tiago 5:19-20: “Meus irmãos, se algum entre vós se desviar da verdade, e alguém o converter, sabei que aquele que converte o pecador do seu caminho errado salvará da morte a alma dele e cobrirá multidão de pecados.”

Verdade é, que não existe nenhuma ordem nas Escrituras para ostracizar aqueles que abandonam a fé cristã (1 João 2:19). Enquanto que aqueles que causam divisões (Romanos 16:17) ou promovem falsas doutrinas (Tito 3:10) devem ser vigiados e “rejeitados” se não se arrependerem depois de terem sido avisados, não existe nenhuma ordem para parar de se comunicar com ex-crentes. Os membros expulsos devem sempre ser “amados,” não “odiados” (Lucas 6:27-37).

Que o Deus da verdade ilumine todos as testemunhas de Jeová sinceras a perceber o grande erro que comentem ao ostracizar seus entes queridos que resolveram abandonar as crenças do Jeovismo. As Testemunhas precisam entender que a religião não deve ser usada para dividir as pessoas com a intolerância, muito menos os membros de uma família, mas para aproximar as pessoas. A religião precisa ser a mais poderosa força para a liberdade na sociedade.


Mais amor menos intolerância!

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