Teologia

sexta-feira, 12 de agosto de 2022

FRUTOS DA OBRA SALVADORA DE JESUS


 Otoniel Tavares de Carvalho*

Isaías afirmou que Jesus veria "o fruto do penoso trabalho de Sua alma”

Duas horas da madrugada. Acordo ouvindo gemidos abafados. Era minha esposa que sentia as primeiras dores de parto de nosso primeiro filho. As dores aumentam. Corro à casa da enfermeira do colégio e não a encontro. Aflito, vou à casa do Pastor José Monteiro e lhe peço ajuda. "Preciso levar minha esposa à cidade de Caruaru", que dista sessenta quilômetros do ENA. Enquanto o automóvel avança estrada a fora, seguro com firmeza a mão de minha esposa e noto em seu rosto um ricto de dor. Finalmente, chegamos ao hospital. A médica a recebe e procura transmitir coragem e entusiasmo. As dores, porém, aumentam e a hora se aproxima. Mais uma hora de sofrimento, e tudo termina. Entro no quarto, e vejo a alegria estampada em seu rosto. Feliz pelo nascimento de uma bonita e sadia garota, minha esposa já não fala de dor e sofrimento. Ri de alegria e felicidade. Nasceu o fruto do seu ventre.

Penoso trabalho

Deus teve muito trabalho para consumar a obra de redenção do homem. A partir do momento em que Deus Se fez homem, na pessoa de Jesus, o Cristo, até ao Calvário, quando concluiu a fase decisiva da salvação do homem, verifica-se uma vida marcada por lutas e sofrimentos. Satanás estava mais do que nunca decidido a impedir que aquele Homem tivesse sucesso em Sua obra. Opor-se-ia a Ele com todas as sutilezas. Poria em Sua estrada pedras e espinhos. Perseguilo-ia minuto a minuto. Não Lhe daria tréguas. Ele sabia que o sucesso do Homem Jesus representaria sua derrota, o esmagar de sua cabeça, como fora anunciado no Éden (Gên. 3:15).

Quando Jesus estava para nascer, Satanás criou certas condições adversas, impedindo que houvesse para Ele um lugar adequado para o Seu nascimento. O diabo desejava matá-Lo na hora do nascimento. Apesar de ter nascido numa manjedoura, Jesus não foi infectado. Nasceu sadio e perfeito.

Depois do batismo, Jesus foi levado ao deserto. Ali, defrontou-Se com Satanás. Satanás trabalhou incansavelmente para levar Jesus ao fracasso. Desejava que o Mestre cedesse terreno. Um vacilo só, e eis que tudo estaria perdido. Tentou-O no apetite (Mat. 4:3 e 4); tentou-O na presunção (4:5-7); e na cobiça por honras, poder e fama mundanos (4:8 e 9). Até que ouviu dos lábios de Jesus a ordem: "Retira-te, Satanás..." (4:10).

Outros agentes

Não conseguindo sucesso em sua tentativa de enganar a Jesus e levá-Lo a desistir ou a vacilar em Seu trabalho de redenção do homem, Satanás usa muitos homens, líderes religiosos do povo, como opositores. Os escribas e fariseus foram continuamente manipulados pelo demônio para tentar barrar o trabalho de Jesus. Acusações levianas; interpretações fantasiosas da Lei de Deus; perguntas cheias de veneno de víbora; insinuações grosseiras quanto à Sua filiação (João 8:41); pressões e ameaças de apedrejamento; tudo isto tornou o trabalho de Cristo uma obra penosa e difícil.

Satanás não sossegava. Semeou desunião entre os apóstolos. Discutiam constantemente sobre quem seria o mais importante no Reino de Deus. Certa vez, quando Jesus terminou de apresentar Seu programa de trabalho na reta final, falou da necessidade de morrer e ao terceiro dia ressuscitar.

Pedro, então, manipulado pelo diabo, chamou Jesus à parte e O repreendeu. Jesus viu naquela reprovação a atuação direta de Satanás, e o desmascarou: "Arreda, Satanás..." (Marcos 8:33).

Judas Iscariotes foi um fantoche nas mãos do diabo, para trair e vender seu Mestre. Pedro também foi usado mais uma vez, negando conhecer a Jesus. Todos foram manipulados por Satanás, que lhes pôs pesado sono, impedindo que vigiassem em oração em favor de seu Mestre, lá no Getsêmani. Sozinho, sem nenhum apoio humano, Jesus foi levado de sala em sala para ser julgado. Interrogatórios, zombarias, acusações falsas, agressões físicas, humilhações, infâmias, indignidade. Num simulacro de julgamento, foi Jesus condenado a morrer numa vergonhosa e maldita cruz, entre ladrões.

Satanás, porém, estava frustrado e insatisfeito. Não queria apenas que Jesus morresse. Morrer por morrer não era suficiente. Satanás queria que Jesus morresse como pecador, e não pelo pecador. Ele não queria que Jesus morresse como substituto do homem, mas como cúmplice do homem. Ele desejava levar Jesus a cometer Seus próprios pecados. Se isto não ocorresse, não teria servido de nada toda a canseira e enfado que pusera sobre o Mestre.

Quando Satanás viu Jesus posto na cruz, já prestes a exalar o último suspiro, e declarar concluído seu penoso trabalho de redenção da humanidade, ficou impaciente. Com o mesmo afã com que trabalhou para levá-Lo à cruz, agora agia celeremente para tentar fazer com que Ele voluntariamente descesse da cruz. O Cristo na cruz, morrendo sem cometer pecados pessoais, significaria a sentença de morte sobre ele, Satanás. Imediatamente o diabo manipula a mente de vários homens, os quais cobram de Jesus alguma ação, descendo da cruz para salvá-los. Não sabiam eles que fora da cruz Jesus não seria o Salvador deles todos. O ladrão à esquerda disse-Lhe: "Não és Tu o Cristo? Salva-Te a Ti mesmo e a nós também." Lucas 23:39. "Também as autoridades zombavam e diziam: Salvou os outros; a Si mesmo Se salve, se é de fato o Cristo de Deus, o escolhido." Lucas 23:35. "Igualmente os soldados O escarneciam e, aproximando-se, trouxeram-Lhe vinagre, dizendo: Se Tu és o Rei dos judeus, salva-Te a Ti mesmo." Lucas 23:36 e 37. O diabo insistia para que Ele saísse da cruz.

"Contudo, Jesus dizia: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem." Lucas 23:34. Realmente todos ignoravam o que pediam. Desistir de morrer pelo homem seria ceder aos apelos de Satanás, submetendo-Se desse modo aos seus caprichos. E isto representaria união com o maioral dos demônios e cumplicidade com sua tirania. Jamais Se prestaria a tal subserviência. No Getsêmani concordara em aceitar a vontade do Pai.

Já Se submetera a Seu Pai. Agora não haveria de desistir. Sorveria o cálice até a última gota. Teria de concluir a penosa e difícil obra que o Pai Lhe confiara. Assim refletindo, deixou-Se conduzir pelos Seus algozes até o momento final. Cansado, ferido e oprimido, sem aparência nem formosura, entrega ao Pai o Seu espírito, exalando um último brado: "Está consumado."

Frutos agradáveis

Quando Isaías foi inspirado por Deus para escrever a profecia que apresentava o sofrimento vicário do Messias, do Cristo sofredor, ele o fez com arte e estilo, afirmando no final: "Ele verá o fruto do penoso trabalho de Sua alma e ficará satisfeito." Isa. 53:11.

Observando-se o trabalho penoso e difícil que Jesus executou, até o momento de Sua morte, tem-se a impressão de que não houve resultados positivos. Quando se vê um Judas ganancioso e traidor; um Pedro falastrão e medroso; um grupo de homens tímidos, que fugiram da luta, deixando seu comandante sozinho a lutar com o inimigo, parece que Jesus havia trabalhado em vão.

Depois da ressurreição, e, principalmente, a partir do Pentecoste, quando o Espírito do Senhor Se apossou deles, ocuparam seu espaço como continuadores da propagação do Reino de Deus. Agora não mais um grupo de homens tímidos e medrosos, mas um exército de pessoas destemidas e corajosas, dispostas a servir "mais a Deus do que aos homens".

Fixaram o olhar em Jesus e O tomaram como ponto de referência de sua vida. Imitar seu Mestre, na vida e na morte, era o lema daqueles discípulos. Não se intimidariam com ameaças e prisões. Estavam prontos a caminhar com Jesus até o final da estrada.

Jesus observava do Céu essa mudança de atitude, fruto de uma conversão sincera, e ficava satisfeito. Esses apóstolos e discípulos eram os agradáveis frutos do penoso trabalho que por eles executara.

O Mestre contemplou a Pedro perante seus carrascos, pedindo para ser crucificado de cabeça para baixo, por não se achar digno de morrer como seu Senhor. Pedro, que dera tanto trabalho a Jesus, agora se transforma em agradável fruto.

Jesus contemplou o destemor de Estêvão, ousado no testemunho perante uma multidão de homens ensandecidos e manipulados por Satanás, o qual não tolerava ouvir esse bendito nome: Jesus. Então o Mestre olhou para Estêvão, e este encontrou o olhar generoso do Mestre.

Saulo de Tarso ajudou a matar a Estêvão. E Jesus notou esse detalhe. Saulo, em seu zelo cego e fanático, decidira acabar com a Igreja de Jesus Cristo, o Nazareno. Satanás o usou como fantoche para essa missão. Jesus queria Saulo trabalhando em Seu exército.

Encontrou-o na estrada de Damasco. Derrubou-o do cavalo, cegou-o e o humilhou. Ele não sabia o que fazia. Era apenas um jovem ousado, a quem Satanás usara para causar danos ao povo de Deus. Jesus então trabalhou com Saulo.

Converteu-o em apóstolo e pregador do Evangelho da redenção. Chamou-o de Paulo, e o ungiu com poder do alto. Paulo tornou-se, nas mãos de Jesus, um fruto precioso.

Através dos séculos

O Senhor olhou através dos séculos e viu Sua Igreja sendo perseguida e agredida por Satanás. Observou a firmeza e coragem com que se punham perante seus agressores. A fogueira, a tortura, as ameaças, nada era suficiente para fazê-los retroceder e desistir da caminhada. Enquanto o diabo ficava desesperado e ensandecido com tamanha coragem e fé, Jesus sorria feliz, lá do Céu, ao ver aquela multidão de homens e mulheres, adultos, jovens e crianças, pecadores salvos pela graça, transformados em agradáveis frutos de Sua penosa obra de redenção, troféus de um Guerreiro vencedor.

Jesus olha, hoje, para cada alma que se arrepende de seus pecados, e abandona as hostes do demônio, e os vê marchando fiéis, dispostos a dar sua vida em louvor ao Senhor, e fica muito contente. Eles representam os agradáveis frutos dessa geração final, que procuram viver de maneira santa no meio de uma geração corrompida e manipulada por Satanás.

Nós somos os penosos e agradáveis frutos da obra salvadora de Jesus. Muitas e muitas vezes causamos-Lhe tristeza e decepção. Quando, porém, nos arrependemos sinceramente e nos pomos à Sua disposição para servir voluntariamente, Ele sente prazer em nós, e fica muito feliz.

Paulo nos oferece um oportuno conselho: "E não entristeçais ao Espírito Santo, no qual fostes selados para o dia da redenção." Ef 4:30. Deus quer sentir prazer em nós. Deseja sentir-Se feliz tendo-nos como amigos. Espera, pois, que haja reciprocidade.

 

*Otoniel Tavares de Carvalho, Pastor da Igreja Central de Vitória,

Espírito Santo

 

FONTE: Revista Adventista, Março de 1990, p. 11-13.

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