Teologia

sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

ABIGAIL, UMA MULHER INTELIGENTE QUE PROMOVEU A CULTURA DA PAZ


 Ricardo André

Queremos neste artigo meditar sobre um episódio marcante na vida de uma mulher fantástica, de nome Abigail, que viveu nos tempos do Antigo Testamento. Embora tivesse casada com um homem perverso, era cheia do Espírito de Deus. Ela soube lidar com circunstâncias muito difíceis com muita sabedoria e humildade. Ela é, indubitavelmente, uma pessoa que deve ser imitada. Sua história está registrada no livro de 1 Samuel 25. Nela, encontramos relevantes lições para nós que vivemos no século XXI. Tais lições com certeza nos ajudarão nas mais diversas situações da nossa vida.

Nabal, um rico perverso

Davi e seus homens estavam fugindo de Saul. Enquanto se refugiaram no deserto de Parã, eles se encontraram com os pastores e os animais de um rico proprietário chamado Nabal. Em vez de se aproveitarem dos animais, Davi e seus homens protegeram os pastores e animais. Finalmente, chegou a primavera. Nos tempos bíblicos, comumente esse era o tempo da tosquia das ovelha. As 3.000 ovelhas de Nabal produziam bastante lã, muito provavelmente a maior fonte de sua renda. Esse período de prosperidade financeira produzia um espírito festivo no ar, e Nabal deveria estar de bom humor e feliz. Sabendo disso, Davi enviou dez de seus homens para pedir uma doação de alimento, em reconhecimento de sua parte na proteção do rebanho de Nabal durante o inverno.

Contudo, em resposta à mensagem cortês de congratulações de Davi, e seu pedido de provisões, Nabal insolentemente sugeriu que Davi era um inútil que não merecia bondade, muito menos uma recompensa. Ele afirmou: “Quem é esse tal de Davi?, perguntou-lhes Nabal. Quem esse filho de Jessé pensa que é? Hoje em dia, há muitos servos que fogem de seus senhores. Devo pegar meu pão, minha água e a carne dos animais que abati para meus tosquiadores e entregar a um bando que vem não se sabe de onde?” (1Sm 25:10-11). Com essas palavras, Nabal deixou muito nítido que pensava ser Davi um ninguém. Em sua mente Davi era tão insignificante que não valia a pena perguntar de onde vinha nem o que fazia.

Ao negar provisões a Davi e enviar os dez homens de Davi de mãos vazias Nabal estava, deveras, confirmando o significado de seu nome, que é “tolo” e “sem juízo” (Comentário Bíblico Adventista, v. 2, p. 617). O tolo e mesquinho avarento Nabal, não somente recusou partilhar sua fartura, mas ainda insultou os mensageiros de Davi. Os servos de Nabal reconheceram que seu senhor era “um homem tão cruel que ninguém consegu[ia] conversar com ele” (1Sm 25:17, NVT).

Quando Davi ouviu o relato, se sentiu profundamente ofendido, sua pressão sanguínea se elevou ao chamejante ponto de vingança. Ele e 400 de seus homens mais capazes partiram imediatamente para eliminar Nabal e toda a sua população de servos do sexo masculino (1Sm 25:13).

Abigail, inteligente pacificadora

No meio dessa irascível cena entrou uma mulher de grande encanto, cujas palavras e procedimento calmos salvaram sua casa de destruição certa e guardaram o futuro rei de manchar temerariamente as mãos com sangue inocente. As Sagradas Escrituras dizem que Abigail era uma mulher “inteligente e bonita” (1Sm 25:3), e seus atrativos evidenciavam-se em sua alma porque ela havia escolhido a paz. Me impressiona a Bíblia, que fora escrita numa cultura que inferiorizava a mulher, destacar a capacidade intelectual de Abigail. Ela destaca que Abigail era “inteligente e bonita”, exatamente nessa ordem. Isso é assaz importante. É como quisesse dizer que a mulher deve ser valorizada não pelo seu corpo, como é comum hoje na cultura ocidental, mas pela sua capacidade intelectual.

Essa qualidade de Abigail me faz pensar sobre a posição da mulher em nossa sociedade atual. Ora, se a mulher tem a mesma capacidade intelectual do homem, ela pode e deve ocupar os mesmos espaços historicamente ocupados por eles, inclusive ocupando cargos de direção em empresas. Já vemos isso hoje, mas os indicadores divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em março de 2018, mostram que o caminho a ser percorrido para a igualdade de gênero permanece longo e tortuoso. Embora representem pouco mais da metade (51,7%) dos trabalhadores brasileiros, somente 37,8% delas estão em cargos gerenciais existentes no Brasil. No que se refere a remuneração, apesar da melhora nos últimos anos, uma mulher ainda recebia 76,5% do rendimento dos homens em 2016.

Voltemos a Abigail. Ela só não se deu bem no amor. Não sabemos ao certo como ela pode casar com um brutamonte cruel e mesquinho, como Nabal. Provavelmente seu casamento com Nabal tenha sido arranjado, como era comum nos tempos bíblicos, e em muitas partes do mundo hoje. E então ela não teve escolha a esse respeito.

Uma das mais difíceis de todas as relações humanas é apaziguar a ira. As palavras podem ser muito incitantes. Às vezes parece impossível desviar as pessoas que estão obcecadas pela ira e inclinadas à vingança. Todavia, Abigail fez exatamente isto.

Ao ser informada por um servo do tratamento mau do seu marido dispensado a Davi, Abigail ficou preocupada com a sua casa e com os seus. Ela sabia que dessa vez Nabal havia ido longe demais e colocado em risco a vida dele, a vida dela, da família e de todos os servos. Sem contar nada para seu marido, imediatamente preparou um banquete para Davi e seus homens e foi se encontrar com o guerreiro e seu bando. Note que, ao invés de atear fogo sobre a confusão, ela joga água. Quando encontrou-se com Davi, prostrou-se diante dele e se dirigiu a ele como se já fosse rei. “Eu, tua serva, não vi os rapazes que meu senhor enviou” (v. 25). Por outras palavras, tentava dizer: “Se eu os tivesse visto, tentaria usar a minha influência para evitar este problema”.

 “Nada tendo de ostentação ou orgulho, antes cheia da sabedoria e amor de Deus, Abigail revelou a força de sua devoção para com sua casa, e esclareceu a Davi que o procedimento indelicado de seu marido de nenhuma maneira fora premeditado contra ele como uma afronta pessoal, mas que tinha simplesmente sido a explosão de uma natureza infeliz e egoística” (Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, p. 666).

O seu apelo, baseado no caráter de Deus e no Seu soberano poder, deixou Davi desarmado. Uma das mais reveladoras características dessa culta e refinada mulher estava em não pretender nenhum mérito por arrazoar calmamente com Davi procurando desviá-lo de seu desejo de vingança. Ao contrário, deu a Deus todo o louvor e glória. Davi aceitou a reprovação com louvor a Deus pelo sábio conselho de Abigail. “Bendito seja o Senhor, o Deus de Israel, que hoje a enviou ao meu encontro. Seja você abençoada pelo seu bom senso e por evitar que eu hoje derrame sangue e me vingue com minhas próprias mãos. De outro modo, juro pelo nome do Senhor, o Deus de Israel, que evitou que eu lhe fizesse mal, se você não tivesse vindo depressa encontrar-me, nem um só do sexo masculino pertencente a Nabal teria sido deixado vivo ao romper do dia". Então Davi aceitou o que ela havia lhe trazido e disse: "Vá para sua casa em paz. Ouvi o que você disse e atenderei o seu pedido" (1Sm 25:32-35). Em lugar de ser impaciente e manter o rancor, permitiu que as palavras calmas e respeitosas de Abigail influenciassem seu coração.

“De manhã, quando Nabal estava sóbrio, sua mulher lhe contou todas essas coisas; ele sofreu um ataque e ficou paralisado como uma pedra. Cerca de dez dias depois, o Senhor feriu a Nabal, e ele morreu” (1Sm 25:37,38). A princípio Abigail escondeu de Nabal, sobre como as coisas se resolveram com Davi. A intenção era boa, o resultado por sua vez, não foi bom para seu marido.

Quando ela contou, ele ficou tão estressado que provavelmente tenha tido um Acidente Vascular Cerebral (AVC), porque a Bíblia afirma que ele “ficou paralisado como uma pedra”. Ao saber disso, Davi louva a Deus e pede Abigail em casamento, ela diz: Sim! (v. 39-42). Daí em diante vai viver uma novidade de vida. Deus, em sua infinita bondade lhe concede um recomeço. De uma mulher casada com um homem tolo e mau, ela se tornou a esposa do rei Davi. E eu fico a pensar em como tudo mudou para ela, e sobre a forma inteligente e sábia com a qual ela venceu sua crise.

As lições da vida de Abigail

A experiência de Abigail de lidar com dois homens difíceis ilustra como a beleza interior da personalidade, impregnada da graça e atmosfera do Céu, pode intervir em circunstâncias difíceis e influenciar outros para o bem. Nos nossos dias há muitas pessoas que promovem a discórdia, confusão, o ódio e a violência. Já pensou se Abigail fosse uma mulher insensata e incendiária, teria incentivado Nabal a “tomar satisfações” com Davi. O resultado seria o de muitas vidas inocentes desperdiçadas. Ellen G. White compara sua piedade com o “perfume de uma flor, [que] exalava de seu rosto, de suas palavras e ações, sem que disso ela se apercebesse” (Idem, p. 667). Como cristãos, somos chamados por Jesus a rodear-nos a nós mesmos e aos outros com a inspiração edificante que vem das flores. E podemos fazer isso sendo bondosos, piedosos e pacificadores. Em nossos relacionamentos interpessoais no lar, na escola, na Faculdade, em nossa vizinhança, na igreja ou em qualquer meio social em que estivermos inseridos, quando houver atritos e tensões, não precisamos alimentar a violência. Devemos iniciar um ciclo de paz e vida. Não façamos guerra em nossa casa ou em nosso ambiente de trabalho.

Vivemos num mundo dividido, com muros, cercas, polarização política, classes sociais, raças, culturas e riquezas, que nos separam uns dos outros. E, é justamente nesse mundo dividido, impregnado pelo ódio, que somos chamados a sermos pacificadores. “Felizes os que promovem a paz, pois serão chamados filhos de Deus” (Mt 5:9), disse Jesus. Vejam como esse texto na Nova Tradução na Linguagem de Hoje ficou com expressões bem mais abarcantes e eternas: “Felizes as pessoas que trabalham pela paz, pois Deus as tratará como seus filhos”. Segundo Jesus, os pacificadores são mais felizes, pois verão o Deus da paz e viverão no eterno reino da paz. Portanto, façamos a paz com nosso semelhante! O teólogo William Barclay disse que “em cada homem há uma tensão; cada homem é uma guerra civil em marcha”.

Caro(a) amigo(a) leitor(a), a única maneira de qualquer um dentre nós se tornar um verdadeiro pacificador como Abigail consiste em termos a paz de Deus em nosso interior, aquela que advém quando, como disse Paulo: “Já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim” (Gl 2:20). Não quer você abrir seu “coração” para que Cristo entre e viva em você, e promova mudanças radicais em sua vida? Faça isso agora!

Deus te abençoe ricamente!

 

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