Teologia

sexta-feira, 27 de novembro de 2020

A ORAÇÃO E O SIGNIFICADO DA VIDA


 Você já imaginou se suas orações não passassem de apenas um diálogo consigo mesmo, uma projeção de suas vontades e desejos, uma invenção de sua imaginação febril? Você já pensou se orar fosse um ato irracional e ridículo, pois Deus conhece tudo? Você fica frustrado quando vê que suas orações não são respondidas? Você já se sentiu insatisfeito com Deus porque Ele não atendeu aos seus pedidos?

Essas e outras perguntas surgem em nossa mente quando refletimos sobre o mistério da oração. E, a menos que entendamos o que a Palavra de Deus diz a respeito disso, essas perguntas não terão respostas.

Que tragédia seria passar pela vida sem qualquer indicação de por que seguimos por um caminho ou para onde o caminho nos leva! A jornada da vida já é válida por si mesma. No entanto, essa jornada tem um significado! As Santas Escrituras nos ensinam sobre a relação que existe entre o ato de orar e o significado da vida.

ORAÇÃO: O CHAMADO E A RESPOSTA

A Bíblia nos ensina que orar é uma resposta inspirada da criatura para com o chamado e as promessas do Criador. “E desse mesmo modo – pela nossa fé – o Espírito Santo nos ajuda em nossos problemas diários e em nossas orações. Nem mesmo sabemos por quais devemos orar, nem orar como devemos; o Espírito Santo, porém, ora por nós com tal sentimento que não pode ser expresso em palavras” (Romanos 8:26 – Bíblia Viva). O que significa “resposta inspirada”? Será que Deus chama e também responde? De que maneira a oração pode ser um chamado e uma resposta ao mesmo tempo?

Para responder a essa pergunta, vamos voltar à origem da humanidade. O livro de Gênesis nos diz que, depois da queda, Adão e Eva foram dominados pelo medo e se esconderam da presença de Deus – pelo menos eles achavam que podiam se esconder. O Criador, porém, seguia os passos de Suas criaturas. Ele os buscou onde estavam: “Mas o Senhor Deus chamou o homem, perguntando: ‘Onde está você?’” (Gênesis 3:9). Deus pro- curou estar mais próximo da humanidade. Foi Ele que pronunciou a primeira palavra na consciência de Adão e Eva. Ele “chamou Adão”. E Adão respondeu: “Ouvi Teus passos no jardim e fiquei com medo, porque estava nu; por isso me escondi” (verso 10).

Foi o chamado de Deus e a respostas a esse chamado que tornou possível a primeira conversa entre o Criador e a criatura após a queda. Mas, nessa conversa, não temos ainda uma oração, nem mesmo em sua forma embrionária. Por quê? Por causa da atitude de Adão: ele fugiu de Deus e estava com medo. Ele reconheceu sua situação e respondeu ao chamado de Deus. Contudo, essa não era uma forma de resposta que inicia um relacionamento com Deus.

Esse, porém, não foi o fim do encontro: a resposta de Adão não foi um impedimento para Deus; ao contrário, fez com que Deus respondesse com amor, para dar a ele uma solução ao seu problema. Qual foi a resposta divina para a nudez da humanidade representada pelo primeiro casal? A Bíblia assim nos diz: “O Senhor Deus fez roupas de pele e com elas vestiu Adão e sua mulher” (Gênesis 3:21).

Assim, desde o princípio, as Escrituras nos dizem três coisas sobre o nosso relacionamento com Deus: Primeiro, começa com um chamado amoroso de Deus a nós, pois o relacionamento é, fundamentalmente, um anseio divino. Em segundo lugar, As Escrituras nos dizem que nossa tendência natural é fugir de Deus. Adão respondeu: “Ouvi teus passos no jardim e fiquei com medo, porque estava nu; por isso me escondi.” Ficar com medo de Deus é o nosso pior inimigo! Terceiro, Deus é o Único que oferece as respostas para os nossos temores, os quais nos fazem fugir da vida. Deus satisfaz à nossa necessidade de nos sentirmos protegidos, afastando de nós vergonha de nos sentirmos nus.

A oração inicia o relacionamento com Deus. Ela é tanto o chamado que Deus faz ao nosso coração, como a resposta às nossas mais profundas necessidades humanas. É também a nossa resposta, inspirada por Deus, e o chamado que inspirou essa resposta. A oração verdadeira é uma busca e uma resposta divina em nosso coração. Em cada coração humano! Tendo em vista que a oração não é uma questão confessional, não é também a herança de qualquer tradição religiosa. Você não precisa ser judeu, cristão, hindu, muçulmano, xintoísta ou budista para receber o chamado de Deus em sua consciência e responder a ele da maneira apropriada. O chamado está lá, no profundo do ser, em cada pessoa. Está em nossa consciência porque somos criaturas humanas. Está também no ateu que, ao negar a Deus, pronuncia o Seu nome. Deus é a origem da nossa existência, e a oração é o chamado e a resposta que dá significado à vida.

O chamado de Deus está no profundo do nosso ser, mas como uma verdade que podemos ignorar, como um chamado que também podemos ignorar. A verdade de Deus não é “algo” que deva ser “lembrado” e trazido à luz pelo simples raciocínio. A verdade de Deus é um chamado sempre presente, que pode ser rejeitado (ver Hebreus 3:15).

Portanto, a oração é, antes de tudo, a expressão de um sentimento de amor. É o primeiro apelo de Deus à humanidade. E é também a resposta humana inspirada pelo Espírito Santo que corresponde a esse sentimento com outro sentimento de amor.

Assim, se na oração, tudo vem de Deus, qual é a participação humana? O que dizer a respeito das orações de súplica e de confissão?

SILÊNCIO PERANTE DEUS

O livro de Salmos nos ajuda a entender o profundo significado da oração e a responder à questão da função humana na oração. Ele nos auxilia a entender em que consiste o ato da oração e como invocar a presença de Deus no coração. No Salmo 37:7, Davi nos diz: “Descanse no Senhor e aguarde por Ele com paciência”. E o Salmo 46:10 (ARA) nos reafirma esse sentimento: “Aquietai-vos e sabei que Eu sou Deus.” “Aquietai-vos” é um chamado para ficarmos em silêncio e nos voltarmos para Deus como a Fonte de todas as respostas. O silêncio diante de Deus coloca em nossas mãos o doce fruto da esperança, pois nos oferece a oportunidade de entrar em um relacionamento de confiança com o Criador, de conhecê-Lo verdadeiramente. Ellen White assim escreveu: “Precisamos ouvir individualmente Sua voz a nos falar ao coração. Quando todas as outras vozes silenciam e em sossego esperamos perante Ele, o silêncio da alma torna mais distinta a voz de Deus, Ele nos manda: ‘Aquietai-vos, e sabei que Eu Sou Deus’ (Salmo 46:10). Somente assim se pode encontrar o verdadeiro descanso. E é essa a preparação eficaz para todo trabalho que se faz para Deus. Por entre a turba apressada e a tensão das febris atividades da vida, a alma que assim se refrigera será circundada por uma atmosfera de luz e paz. A vida exalará fragrância, e há de revelar um divino poder que atinge o coração dos homens.”

A oração começa com o silêncio, não com nossas palavras. Não com nossos desejos e necessidades. Devemos fazer silenciar nossos desejos e necessidades para começar a ouvir Deus. O importante não é pedir o que pensamos que necessitamos ou desejamos, mas pedir clareza para captar o que nossa razão não pode compreender e o que nossa mente finita não consegue alcançar – mais precisamente, a presença da luz de Deus em nossa vida (ver João 8:12).

A vida requer que constantemente façamos decisões, e nós buscamos a Deus para obter as respostas. Algumas vezes, em meio ao desespero! E muitas vezes nós não as encontramos porque exigimos muito de nosso raciocínio limitado. Não deveríamos pensar em como explicar nossos desejos a Deus ou fazer com que Ele entenda as nossas orações, pois, mesmo que deixe- mos de apresentar todos os nossos desejos a Ele e nos conformemos com as nossas dores e problemas, ainda assim, não conseguiremos conhecer a Deus. Portanto, vamos primeiramente pedir humildade a Deus para que a Sua presença possa ser sentida em nosso coração! Essa presença divina destrói o que está represado em nossa mente e nos traz paz e lucidez! Esse momento da eternidade em nosso coração é o que Jesus prometeu quando afirmou: “Eu sou a luz do mundo. Quem Me segue, nunca andará em trevas, mas terá a luz da vida” (João 8:12). Debaixo dessa luz, nossas decisões serão sábias, e o tempo vai confirmar isso.

Portanto, não se trata de Deus satisfazer os nossos desejos ou de atender aos nossos pedidos, mas de que Ele Se torna evidente no profundo do nosso ser! Essa luz está presente na oração correta, que não dá, nem pede explicação de nada, mas que suplica para que Deus Se explique através de nós!

Quer isso dizer que não devemos pedir a Deus por necessidades específicas? De modo nenhum. Isso significa que nEle está a origem de tudo o que necessitamos ou pedimos! Deus tem diante dEle todos os nossos desejos. Sem a luz de Deus, não sabemos o que pedir, nem compreendemos nossas verdadeiras necessidades (ver Romanos 8:26). A promessa é certa e segura: “O meu Deus suprirá todas as necessidades de vocês, de acordo com as Suas gloriosas riquezas em Cristo Jesus” (Filipenses 4:19 – itálico acrescentado).

A ENCARNAÇÃO E A ORAÇÃO

Se a oração representa um relacionamento entre o Criador e a criatura humana, como esse tipo de relacionamento é expresso na vida? Como Deus conhece os anseios mais profundos do coração do crente que ora?

A chama da oração não é consumida na alma daquele que ora. Orar não somente faz com que estejamos abertos para Deus, como também para aqueles que estão ao nosso redor. A oração não é um solilóquio, isto é, ela não é um diálogo consigo mesmo, com um objeto ou com um ser incapaz de falar. Não se trata de conversar com uma planta ou um animal para expressar os sentimentos em meio à solidão. O ato de orar encontra sua expressão máxima quando se transforma em ação, quando se torna uma obra de amor em favor dos outros.

O amor é a expressão divina mais sublime que há no mundo. A verdadeira oração sai do coração como uma flecha atirada em direção a Deus e que se dirige ao coração do próximo. Não é essa a maior manifestação da presença de Deus entre os seres humanos? Quem mais, a não ser Deus, pode nos impelir a nos movermos para fora de nós mesmos e irmos em busca do que é bom para os outros? Somente o Criador, em cuja imagem e semelhança fomos criados, Esse mesmo Ser, que é o Originador da nossa própria existência, pode nos impelir a ajudar nossos semelhantes.

Desse modo, concluímos que o amor, como a expressão mais sublime e concreta de uma oração, c, consequentemente, entre a oração e o significado da vida.

*Ricardo Bentancur, PhD pela Universidade Nacional de Córdoba, Argentina, é pastor e atua como diretor de Publicações Internacionais na Pacific Press Publishing Association, Nampa, Idaho, EUA.

NOTAS E REFERÊNCIAS

https://www.the-philosophy.com/plato-theory-knowledge.

Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1990), p. 363.

 

FONTE: Revista Diálogo Universitário

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