Teologia

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

DEVEM OS ADVENTISTAS CELEBRAR O NATAL?


Ricardo André

Com a aproximação do dia 25 de dezembro, data em que o mundo cristão celebra o Natal do Senhor Jesus, muitos cristãos adventistas mostram-se preocupados com o fato de muitas das nossas igrejas comemorarem um festival de origem pagã. Vale ressaltar que o debate sobre se os cristãos devem ou não celebrar o Natal tem sido discutido por séculos. Há cristãos igualmente sinceros e comprometidos em ambos os lados da questão, cada um com várias razões por que o Natal deve (ou não) ser comemorado em lares cristãos. Entretanto, o que diz a Bíblia e o Espírito de Profecia? É o Natal uma festividade pagã? Devemos celebrar o Natal de Jesus?

Em primeiro lugar, vejamos alguns fatos. Ninguém sabe o dia em que Jesus nasceu. Certamente não foi em 25 de dezembro. Não sabemos as razões reais pelas quais Deus omitiu a data do nascimento de Jesus. Entretanto, Ellen G. White apresenta uma possível razão para o ocultamento do dia. Ela afirma: “A Bíblia não nos informa a data precisa. Se o Senhor tivesse considerado este conhecimento essencial para a nossa salvação, Ele Se teria pronunciado através de Seus profetas e apóstolos, para que pudéssemos saber tudo a respeito do assunto. Mas o silêncio das Escrituras sobre este ponto dá-nos a evidência de que ele nos foi ocultado por razões as mais sábias. Em Sua sabedoria o Senhor ocultou o lugar onde sepultou Moisés. Deus o sepultou e Deus o ressuscitou e o levou para o Céu. Este procedimento visava prevenir a idolatria. Aquele contra quem se haviam rebelado quando estava em serviço ativo, a quem haviam provocado quase além dos limites da resistência humana, era quase adorado como Deus depois de separado deles pela morte. Pela mesma razão é que Ele ocultou o dia preciso do nascimento de Cristo, para que o dia não recebesse a honra que devia ser dada a Cristo como Redentor do mundo - Aquele que deve ser recebido, em quem se deve crer e confiar como Aquele que pode salvar perfeitamente” (O Lar Adventista, p. 477).

Muitos estudiosos acham que o Natal de Jesus deve ter ocorrido em setembro ou outubro. O dia 25 de dezembro já era um feriado comemorado pelos romanos: era a festa do Sol Invictus. Com o triunfo do cristianismo no Império Romano, esta data foi escolhida pela Igreja Romana para a celebração do nascimento de Jesus.

O Comentário Bíblico Adventista informa que “foi só no 4º século da era cristã que o dia 25 de dezembro passou a ser observado como aniversário. Segundo o calendário Juliano, esta era a data do solstício de inverno, quando o sol se volta em direção ao norte. Nas regiões pagãs, essa época era marcada pelas celebrações festivas, conhecidas entre os romanos como a Sartunália, realizadas em honra a várias divindades solares. Na igreja ocidental é que o nascimento de Cristo foi primeiramente associada ao feriado pagão” (v. 5, p. 767).

Antes de concluirmos que os adventistas nada têm a ver com o Natal, precisamos levar em consideração alguns fatos:

1) Tanto para os cristãos como para os não-cristãos, o dia 25 de dezembro é associado com o nascimento de Jesus. Embora certos elementos como Papai Noel, festejos e bebedice sejam uma herança do passado pagão, outros aspectos como corais e histórias de pastores e magos apontam para um núcleo de significado cristão.

2)  O mais importante não é a data, mas o evento. A Bíblia revela que Jesus nasceu numa noite em Belém da Judeia (Lc 2:10, 11). Isto é fato para nós. Logo, o estabelecimento do Natal celebra um evento profundamente cristão, a encarnação de Jesus Cristo. O EVENTO celebrado é que cristianiza a data.

3) O Natal se tomou uma ocasião para reuniões familiares, por simples conveniência. Os feriados públicos que caem nesse período tornam possível as viagens para visitar os pais, os filhos, e os amigos. E os adventistas participam de tais oportunidades.

Que Espécie de Testemunho?

É claro que os adventistas poderiam se recusar a tomar conhecimento do dia 25 de dezembro e a ter qualquer coisa a ver com o Natal. Poderíamos manter abertas as nossas instituições, a exemplo das escolas e faculdades. Poderíamos deixar de realizar uma Programação especial em nossas igrejas. Poderíamos recusar-nos a mencionar o nascimento de Jesus, ou a reunir-nos com os queridos e amigos. Poderíamos recusar-nos a realizar a ceia em nossos lares e a trocar presentes.

Em assim fazendo, estaremos deixando claro que a festa celebrada no dia 25 de dezembro é de origem pagã. Mas que espécie de testemunho estaríamos dando em favor de nosso Senhor? Creio que nenhum!

E por que eliminar apenas o Natal? Em muitos idiomas os nomes dos dias da semana também são de origem pagã. Em inglês, domingo é Sunday, ou dia do Sol; Monday vem de Moon-day, ou dia da Lua, e assim por diante. Para sermos coerentes, deveríamos parar de usar tais nomes também.

A Bíblia tem vários exemplos de símbolos pagãos que foram usados para expressar verdades eternas, como a serpente no deserto que era símbolo de um deus egípcio e símbolo do Dragão (Apo. 12), mas que Deus usou como símbolo de Cristo (João 3:14). A cruz era símbolo de tortura e opressão pelos romanos mas Deus a usou para realizar a expiação. O uso cristão desses símbolos modificou suas conotações.

Invertendo um pouco a analogia, o arco-íris foi usurpado pelo movimento homossexual e tem hoje fortes associações pagãs. Por que não vemos os críticos do Natal rejeitando o arco-íris como um símbolo da promessa divina por causa dessa associação?

Não há dúvida de que nossa cultura é uma amálgama de ideias e práticas procedentes de várias fontes. A origem de algumas ideias se perdeu; outras, deixaram de ser importantes, como é o caso dos nomes dos dias da semana. O cristão deve ser uma pessoa de sua própria época, mas enraizado na filosofia das Escrituras, e sempre alerta para o significado que a soberania de Jesus Cristo tem em sua própria cultura.

Creio que como adventistas podemos deixar claro que o dia 25 de dezembro não é o dia do nascimento de Jesus, mas não devemos deixar de nesse dia demonstrar nosso regozijo pelo nascimento de Jesus, nosso Salvador e Senhor. Todos nós sabemos que o Natal, há muito tempo, tem sido associado ao comércio, a Papai Noel, bebidas, ao consumismo e muita comida. Devemos evitar tudo isso, podemos por outro lado participar do júbilo e do espírito doador. Mas o cristão sincero não precisa fugir do que é bom por causa dos excessos incentivados pelo mal. O mais importante é depurar os equívocos, como a comercialização da data e enaltecer a celebração de Cristo, nosso Salvador, mesmo que tenha sido instituída pelo catolicismo.


Ellen G. White nos orienta nesse sentido. Ela afirma:

“Lembremo-nos de que o Natal é celebrado em comemoração do nascimento do Redentor do mundo. Este dia é geralmente gasto em festas e glutonaria. Grandes somas de dinheiro são gastas em desnecessárias condescendências pessoais. O apetite e os prazeres sensuais são satisfeitos a expensas da força física, mental e moral. Todavia, isto se tornou um hábito. O orgulho, a moda e a satisfação do paladar têm tragado imensas quantias que a ninguém, em verdade, beneficiaram, mas animaram uma prodigalidade de meios desagradável a Deus. Esses dias são passados mais em glorificar ao próprio eu do que ao Senhor. A saúde tem sido sacrificada, o dinheiro, pior do que se fosse jogado fora; muitos têm perdido a vida. (Ellen G. White, Mensagens aos Jovens, p. 311).

“As festividades de Natal e Ano Novo podem e devem ser celebradas em favor dos necessitados. Deus é glorificado quando ajudamos os necessitados que têm família grande para sustentar”. (Ellen G. White, Manuscrito 13, 1896).

Com essa atitude daremos um melhor testemunho de Jesus Cristo. E isto estará em harmonia com a herança que os pioneiros do adventismo nos legaram — aqueles homens e mulheres que tomaram suas próprias decisões ao lado do Senhor, ao deixarem de observar o dia do Sol e ao passarem a observar o sábado bíblico. Afinal de contas, Ellen White afirmou: “Sendo que o dia 25 de dezembro é observado em comemoração do nascimento de Cristo, e sendo que as crianças têm sido instruídas por preceito e exemplo que este foi indubitavelmente um dia de alegria e regozijo, será difícil passar por alto este período sem lhe dar alguma atenção. Ele pode ser utilizado para um bom propósito” (O Lar Adventista,478). E até mesmo apoiou a colocação de uma árvore de Natal na igreja. Observe o que ela disse: “Deus muito Se alegraria se no Natal cada igreja tivesse uma árvore de Natal sobre a qual pendurar ofertas, grandes e pequenas, para essas casas de culto. Têm chegado a nós cartas com a interrogação: Devemos ter árvores de Natal? Não seria isto acompanhar o mundo? Respondemos: Podeis fazê-lo à semelhança do mundo, se tiverdes disposição para isto, ou podeis fazê-lo muito diferente. Não há particular pecado em selecionar um fragrante pinheiro e pô-lo em nossas igrejas, mas o pecado está no motivo que induz à ação e no uso que é feito dos presentes postos na árvore” (Idem, p. 482).

Poucas semanas antes do Natal de 1884, a mensageira do Senhor escreveu o seguinte: “Que todos tenham sabedoria para torná-lo [Natal] um período precioso. Que os membros mais antigos da igreja se unam, alma e coração, com seus filhos nessa diversão inocente e recreação, na concepção de formas e maneiras de mostrar o verdadeiro respeito a Jesus, ­trazendo-Lhe presentes e ofertas. Que cada um se lembre das reivindicações de Deus. Sua causa não pode avançar sem sua ajuda. Que os presentes que geralmente vocês têm dado uns aos outros sejam colocados no tesouro do Senhor” (Review and Herald, 9 de dezembro de 1884).

Ellen G. White ainda aprovou a celebração do Natal na igreja de Battle Creck, em dezembro de 1889. Note o que ela disse: “Na noite passada a celebração [da Véspera] do Natal foi realizada no Tabernáculo [de Battle Creck] e decorreu muito bem de maneira modesta, solene, e com gratidão expressa em tudo que se fez e disse, porque Jesus, o Príncipe da Vida, veio a nosso mundo como bebê em Belém, a fim de ser uma oferta pelo pecado. Veio cumprir a predição dos profetas e videntes que Ele mandara proferissem para cumprir os desígnios do Céu e confirmar Sua própria palavra nessa grande missão e obra. E por isso, toda pessoa está sob a mais solene obrigação e gratidão para com Deus, porque Jesus, o Redentor do mundo, comprometeu-Se a realizar a completa salvação de todo filho e filha de Adão. Se eles não aceitam o Dom celestial, só podem culpar-se a si mesmos. O sacrifício foi amplo, inteiramente de acordo com a justiça e a honra da santa lei de Deus. O Inocente sofreu pelos culpados, e isso deve suscitar abundante e completa gratidão” (Este Dia Com Deus, [MM 1980], p. 366).


Penso que os cristãos devem aproveitar o Natal como uma oportunidade para exaltar a Cristo e testemunhar do Seu grande amor por nós.

Obviamente, não devemos observar o Natal com qualquer pensamento de ser esse um dia santificado cuja observância seja necessária à nossa salvação. Mas isto não quer dizer que haja algum mal em aproveitar a época do ano em que o nascimento de nosso Senhor possa ser especialmente relembrado, servindo-nos dessa ocasião par a passar um período feliz e contente no círculo familiar.

Independente do dia, Jesus nasceu e foi por você

Embora não exista nenhum meio para sabermos o dia exato do nascimento de Jesus, este é um fato histórico. “Por mais de mil anos aguardara o povo judeu a vinda do Salvador. Nesse acontecimento fundamentara suas mais gloriosas esperanças. No cântico e na profecia, no ritual do templo e nas orações domésticas, haviam envolvido o Seu nome. Entretanto, por ocasião de Sua vinda, não O conheceram. O Bem-Amado do Céu foi para eles "como raiz duma terra seca"; não tinha "parecer nem formosura" Isa. 53:2; e não Lhe viam beleza nenhuma para que O desejassem. "Veio para o que era Seu, e os Seus não O receberam." João 1:11.” (Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, p. 27.

O evangelho de João começa assim: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por intermédio dEle, e, sem Ele, nada do que foi feito se fez. A vida estava nEle e a vida era a luz dos homens.” (João 1:1-4).

Na Bíblia, o termo Verbo refere-se a Jesus. “João usa o termo aqui como uma designação para Cristo, que veio para revelar o caráter, a mente e a vontade do Pai, assim como uma fala é a expressão das ideias da mente (Comentário Bíblico Adventista, v. 5, p. 989).

O Verbo, que tudo fez, deixou Sua morada eterna para viver neste mundo caído. Como nos sentimos quando temos de deixar nossa casa, um grupo de amigos ou quando temos que nos mudar? Deixaríamos tudo o que temos para viver num lugar em que não seríamos reconhecidos? Podemos imaginar a mudança que houve na vida de Jesus? Certamente, não podemos alcançar a grandeza desse amor!

A prioridade de Jesus era você, era eu, cada um de nós que O aceitamos em nosso coração. Por esse motivo, Jesus deixou toda a perfeição celeste e veio a este mundo manchado pelo pecado. Foi por você! Ou melhor, diga: Foi por mim que Jesus nasceu neste mundo!

O texto bíblico de João 1 diz nos versos 10 e 11: “O Verbo estava no mundo, o mundo foi feito por intermédio dEle, mas o mundo não O conheceu. Veio para o que era Seu, e os Seus não O receberam.”

Neste Natal devemos nos lembrar de que essa celebração é a mais importante para este mundo. Lembra a vinda do Filho Unigênito de Deus à Terra. Lembra o maior Dom de Deus aos homens, o maior amor já demonstrado em nosso favor, pois foi por você e por mim que “o Verbo Se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1:14).

Ellen G. White descreve belamente esse amor de Deus assim: “Todo o amor paternal que veio de geração em geração através do coração humano, toda fonte de ternura que se abriu na alma do homem, não passam de tênue riacho em comparação com o ilimitado oceano, quando postos ao lado do infinito, inexaurível amor de Deus. A língua não o pode exprimir, nem a pena é capaz de o descrever. Podeis meditar nele todos os dias de vossa vida; podeis esquadrinhar diligentemente as Escrituras a fim de compreendê-lo; podeis reunir toda faculdade e poder a vós concedidos por Deus, no esforço de compreender o amor e a compaixão do Pai celeste; e todavia existe ainda um infinito para além. Podeis estudar por séculos esse amor; não obstante jamais podereis compreender plenamente a extensão e a largura, a profundidade e a altura do amor de Deus em dar Seu Filho para morrer pelo mundo. A própria eternidade nunca o poderá bem revelar. No entanto, ao estudarmos a Bíblia e meditarmos sobre a vida de Cristo e o plano da redenção, esses grandes temas se desdobrarão mais e mais ao nosso entendimento. E pertencer-nos-á a bênção que Paulo desejava à igreja de Éfeso ao orar “que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos dê em Seu conhecimento o espírito de sabedoria e de revelação, tendo iluminados os olhos do vosso entendimento, para que saibais qual seja a esperança da Sua vocação e quais as riquezas da glória da Sua herança nos santos e qual a sobre excelente grandeza do Seu poder sobre nós, os que cremos”. Efés. 1:17-19” (Ellen G. White, Testemunhos Seletos, vol. 2, p. 337).

Não devemos nos esquecer nunca de que o Cristo humano era Deus conosco, “um Salvador”. Essa é a mensagem de Natal, as “boas-novas de grande alegria” (Lc 2:10). Nasceu Emanuel! Ele pode mudar o coração das pessoas, ressuscitar os mortos e salvar-nos da destruição eterna. Mas fazer isso custou-Lhe a vida. Devemos sempre contemplar Belém à luz do Calvário – contemplar a esperança que a manjedoura e a cruz nos dão.



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