Ricardo
André
Dezembro passado, a
produtora Porta dos Fundos lançou na plataforma da Netflix o filme “Especial de
Natal Porta dos Fundos: A Primeira Tentação de Cristo”. Nele, Jesus Cristo é
sugestivamente retratado como homossexual e sua divindade apresentada de forma
sarcástica. Dizem que em uma das
cenas do filme, Jesus é surpreendido com uma festa de aniversário de 30 anos,
quando em certa altura Maria e José lhe revelam que ele é adotado e seu
verdadeiro pai é Deus, usando um tom sarcástico. A referida produção provocou grande indignação de cristãos de todas as linhas. A
produtora sofreu duras críticas nas redes sociais, ataque no seu prédio no dia
25 de dezembro por um grupo de neo-integralistas, de cunho fascista, bem como de
uma ação judicial impetrada pela “Associação Centro Dom Bosco de Fé e Cultura”,
grupo de católicos conservadores pedindo a suspensão do filme na Plataforma. O
pedido foi deferido pelo desembargador Benedicto Abicair, da 6ª Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, nesta quarta-feira, dia 08 de janeiro,
em decisão liminar (provisória). Na decisão, o juiz determinou que a produtora
Porta dos Fundos e a Netflix retirassem do ar o polêmico filme. Liminar
derrubada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias
Toffoli, nesta noite de quinta-feira (09).
A produção do filme
acendeu intenso debate entre os cristãos quanto ao uso dessa mídia. Muitos
deles, tanto evangélicos como católicos, têm sugerido um boicote a Netflix, orientando
aos clientes cristãos a cancelarem as suas assinaturas e não assistiream mais
os filmes exibidos pela plataforma. Diante dessa realidade, as perguntas que se
impõem são: Devem os cristãos assistirem os filmes da Netflix? Existem perigos nela
para a vida espiritual dos crentes? Em caso afirmativo, que cuidados os cristãos
deveriam ter ao assisti-los? E o mais importante, o que diz as Sagradas
Escrituras?
Os
cuidados com a Netflix
A Netflix é uma das
maiores plataformas de streaming de vídeos, tendo milhares de títulos de todos
os tipos à disposição. É impressionante como a Netflix tem se tornado popular
em todo o mundo. Segundo o site de notícias da Folha de São Paulo, em 2017, quase 100 milhões de pessoas assinaram
o serviço (https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/01/1851185-netflix-se-aproxima-de-100-milhoes-de-assinantes-metade-fora-dos-eua.shtml). Já o site UOL revela que, em 2016, a Plataforma
garantia acesso a um acervo de aproximadamente 1 milhão de títulos – que se
dividem em filmes, séries, documentários, shows, entre outros.
(https://tvefamosos.uol.com.br/noticias/ooops/2016/02/18/fim-do-misterio-saiba-quantos-filmes-e-episodios-ha-na-netflix-no-brasil.htm).
Atualmente, esses números, certamente, se multiplicaram.
Antes de prosseguirmos
na análise da questão em tela, entendemos ser necessário fazermos os seguintes
esclarecimentos: 1) O presente estudo não pretende esgotar o assunto, portanto,
outras considerações poderiam ser acrescidas a ela; 2) Meu propósito aqui não é
demonizar a Netflix, condenando quem a assina e usufrui de seus serviços. Se
assim o fizesse, eu seria um hipócrita, porque minha esposa é uma assinante, e
eu mesmo já assisti o documentário “Democracia em Vertigem”. Meu objetivo,
então, é mostrar como a Netflix, se mal utilizada, pode escravizar o cristão,
inserir em sua mente ideais seculares contrárias aos princípios bíblicos e o
conduzir ao pecado. Logo, penso que os cristãos precisam ter assaz cautela com
esse tipo de entretenimento. Cuidado não somente em relação ao tempo gasto, mas
também em relação ao conteúdo oferecido. Há perigos explícitos e sutis na
plataforma, que podem levá-los a regredir na fé, na santificação e no
entusiasmo em expressar um bom testemunho cristão.
1) A Netflix, quando
consumida sem moderação, rouba-nos o tempo que poderíamos estar realizado outras
atividades mais relevantes
Eu já ouvi falar de
jovens e de adultos também que gastaram e gastam horas a fio assistindo as
séries. Muitos até viram a noite assistindo tais séries. Estas buscam a
fidelização do cliente. Isso significa que as séries são produzidas para que o
cliente termine de assistir a um episódio já querendo desesperadamente assistir
ao próximo. Tudo, do roteiro à edição, é feito para conquistar sua atenção, de
modo que a frase “vou assistir a apenas mais um” facilmente se torne “assisti à
toda temporada e nem percebi”. Quando as pessoas se dão conta já estão
escravizadas quanto ao tempo.
Portanto, os cristãos
usuários dessa plataforma precisam ter bastante cuidado com o tempo gasto. A
Bíblia diz que os cristãos devem andar sabiamente, remindo o tempo, porque os dias são maus (Efésios 5:15). Remir o
tempo significa otimizar e aproveitar ao máximo cada oportunidade de forma
prudente. Remir o tempo é praticar a mordomia do tempo, e a mordomia do tempo é
também a mordomia das oportunidades.
Sem dúvida viver
remindo o tempo “é obrigação e privilégio de todo cristão aproveitar cada
momento do tempo para grande e nobres propósitos. Remir o tempo é mais do que simplesmente se
abster da ociosidade ou de atividades frívolas. [...] Assim como Jesus, o
crente também precisa “tratar” dos negócios do Pai (Lc 2:49)” (Comentário
Bíblico Adventista, v. 6, p. 1147). O tempo é um presente precioso que Deus nos
dá para sermos bons mordomos dele. Sem dúvida a melhor
aplicação do nosso tempo é aquela que prioriza o Reino de Deus. O próprio
Senhor Jesus diz que devemos buscar em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua
justiça; e todas as demais coisas essenciais à nossa sobrevivência serão
acrescentadas (Mateus 6:33).
Para além da comunhão
íntima e crescente com Deus e conduzir pessoas a Cristo, “tratar das coisas do
Pai” envolve “buscar ativamente as oportunidades para fazer o bem (Gl 6:10),
mesmo aos inimigos (Mt 5:44)” (Ibdem), bem como cuidar dos nossos
relacionamentos.
A escritora cristã
Ellen G. White afirma que um dia prestaremos contas a Deus de todas as coisas
que foram colocadas em suas mãos, inclusive do uso do tempo: “Aquele
que perde horas, dias e semanas porque não está disposto a fazer o trabalho que
se oferece, por humilde que seja, será chamado a prestar contas a Deus por seu
tempo mal-empregado” (Mensagens Escolhidas, v. 2, p. 181).
Ademais, é preciso que
se entenda que mesmo as coisas boas e divertidas em excesso tornam-se
prejudiciais. Relacionamento, trabalho, estudo e a própria saúde podem ser
prejudicados quando se passa horas e horas diariamente em frente à televisão.
Pior: o relacionamento com Deus é prejudicado quando preferimos a série favorita
à devoção a Deus. O apóstolo Paulo afirma: “Tudo me é permitido”, mas nem tudo convém.
"Tudo
me é permitido", mas eu não deixarei que nada domine” (1 Coríntios 6:12,
NVI). A Netflix tem dominado você, prejudicando sua vida com Deus, com
o próximo e o atrapalhando em suas responsabilidades? Se esse é o caso, o
melhor que se possa fazer é, realmente, cancelar a assinatura da Netflix.
2)
Cuidado
com o conteúdo!
Ao usufruirmos dos
serviços da Netflix precisamos também termos cuidados com o conteúdo dos vídeos
das séries, muitos dos quais preconizam ideias e valores contrários aos
princípios do evangelho. Frequentemente, vê-se forte apologia ao casamento
homoafetivo, ao aborto e à legalização das drogas, entre outros. Vemos também a
banalização do sexo e da violência. Vemos ainda inversão de valores, costumes e
comportamentos, e muitas vezes, de forma sutil, a ridicularização da fé cristã.
O apóstolo exorta-nos: “[...]
Meus irmãos, encham a mente de vocês com tudo o que é bom e merece elogios,
isto é, tudo o que é verdadeiro, digno, correto, puro, agradável e decente”
(Filipenses 4:8, NTLH). Os cientistas acreditam que tudo o que vemos e
ouvimos fica gravado em nossa mente para sempre. Com o passar do tempo podemos
ter dificuldades para recordar, mas a informação está fixada. Imagine quantas
coisa o cérebro humano pode captar e gravar em pouquíssimo tempo! Não sabemos
exatamente como o cérebro acumula tanta informação. É o órgão mais complexo do
corpo humano e um dos mais difíceis da carreira da Medicina. Ocorre que, muitas
dessas informações sobrecarregam a mente, que é o centro de nossos pensamentos
e decisões e também nosso canal de comunicação com Deus. As informações nos
chegam exatamente por meio da literatura, da música, da internet, da televisão
e dos filmes e programas a que assistimos cotidianamente. Diante da oferta de
material fútil que inunda a televisão e o rádio, torna-se indispensável que
saibamos filtrar e selecionar o que entrará por nossos olhos e ouvidos,
chamados por Ellen G. White de “janelas da alma” (Mente, Caráter e
Personalidade, v. 1, p. 27). Inclusive ela faz uma importante exortação aos
filhos de Deus: “Fechai as janelas da alma para a terra, e abri-as em direção ao Céu”
(Ellen G. White, O Lar Adventista, pág. 343).
O texto de Filipense 4:8 apresenta um grande
desafio para os cristãos. Ele nos desafia a alimentar nossa mente “com tudo o
que é bom e merece elogios”. A pessoa que fica por horas exposta aos ideais
anticristãos, cuja mente vai sendo alimentada com vulgaridade e frivolidade, podem
o conduzir à relativização da fé, aceitação, e quem sabe até apoio, àquilo que
Deus expressamente diz abominar em sua Palavra, e será sempre vulgar. Aquela
que, submissa à graça de Deus, nutre a mente com as
elevadas virtudes mencionadas por Paulo será cada vez mais nobre,
habilitando-se para viver na sociedade dos anjos, no Céu. Não podemos olvidar
que aquilo que colocamos em nossa mente é o que irá nortear a nossa vida.
Mais uma vez nos
valemos de um pensamento de Ellen G. White: “Se os pensamentos forem maus,
maus também serão os sentimentos; e os pensamentos e os sentimentos combinados,
constituem o caráter moral” (Mensagens aos Jovens, p. 92). Ora, se o
caráter moral é resultante da combinação de pensamentos e sentimentos, devemos
preocupar-nos com a fonte de nossos pensamentos, que como já mencionamos anteriormente,
são os filmes, as músicas, livros, entre outros.
Não obstante os perigos
que a Netflix representa para a vida espiritual do cristão, a Plataforma
disponibiliza sobejamente filmes, séries, e documentários cristãos, com
conteúdo comprovadamente bons baseados em fatos reais, que podem enriquecer
nosso conhecimento em diversas áreas, a exemplo de “Corajosos”, “Deus não está
Morto”, “Redenção”, “O Príncipe do Egito”, “Uma Vida com Propósito”, entre
outros. Há também diversos filmes e documentários que mesmo não tendo caráter
religioso são muito bons. É preciso apenas selecioná-los bem, e assisti-los
analisando criticamente o conteúdo. Até porque há uma enorme diferença entre
absorver com crítica a um conteúdo televisivo e encher a mente, sem crítica
alguma, de imagens e diálogos que foram produzidos com o objetivo de moldar a
crença e os ideais de uma pessoa. Amigo, a Netflix tem influenciado você a
aceitar os valores e ideais seculares contrários a filosofia cristã? Em caso
afirmativo, então é hora de abandonar a plataforma urgentemente!
Vale ressaltar que,
grande parte dos cristãos usufruem de outras plataformas de entretenimento
durante o dia e, com certeza, podem ter acesso a filmes com conteúdo impróprio para
os cristãos, a exemplo da internet, sem precisar da Netflix. Portanto, minha
ideia aqui não é dizer que a culpa pela impureza de muitos cristãos é da
plataforma. Meu objetivo é mostrar que existem perigos sutis aos usuários e
que, portanto, prudência é necessária. Paulo diz: “Ora, as obras da carne são
manifestas: imoralidade sexual, impureza e libertinagem [...]” (Gl 5:19, NVI)”
Amigo, a Netflix tem sido o meio pelo qual as obras de sua carne têm se
manifestado? Então, é preciso afastar-se prementemente dessa mídia!
Conclusão
Retomamos a pergunta do
título desse artigo: As Sagradas Escrituras condenam os cristãos a acessarem a
Plataforma da Netflix? Não necessariamente, pois não há pecado nisso! O que vai
determinar se isso é pecado ou não é o modo como nós nos relacionamos com ela. Se
um cristão acessa filmes com conteúdo pornográfico (certamente proibido pela
Bíblia (Rm 1:24; 6:19; 1Co 6:13; 10:8; 12:21), de violência, e o tempo de
consumo é excessivamente longo (tornando-se um obstáculo à frequência aos
cultos ou à execução de trabalhos relevantes), tal atividade torna-se pecado.
Eu diria que a Netflix
é a prova de fogo para muitos cristãos. Ou ele a controla ou é controlado. Não
há mal em termos uma assinatura dela, se, de fato, pudermos controlá-la.
Quando, porém, a plataforma nos obrigar a postar-nos diante de seus espetáculos,
abramos os olhos. Uma coisa é mais importante do que não termos uma assinatura
da Netflix: é possuirmos autocontrole, ou seja, domínio de nós mesmos. E isto é
obra do Espírito Santo.
O que irá acontecer com
aqueles que desperdiçam o tempo em frente de uma televisão, celular, computador
vendo cenas de violência, crimes, homicídios, sexo? Certamente, isso irá
paulatinamente arruinar a fé, e o afastará de Deus. Por outro lado, tudo que
evoca pureza, nobreza de caráter contribuem para a preparação para o Céu,
salvação em Cristo.
“É lei, tanto da
natureza intelectual como da espiritual, que, pela contemplação, nos
transformamos” (Ellen G. White, Mente Caráter e Personalidade, v. 1, p. 331). A
TV está formando, plasmando as pessoas de amanhã. Crianças e adultos estão
gastando horas e horas diariamente contemplando cenas de violência, sexo,
dramas, que estão penetrando “as janelas da alma" e sendo gravadas na mente.
Esta programação dificultará o estudo da Palavra de Deus. O tempo gasto irá
destruir o diálogo com Deus, que ocorre através da oração.
Caro amigo leitor, tenha
prudência e crítica quando assistir aos filmes e às séries. Não se deixe
influenciar cegamente por eles. Antes, procure sua identidade e seus valores em
Jesus Cristo. Demos à Bíblia Sagrada, ao Espírito de Profecia, bem como às
reuniões da igreja, o lugar que lhe é devido. Voltemos para Cristo e
contemplemos o Seu amor e Sua beleza para que sejamos renovados em nosso
entendimento.
Deus abençoe a todos e
todas!
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