ADVENTISTAS E A FALÁCIA DO FARISEU



Pr. Douglas Reis

Em tempos de guinada liberal, tornou-se moda acusar qualquer adventista bíblico de fariseu. É contra a música pop cristã? Acha que mulheres (para não dizer de homens) não deveriam usar brincos? Não vai ao cinema? Então se prepare: em algum momento, em uma rede social perto de você, alguém lhe dirá, sem cerimônia, sobre o seu “cerimonialismo religioso”: “Seu fariseu!”

É verdade que muita gente nem sabe ao certo quem eram os fariseus, suas preocupações e contexto social. Ficam apenas com o conceito popular de que eram legalistas. Aliás, alguns até acham que as palavras sejam sinônimas. É bom que se saiba: não são. Fariseu é um termo que se refere a uma seita judaica, cuja origem remonta a Judas Macabeu. Parece que a fidelidade dos macabeus e seu compromisso com a religião judaica fomentou o surgimento de um grupo de pessoas extremamente zelosas com a lei. Aos poucos, porém, o zelo se degenerou em salvação pelas obras. Resumo da ópera: nem todos os fariseus eram legalistas, embora tivessem zelo pela lei.
E o que seria um legalista? Legalistas não são aqueles que amam as leis de Deus e pretendem obedecê-las – o nome desse grupo aí é “cristãos” (Jo 14:15; 1 Jo 2:4)! Legalistas são os que querem se salvar pela obediência a lei, como se fosse possível perfeição completa de pecadores! Se fosse o caso, Jesus morreria à toa! Agora que a diferença entre fariseu e legalista ficou mais clara, precisamos pensar na relação dos dois termos com um terceiro: obediência. Para ser mais exato, poderíamos nos perguntar: qual é o papel da obediência no plano da salvação? Uma segunda pergunta também seria necessária: quais áreas da vida são afetadas pela obediência ao evangelho?

Para respondermos a essa perguntas, vamos olhar panoramicamente o livro de Tiago. Por razões mais práticas, a exposição não se aterá a detalhes ou análises técnicas. Apenas um vislumbre da teologia da epístola será necessário para nos ajudar com nossas questões.

O livro de Tiago é injustamente esquecido na teologia protestante, a começar pelo próprio Lutero, que achava que ele não poderia reconciliar-se com a doutrina da justificação como expresso por Paulo. Embora não seja nosso propósito de analisar a questão, em nosso breve resumo de alguns dos temas soteriológicos (ou seja, relacionados à salvação) do livro, queremos enfatizar que Tiago não pensou em desarmonia com Paul. Estamos diante de uma abordagem diferente, em virtude de ambos lidarem com distintas situações e audiências. Com isto em mente, vamos nos voltar para uma análise preliminar de como o autor inspirado lida com o tema da salvação e que papel confere à obediência.

Em sua introdução, Tiago fala do papel da provação e leva seus leitores a ver um propósito nela. A prova produz perseverança (Tg 1, 3), que nos fará alcançar a coroa da vida (Tg 1:12). O objetivo é a maturidade na fé (Tg 1:4). Neste processo de crescimento, podemos facilmente voltar-nos para Deus, o doador divino (Tg 1:4, 17), capaz de nos dar sabedoria do alto (1:5), um conceito importante na epístola. Este mesmo Pai e Doador por Seu Pai por Sua deliberação decidiu criar-nos através da Sua Palavra (Tg 1:18).

 A metáfora é clara: havíamos morrido e precisávamos de uma nova vida. A vida só é possível através da Palavra de Deus, o agente que dá a vida. Sendo implantada em nós, a Palavra é capaz de salvar (Tg 1:21). Deus nos gerou pela sua vontade, para sermos como seus primeiros frutos, ou seja, a intenção é de nos recriar (Tg 1:18). A relação com a Palavra possui uma abordagem muito prática na epístola. Devemos nos livrar do mal e da impureza ao aceitar a Palavra implantada, a qual nos salva (Tg 1:21) para sermos Seus cumpridores e não somente ouvintes (Tg 1:22). Inclusive se afirma, por exemplo, que a religião não é uma prática ascética ou intelectual, mas algo visível, uma nova visão do mundo: " A religião que Deus, o nosso Pai aceita como pura e imaculada é esta: cuidar dos órfãos e das viúvas em suas dificuldades e não se deixar corromper pelo mundo.” (Tg 1:27, NVI).

Na sequência, Tiago ressalta a importância do conceito de religião nas relações comunitárias. Os cristãos não devem desprezar os pobres de sua comunidade, uma vez que eles também foram escolhidos para fazer parte do reino (Tg 2:1-5). Afinal, Deus dá graça aos humildes (Tg Tiago 4:6). O apóstolo ensina o pecado reside em mostrar favoritismo, o que é condenado pela lei (Tg 2:9), sendo o próprio coração da lei o amor.

A partir daí começa o seu debate polêmico sobre a fé e obras, prova de que, na soteriologia bíblica, fé genuína precisa estar ligado obediência à lei de Deus (Tg 2:14-26). Fé sem obras é uma fé morta, vazia, que não leva à salvação (aqui entendida no contexto do viver cristão diário, ou seja, envolvendo o processo de santificação). Se a fé não produz resultados visíveis, não é fé proveitosa. Embora fé seja confiança no invisível (cf.: Hb 11:1), a própria fé não pode apresentar resultados invisíveis!

Adiante, Tiago amplia suas considerações e mostra também que a falta de ética resulta de uma sabedoria que não se origina em Deus (Tg 3:14-15). Portanto, é arriscado viver o cristianismo em uma perspectiva secular, sem o tipo de experiência com Cristo que imprima um caráter distinto ao seu comportamento e pensamento. Aqui a atitude é condenada abertamente. O escritor bíblico chega a definir a amizade com o mundo como inimiga de Deus (Tg 4:4). A solução? Aproximar-se de Deus, o que é possível ao decidir abandonar o que Lhe desagrada (Tg 4:8). É preciso que nos humilhemos diante dEle (Tg 4:9-10) e nos submetamos ao único Legislador (Tg 4:11-12). Assim, teremos a verdadeira experiência que agrada a Deus, livre de toda impureza. Ainda somos lembrados de que o pecado não significa apenas praticar o mal, mas inclui deixar de prestar atenção ao dever de atuar como se deveria. Na carta, Tiago ensina que há pecado por omissão e negligência (Tg 4:17).

Em seu término, o livro mostra que a salvação consiste na perseverança até o julgamento (Tg 5:7-8), o que leva à atitude de viver bem na comunidade. Não há ninguém a queixar-se de outrem – o Juiz está às portas (Tg 5:9). Em vez disso, a intercessão pelos pecadores que precisam de regeneração é a marca registrada de cada cristão (Tg 5:16,20).

Depois desse rápido tur, o que podemos concluir da teologia bíblica de Tiago sobre a questão envolvendo salvação e obediência? Sugiro algumas lições: (1) Salvação envolve obediência ativa, porque ganhamos vida pela Palavra a fim de sermos obedientes e desobediência implica em inimizade com Deus (perda da salvação); (2) Salvação compreende uma vida de obediência prática, à lei divina e à tudo quanto Deus ordenar (cf.: Mt 4:4); (3) Obediência não exclui amor, pelo contrário: sendo a lei de Deus amor, a obediência genuína se fundamenta no amor e leva em consideração os mais desfavorecidos socialmente e expressa preocupação por cristãos apostatados.

Um cristão que honestamente acuse a outro de fariseu por querer obedecer à Palavra de Deus em todos os seus aspectos, só pode estar desinformado. Fé sem obediência não é bíblico. E em relação aos fariseus, os cristãos não podem ser menos zelosos (embora seu zelo tenha um motivo diferente). Vale conferir as palavras de Jesus: “Pois eu lhes digo que se a justiça de vocês não for muito superior à dos fariseus e mestres da lei, de modo nenhum entrarão no Reino dos céus” (Mt 5:20, NVI).

FONTE: http://questaodeconfianca.blogspot.com.br/

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