HÁ ESPERANÇA PARA OS FILHOS QUE DEIXARAM A IGREJA?
Ricardo André
Texto
bíblico: Provérbios 6:20-22; 22:6
No salmo 127:3 o
salmista declara serem os filhos “herança do Senhor”, legada aos pais.
Certamente, como cristãos, devemos considerar os filhos como presentes de Deus.
Depois da vida em si (tanto temporal como eterna), são os mais maravilhosos de
todos os presentes. As Escrituras Sagradas consideram os filhos como presente
de Deus. Realmente, os filhos pertencem a Ele; assim, os pais são responsáveis a
Deus pelo modo de tratar essa descendência.
Nessa mesma linha de
pensamento, Ellen G. White escreveu: “Os filhos são herança do Senhor e Lhe
somos responsáveis pela administração de Sua propriedade” (O Lar Adventista, p. 159). Portanto, os pais devem sempre se
lembrar a quem os seus filhos realmente pertencem. Este é certamente um caso em
que nenhum de nós quer ser julgado “administrador infiel” (Lc 16:8).
Se os filhos são
herança do Senhor e nós, pais, somos mordomos, Ele espera que administremos bem
essa propriedade preciosa. Uma das formas de cuidar da herança do Senhor, que
são nossos filhos, é cumprir em relação a eles a missão que Deus nos incumbiu: “Instrua
a criança segundo os objetivos que você tem para ela, e mesmo com o passar dos
anos não se desviará deles” (Pv 22:6, NVI). Segundo o texto sacro, a missão dos
pais é, por meios do exemplo, palavras e pela experiência, instruir os filhos a
respeito dos valores e princípios do evangelho, conduzindo-os a Jesus. É
ensiná-los a amarem a Jesus e a tornarem-se discípulos Dele.
Nesse sentido, Ellen G.
White escreveu: “Aos pais é comissionada a grande obra de educar e preparar os
filhos para a vida futura e imortal. [...] Nenhuma obra jamais empreendida pelo
homem requer maior cuidado e habilidade que o devido ensino e educação dos
jovens e das crianças” (Orientação da
Criança, p. 38, 39). Tal educação tem um efeito eterno. O apóstolo Paulo
parece ter se referido a esta passagem quando elogiou Timóteo por sua educação
desde criança no conhecimento das “Sagradas Letras, que [podiam torná-lo] sábio
para a salvação” (2 Tm 3:15).
A serva do Senhor
escreveu esse pensamento poderoso: “[...] Trabalhem igualmente os pais para a
família com amor, fé e oração, até que possam ir a Deus com alegria e dizer:
‘Eis-me aqui com os filhos que me deu o Senhor’” (O Lar Adventista, p. 159).
Parafraseando o que a
filha de Faraó disse à mãe de Moisés (Êx 2:9), penso que Deus diria algo
parecido a cada pai e mãe: “Toma esta criança e cria-a para Mim; Eu te darei a
tua recompensa”. Entendemos que os pais têm para com os filhos grande
responsabilidade porque, antes de tudo, eles pertencem a Deus, e só depois aos
pais. Mas tenhamos a certeza de que se formos mordomos fieis ao educar nossos
filhos nos caminhos do Senhor, Ele nos recompensará com o título de “servo bom
e fiel”. E ainda nos dirá: “Você foi fiel no pouco; eu o porei sobre o muito.
Venha e participe da alegria do seu senhor!” (Mt 25:21, NVI).
Se os nossos filhos são
propriedades de Deus. Ele espera que os filhos voltem são e salvos para Suas
mãos.
Voltando ao texto de
Provérbios 22:6, note que o verso diz que se os pais educarem bem os filhos,
estes não se desviarão das instruções quando tornarem-se adultos. Em outras
palavras, o filho que recebe a educação correta normalmente não se perde. No
entanto, o ensino dos pais não é a única influência na vida de uma criança. Na
adolescência, os pais já não serão as únicas influências na vida dos filhos
Terão que competir pela alma deles com o celular, com os amigos, com a escola e
com outras influências na vida dos filhos. E estes, por sua própria vontade,
podem frustrar o princípio geral registrado em Pv 22:6. Infelizmente, um filho
que recebeu o preparo correto em casa pode ceder a outras influências. O texto
declara um princípio geral para o qual existem exceções, a exemplo de Caim,
Esaú e Judas.
As estatísticas não
estão a favor dos pais. Uma pesquisa Gallup, de três décadas atrás, informava
que 46% das crianças deixam de participar na igreja em algum ponto da vida. A
incidência maior acontece no período da adolescência. Pesquisa mais recente da Bible-Science Association, refletindo o
mundo evangélico em geral, afirma que de cada 20 crianças que nascem em família
cristã apenas duas chegam ao Ensino Médio ainda participando da igreja.
Não podemos esquecer
que Deus dá liberdade de escolha às pessoas. Neste sentido, todos decidimos
nosso próprio destino. Embora esperemos que nossos filhos sigam
os caminhos que escolhemos, eles devem decidir por si mesmos receber as bênçãos
do evangelho. Muitas vezes os pais fazem
todo o necessário para ensinar suas crianças sobre os valores bíblicos, e
quando eles crescem decidem abandonar a igreja. Nesse caso, não podemos culpar
necessariamente os pais de negligência ou da educação deficiente quando os
filhos abandonam o caminho do Senhor. O próprio Deus perdeu um terço de sua
família divina sem que tivesse qualquer culpa.
A questão de capital
importância é: Há esperança para os filhos que abandonaram a Cristo e sua
igreja? Como
lidar com essa realidade dolorosa? Há várias coisas que podemos fazer.
Minha
experiência com meu filho
Quando eu e minha
esposa, Ana Claudia, descobrimos que ela estava grávida, em abril de 2006, sentimos
um misto de emoções inexplicável. Vibramos de alegria ao saber que seríamos pais.
Meses depois, a ultrassonografia revelou que a criança em gestação era um
menino. Ao passo que sentíamos uma gratidão enorme pelo presente que Deus estava
nos dando, sentíamos o peso da responsabilidade de educar o bebê vindouro nos
caminhos do Senhor.
Passados os meses de
gestação, tomados por uma enorme ansiedade de tê-lo em meus braços, chegou o
dia da chegada de Martin Luther King. Em 29 de dezembro de 2006 ele nasceu. Fiz
todos os esforços necessários para transferir para ele os valores cristãos,
conforme as Escrituras Sagradas nos orientam. Antes mesmo dele nascer comprei o
CD “Nana Nenê”, da saudosa cantora Zilda Azevedo. Ainda no ventre da mãe ele já
ouvia as lindas e suaves músicas desse CD. Quando nasceu continuou ouvindo
essas preciosas canções de ninar. Inúmeras vezes ele dormiu nos meus braços
ouvindo essas canções. A medida que ele ia crescendo, comprei outros Cd’s e
DVD’s de músicas infantis produzidos pela igreja. Lembro-me da primeira Bíblia
para criança, da CPB, que comprei. Contei para ele repetidas vezes as histórias
bíblicas contidas naquela Bíblia. Além da Bíblia, líamos para ele a Lição da
Escola Sabatina. Sempre fiz a assinatura da Lição. Fazíamos o culto familiar
todas as manhãs, e na sexta-feira realizávamos o culto duas vezes: um pela
manhã e o outro ao pôr-do-sol, para recebermos o sábado de Deus.
Em janeiro de 2015, com
oito anos de idade, colocamos ele no Clube de Aventureiros “Maravilhas do Mar”,
da IASD Central de Lagarto. Nesse mesmo ano, ele pediu para ser batizado. Seu
batismo ocorreu em setembro, no batismo da Primavera. Aquele dia marcou
indelevelmente nossas vidas. Foi muito emocionante ver meu filho entregar a sua
vida a Jesus. Até hoje quando assisto o vídeo do seu batismo me emociono
bastante.
Aos 10 anos,
matriculamos ele no Clube de Desbravadores “Reino Marinho”, da IASD Central de
Lagarto. Lá, permaneceu até aos 15 anos. Quando completou os 16 anos, em 29
dezembro de 2022, pediu para sair do clube, o que me deixou bastante
preocupado, porque seu afastamento do clube era um sinal de seu desinteresse
pelas coisas de Deus. De fato, a partir daquele momento Martin já não sentia
mais prazer em participar da Classe de adolescentes no sábado. Depois, não quis
mais frequentar assiduamente os cultos aos sábados. Não obstante ter ensinado
hábitos de oração e estudo da Bíblia, hoje, infelizmente, Martin não faz
orações a Deus, não estuda a Lição da Escola Sabatina, não ler sua Meditação
Diária e vai à igreja somente aos sábados, e ainda assim esporadicamente. A
cada sábado que ele deixa de ir à Igreja eu tenho muitas preocupações dele
deixar a Jesus e sua igreja. Oro a Deus todos os dias para que Ele faça com que
Martin restabeleça sua trajetória espiritual.
Fizemos de tudo para
que Martin pudesse ser hoje um cristão espiritual, um discípulo de Jesus. Mas,
parece que nada funcionou. Vez por outra, minha cabeça gira de preocupação, meu
coração se enche de culpa e angústia, achando que eu fracassei como pai cristão.
Muitas
pessoas compartilham essa mesma experiência que estou vivenciando. Quando os
filhos se afastam do caminho do evangelho, isso pode ser algo muito difícil de
lidar para os pais que permanecem fiéis. Para alguns pais restam apenas as
memórias nostálgicas daquilo que a religião significou para os filhos. Com
fervor, esses pais oram ao Senhor e pedem pelo retorno de suas sempre crianças
à casa de Deus. Martin não saiu da igreja completamente, mas está no caminho
que o levará a isso. Sinto que ele está rejeitando nosso
estilo de vida cristão.
O
casal White e a dificuldade com seu filho
James Edson White era o
filho mais velho dos dois filhos vivos do casal White. Ele era um filho muito
difícil e possuía grave deformação de caráter. Era desobediente, mentiroso e
também gastador, não tinha prazer nas coisas de Deus mas encontrava sua
satisfação nas coisas do mundo. Além de tudo isso, não era um cristão
espiritual. Todas essas características de Edson, deixava Ellen White cheia de muitas
preocupações. Às vezes, ela perdia o sono pensando nos erros que poderia ter
cometido na educação dele.
Um dia ela teve um
encontro com ele para dar-lhe algumas orientações a respeito de sua vida
espiritual. Aquele encontro dela com seu jovem filho foi muito difícil. No seu
Diário, ela escreveu: “Tive uma conversa com Edson. Senti-me excessivamente
aflita, achando que isto não estava sendo conduzido de maneira sábia” (DOUGLAS,
Herberty E. Douglass, A Mensageira do Senhor [CPB, 2003], p. 59). Preocupada
com a vida espiritual de Edson, Ellen escreveu uma emocionante carta maternal
para ele em 13 de fevereiro de 1867. Ele tinha 18 anos. Disse: “Fico muito mais
ansiosa para que você se torne um cristão humilde do que para que alcance uma
posição exaltada neste mundo. Preocupo-me com o desenvolvimento de um caráter
digno da vida melhor. É apenas uma questão pequena você se qualificar para
viver esta curta vida. É a vida por vir, a vida sem fim que deve tomar conta de
suas mais elevadas aspirações. Seria esta curta vida sofredora tão relevante a
ponto de obscurecer todo o valor da vida imortal prometida sob a condição da
obediência fiel? Edson, você se entregará a Deus sem reservas? Buscará
desenvolver um bom caráter cristão? […] Que o seu nome seja escrito no Livro da
Vida do Cordeiro como um dos fiéis e devotos soldados Dele, é tudo que eu peço.
É por isso que oro todos os dias. Edson, você se voltará para seu Redentor com
todo o propósito de seu coração?” (Carta 4, 1867).
“Ao longo de seus 44
anos, ele nunca mostrara sinais de conversão completa em sua vida pessoal e em
seus negócios, mas sua mãe nunca desistira dele. Em maio de 1893, Edson
escreveu para a mãe que não tinha “a mínima inclinação religiosa” e estava
pensando em sair da igreja. Ellen White ficou chocada ao ler que o filho estava
dando as costas a tudo aquilo que ela procurara lhe ensinar durante a sua vida”
(Enciclopédia Ellen G. White [Tatuí:
CPB, 2018], p. 78).
Da Austrália, Ellen
White, em resposta, escreveu uma carta para seu filho, onde relata um sonho, em
que seu filho encontrava-se na praia com mais quatro jovens, quando foi
arrastado por uma grande onda. Enquanto se debatia em meio às ondas, Ellen
acordou ao ouvi-lo dar um grito agudo de medo.
Aquela carta de Ellen
White foi a virada de chave na vida de Edson. Quando ele recebeu a carta, um
mês depois, sua atitude começou a mudar. “No dia 10 de agosto, contou à mãe que
começara a deixar de lado “as diversões e os prazeres” que antes eram a única
fonte de sua “satisfação”. [...] Em 11 de agosto, escreveu para o irmão Willie:
‘Comecei o caminho que leva à vida eterna e encontrei o Salvador’” (Idem, p. 79). Edson White se encontrou
com Jesus e se converteu, tendo sua vida transformada.
Ele escreveu uma carta
para sua mãe relatando sua experiência de conversão. Quando Ellen leu essa
carta, ficou assaz feliz e escreveu: “Hoje recebemos sua carta e estamos
alegres demais por você ter de fato feito sua entrega a Deus. Estou mais feliz
do que consigo expressar porque você em simplicidade de fé, aceitou a Jesus e
não estou surpresa de que tenha resolvido fazê-lo de uma vez por todas” (Idem, p. 79). Depois daquela
experiência com Jesus, Edson continuou enfrentando seus problemas pessoais, mas
permaneceu firme ao lado de Jesus.
Edson foi ordenado
pastor e destacou-se compondo hinos para a Escola Sabatina. Publicou seis
hinários sozinho e mais sete em associação com seu primo F. E. Belden, além de
um periódico sobre música, chamado Musical Messenger. Sua maior contribuição
foi a obra evangelística entre os negros do sul, a qual consistiu em “uma
bênção para as pessoas pelas quais trabalhou, para a igreja e para a sua mãe,
que se empolgava com sua missão de fé em um campo negligenciado.” Por meio de
sua vida transformada, Edson foi um testemunho em resposta à ‘angústia, o amor
e a perseverança’ de sua mãe” (Idem, p.
79). Apesar de uma personalidade excêntrica e turbulenta,
Edson tornou-se um pioneiro gigante. Morreu em 3 de junho de
1928, firme na fé de Jesus.
Queridos irmãos e irmãs,
existe alguém em sua família que necessita de uma experiência de conversão ou
reconversão? Você dedicou tempo, esforço e sacrifício na educação dos filhos,
mas ainda assim não colheram os frutos desejados? É possível que haja até mesmo uma pessoa bem
próxima a você. A experiência de Edson e de sua conversão enche de esperança em
relação a nossos próprios entes queridos, que andam vacilantes na fé ou que
abandonaram a igreja. Há esperança para nossos filhos que estão distantes de
Deus e sua igreja.
Há três declarações
poderosas de Ellen G. White a respeito do interesse e do esforço de Deus para
trazer de volta aqueles que deixaram o aprisco do Senhor: “Quando a tempestade
da perseguição realmente irromper sobre nós, […] muitos que se desviaram do
aprisco retomarão para seguir o grande Pastor” (Testemunhos Para a Igreja [Tatuí: CPB, 2007], v. 6, p. 401). “O
amor de Deus anela sempre aquele que Dele se afastou, e põe em operação
influências para fazê-lo tornar à casa paterna. […] Uma cadeia dourada, a graça
e compaixão do amor divino, é atada ao redor de toda pessoa em perigo” (Parábolas de Jesus [Tatuí: CPB, 2018], p.
202). “O Céu aguarda e anela a volta dos pródigos que vagueiam longe do
rebanho. Muitos dos que se extraviaram podem ser trazidos de volta, pelo
amoroso serviço dos filhos de Deus” (Nos
Lugares Celestiais [MD 1968], p. 10).
Há muitas lições na
maneira que Ellen White lidou com Edson White. À semelhança dela, não podemos
desistir de nossos filhos(as). Continuemos a amá-los. Eles
não precisam de outro estudo bíblico, de sermões! O que eles precisam, o que
todos nós precisamos, é amor e compreensão, não julgamento. Se continuarmos
amando nossos filhos e outros entes queridos como eles são hoje, podemos ainda
ter a esperança de que retornarão a uma vida centralizada no evangelho. Com
frequência os familiares retornam após um período de afastamento. Como o filho
pródigo da parábola contada por Jesus (Lc 15:11-32), eles se dão conta de que
sua antiga vida lhes proporcionou boas mensagens e princípios, e adotam
novamente esses valores. Precisamos comemorar as boas qualidades
deles e os momentos felizes que passamos com eles. Devemos aceitar o princípio
de que nossos familiares são abençoados com o livre-arbítrio, seja como for que
o usarem.
Mas, sobretudo, os pais
precisam continuar orando a Deus para que eles tenham um encontro especial com
Jesus e retornem para a casa do Pai. A experiência com a oração nos ensina a
lembrar o quanto nossos filhos são preciosos para o Pai Celestial, o que ajuda
a aliviar nossa dor. A oração nos proporciona uma compreensão muito útil do que
fazer e do que dizer. Também nos ajuda a encontrar consolo. Sobre o poder da
oração de uma mãe, Ellen White escreveu: “O poder das orações de uma mãe não
pode ser demasiadamente estimado. Aquela que se ajoelha ao lado do filho ou
filha, em suas dificuldades da infância, nos perigos de sua juventude, não
saberá senão no juízo a influência de suas orações sobre a vida de seus filhos”
(O Lar Adventista [Tatuí: CPB, 2005], p.
266).
Queridos jovens, hoje é
um bom dia para refletir nos sábios conselhos recebidos de seus pais e de
outros cristãos verdadeiros. Pela graça de Deus, o dia de hoje pode ser um novo
começo em sua vida! Nossa família deve permanecer unida ao
longo de toda a eternidade! Por que não fazer nosso melhor para reconstruí-la
ou fortalecê-la em torno dos valores bíblicos que um dia aceitamos?
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