Teologia

sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

A GUERRA DE ISRAEL CONTRA OS PALESTINOS É UM SINAL DO FIM DO MUNDO?

Ricardo André

O mundo acompanha com perplexidade a guerra entre Israel e os palestinos da Faixa de Gaza, iniciada em 07 de outubro, com o ataque dos soldados do Hamas (grupo político que governa a Faixa de Gaza desde 2007) contra israelenses, matando mais de mil judeus e sequestrando mais de 200 deles, provocando uma resposta assimétrica do Estado de Israel, liderado pelo Primeiro Ministro Benjamin Netanyahu, contra os palestinos. O Ministério da Saúde controlado pelo Hamas informou que mais de 11 mil palestinos já foram exterminados em Gaza até o dia 10 de novembro; a Cisjordânia relatou 183, enquanto autoridades israelenses registraram cerca de 1.200 mortes.

Diante desse cenário horroroso de guerra entre israelenses e palestinos, muitos cristãos são levados a perguntar: É possível ver alguma implicação escatológica no conflito entre Israel e palestinos? Há alguma base bíblica para dizer que esse conflito atual aponte para a volta de Jesus? O status final da cidade de Jerusalém é importante para o povo de Deus? E mais: Por que os evangélicos no Brasil defendem e apoiam cegamente o Estado israelense e suas políticas de expropriação dos palestinos dos seus territórios e extermínio dos mesmos? O uso de símbolos como a estrela de Davi ou a bandeira de Israel em eventos evangélicos no Brasil se tornou comum nos últimos anos.

Importante dizer, que esse apoio é baseado numa concepção religiosa equivocada. Os líderes evangélicos confundem o povo de Deus histórico, a nação de Israel do Velho Testamento da Bíblia Sagrada, com o Estado moderno de Israel, com a política sionista, ou seja, creem que Israel étnico ainda permanece como povo escolhido de Deus, conservando privilégios especiais e tendo lugar destacado nas profecias bíblicas. Os líderes neopentecostais e mesmo de igrejas protestantes históricas enxergam Israel como uma espécie de “relógio do fim do mundo”. É a falsa ideia de que Israel de hoje é uma espécie de “sinal divino” para o cristianismo. Eles acreditam que os eventos que ocorrem na cidade de Jerusalém possuem significados proféticos, são sinais do fim do mundo. Essa corrente teológica bastante popular entre as igrejas evangélicas é chamada de dispensasionalismo.

Segundo o dispensacionalismo (um sistema de interpretação profética incompatível com o que os Adventistas do Sétimo Dia entendem das profecias), antes do fim do mundo, Deus faria com que o seu povo voltasse para a terra prometida (a Palestina), isso seria um sinal. A criação do Estado de Israel em 1948, é entendida por essa corrente como sinal de que o fim do mundo está próximo. Ou seja, o relógio do apocalipse teria sido disparado a partir da criação do Estado de Israel, e seria necessário os cristãos prestarem assaz atenção em tudo o que acontece nesse local.  Tim LaHaye chegou a afirmar o seguinte: “Chamo a reuniões dos cinco milhões de judeus que regressaram à Terra Santa e o fato de constituiírem uma nação em nossa geração [1948] de ‘o sinal infalível’ da chegada do fim dos tempos” (citado em Ninguém Será Deixado Para Trás, CPB, p. 57). É óbvio que isso não está em harmonia com a evidência bíblica. As Sagradas Escrituras mencionam diversos eventos na esfera social, religiosa, econômica e na natureza que apontam para o fim do mundo, como a pregação do evangelho no mundo (Mt 24:14), a aparição de falsos profetas e falsos cristos (Mt 24:4, 5), a decadência moral da humanidade (2 Tm 3:1-5), entre outros. Mas nada diz sobre o retorno dos judeus a Jerusalém como sinal do fim do mundo.

Ainda segundo essa corrente teológica, em Jerusalém, os judeus retomarão à área do antigo templo e o reconstruirão, reinstituindo a prática dos rituais e sacrifícios do Antigo Testamento; por esse tempo, a Igreja será arrebatada secretamente, e 144 mil judeus se converterão a Cristo, compondo o povo de Deus na Terra. O anticristo, que será uma figura literalmente anticristão e de grande carisma e estratégia político-militar, terá entrado em acordo com o povo judeu tão-somente para engambelá-lo e se apoderar do templo, transformando-o em quartel-general. A partir dali governará o mundo e levará a humanidade à angustia final, que se estenderá por três anos e meio. Ao fim desse período, Jesus retornará. Nesse dia, haverá o grande Armagedom, a batalha final entre a luz e as trevas, entre Deus e seus anjos por um lado, e o Diabo e seus demônios por outro lado. Ao cabo, Cristo vencerá e acabará com o anticristo e estabelecerá, na Terra, o Seu reino milenar.

Como os adventistas consideram tudo isso? Pura fantasia! Não passa de especulações desprovidas de sólido fundamento e que resultam em sérias distorções da verdade bíblica. Não há base bíblica para sustentar a teoria de Israel como o “relógio do fim do mundo”. Não negamos que o atual conflito entre judeus e palestinos é um sinal do fim, mas apenas cumprindo o que Jesus predisse, que nos últimos dias haveria guerras e rumores de guerras (Mat. 24:6 e 7), isto é, desentendimento e conflitos generalizados. Assim como as duas guerras mundiais e outros conflitos locais que ocorreram ao longo do século XX e XXI, a guerra entre israelenses e palestinos são cumprimentos da profecia de Jesus proferido no seu famoso sermão profético registrado em Mateus 24. Ele predisse: “Vocês ouvirão falar de guerras e rumores de guerras, mas não tenham medo. É necessário que tais coisas aconteçam, mas ainda não é o fim. Nação se levantará contra nação, e reino contra reino [...]” (Mt 24:6,7, NVI). Portanto, todas as guerras que ocorreram e aquelas que ainda estão ocorrendo apontam para o fato de que a história está avançando para o seu ponto final, e nos lembra que Jesus está prestes a voltar. Ele predisse: “Vocês ouvirão falar de guerras e rumores de guerras, mas não tenham medo. É necessário que tais coisas aconteçam, mas ainda não é o fim. Nação se levantará contra nação, e reino contra reino [...]” (Mt 24:6,7, NVI).

Portanto, não acreditamos que haja alguma importância, para o povo de Deus, no “status final” de Jerusalém, desde que esta cidade perdeu, ao ser Cristo rejeitado pelos judeus, qualquer status distintivo, isto é, que a diferencie das outras cidades da Terra. Até porque quando o Israel étnico, a nação escolhida, rejeitou a Cristo como o Messias, Ele proferiu estas tristes palavras: “Portanto eu lhes digo que o Reino de Deus será tirado de vocês e será dado a um povo que dê os frutos do Reino” (Mt 21:43). Com essas palavras Cristo quis dizer que Israel étnico ou literal deixaria de ser o povo escolhido de Deus, que após a Sua crucifixão, “a igreja cristã, constituída dos que criam no Salvador e aceitavam o Seu Evangelho, tornou-se herdeira das promessas feitas a Abraão e seus descendentes. Gálatas 3:7,8, 16 e 29; Romanos 9 e 11. Os cristãos são agora ‘raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus’ (1 Pd 2:9)” (Consultoria Doutrinária [CPB, 1979], p. 79). Portanto, a igreja cristã é o Israel espiritual constituído por pessoas oriundas de todos os povos (inclusive judeus convertidos ao Senhor Jesus). Ao escrever sua carta aos gálatas, o apóstolo Paulo se refere nitidamente ao “Israel de Deus”, como “um grupo mais amplo do que o Israel étnico (Gl 6:16), refere-se a Isaque como representando os gentios da Galácia (4:28) e a todos os que pertencem a Cristo como descendentes de Abraão e herdeiros segundo a promessa” (93:29)” (Interpretando as Escrituras: descubra o sentido dos textos mais difíceis da Bíblia [CPB, 2019], p. 290).

Nessa mesma linha de pensamento, Ellen G. White, pioneira e profetisa adventista, escreveu: “Aquilo que Deus propôs realizar em favor do mundo por intermédio de Israel, a nação escolhida, Ele executará afinal por meio de Sua igreja na Terra hoje. Ele arrendou Sua vinha "a outros lavradores", isto é, ao Seu povo que guarda o concerto, e que fielmente dá "os seus frutos". Jamais esteve o Senhor sem verdadeiros representantes na Terra e que fazem do interesse de Deus o seu próprio interesse. Essas testemunhas do Senhor são contadas entre o Israel espiritual, e em relação a eles se cumprirão todas as promessas do concerto feitas por Jeová a Seu antigo povo” (Profetas e Reis, p. 713 e 714).

Em Romanos 11, o apóstolo fala do chamado que Deus faz a igreja para despertar o Israel natural (LARONDELLE, Hans K. Israel e a Igreja. Ministry Magazine, setembro de 1981). Deus não rejeitou os judeus (Romanos 11:1-2), pois Cristo morreu na cruz também por eles. Haverá muitos convertidos entre os judeus nos tempos finais, e eles farão parte do Israel de Deus. Cremos profundamente também que há, de fato, um plano divino para os judeus, quanto à sua participação na fase final da pregação da tríplice mensagem angélica ao mundo (o que pode ser referido como a obra do quarto anjo, ou anjo de Ap 18). Conforme a profecia de Ap 13, pouco antes da volta de Jesus, a besta de dois chifres, que emerge da terra, representada pelos EUA, renunciando os princípios de liberdade religiosa, irá impor o sinal da besta papal, a observância do domingo como dia de guarda, por meio de leis. Tal medida intolerante acarretará a perda da liberdade dos observadores do sábado, que será seguida pelas nações do mundo. Ao perceber a gravidade da questão provocada pela agitação da questão dominical, muitos judeus se converterão a Cristo e aceitarão a verdade e desempenharão um papel importante na grande arrancada final da proclamação do Evangelho, com seus talentos e recursos.

Na efervescência da discussão, em que o sábado é ponto de controvérsia, os judeus participarão de maneira significativa, levantando-se para proclamar a importância do dia sagrado.

Sobre isso, Ellen G. White escreveu: “Haverá muitos conversos entre os judeus, e esses conversos ajudarão a preparar o Caminho do Senhor, e fazer no deserto caminho direto para o nosso Deus. Judeus conversos hão de ter parte importante a desempenhar nos grandes preparativos a serem feitos no futuro para receber a Cristo, nosso Príncipe. Nascerá uma Nação em um dia. Como? Por homens que designou se converterem à verdade” (Evangelismo, p. 579).

“Há entre os judeus alguns que, como Saulo de Tarso, são poderosos nas Escrituras, esses proclamarão com maravilhoso poder a imutabilidade da lei de Deus. O Deus de Israel fará que isto suceda em nossos dias” (Ellen G. White, Obreiros Evangélicos, p. 339).

Portanto, acreditamos, inclusive, que Deus tenha em reserva muitos “Saulos de Tarso” para o momento estratégico e propício. Mas isso não significa qualquer privilégio étnico dos judeus, que os defina como “nação” de Deus e torne o conflito entre judeus e palestinos mais relevante que outros conflitos no mundo.

O “Israel de Deus” ou o Israel espiritual está alicerçado sobre Cristo e tem de produzir frutos. Os mesmos frutos missionários que Deus esperava de Israel étnico. Porque o povo de Deus não mudou, continua sendo aquele que dá fruto. É composto daqueles que creem e obedecem, e que executam a missão. Judeus e gentios integrados em Cristo pela fé Nele participarão da advertência final descrita em Apocalipse 18. E o farão mediante o recebimento do Espírito Santo, prometido pelo Salvador aos que Lhe obedecem (Atos 1:8; 5:32). Quando a última advertência for dada ao mundo, o Senhor virá para buscar seu povo fiel para levá-lo para o Céu (Mt 24:14; Jo 14:1-3). Lá ficarão durante mil anos. No fim do milênio, o Senhor destruirá para sempre Satanás e aqueles que aderiram a sua rebelião (Ap 20:1-14). O Universo ficará livre do pecado. E então Deus recriará a Terra para que seja o lar eterno dos salvos (Ap 21:1-5).

“O grande conflito terminou. Pecado e pecadores não mais existem. O Universo inteiro está purificado. Uma única palpitação de harmonioso júbilo vibra por toda a vasta criação. Daquele que tudo criou emanam vida, luz e alegria por todos os domínios do espaço infinito. Desde o minúsculo átomo até ao maior dos mundos, todas as coisas, animadas e inanimadas, em sua serena beleza e perfeito gozo, declaram que Deus é amor” (Ellen G. White, O Grande Conflito, p. 678).

 

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