LAR, ENFIM
Alberto R. Timm*
O Horizonte Perdido, de
James Hilton,1 descreve o acidente de um avião que, sem combustível,
é obrigado a pousar à noite entre as montanhas do Tibete. Com o impacto da
aterrisagem, o piloto acaba morrendo, mas os quatro passageiros sobrevivem e
são conduzidos por um grupo de tibetanos ao mosteiro lamaísta de Shangri-La.
Naquele lugar, não existe o mal, a vida cresce em amor e sabedoria, e as
pessoas são longevas. Mesmo alheio ao conceito bíblico de que toda a criação
precisa ser “redimida do cativeiro da corrupção” (Rm 8:21), esse romance
expressa uma das mais profundas aspirações do ser humano – o anseio por um
mundo melhor.
Em contraste com a
utopia de Shangri-La, a esperança cristã de “novos céus e nova Terra” (2Pe
3:13) se fundamenta na Palavra de Deus. (Ap 21:1-4).
Mas o acesso ao novo
céu e à nova Terra de perene felicidade passa pelo caminho da cruz (Mc 8:34);
pois “somente pela graça imerecida de Cristo alguém pode ter entrada na cidade
de Deus”.2 Por isso, toda mensagem bíblica aponta para o Cristo
crucificado, cujo sangue vertido na cruz no Calvário abriu um “novo e vivo
caminho” de acesso a Deus (Hb 10:20), para todo o que nEle crê (Jo 3:16).
Preparo
Pela cruz, o pecador é
libertado “do império das trevas” e transportado “para o reino do Filho do Seu
amor” (Cl 1:13). Como cidadão do reino da graça, ele vive no mundo sem ser do
mundo (Jo 17:15, 16), aguardando “uma pátria superior” (Hb 11:16). Seu maior
prazer é viver “em Cristo” (2Co 5:17), tendo “a mente de Cristo” (1Co 2:16), e
familiarizando-se nesta vida com os heróis de Deus que serão seus companheiros
por toda eternidade. Aqueles que serão levados para o Céu “educam sua mente de
modo a estar preparados para entoar os cânticos do Céu”.3 Vivem tão
familiarizados com a atmosfera celestial que o próprio Céu não lhes será um
lugar estranho; pois os que “querem ser santos no Céu precisam ser primeiro
santos na Terra”.4
Em Sua oração
sacerdotal, Cristo orou: “Pai, a Minha vontade é que onde Eu estou, estejam
também comigo os que Me deste” (Jo 17:24). Virá o glorioso e tão esperado dia
em que Cristo despontará nas nuvens para a salvação eterna dos Seus filhos. Os
justos mortos serão ressuscitados e se unirão aos justos vivos em um grande
cortejo que ascenderá à nova Jerusalém. “A cidade de Deus abrirá suas portas de
ouro para receber aquele que, enquanto na Terra, aprendeu a se apoiar em Deus
quanto à direção e sabedoria, conforto e esperança, por entre perdas e
aflições. Os cânticos dos anjos hão de festejar-lhe a entrada ali, e para ele
dará seus frutos a árvore da vida.”5
Novo
mundo
A filosofia grega gerou
na cultura ocidental uma concepção dicotômica da realidade, contrastando a vida
presente, neste mundo material e tangível, e a vida futura, no suposto mundo
imaterial e etéreo das ideias. Para muitos, ainda hoje, a cruz de Cristo é
“escândalo” e “loucura” (1Co 1:23); e um Céu literal, com um santuário literal,
não passa de mera utopia. Em contraste com o pensamento grego, a Palavra de
Deus descreve o novo Céu e a nova Terra de uma perspectiva tão real e concreta
como o mundo em que vivemos, mas sem as limitações impostas pelo pecado. Ali,
“nessas pacíficas planícies, ao lado daquelas correntes vivas, o povo de Deus,
durante tanto tempo peregrino e errante, encontrará um lar”.6
Livres da maldição e da
influência do pecado, os remidos viverão em um ambiente perfeito, onde flores
não mais murcharão e animais não mais serão ferozes (Is 65:17-25). Deus
enxugará “toda lágrima” (Ap 21:4), e nunca mais se ouvirá na cidade de Deus
“nem voz de choro nem de clamor” (Is 65:19). Ali “não haverá lembrança das
coisas passadas” (Is 65:17), não no sentido de absoluta amnésia, mas de
lembranças negativas que roubem a felicidade dos remidos. O cântico dos remidos
traz à lembrança o juízo divino sobre “a grande meretriz que corrompia a Terra
com sua prostituição” e a forma pela qual Deus “vingou o sangue dos Seus
servos” (Ap 19:1-3).
No Céu, “os remidos conhecerão
como são conhecidos.7 Mesmo não se casando nem se dando “em
casamento” (Mt 22:30), os vínculos familiares e de amizade não serão desfeitos.
É-nos assegurado que, na manhã da ressurreição, criancinhas serão “levadas
pelos santos anjos aos braços de suas mães” e “amigos há muito separados pela
morte, reúnem-se, para nunca mais se separarem”.8 Ali estarão reunidos
os salvos de todas as épocas e todos os lugares.
No diálogo entre os
remidos, surgirão expressões de gratidão àqueles que os conduziram a Cristo.
Alguns dirão: “‘Eu era pecador, sem Deus e sem esperança no mundo; e você se
aproximou de mim, e atraiu minha atenção para o precioso Salvador, como minha
única esperança. E eu cri nEle. Arrependi-me de meus pecados, e foi-me dado
assentar juntamente com Seus santos nos lugares celestiais em Cristo Jesus.’
Outros dirão: ‘Eu era pagão, em terras pagãs. Você deixou seu lar confortável e
veio me ajudar a encontrar Jesus, e a crer nEle como o único Deus verdadeiro.
Destruí meus ídolos e adorei a Deus, e agora O vejo face a face. Estou salvo,
eternamente salvo, para ver perpetuamente Aquele a quem amo. Então eu O via
apenas com os olhos da fé, mas agora vejo-O como Ele é. É-me dado agora
expressar Àquele que me amou, e me lavou dos pecados em Seu sangue, minha
gratidão por Sua redentora misericórdia.’”9
Então, “todo remido
compreenderá a atuação dos anjos em sua própria vida. Que maravilha será
entreter conversa com o anjo que foi o seu guardador desde os seus primeiros
momentos, que lhe vigiou os passos e cobriu a cabeça no dia de perigo, que o
protegeu no vale da sombra da morte, que assinalou seu lugar de repouso, que
foi o primeiro a saudá-lo na manhã da ressurreição, e dele aprender a história
da interposição divina na vida individual, e da cooperação celestial em toda a
obra em favor da humanidade”.10
Nenhuma estrutura
terrestre pode ser comparada ao santuário celestial (Hb 8:2; Ap 11:19), onde
está o trono de Deus. É-nos dito que os salvos adorarão “diante do trono de
Deus”, servindo-O “de dia e de noite no Seu santuário” (Ap 7:15; cf. Ap 21:22).
Ellen White acrescenta: “Oh! Que felicidade desfrutaremos nós, reunidos em
volta do trono, envoltos nas vestes brancas da justiça de Cristo. Não mais
tristeza, não mais separação, e, sim, habitar em paz, habitar em felicidade,
habitar em glória por todos os intermináveis séculos da eternidade!”11
Mas o supremo
privilégio dos salvos será ver o próprio Deus face a face. O apóstolo João
afirma que, “quando Deus Se manifestar, seremos semelhantes a Ele, porque
haveremos de vê-Lo com Ele é” (1Jo 3:1-3); e que os servos de Deus “O servirão”
e “contemplarão a Sua face” (Ap 22:3, 4). Cristo assegurou: “Bem-aventurados os
limpos de coração, porque verão a Deus” (Mt 5:8).
Explorando
o Universo
Os remidos de Deus
terão o privilégio de explorar o infinito Universo. “Todos os tesouros do
Universo estarão abertos ao estudo dos remidos de Deus. Livres da mortalidade,
alçarão voo incansável para os mundos distantes – mundos que fremiram de
tristeza ante o espetáculo da desgraça humana, e ressoaram com cânticos de
alegria ao ouvir as novas de uma pessoa resgatada. Com indizível deleite os
filhos da Terra entram de posse da alegria e sabedoria dos seres não caídos.
Participam dos tesouros do saber e entendimento adquiridos durante séculos e
séculos, na contemplação da obra de Deus. Com visão desanuviada olham para a glória
da criação, achando-se sóis, estrelas e sistemas planetários, todos na sua
indicada ordem, a circular em redor do trono da Divindade.”12
Os mistérios da vida
serão estudados em maior profundidade. Mas o objeto supremo de estudo será o
amor de Deus revelado no plano da salvação. “A cruz de Cristo será a ciência e
cântico dos remidos por toda a eternidade… Jamais será esquecido que Aquele
cujo poder criou e manteve os inumeráveis mundos através dos vastos domínios do
espaço, o Amado de Deus, a Majestade do Céu, Aquele a quem querubins e
resplendentes serafins se deleitavam em adorar – humilhou-Se para levantar o
homem decaído; que Ele suportou a culpa e a ignomínia do pecado e a ocultação
da face de Seu Pai, até que as misérias de um mundo perdido Lhe quebrantaram o
coração e aniquilaram a vida na cruz do Calvário. O fato de o Criador de todos
os mundos, o Árbitro de todos os destinos, deixar Sua glória e Se humilhar por
amor do homem, despertará eternamente a admiração e a adoração do Universo.”13
Todas as evidências
demonstram que “o grande conflito vai se aproximando do fim. Toda notícia de
calamidade em terra ou mar é testemunho do fato de que está às portas o fim de
todas as coisas. Guerras e rumores de guerra o declaram… Haverá um só cristão
cuja pulsação não se acelere ao prever os acontecimentos que se iniciam perante
nós? O Senhor vem. Ouvimos os passos de um Deus que Se aproxima!”. 14
Referências:
1. James Hilton,
Horizonte Perdido (Rio de Janeiro: Record, s/d).
2. Ellen G. White,
Parábolas de Jesus, p. 394.
3. __________,
Testemunhos Para a Igreja, v. 2, p. 265.
4. __________, Eventos
Finais, p. 295.
5. __________, O Maior
Discurso de Cristo, p. 100.
6. __________, O Grande
Conflito, p. 675.
7. Ibid., p. 677.
8. Ibid., p. 645.
9. Ellen G. White, Testemunhos
Para a Igreja, v. 6, p. 311.
10. __________,
Educação, p. 305.
11. __________, Este
Dia com Deus (MM 1980), p. 331.
12. Ellen G. White,O
Grande Conflito, p. 677, 678.
13. Ibid., p. 651.
14. Ellen G. White,
Maranata – O Senhor Vem! (MM 1977), p. 360
*Alberto
R. Timm – Diretor associado do Instituto de Pesquisa
Bíblica (BRI, na sigla em inglês), órgão da Associação Geral da IASD.
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